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segunda-feira, 26 de outubro de 2015

DECISÃO: Turma esclarece situações de incidência de contribuição previdenciária em verbas salariais


26/10/15 16:10
DECISÃO: Turma esclarece situações de incidência de contribuição previdenciária em verbas salariais
A 8ª Turma do TRF1, de forma unânime, negou provimento aos agravos regimentais interpostos contra decisão que negou seguimento às apelações, declarando legítima a incidência de contribuição previdenciária sobre as horas extras e respectivos adicionais, adicionais noturno, de periculosidade e insalubridade, assim como sobre o salário-maternidade. A sentença considerou ilegítima, no entanto, a incidência previdenciária sobre o salário dos primeiros 15 dias de afastamento por doença ou acidente, férias indenizadas e 13º salário proporcional ao aviso prévio indenizado.

A União, em seu recurso, alegou omissão do julgado acerca da ofensa ao artigo 97 da Constituição e da legalidade e constitucionalidade da contribuição previdenciária sobre salário dos primeiros 15 dias de afastamento por doença/acidente, terço constitucional de férias indenizadas/gozadas, aviso prévio indenizado, férias indenizadas e 13º proporcional ao aviso prévio.

A outra parte, uma emissora de rádio, por sua vez, interpôs agravo regimental da decisão que manteve a exigibilidade da contribuição previdenciária sobre as seguintes verbas: férias gozadas, salário-maternidade, horas extras, adicional noturno e adicionais de periculosidade e insalubridade.

O Colegiado, ao apreciar o caso, rejeitou os argumentos de ambas as partes. Em seu voto, o relator, desembargador federal Novély Vilanova da Silva Reis, citou diversos precedentes do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do próprio TRF1 para declarar que não incide a contribuição previdenciária sobre o salário dos primeiros 15 dias de afastamento por doença, terço constitucional de férias e aviso prévio indenizado. Também é ilegítima a incidência da mesma contribuição sobre o salário dos primeiros 15 dias de afastamento por acidente, férias indenizadas e 13º proporcional ao aviso prévio indenizado.

É devida, entretanto, a incidência de contribuição previdenciária sobre as horas extras e o respectivo adicional, bem assim sobre os adicionais noturno e de periculosidade. Esse entendimento vale para o salário-maternidade, considerando sua natureza salarial, e para o adicional de insalubridade e férias gozadas.

Processo nº 0013462-42.2013.4.01.3803/MG
Data do julgamento: 25/9/2015
Data de publicação: 9/10/2015

sexta-feira, 23 de outubro de 2015

Informativo STJ n. 0568\2015

Informativo n. 0568Período: 3 a 16 de setembro de 2015.
Recursos Repetitivos
DIREITO EMPRESARIAL E PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE POR AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO DE INSCRIÇÃO DE CORRENTISTA NO CCF. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ). TEMA 874.
O Banco do Brasil, na condição de gestor do Cadastro de Emitentes de Cheques sem Fundos (CCF), não tem a responsabilidade de notificar previamente o devedor acerca da sua inscrição no aludido cadastro, tampouco legitimidade passiva para as ações de reparação de danos diante da ausência de prévia comunicação. Inicialmente, destaca-se que a Segunda Seção do STJ, no julgamento do REsp 1.061.134-RS, fixou, para os efeitos do art. 543-C do CPC, a tese de que "os órgãos mantenedores de cadastros possuem legitimidade passiva para as ações que buscam a reparação dos danos morais e materiais decorrentes da inscrição, sem prévia notificação, do nome de devedor em seus cadastros restritivos, inclusive quando os dados utilizados para a negativação são oriundos do CCF do Banco Central ou de outros cadastros mantidos por entidades diversas". No entanto, o CCF tem natureza, finalidade e características específicas, que não se confundem com as de outros cadastros a que se refere imediatamente a lógica daquele julgado. Com efeito, o CCF tem natureza pública, visa à proteção do crédito em geral e à preservação da higidez do sistema financeiro nacional, servindo aos interesses da coletividade (art. 192 do CF), envolvendo relevante interesse de ordem pública, submetido a normas de cunho estatutário obrigatório, estabelecidas pelas autoridades monetárias, operando sob controle do Banco Central do Brasil (Bacen), sem prevalente intuito de obtenção de ganhos. Já os demais cadastros são de natureza privada, instituídos e mantidos no interesse de particulares, sociedades empresárias atuantes, sem vínculo sistêmico, no ramo comercial, submetidos a normas de índole meramente contratual, operados por entidades privadas, que os exploram com nítido intuito da obtenção de lucro. Segundo a Resolução 1.682/1990 do Bacen, a inclusão no CCF ocorre automaticamente quando o cheque é devolvido por: a) falta de provisão de fundos (motivo 12), na segunda apresentação; b) conta encerrada (motivo 13); e c) prática espúria (motivo 14). Conforme o art. 10 da referida Resolução e o item 14 da Circular 2.989/2000 do Bacen: "Nas devoluções pelos motivos 12 a 14, o banco sacado é responsável pela inclusão do emitente no Cadastro de Emitentes de Cheques sem Fundos (CCF)". A mesma Resolução dispõe que a instituição financeira, ao recusar o pagamento de cheque por motivo que enseje a inclusão de ocorrência no CCF, deve providenciar a referida inclusão no prazo de quinze dias, contados da data de devolução do cheque. Por sua vez, o correntista não fica prejudicado pela inscrição de seu nome no CCF, senão após previamente notificado, pois as ocorrências do CCF devem ser obrigatoriamente comunicadas pela instituição financeira sacada, por escrito, ao respectivo correntista emitente do cheque e, somente após, serão consolidadas pelo executante dos serviços de compensação de cheques e outros papéis e distribuídas, em meios magnéticos, às instituições bancárias, conforme o art. 16 e o art. 27, "a", da Resolução 1.682/1990 do Bacen, alterado pelo art. 1º da Circular 2.250 do Bacen. Assim, tratando-se de sistema financeiro, não pode o Banco do Brasil encarregar-se de desempenhar função estranha, notificação prévia de emitente de cheque sem provisão de fundos, dever que as normas de regência do sistema atribuem corretamente a outro componente do sistema, o próprio banco sacado, instituição financeira mais próxima do correntista, detentor do cadastro desse cliente e do próprio saldo da conta do correntista, como depositário. É, pois, de reconhecer-se a ilegitimidade do Banco do Brasil, na condição de gestor do CCF, para responder pela ausência de prévia notificação aos correntistas inscritos no CCF, pelo que descabe cogitar-se de sua responsabilização por danos materiais ou morais, exceto nas hipóteses em que também figure como banco sacado. Precedentes citados: REsp 1.425.756-RS, Terceira Turma, DJe de 16/6/2014; e AgRg no AREsp 230.981-RS, Quarta Turma, DJe de 17/9/2014. REsp 1.354.590-RS, Rel. Min. Raul Araújo, Segunda Seção, julgado em 9/9/2015, DJe 15/9/2015.
Recursos Repetitivos
DIREITO PENAL. CONFIGURAÇÃO DO CRIME DE ESTUPRO DE VULNERÁVEL. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ). TEMA 918.
Para a caracterização do crime de estupro de vulnerável previsto no art. 217-A, caput, do Código Penal, basta que o agente tenha conjunção carnal ou pratique qualquer ato libidinoso com pessoa menor de 14 anos; o consentimento da vítima, sua eventual experiência sexual anterior ou a existência de relacionamento amoroso entre o agente e a vítima não afastam a ocorrência do crime. Inicialmente, registre-se que a interpretação jurisprudencial acerca do art. 224, "a", do CP (antes da entrada em vigor da Lei 12.015/2009) já vinha se consolidando no sentido de que respondia por estupro ou por atentado violento ao pudor o agente que mantinha relações sexuais (ou qualquer ato libidinoso) com menor de 14 anos, mesmo sem violência real, e ainda que mediante anuência da vítima (EREsp 1.152.864-SC, Terceira Seção, DJe 1º/4/2014). Com efeito, o fato de alterações legislativas terem sido incorporadas pela Lei 12.015/2009 ao "Título IV - Dos Crimes contra a Dignidade Sexual", especialmente ao "Capítulo II - Dos Crimes Sexuais contra Vulnerável", do CP, estanca, de uma vez por todas, qualquer dúvida quanto à irrelevância, para fins de aperfeiçoamento do tipo penal inscrito no caput do art. 217-A, de eventual consentimento da vítima ao ato libidinoso, de anterior experiência sexual ou da existência de relacionamento amoroso entre ela e o agente. Isso porque, a despeito de parte da doutrina sustentar o entendimento de que ainda se mantém a discussão sobre vulnerabilidade absoluta e vulnerabilidade relativa, o tipo penal do art. 217-A do CP não traz como elementar a expressão "vulnerável". É certo que o nomem iuris que a Lei 12.015/2009 atribui ao citado preceito legal estipula o termo "estupro de vulnerável". Entretanto, como salientado, a "vulnerabilidade" não integra o preceito primário do tipo. Na verdade, o legislador estabelece três situações distintas em que a vítima poderá se enquadrar em posição de vulnerabilidade, dentre elas: "Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos". Não cabe, destarte, ao aplicador do direito relativizar esse dado objetivo, com o fim de excluir a tipicidade da conduta. A propósito, há entendimento doutrinário no viés de que: "Hoje, com louvor, visando acabar, de uma vez por todas, com essa discussão, surge em nosso ordenamento jurídico penal, fruto da Lei nº 12.015, de 7 de agosto de 2009, o delito que se convencionou denominar de estupro de vulnerável, justamente para identificar a situação de vulnerabilidade que se encontra a vítima. Agora, não poderão os Tribunais entender de outra forma quando a vítima do ato sexual for alguém menor de 14 (quatorze) anos. [...]. O tipo não está presumindo nada, ou seja, está tão somente proibindo que alguém tenha conjunção carnal ou pratique outro ato libidinoso com menor de 14 anos, bem como com aqueles mencionados no § 1º do art. 217-A do Código Penal. Como dissemos anteriormente, existe um critério objetivo para análise da figura típica, vale dizer, a idade da vítima". Dessa forma, não se pode qualificar ou etiquetar comportamento de crianças, de modo a desviar a análise da conduta criminosa ou justificá-la. Expressões como "amadurecimento sexual da adolescente", "experiência sexual pretérita da vítima" ou mesmo a utilização das expressões "criança prostituta" ou "criança sedutora" ainda frequentam o discurso jurisprudencial, como se o reconhecimento de tais circunstâncias, em alguma medida, justificasse os crimes sexuais perpetrados. Esse posicionamento, todavia, implica a impropriedade de se julgar a vítima da ação delitiva para, a partir daí, julgar-se o agente. Refuta-se, ademais, o frágil argumento de que o desenvolvimento da sociedade e dos costumes possa configurar fator que não permita a subsistência de uma presunção que toma como base a innocentia consilli da vítima. Basta um rápido exame da história das ideias penais - e, em particular, das opções de política criminal que deram ensejo às sucessivas normatizações do Direito Penal brasileiro - para se constatar que o caminho da "modernidade" é antípoda a essa espécie de proposição. Deveras, de um Estado ausente e de um Direito Penal indiferente à proteção da dignidade sexual de crianças e adolescentes, evoluiu-se, paulatinamente, para uma Política Social e Criminal de redobrada preocupação com o saudável crescimento físico, mental e afetivo do componente infanto-juvenil de nossa população, preocupação que passou a ser compartilhada entre o Estado, a sociedade e a família, com reflexos na dogmática penal. Assim é que novas tipificações vieram reforçar a opção do Estado brasileiro - na linha de similar esforço mundial - de combater todo tipo de violência, sobretudo a sexual, contra crianças e adolescentes. É anacrônico, portanto, qualquer discurso que procure considerar a modernidade, a evolução moral dos costumes sociais e o acesso à informação como fatores que se contrapõem à natural tendência civilizatória de proteger certos grupos de pessoas física, biológica, social ou psiquicamente fragilizadas. Além disso, não há que se falar em aplicação do princípio da adequação social, porquanto no julgamento de caso de estupro de vulnerável deve-se evitar carga de subjetivismo, sob pena de ocorrência de possíveis danos relevantes ao bem jurídico tutelado - o saudável crescimento físico, psíquico e emocional de crianças e adolescentes - que, recorde-se, conta com proteção constitucional e infraconstitucional, não sujeito a relativizações. Ora, a tentativa de não conferir o necessário relevo à prática de relações sexuais entre casais em que uma das partes (em regra, a mulher) é menor de 14 anos, com respaldo nos costumes sociais ou na tradição local, tem raízes em uma cultura sexista - ainda muito impregnada no âmago da sociedade ocidental, sobretudo em comunidades provincianas, segundo a qual meninas de tenra idade, já informadas dos assuntos da sexualidade, estão aptas a manter relacionamentos duradouros e estáveis (envolvendo, obviamente, a prática sexual), com pessoas adultas. Ressalta-se, por fim, que praticamente todos os países do mundo repudiam o sexo entre um adulto e um adolescente - e, mais ainda, com uma criança - e tipificam como crime a conduta de praticar atos libidinosos com pessoa ainda incapaz de ter o seu consentimento reconhecido como válido. Precedentes citados: AgRg nos EDcl no AREsp 191.197-MS, Quinta Turma, DJe 19/12/2014; e AgRg no REsp 1.435.416-SC, Sexta Turma, DJe 3/11/2014. REsp 1.480.881-PI, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Terceira Seção, julgado em 26/8/2015, DJe 10/9/2015.
DIREITO PENAL. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE INDEPENDENTEMENTE DO ADIMPLEMENTO DA PENA DE MULTA. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ). TEMA 931.
Nos casos em que haja condenação a pena privativa de liberdade e multa, cumprida a primeira (ou a restritiva de direitos que eventualmente a tenha substituído), o inadimplemento da sanção pecuniária não obsta o reconhecimento da extinção da punibilidade. A Lei 9.268/1996 deu nova redação ao art. 51 do CP e extirpou do diploma jurídico a possibilidade de conversão da pena de multa em detenção, no caso de inadimplemento da sanção pecuniária. Após a alteração legislativa, o mencionado artigo passou a vigorar com a seguinte redação: "Transitada em julgado a sentença condenatória, a multa será considerada dívida de valor, aplicando-se-lhes as normas da legislação relativa à dívida ativa da Fazenda Pública, inclusive no que concerne às causas interruptivas e suspensivas da prescrição". Portanto, diante da nova redação dada ao CP, a pena de multa não mais possui o condão de constranger o direito à locomoção do sentenciado (STF: AgRg no HC 81.480-SP, Primeira Turma, DJ 5/4/2002; e HC 73.758-SP, Segunda Turma, DJ 24/9/1999). É imperioso frisar que a nova redação do art. 51 do CP trata da pena de multa como dívida de valor já a partir do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, ou seja, em momento, inclusive, anterior ao próprio cumprimento da pena privativa de liberdade ou da restritiva de direitos. Isso implica afirmar que o jus puniendi do Estado exaure-se ao fim da execução da pena privativa de liberdade ou da restritiva de direitos, porquanto, em nenhum momento, engloba a pena de multa, considerada dívida de valor a partir do trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Entendimento oposto, ou seja, a possibilidade de constrição da liberdade daquele que é apenado somente em razão de sanção pecuniária, consistiria em legitimação da prisão por dívida, em afronta, portanto, ao disposto no art. 5º, LXVII, da CF e, ainda, no art. 7º, 7, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), cujo texto estabelece que "ninguém deve ser detido por dívida". Dessa forma, o reconhecimento da pena de multa como dívida de valor atribui à sanção pecuniária caráter extrapenal. Se a natureza da multa, após o trânsito em julgado da condenação, fosse compreendida como de caráter penal, mesmo diante da extinção da pena privativa de liberdade ou da restritiva de direitos pelo cumprimento, os efeitos da sentença se conservariam até o adimplemento da pena pecuniária, porquanto não reconhecida a extinção da punibilidade do apenado. Após a alteração legislativa que considerou a pena de multa como dívida de valor, deve-se assinalar também a alteração da competência para a execução da sanção, exclusiva, então, da Fazenda Pública, conforme disposto no enunciado da Súmula 521 do STJ: "A legitimidade para a execução fiscal de multa pendente de pagamento imposta em sentença condenatória é exclusiva da Fazenda Pública". Portanto, extinta a pena privativa de liberdade (ou restritiva de direitos) pelo seu cumprimento, o inadimplemento da pena de multa não obsta a extinção da punibilidade do apenado, porquanto, após a nova redação do art. 51 do CP, dada pela Lei 9.268/1996, a pena pecuniária é considerada dívida de valor e, desse modo, possui caráter extrapenal, de forma que sua execução é de competência exclusiva da Procuradoria da Fazenda Pública. REsp 1.519.777-SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Terceira Seção, julgado em 26/8/2015, DJe 10/9/2015.
Segunda Seção
DIREITO EMPRESARIAL. PRAZO DE PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO DE COBRANÇA DE DEMURRAGE.
Prescreve em cinco anos a pretensão de cobrança de valores estabelecidos em contrato de transporte marítimo de cargas (unimodal) para as despesas de sobre-estadia de contêiner (demurrage). A distinção entre o que se denominou ser transporte multimodal e o transporte dito unimodal, pelo menos para fins de definição do prazo prescricional aplicável à eventual pretensão de cobrança de despesas de sobre-estadia de contêineres, não se fazia relevante até a entrada em vigor do novo Código Civil, já que, ainda que se admitisse a existência de demurrage no transporte multimodal, para ambos os casos o prazo previsto necessariamente seria ânuo. No caso do transporte unimodal, por força do estabelecido pelo Código Comercial, e, no do transporte multimodal, em virtude da específica regra do art. 22 da Lei 9.611/1998. Ocorre que o artigo do Código Comercial que estabelecia o prazo de prescrição de um ano para a hipótese (art. 449, 3) foi expressamente revogado pelo Código Civil de 2002 (art. 2.045). Já quanto ao não cumprimento das responsabilidades decorrentes do transporte multimodal, o prazo prescricional permanece sendo de um ano por expressa previsão no art. 22 da Lei 9.611/1998. Ademais, nenhuma relação com a hipótese guarda o art. 8º do Decreto-Lei 116/1967, haja vista dispor no sentido de que prescrevem "ao fim de um ano, contado da data do término da descarga do navio transportador", as ações decorrentes do eventual extravio da carga transportada, bem como da falta de conteúdo, diminuição, perdas e avarias ou danos a esta. Quanto à aplicação analógica do art. 22 da Lei 9.611/1998, esta é absolutamente incabível, pois não se coaduna com os princípios gerais que regem o Direito Civil brasileiro, além de constituir verdadeiro atentado à segurança jurídica. É justamente a diferença existente entre as atividades desempenhadas pelo transportador marítimo e aquelas legalmente exigidas do Operador de Transporte Multimodal que revela, por si só, a manifesta impossibilidade de se estender à pretensão de cobrança de despesas decorrentes da sobre-estadia de contêineres (pretensão do transportador unimodal contra o contratante do serviço) a regra que estabelece o prazo prescricional ânuo para as ações fundadas no não cumprimento das responsabilidades decorrentes do transporte multimodal (pretensões dos contratantes do serviço contra o Operador de Transporte Multimodal). Vale destacar que, no caso do transporte unimodal (marítimo), a responsabilidade do transportador é restrita ao percurso marítimo, que se inicia após o recebimento da carga a bordo do navio no porto de origem, cessando imediatamente após o içamento das cargas e o consequente desembarque no porto de destino. Ou seja, os demais serviços e atos correlatos, tais como desembaraço aduaneiro, transporte, desunitização dos contêineres etc., são de exclusiva responsabilidade do afretador, e, por tal motivo, a demora na conclusão desse procedimento pode resultar em demasiado atraso na devolução dos contêineres utilizados no transporte da carga ao transportador. Essa situação que não se verifica no transporte multimodal de cargas, visto que este compreende, consoante expressamente disposto no art. 3º da Lei 9.611/1998, "além do transporte em si, os serviços de coleta, unitização, desunitização, movimentação, armazenagem e entrega da carga ao destinatário, bem como a realização dos serviços correlatos que forem contratados entre a origem e o destino, inclusive os de consolidação e desconsolidação documental de cargas". Em outras palavras, em nenhum momento a unidade de carga deixa de estar sob a posse e o controle do operador de transporte multimodal, sendo descabido, portanto, falar, em tal caso, na existência de responsabilidade do contratante por suposta sobre-estadia de contêineres. Além da dessemelhança das situações em apreço, certo é que, em se tratando de regras jurídicas sobre prazos prescricionais, a interpretação analógica ou extensiva sequer é admitida pelo ordenamento jurídico. A própria inteligência do caput do art. 205 do Código Civil evidencia a impossibilidade de interpretação analógica ou extensiva de norma sobre prescrição, visto que estabelece o prazo prescricional decenal como regra geral a ser aplicada nas hipóteses em que prazo inferior não seja expressamente fixado por lei. Desse modo, diante da certeza de que o art. 22 da Lei 9.611/1998 não alcança as ações de cobrança de despesas de sobre-estadia decorrentes da execução de contrato de transporte de cargas unimodal e de que inexiste lei especial vigente que defina prazo prescricional específico para a referida pretensão, a matéria deve ser regida pelas disposições insertas no Código Civil. Não por outro motivo é que ambas as Turmas julgadoras integrantes da Segunda Seção do STJ já haviam reconhecido que, em se tratando de transporte unimodal de cargas, quando a taxa de sobre-estadia objeto da cobrança for oriunda de disposição contratual que estabeleça os dados e os critérios necessários ao cálculo dos valores devidos a título de ressarcimento pelos prejuízos causados em virtude do retorno tardio do contêiner, será quinquenal o prazo prescricional (art. 206, § 5º, I, do CC); caso contrário, ou seja, nas hipóteses em que inexistente prévia estipulação contratual, aplica-se a regra geral do art. 205 do CC, ocorrendo a prescrição em dez anos. Precedentes citados: REsp 1.192.847-SP, Terceira Turma, DJe 1º/8/2014; e REsp 1.355.173-SP, Quarta Turma, DJe 17/2/2014. REsp 1.340.041-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 24/6/2015, DJe 4/9/2015.
Terceira Seção
DIREITO PROCESSUAL PENAL. UTILIZAÇÃO DE FORMULÁRIOS FALSOS DA RECEITA FEDERAL E COMPETÊNCIA.
O fato de os agentes, utilizando-se de formulários falsos da Receita Federal, terem se passado por Auditores desse órgão com intuito de obter vantagem financeira ilícita de particulares não atrai, por si só, a competência da Justiça Federal. Isso porque, em que pese tratar-se de uso de documento público, observa-se que a falsidade foi empregada, tão somente, em detrimento de particular. Assim sendo, se se pudesse cogitar de eventual prejuízo sofrido pela União, ele seria apenas reflexo, na medida em que o prejuízo direto está nitidamente limitado à esfera individual da vítima, uma vez que as condutas em análise não trazem prejuízo direto e efetivo a bens, serviços ou interesses da União, de suas entidades autárquicas ou empresas públicas (art. 109, IV, da CF).CC 141.593-RJ, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 26/8/2015, DJe 4/9/2015.
Segunda Turma
DIREITO ADMINISTRATIVO. ALTERAÇÃO NO CNPJ POR TRANSFORMAÇÃO DE SOCIEDADE COOPERATIVA.
A alteração no CNPJ da razão social de sociedade cooperativa que modificou sua forma jurídica não exige o prévio cancelamento de sua autorização para funcionar e de seu registro. O art. 4º da Lei 5.764/1971 estabelece que "as cooperativas são sociedades de pessoas, com forma e natureza jurídica próprias, de natureza civil, não sujeitas a falência, constituídas para prestar serviços aos associados [...]". Consoante a doutrina e a jurisprudência do STJ, as cooperativas são sociedades simples (art. 982, parágrafo único, do CC) que não exercem atividade empresarial (art. 1.093 do CC). Nesse contexto, a melhor interpretação ao art. 63, IV, da Lei 5.764/1971 - segundo o qual, em caso de transformação da forma jurídica, ocorrerá, de pleno direito, a dissolução da sociedade cooperativa - é aquela que implica reconhecer tão somente a resolução da função social para a qual foi criada a cooperativa, promovendo sua conversão na entidade societária pretendida. O art. 1.113 do CC autoriza o ato de transformação societária independentemente "de dissolução ou liquidação da sociedade", resguardando, apenas, a observância dos "preceitos reguladores da constituição e inscrição do tipo em que vai converter-se", de modo que a transformação do tipo societário simples (classificação das cooperativas) não impõe a necessidade de liquidá-la, porque a pessoa jurídica é uma só, tanto antes quanto depois da operação, mudando apenas o tipo. REsp 1.528.304-RS, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 20/8/2015, DJe 1º/9/2015.
DIREITO ADMINISTRATIVO. POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA A ESTAGIÁRIO.
O estagiário que atua no serviço público, ainda que transitoriamente, remunerado ou não, está sujeito a responsabilização por ato de improbidade administrativa (Lei 8.429/1992). De fato, o conceito de agente público, constante dos artigos 2º e 3º da Lei 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa), abrange não apenas os servidores públicos, mas todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função na Administração Pública. Assim, na hipótese em análise, o estagiário, que atua no serviço público, enquadra-se no conceito legal de agente público preconizado pela Lei 8.429/1992. Ademais, as disposições desse diploma legal são aplicáveis também àquele que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma, direta ou indireta. Isso porque o objetivo da Lei de Improbidade não é apenas punir, mas também afastar do serviço público os que praticam atos incompatíveis com o exercício da função pública. REsp 1.352.035-RS, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 18/8/2015, DJe 8/9/2015.
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. PRAZO DECADENCIAL DO DIREITO DE PLEITEAR REVISÃO DE PENSÃO PREVIDENCIÁRIA DECORRENTE DE MORTE.
O prazo decadencial do direito de revisar o valor do salário de benefício da pensão previdenciária por morte mediante o recálculo da renda mensal inicial do benefício originário de aposentadoria conta-se após o deferimento do ato de pensionamento. Isso porque, em decorrência do princípio da actio nata, a legitimidade do pensionista para propositura de ação de revisão advém apenas com o óbito do segurado, já que, por óbvio, aquele não era titular do benefício originário, direito personalíssimo. REsp 1.529.562-CERel. Min. Herman Benjamin, julgado em 20/8/2015, DJe 11/9/2015.
DIREITO TRIBUTÁRIO. INCIDÊNCIA DE PIS/PASEP-IMPORTAÇÃO E COFINS-IMPORTAÇÃO SOBRE A IMPORTAÇÃO DE ANIMAL SILVESTRE.
Há incidência de contribuição para o PIS/PASEP-Importação e de COFINS-Importação sobre a importação de animal silvestre, ainda que sua internalização no território nacional tenha ocorrido via contrato de permuta de animais. O art. 1º, caput, da Lei 10.865/2004 instituiu a Contribuição para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público incidente na Importação de Produtos Estrangeiros ou Serviços (PIS/PASEP-Importação) e a Contribuição Social para o Financiamento da Seguridade Social devida pelo Importador de Bens Estrangeiros ou Serviços do Exterior (COFINS-Importação), com base nos arts. 149, § 2º, II, e 195, IV, da CF, observado o disposto no seu art. 195, § 6º. Da análise da referida Lei, verifica-se que o fato gerador de ambas as contribuições, nos termos do art. 3º, I, faz referência a "bens" e não a "produtos" ou "mercadorias". Logo, discutir se os animais objeto do contrato se enquadram nos conceitos de produto e mercadoria é irrelevante no plano infraconstitucional. Ademais, os artigos seguintes da mencionada Lei deixam clara a intenção do legislador em tributar os bens importados, não havendo restrição aos que estariam enquadrados nos conceitos de "produto" ou "mercadoria". Registre-se, ad argumentandum tantum, que até mesmo no plano constitucional é despicienda, na hipótese, a análise dos conceitos de "produto" e "mercadoria", tendo em vista que o art. 195, IV, quando trata do financiamento da seguridade social, determina que ela também ocorrerá mediante recursos provenientes de contribuições do importador de bens, não havendo referência, nesse dispositivo constitucional, aos referidos termos. Dessa forma, os animais silvestres objeto de contrato de permuta enquadram-se no conceito de bem definido no art. 82 do CC para fins de incidência do PIS/PASEP-Importação e da COFINS-Importação, pelo que a sua internalização no território nacional está sujeita às referidas contribuições. Ressalte-se que, ainda que no contrato de permuta o pagamento não se realize com moeda, mas sim com a entrega do bem que se pretende trocar, tal fato não retira a possibilidade de se atribuir valor financeiro, ou preço, à operação realizada, sobretudo porque o art. 533 do CC determina a aplicação à permuta das disposições referentes à compra e venda.REsp 1.254.117-SC, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 18/8/2015, DJe 27/8/2015.
DIREITO TRIBUTÁRIO. INCIDÊNCIA DE IR SOBRE LUCROS CESSANTES.
Os valores percebidos, em cumprimento de decisão judicial, a título de pensionamento por redução da capacidade laborativa decorrente de dano físico causado por terceiro são tributáveis pelo Imposto de Renda (IR).Para a materialização da hipótese de incidência do IR, requer-se, simplesmente, a existência de acréscimo patrimonial, consistente na aquisição de riqueza nova, independentemente da fonte ou procedência do ganho, exceto em situações de imunidade ou isenção. Tal afirmação encontra-se em sintonia com o princípio tributário intitulado pecunia non olet, que, de acordo com a doutrina, "significa que o 'dinheiro não tem cheiro'", razão pela qual "o tributo será cobrado de todos aqueles que apresentam capacidade contributiva (capacidade econômica)". Feitas essas considerações, sob a ótica do Código Civil, notadamente dos arts. 402 e 403, tem-se que indenização corresponde a perdas e danos, devendo englobar não apenas o que o indivíduo perdeu, como também o que deixou de lucrar, este último denominado "lucros cessantes". Nesse contexto, a natureza indenizatória dos lucros cessantes não os retira do âmbito de incidência do IR, pois o que interessa para a tributação por intermédio do referido tributo, como visto acima, é a obtenção de riqueza nova, ou seja, a ocorrência de acréscimo patrimonial. Assim, para fins de incidência do IR, o nomen iuris atribuído à verba é irrelevante. No caso dos valores percebidos a título de pensionamento por redução da capacidade laborativa decorrente de dano físico causado por terceiro, não obstante a verba ostente a natureza de lucros cessantes - o que a qualifica como verba indenizatória -, há acréscimo patrimonial apto a autorizar a incidência do IR com base no art. 43, II, do CTN. REsp 1.464.786-RSRel. Min. Og Fernandes, julgado em 25/8/2015, DJe 9/9/2015.
DIREITO TRIBUTÁRIO E PREVIDENCIÁRIO. GRATIFICAÇÕES E PRÊMIOS E CONTRIBUIÇÃO PREVIDÊNCIÁRIA.
Não incide contribuição previdenciária sobre prêmios e gratificações de caráter eventual. A fim de verificar a sua inclusão ou não no salário-de-contribuição, uma das principais características a ser aferida sobre as gratificações e os prêmios é a habitualidade ou não de seu pagamento. Havendo pagamento com habitualidade, manifesto o caráter salarial, implicando ajuste tácito entre as partes, razão pela qual incide contribuição previdenciária. A propósito, o STF possui entendimento firmado pela Súmula 207 ("As gratificações habituais, inclusive a de natal, consideram-se tacitamente convencionadas, integrando o salário"). Tratando-se de prêmio ou gratificação eventual, fica afastada a incidência da contribuição, conforme o art. 28, § 9º, "e", 7, da Lei 8.212/1991. REsp 1.275.695-ES, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 20/8/2015, DJe 31/8/2015.
DIREITO TRIBUTÁRIO E PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-FAMÍLIA E CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA.
Não incide contribuição previdenciária sobre salário-família. A doutrina aponta que a natureza jurídica do salário-família não é de salário, em que pese o nome, na medida em que não é pago como contraprestação de serviços prestados pelo empregado. Realizando-se uma interpretação sistemática da legislação de regência (art. 70 da Lei 8.213/1991 e art. 28, § 9º, "a", da Lei 8.212/1991), verifica-se que se trata de benefício de natureza previdenciária não incorporável ao cômputo dos rendimentos que integrarão a aposentadoria do trabalhador. REsp 1.275.695-ES, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 20/8/2015, DJe 31/8/2015.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. LEGITIMIDADE DO MP PARA PROPOR ACP OBJETIVANDO A LIBERAÇÃO DE SALDO DE CONTAS PIS/PASEP DE PESSOAS COM INVALIDEZ.
O Ministério Público tem legitimidade para propor ação civil pública objetivando a liberação do saldo de contas PIS/PASEP, na hipótese em que o titular da conta - independentemente da obtenção de aposentadoria por invalidez ou de benefício assistencial - seja incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, bem como na hipótese em que o próprio titular da conta ou quaisquer de seus dependentes for acometido das doenças ou afecções listadas na Portaria Interministerial MPAS/MS 2.998/2001. Embora a LC 75/1993, em seu art. 6º, VII, "d", preceitue que "Compete ao Ministério Público da União (...) VII - promover o inquérito civil e a ação civil pública para: (...) d) outros interesses individuais indisponíveis, homogêneos, sociais, difusos e coletivos", o Ministério Público somente terá sua representatividade adequada para propor ação civil pública quando a ação tiver relação com as atribuições institucionais previstas no art. 127, caput, da Constituição da República ("O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis"). Deve-se destacar, nesse passo, que a jurisprudência do STF e do STJ assinala que, quando se trata de interesses individuais homogêneos - até mesmo quando disponíveis - a legitimidade do Ministério Público para propor ação coletiva é reconhecida se evidenciado relevante interesse social do bem jurídico tutelado, atrelado à finalidade da instituição (RE 631.111-GO, Tribunal Pleno, DJe 30/10/2014; REsp 1.209.633-RS, Quarta Turma, DJe 4/5/2015). Ademais, ao se fazer uma interpretação sistemática dos diplomas que formam o microssistema do processo coletivo, seguramente pode-se afirmar que, por força do art. 21 da Lei 7.347/1985, aplica-se o Capítulo II do Título III do Código de Defesa do Consumidor (CDC) à hipótese em análise. Com efeito, a tutela coletiva será exercida quando se tratar de interesses/direitos difusos, coletivos e individuais coletivos, nos termos do art. 81, parágrafo único, do CDC. Assim, necessário observar que, no caso, o interesse tutelado referente à liberação do saldo do PIS/PASEP, mesmo se configurando como individual homogêneo (Lei 8.078/1990), mostra-se de relevante interesse à coletividade, tornando legítima a propositura de ação civil pública pelo Parquet, visto que se subsume aos seus fins institucionais. REsp 1.480.250-RS, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 18/8/2015, DJe 8/9/2015.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. NATUREZA JURÍDICA DO TERMO DE ACORDO DE PARCELAMENTO PARA FINS DE EXECUÇÃO.
O Termo de Acordo de Parcelamento que tenha sido subscrito pelo devedor e pela Fazenda Pública deve ser considerado documento público para fins de caracterização de título executivo extrajudicial, apto à promoção de ação executiva, na forma do art. 585, II, do CPC. De fato, o art. 585, II, do CPC elenca o "documento público assinado pelo devedor" dentre os títulos executivos extrajudiciais, mas não traz o seu conceito, sendo que o art. 364 do CPC revela tão somente a força probante do referido documento, ao referir que "faz prova não só da sua formação, mas também dos fatos que o escrivão, o tabelião, ou o funcionário declarar que ocorreram na sua presença". Nesse contexto, o STJ, ao analisar situação similar, assentou que "a melhor interpretação para a expressão documento público é no sentido de que tal documento é aquele produzido por autoridade, ou em sua presença, com a respectiva chancela, desde que tenha competência para tanto" (REsp 487.913-MG, Primeira Turma, DJ 9/6/2003). Ademais, essa mesma linha de raciocínio é seguida pela doutrina, que define documento público como "todo aquele cuja elaboração se deu perante qualquer órgão público, como, por exemplo um termo de confissão de dívida em repartição administrativa". Dessa forma, na hipótese em análise, não há como extirpar da declaração de vontades exarada pelas partes no âmbito administrativo a natureza de documento público, na medida em que lavrada sob a chancela de órgão público e firmado pelo devedor, externando a vontade da Administração Pública e do particular. REsp 1.521.531-SE, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 25/8/2015, DJe 3/9/2015.
Terceira Turma
DIREITO CIVIL. ALTERAÇÃO DE FACHADA SEM AUTORIZAÇÃO DA TOTALIDADE DOS CONDÔMINOS.
O condômino não pode, sem a anuência de todos os condôminos, alterar a cor das esquadrias externas de seu apartamento para padrão distinto do empregado no restante da fachada do edifício, ainda que a modificação esteja posicionada em recuo, não acarrete prejuízo direto ao valor dos demais imóveis e não possa ser vista do térreo, mas apenas de andares correspondentes de prédios vizinhos. Destaca-se que o legislador, tanto no Código Civil como na Lei 4.591/1964, faz referência expressa à proibição de se alterar a cor das esquadrias externas ao dispor, respectivamente, que "São deveres do condômino: [...] não alterar a forma e a cor da fachada, das partes e esquadrias externas" (inciso III do art. 1.336) e que "É defeso a qualquer condômino: [...] decorar as partes e esquadriais externas com tonalidades ou côres diversas das empregadas no conjunto da edificação" (inciso II do art. 10), ressalvando-se a possibilidade de sua modificação quando autorizada pela unanimidade dos condôminos (art. 10, § 2º, da Lei 4.591/1946). A consideração de que a alteração seria possível porque pouco visível a partir da vista da rua e por não acarretar prejuízo direto no valor dos demais imóveis do condomínio fere a literalidade da norma, pois é indiscutível que houve alteração na fachada do prédio. Admitir que apenas as alterações visíveis do térreo possam caracterizar alteração da fachada, passível de desfazimento, poderia levar ao entendimento de que, em arranha-céus, os moradores dos andares superiores, quase invisíveis da rua, não estariam sujeitos ao regramento em análise. De igual modo, poderia ensejar a descaracterização do padrão arquitetônico da obra, ainda que a alteração da fachada seja avistável apenas dos prédios vizinhos em andares correspondentes, visto posicionar-se em área recuada. Há de se considerar que recuos são recursos arquitetônicos comuns e que, se localizados na face externa da edificação, não deixam de compor a fachada. De fato, fachada não é somente aquilo que pode ser visualizado do térreo. Assim, isoladamente, a alteração pode não afetar diretamente o preço dos demais imóveis do edifício, mas deve-se ponderar que, se cada proprietário de unidade superior promover sua personalização, empregando cores de esquadrias que entender mais adequadas ao seu gosto pessoal, a quebra da unidade arquitetônica seria drástica, com a inevitável desvalorização do condomínio. Registre-se, por fim, que não se ignoram as discussões doutrinárias e jurisprudenciais a respeito da alteração de fachada, mais especificamente acerca de fechamento de varandas com vidros incolores, instalação de redes de segurança e até substituição de esquadrias com material diverso do original quando este não se encontra mais disponível no mercado. Entretanto, na hipótese em apreço, foi utilizada esquadria de cor diversa do conjunto arquitetônico, alteração jamais admitida e em flagrante violação do texto legal. REsp 1.483.733-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 25/8/2015, DJe 1º/9/2015.
DIREITO CIVIL. PENSÃO CIVIL POR INCAPACIDADE PARCIAL PARA O TRABALHO.
Pode ser incluída pensão civil em indenização por debilidade permanente de membro inferior causada a soldado por acidente de trânsito, ainda que se possa presumir capacidade para atividades administrativas no próprio Exército Brasileiro ou para outras ocupações. O STJ já decidiu que a circunstância de se presumir a capacidade laborativa da vítima para outras atividades, diversas daquela exercida no momento do acidente, não exclui o pensionamento civil, observado o princípio da reparação integral do dano. Precedentes citados: REsp 1.269.274-RS, Segunda Turma, DJe 10/12/2012; e REsp 899.869-MG, Terceira Turma, DJe 26/3/2007. REsp 1.344.962-DF, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 25/8/2015, DJe 2/9/2015.
DIREITO CIVIL. VALOR DA PENSÃO CIVIL POR INCAPACIDADE PARCIAL PARA O TRABALHO.
A pensão civil incluída em indenização por debilidade permanente de membro inferior causada a soldado do Exército Brasileiro por acidente de trânsito pode ser fixada em 100% do soldo que recebia quando em atividade. A pensão correspondente ao soldo integral que o soldado recebia na ativa bem repara o dano gravíssimo sofrido, com amparo no princípio da reparação integral do dano. REsp 1.344.962-DF, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 25/8/2015, DJe 2/9/2015.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. FORO COMPETENTE PARA APRECIAR AÇÃO DE DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL CUMULADA COM ALIMENTOS.
A autora pode optar entre o foro de seu domicílio e o foro de domicílio do réu para propor ação de reconhecimento e dissolução de união estável cumulada com pedido de alimentos, quando o litígio não envolver interesse de incapaz. Deve-se ponderar, para a solução da controvérsia em análise, acerca de qual regra de competência deve sobressair: se a geral do art. 94, ou a especial do art. 100, II, ambos do CPC. A resposta se orienta à luz do princípio da especificidade, prevalecendo, dessa forma, a segunda regra de competência. Deve-se ressaltar, contudo, que a competência prevista no art. 100, II, do CPC é relativa quando se tratar de pedido de alimentos feito por qualquer um dos cônjuges, ao qual se presume a condição de hipossuficiente. O que significa dizer que é lícito à autora optar tanto pelo foro do domicílio do réu quanto pelo de seu próprio domicílio. A propósito do tema, cabe invocar a seguinte lição doutrinária: "A regra especial de competência dos incisos I e II do CPC 100 não fere o princípio constitucional da isonomia (art. 5º, I), nem é incompatível com a igualdade dos cônjuges na condução da sociedade conjugal (CF 226) (RJTJSP 134/283, 132/279). A hipótese é de tratar desigualmente partes desiguais, vale dizer, de discriminação justa, permitida pela CF 5º, I. Como, em tese, o alimentando necessita dos alimentos para sobreviver e o alimentante pode pagá-los, a ação de alimentos deve ser proposta no foro do domicílio do alimentando". Conclui-se, portanto, que a aplicação da regra especial de competência resguarda o alimentando em sua presumida condição de hipossuficiente e ameniza o custo financeiro de se demandar em foro distinto de seu domicílio, promovendo seu acesso à justiça. REsp 1.290.950-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 25/8/2015, DJe 31/8/2015.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. DESNECESSIDADE DE EXAURIMENTO DAS VIAS EXTRAJUDICIAIS PARA A UTILIZAÇÃO DO SISTEMA RENAJUD.
A utilização do sistema RENAJUD com o propósito de identificar a existência de veículos penhoráveis em nome do executado não pressupõe a comprovação do insucesso do exequente na obtenção dessas informações mediante consulta ao DETRAN. O RENAJUD é um sistema on linede restrição judicial de veículos criado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que interliga o Judiciário ao Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) e permite consultas e o envio, em tempo real, à base de dados do Registro Nacional de Veículos Automotores (Renavam), de ordens judiciais de restrições de veículos, inclusive registro de penhora. Para a utilização desse sistema, assim como ocorre com a penhora on line pelo sistema BACENJUD, é dispensável o exaurimento das vias administrativas tendentes à localização de bens do devedor. Essa conclusão pode ser extraída das seguintes considerações: a) a execução é movida no interesse do credor, a teor do disposto no artigo 612 do CPC; b) o sistema RENAJUD é ferramenta idônea para simplificar e agilizar a busca de bens aptos a satisfazer os créditos executados; e c) a utilização do sistema informatizado permite a maior celeridade do processo (prática de atos com menor dispêndio de tempo e de recursos) e contribui para a efetividade da tutela jurisdicional. Observe-se que, nos termos do art. 655, I e II, do CPC, a penhora observará, preferencialmente, dinheiro e, em seguida, veículos de vias terrestres. Logo, em cumprimento à referida ordem de preferência, no insucesso da utilização da ferramenta BACENJUD para a localização de ativos financeiros, é lícito ao exequente requerer ao juízo que promova a consulta via RENAJUD a respeito da possível existência de veículos automotores em nome do executado, revelando-se injustificável a recusa com esteio no singelo fundamento da ausência de comprovação do esgotamento de diligências na busca de bens penhoráveis. Sob outra perspectiva, é notório que os órgãos públicos, em sua grande maioria, como garantia de privacidade, não fornecem os dados cadastrais de particulares, o que torna difícil a obtenção da informação pretendida. Além disso, a busca realizada no DETRAN local não é capaz de verificar a existência de veículos em outros Estados da Federação, ao contrário da pesquisa pelo sistema RENAJUD, que atinge todo o país. Dessa forma, atualmente, com o aparato tecnológico posto a favor do Estado, a exigência de exaurimento das vias administrativas de busca bens do devedor se afigura verdadeiro mecanismo de procrastinação do andamento do feito, o que vai de encontro à efetiva prestação jurisdicional. Ademais, o CNJ, atento às repercussões dos sistemas BACENJUD, RENAJUD e INFOJUD como importantes ferramentas que asseguram a razoável duração do processo judicial, editou a Recomendação 51/2015, cujo teor corrobora o entendimento exposto acima. REsp 1.347.222-RS, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 25/8/2015, DJe 2/9/2015.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. PRAZO DECADENCIAL PARA AJUIZAMENTO DE AÇÃO ANULATÓRIA NO PROCEDIMENTO ARBITRAL.
No procedimento arbitral, o prazo decadencial de noventa dias para o ajuizamento de ação anulatória (art. 33, § 1º, da Lei 9.307/1996) em face de sentença arbitral parcial conta-se a partir do trânsito em julgado desta, e não do trânsito em julgado da sentença arbitral final. De plano, afigura-se de suma relevância consignar que, no âmbito do procedimento arbitral, nos termos da Lei 9.307/1996 (antes mesmo das alterações promovidas pela Lei 13.129/2015), inexiste qualquer óbice à prolação de sentença arbitral parcial. Efetivamente, a possibilidade de prolação de sentença arbitral parcial, há muito admitida no Direito Comparado e expressamente prevista nos principais regulamentos de arbitragem internacionais (dentre eles, citam-se: da UNCITRAL -United Nations Commission on International Trade Law, art. 32.1; da ICC -International Court of Arbitration, art. 2 (iii); da AAA - International Centre for Dispute Resolution, art. 27.7; e da LCIA - London Court of International Arbitration, art. 26.7), encontrava, no país, antes da Lei 11.232/2005, alguma resistência de alguns autores, em virtude, não raro, da inevitável comparação com o processo judicial então em vigor. Todavia, após a Reforma instituída pela Lei 11.232/2005, pela qual se afastou da definição de sentença o critério "exclusivamente" topográfico (extinção do processo), reportando-se ao conteúdo das matérias vertidas nos arts. 267 e 269 do CPC, tornou-se insubsistente o argumento de parte da doutrina nacional, que não admitia a prolação de sentença parcial no âmbito do procedimento arbitral em virtude da literalidade do art. 29 da Lei 9.307/1996 ("Proferida a sentença arbitral, dá-se por finda a arbitragem..."). Não se olvidam, tampouco se afastam, as vantagens de se traçar um paralelo entre o processo judicial e a arbitragem, notadamente por se tratar efetivamente de ramos do Direito Processual. E, desse modo, natural que do processo judicial se extraiam as principais noções e, muitas vezes, elementos seguros para solver relevantes indagações surgidas no âmbito da arbitragem, de modo a conceder às partes tratamento isonômico e a propiciar-lhes o pleno contraditório e a ampla defesa. Por consectário, vislumbra-se, em certa medida, a salutar harmonia dos institutos processuais incidentes no processo judicial com aqueles aplicáveis à arbitragem. Isso, todavia, não autoriza o intérprete a compreender que a arbitragem - regida por princípios próprios (notadamente o da autonomia da vontade e o da celeridade da prestação jurisdicional) - deva observar necessária e detidamente os regramentos disciplinadores do processo judicial, sob pena de desnaturar-se esse importante modo de heterocomposição. Há que se preservar, portanto, as particularidades de cada qual. É justamente com este enfoque que se deve examinar a admissão da prolação de sentença parcial no âmbito do procedimento arbitral, assim como sua adequação com o sistema processual vigente. E, o fazendo, pode-se afirmar com segurança que o julgamento fatiado da causa afigura-se adequado, viável e condizente com o sistema processual posto (inclusive pela Lei 11.232/2005). Portanto, em consonância com o sistema processual vigente, absolutamente admissível que, no âmbito do procedimento arbitral, os árbitros profiram decisão (sentença) que resolva a causa parcialmente, compreendida esta como o decisum que reconhece ou não o direito alegado pela parte (sentença de mérito), ou que repute ausente pressupostos ou condições de admissibilidade da tutela jurisdicional pretendida (sentença terminativa). Naturalmente, levando-se em conta as peculiaridades do processo arbitral, a decisão (sentença) que decide a causa, total ou parcialmente, não pode ser impugnada por meio de recursos (com exceção, é certo, dos embargos aclaratórios), mas apenas pela estreita via da ação anulatória, justamente em função da celeridade e da segurança jurídica da prestação jurisdicional perseguida pelas partes signatárias. Não obstante, a simples disparidade de forma pela qual a decisão (sentença) parcial é impugnada nos processos judicial e arbitral não consubstancia justificativa idônea para inadmiti-la neste último. Com base em tais premissas, e em se transportando a definição de sentença ofertada pela Lei 11.232/2005 à Lei 9.307/1996, é de se reconhecer a absoluta admissão, no âmbito do procedimento arbitral, de se prolatar sentença parcial, compreendida esta como o ato dos árbitros que, em definitivo (ou seja, finalizando a arbitragem na extensão do que restou decidido), resolve parte da causa, com fundamento na existência ou não do direito material alegado pelas partes ou na ausência dos pressupostos de admissibilidade da tutela jurisdicional pleiteada. Nesse passo, a sentença parcial arbitral resolve parte da causa em definitivo, ou seja, finaliza a arbitragem na extensão do que restou decidido, sendo, portanto, apta, no ponto, à formação da coisa julgada. Nessa medida, a ação anulatória destinada a infirmá-la - único meio admitido de impugnação dodecisum - deve ser intentada de imediato, sob pena de a questão decidida tornar-se imutável, porquanto não mais passível de anulação pelo Poder Judiciário, a obstar, por conseguinte, que o Juízo arbitral profira nova decisão sobre a matéria. Não há, dessa maneira, qualquer argumento idôneo a autorizar a compreensão de que a impugnação ao comando da sentença parcial arbitral, por meio da competente ação anulatória, poderia ser engendrada somente por ocasião da prolação da sentença arbitral final. Sob o enfoque da celeridade, da efetividade e da segurança jurídica especialmente perseguidas pelas partes signatárias de um compromisso arbitral, absolutamente contraproducente a adoção de tal postura. De fato, encontrando-se determinado capítulo da causa maduro para ser julgado, não haveria razão para que a correlata matéria não fosse desde logo decidida. E, uma vez resolvida a questão em sentença parcial, caso esta venha a ser anulada, salutar que o referido provimento judicial seja exarado o quanto antes a fim de não comprometer ainda mais o procedimento arbitral. A justificar, ainda, a imediata impugnação, é de suma relevância reconhecer que a questão decidida pela sentença arbitral parcial encontrar-se-á definitivamente julgada, não podendo ser objeto de ratificação e muito menos de modificação pela sentença arbitral final, exigindo-se de ambas, por questão de lógica, naturalmente, coerência, tão-somente. Não bastassem tais considerações, suficientes em si, para lastrear a compreensão de que a impugnação da sentença parcial, por meio de ação anulatória, deve ser exercida pela parte sucumbente imediatamente à sua prolação, é de se reconhecer, também e principalmente, que tal incumbência decorre da própria lei de regência (Lei 9.307/1996, inclusive antes das alterações promovidas pela Lei 13.129/2015), que, no § 1º do art. 33, estabelece o prazo decadencial de 90 (noventa dias) para anular a sentença arbitral. Nesse contexto, compreendendo-se sentença arbitral como gênero, do qual a parcial e a definitiva são espécies, o prazo previsto no aludido dispositivo legal aplica-se a estas, indistintamente. REsp 1.519.041-RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 1º/9/2015, DJe 11/9/2015.
Quinta Turma
DIREITO PENAL. TERMO INICIAL DO PRAZO PRESCRICIONAL DO CRIME PREVISTO NO ART. 2º, I, DA LEI 8.137/1990.
O termo inicial do prazo prescricional da pretensão punitiva do crime previsto no art. 2º, I, da Lei 8.137/1990 ("fazer declaração falsa ou omitir declaração sobre rendas, bens ou fatos, ou empregar outra fraude, para eximir-se, total ou parcialmente, de pagamento de tributo") é a data em que a fraude é perpetrada, e não a data em que ela é descoberta. Isso porque o referido tipo tem natureza de crime formal, instantâneo, sendo suficiente a conduta instrumental, haja vista não ser necessária a efetiva supressão ou redução do tributo para a sua consumação, bastando o emprego da fraude. Assim, o fato de a fraude ter sido empregada em momento determinado, ainda que irradie efeitos até ser descoberta, não revela conduta permanente, mas sim, crime instantâneo de efeitos permanentes - os quais perduraram até a descoberta do engodo. Precedente citado do STJ: RHC 9.625-CE, Sexta Turma, DJ 27/8/2001. Precedente citado do STF: RHC 90.532 ED, Tribunal Pleno, DJe 5/11/2009. RHC 36.024-ES, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 25/8/2015, DJe 1º/9/2015.
DIREITO PENAL. INTERRUPÇÃO DE PRESCRIÇÃO DE PRETENSÃO PUNITIVA EM CRIMES CONEXOS.
No caso de crimes conexos que sejam objeto do mesmo processo, havendo sentença condenatória para um dos crimes e acórdão condenatório para o outro delito, tem-se que a prescrição da pretensão punitiva de ambos é interrompida a cada provimento jurisdicional (art. 117, § 1º, do CP). De antemão, salienta-se que o art. 117, IV, do CP enuncia que: "O curso da prescrição interrompe-se: IV - pela publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis". Nesse contexto, é importante ressaltar que, se a sentença é condenatória, o acórdão só poderá ser confirmatório ou absolutório, assim como só haverá acórdão condenatório no caso de prévia sentença absolutória. Na hipótese, contudo, os crimes são conexos, o que viabilizou a ocorrência, no mesmo processo, tanto de uma sentença condenatória quanto de um acórdão condenatório. Isso porque a sentença condenou por um crime e absolveu por outro, e o acórdão reformou a absolvição. Ressaltado isso, enfatiza-se que a prescrição não é contada separadamente nos casos de crimes conexos que sejam objeto do mesmo processo. Ademais, para efeito de prescrição, o art. 117, § 1º, do CP dispõe que: "[...] Nos crimes conexos, que sejam objeto do mesmo processo, estende-se aos demais a interrupção relativa a qualquer deles". Portanto, observa-se que, a despeito de a sentença ter sido em parte condenatória e em parte absolutória, ela interrompeu o prazo prescricional de ambos os crimes julgados. Outrossim, o acórdão, em que pese ter confirmado a condenação perpetrada pelo Juiz singular, também condenou o agente - que, até então, tinha sido absolvido - pelo outro crime, de sorte que interrompeu, novamente, a prescrição de ambos os delitos conexos. Precedente citado do STF: HC 71.983-SP, Segunda Turma, DJ 31/5/1996. RHC 40.177-PR, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 25/8/2015, DJe 1º/9/2015.
DIREITO PENAL. LIVRAMENTO CONDICIONAL NO CRIME DE ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO.
O condenado por associação para o tráfico (art. 35 da Lei 11.343/2006), caso não seja reincidente específico, deve cumprir 2/3 da pena para fazer jus ao livramento condicional. Isso porque a própria Lei 11.343/2006, no parágrafo único do art. 44, prevê requisito objetivo específico para a concessão do livramento condicional ao delito de associação para o tráfico: "Os crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1º, e 34 a 37 desta Lei são inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória, vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos. Parágrafo único. Nos crimes previstos no caput deste artigo, dar-se-á o livramento condicional após o cumprimento de dois terços da pena, vedada sua concessão ao reincidente específico". Assim, em observância ao Princípio da Especialidade, aplica-se o disposto no art. 44, parágrafo único, da Lei 11.343/2006 em detrimento dos incisos I e II do art. 83 do CP. Ressalte-se que o lapso temporal de cumprimento de pena para obtenção do livramento condicional quanto ao delito do art. 35 da Lei 11.343/2006 independe da análise do caráter hediondo do crime. Precedentes citados: AgRg no REsp 1.484.138-MS, Sexta Turma, DJe de 15/6/2015; e HC 292.882-RJ, Sexta Turma, DJe de 18/8/2014. HC 311.656-RJ, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 25/8/2015, DJe 2/9/2015.
Sexta Turma
DIREITO PENAL. IMPORTAÇÃO E TRANSPORTE ILEGAIS DE AGROTÓXICO.
A conduta consistente em transportar, no território nacional, em desacordo com as exigências estabelecidas na legislação pertinente, agrotóxicos importados por terceiro de forma clandestina não se adequa ao tipo de importação ilegal de substância tóxica (art. 56 da Lei 9.605/1998) caso o agente não tenha ajustado ou posteriormente aderido à importação ilegal antes da entrada do produto no país, ainda que o autor saiba da procedência estrangeira e ilegal do produto, subsumindo-se ao tipo de transporte ilegal de agrotóxicos (art. 15 da Lei 7.802/1989). De fato, o art. 56 da Lei 9.605/1998 dispõe: "Produzir, processar, embalar, importar, exportar, comercializar, fornecer, transportar, armazenar, guardar, ter em depósito ou usar produto ou substância tóxica, perigosa ou nociva à saúde humana ou ao meio ambiente, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou nos seus regulamentos: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa". Por sua vez, o art. 15 da Lei 7.802/1989 (Lei dos Agrotóxicos) prescreve: "Aquele que produzir, comercializar, transportar, aplicar, prestar serviço, der destinação a resíduos e embalagens vazias de agrotóxicos, seus componentes e afins, em descumprimento as exigências estabelecidas na legislação pertinente estará sujeito à pena de reclusão, de dois a quatro anos, além de multa". Ocorre que, não havendo elementos no sentido de que o agente, tendo recebido os produtos dentro do Brasil, sabendo da procedência estrangeira, tenha previamente ajustado ou posteriormente aderido à importação ilegal antes da consumação do crime, que, sendo formal instantâneo, ocorre com a simples entrada do produto no país, não se pode falar em participação na importação de substância tóxica (art. 56 da Lei 9.605/1998), mas tão somente em delito autônomo de transporte de agrotóxico (art. 15 da Lei 7.802/1989). Isso porque a participação na modalidade de coautoria sucessiva, em que o partícipe resolve aderir à conduta delituosa após o início da sua execução, exige, além do liame subjetivo comum a todo concurso de agentes, que a adesão do partícipe ocorra antes da consumação do delito, caso contrário restará configurado delito autônomo. Vale lembrar ilustrativamente que, assim como o receptador não responde por participação em contrabando pelo simples fato de conhecer a procedência estrangeira da mercadoria que recebe, o réu, no presente caso, também não responde pela importação do produto tóxico que transporta ilegalmente dentro do território nacional apenas por "achar que estaria levando mercadoria estrangeira". REsp 1.449.266-PR, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 6/8/2015, DJe 26/8/2015.
DIREITO PENAL. COMPENSAÇÃO ENTRE A ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA E A AGRAVANTE DE VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER.
Compensa-se a atenuante da confissão espontânea (art. 65, III, "d", do CP) com a agravante de ter sido o crime praticado com violência contra a mulher (art. 61, II, "f", do CP). O STJ tem firme entendimento de que a atenuante da confissão espontânea, por envolver a personalidade do agente, deve ser utilizada como circunstância preponderante quando do concurso entre agravantes e atenuantes, nos termos consignados pelo art. 67 do CP. Nessa linha intelectiva, o STJ, por ocasião do julgamento do REsp 1.341.370-MT, Terceira Seção, DJe 17/4/2013, submetido ao rito do art. 543-C do CPC, pacificou a compreensão de que a agravante da reincidência e a atenuante da confissão espontânea, por serem igualmente preponderantes, devem ser compensadas entre si. Nessa senda, o referido entendimento deve ser estendido, por interpretação analógica, à hipótese em análise, dada sua similitude, por também versar sobre a possibilidade de compensação entre circunstâncias preponderantes.AgRg no AREsp 689.064-RJ, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 6/8/2015, DJe 26/8/2015.
DIREITO PENAL. CRIME DE COAÇÃO NO CURSO DE PROCEDIMENTO INVESTIGATÓRIO CRIMINAL (PIC).
O crime de coação no curso do processo (art. 344 do CP) pode ser praticado no decorrer de Procedimento Investigatório Criminal instaurado no âmbito do Ministério Público. Isso porque, além de o PIC servir para os mesmos fins e efeitos do inquérito policial, o STJ já reconheceu que, mesmo as ameaças proferidas antes da formalização do inquérito caracterizam o crime de coação no curso do processo, desde que realizadas com o intuito de influenciar o resultado de eventual investigação criminal (HC 152.526-MG, Quinta Turma, DJe 19/12/2011). HC 315.743-ES, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 6/8/2015, DJe 26/8/2015.
Recursos Repetitivos - Decisões de Afetação
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. TEMA 904.
Recurso Especial afetado à Primeira Seção como representativo da seguinte controvérsia: "possibilidade de inclusão do décimo-terceiro salário na base de cálculo do valor do benefício previdenciário até a vigência da Lei n. 8.870/94"REsp 1.546.680-RS, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 3/9/2015.
Recursos Repetitivos - Decisões de Afetação
DIREITO DO CONSUMIDOR. TEMA 937.
Recurso Especial afetado à Segunda Seção como representativo da seguinte controvérsia: "critérios para arbitramento de indenização por danos morais na hipótese de inclusão indevida em cadastro de inadimplentes".REsp 1.446.213-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, DJe 3/9/2015.
DIREITO CONSUMIDOR. TEMA 938.
Recurso Especial afetado à Segunda Seção como representativo das seguintes controvérsias:
"prescrição da pretensão de restituição das parcelas pagas a título de comissão de corretagem e de assessoria imobiliária, sob o fundamento da abusividade da transferência desses encargos ao consumidor";
"validade da cláusula contratual que transfere ao consumidor a obrigação de pagar comissão de corretagem e taxa de assessoria técnico-imobiliária (SATI)".
REsp 1.551.956-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, DJe 8/9/2015.
DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. TEMA 939.
Recurso Especial afetado à Segunda Seção como representativo da seguinte controvérsia: "legitimidade passiva da incorporadora (promitente vendedora) para responder pela restituição da comissão de corretagem e da taxa de serviço de assessoria técnico-imobiliária (SATI), sob o fundamento da abusividade da transferência desses encargos ao consumidor"REsp 1.551.956-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, DJe 8/9/2015.
DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. TEMA 940.
Recurso Especial afetado à Segunda Seção como representativo da seguinte controvérsia: "possibilidade de o juiz ou o Tribunal reconhecer de ofício a abusividade de cláusulas contratuais"REsp 1.465.832-RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, DJe 15/9/2015.

Informativo STJ n. 0569\2015

Informativo n. 0569Período: 17 a 30 de setembro de 2015.
Este periódico, elaborado pela Secretaria de Jurisprudência do STJ, destaca teses jurisprudenciais firmadas pelos órgãos julgadores do Tribunal nos acórdãos incluídos na Base de Jurisprudência do STJ no período acima indicado, não consistindo em repositório oficial de jurisprudência.
Recursos Repetitivos
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. MULTA DO ART. 475-J DO CPC EM CUMPRIMENTO DE SENTENÇA ARBITRAL. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ). TEMA 893.
No âmbito do cumprimento de sentença arbitral condenatória de prestação pecuniária, a multa de 10% (dez por cento) do artigo 475-J do CPC deverá incidir se o executado não proceder ao pagamento espontâneo no prazo de 15 (quinze) dias contados da juntada do mandado de citação devidamente cumprido aos autos (em caso de título executivo contendo quantia líquida) ou da intimação do devedor, na pessoa de seu advogado, mediante publicação na imprensa oficial (em havendo prévia liquidação da obrigação certificada pelo juízo arbitral). O CPC (arts. 475-N, IV e parágrafo único), assim como a Lei da Arbitragem (arts. 18 e 31), confere a natureza de título executivo judicial à sentença arbitral, distinguindo apenas o instrumento de comunicação processual do executado. Com efeito, em se tratando de cumprimento de sentença arbitral, a angularização da relação jurídica processual dar-se-á mediante citação do devedor no processo de liquidação ou de execução em vez da intimação promovida nos processos sincréticos. Eis, portanto, a única diferença procedimental entre o cumprimento da sentença proferida no processo civil e o da sentença arbitral. Nessa ordem de ideias, à exceção da ordem de citação (e não de intimação atinente aos processos sincréticos), a execução da sentença arbitral condenatória de obrigação de pagar quantia certa observa o mesmo procedimento previsto para as sentenças civis de idêntico conteúdo, qual seja, o regime previsto nos artigos 475-J a 475-R do CPC. À luz da supracitada premissa, o decurso in albis do prazo de 15 (quinze) dias (contados da comunicação pessoal do devedor, mediante citação ou intimação) para pagamento espontâneo da prestação pecuniária certificada na sentença arbitral enseja a aplicação da multa de 10% (dez por cento) prevista no art. 475-J do CPC. A referida sanção pecuniária (aplicável no âmbito do cumprimento de título representativo de obrigação pecuniária líquida) ostenta caráter punitivo e coercitivo, tendo por objetivo garantir a maior efetividade e celeridade na prestação jurisdicional, tornando onerosa a recalcitrância do devedor em desobedecer ao comando sentencial ao qual submetido. Consequentemente, o afastamento a incidência da referida sanção no âmbito do cumprimento de sentença arbitral de prestação pecuniária representaria um desprestígio ao procedimento da arbitragem (tornando-a um minus em relação à prestação jurisdicional estatal), olvidando-se de um de seus principais atrativos, qual seja, a expectativa de célere desfecho na solução dos conflitos. Além disso, a sentença arbitral não se sujeita a reexame de mérito nem pelo árbitro nem pelo juiz estatal, adquirindo, desde sua prolação, a imutabilidade decorrente da coisa julgada (arts. 18 e 31 da Lei 9.037/1996), razão pela qual cabida sua execução definitiva (e não provisória). Assim, firmada a aplicabilidade da multa do art. 475-J do CPC no âmbito do cumprimento de sentença arbitral condenatória de prestação pecuniária, impende consignar que o termo inicial do prazo de quinze dias contar-se-á: (i) da data da juntada do mandado de citação (com a determinação de pagamento) devidamente cumprido aos autos (em caso de título executivo contendo quantia líquida); ou (ii) da intimação do devedor, na pessoa de seu advogado, mediante publicação na imprensa oficial, no caso em que necessária prévia liquidação da obrigação certificada pelo juízo arbitral. Tal consideração decorre da especificidade da comunicação processual do executado na ação de cumprimento de sentença arbitral, adaptando-se à orientação jurisprudencial do STJ firmada no bojo de recurso especial representativo de controvérsia, no sentido de que "na fase de cumprimento de sentença, o devedor deverá ser intimado, na pessoa de seu advogado, mediante publicação na imprensa oficial, para efetuar o pagamento no prazo de 15 (quinze) dias, a partir de quando, caso não o efetue, passará a incidir a multa de 10% (dez por cento) sobre montante da condenação (art. 475-J do CPC)" (REsp 1.262.933-RJ, Corte Especial, DJe 20/8/2013). REsp 1.102.460-RJ, Rel. Min. Marco Buzzi, Corte Especial, julgado em 17/6/2015, DJe 23/9/2015.
DIREITO ADMINISTRATIVO. FIXAÇÃO DE LIMITAÇÃO TEMPORAL PARA O RECEBIMENTO DE NOVA AJUDA DE CUSTO. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ). TEMA 538.
A fixação de limitação temporal para o recebimento da indenização prevista no art. 51, I, da Lei 8.112/1990, por meio de normas infralegais, não ofende o princípio da legalidade. De fato, o art. 51, I, da Lei 8.112/1990 estabelece que constitui indenização ao servidor a "ajuda de custo". Além disso, o art. 56 desse mesmo diploma legal determina, no seu caput, que "Será concedida ajuda de custo àquele que, não sendo servidor da União, for nomeado para cargo em comissão, com mudança de domicílio" e, no seu parágrafo único, prescreve: "No afastamento previsto no inciso I do art. 93, a ajuda de custo será paga pelo órgão cessionário, quando cabível". Realmente, há normas infralegais que impõem limite temporal para o recebimento de nova ajuda de custo. Nesse ponto, pode-se pensar que, se a Lei 8.112/1990 não estabeleceu limite temporal para a concessão da "ajuda de custo", o legislador administrativo não pode fazê-lo. Esse pensamento, todavia, não deve prevalecer. O art. 52 da Lei 8.112/1990 determina de forma expressa que os critérios para a concessão da ajuda de custo sejam regulamentados por norma infralegal: "Os valores das indenizações estabelecidas nos incisos I a III do art. 51, assim como as condições para a sua concessão, serão estabelecidos em regulamento". Nesse contexto, ao estabelecer o termo "condições" - que o vernáculo entende, entre outros sentidos, como antecedente necessário -, a Lei 8.112/1990 permitiu restrições/limitações que nada mais são que requisitos que qualificam o servidor para o recebimento da indenização. Aliás, a despeito das alterações legislativas ocorridas neste artigo, os valores e as condições para a concessão da ajuda de custo sempre foram fixados em regulamento, na medida em que a Lei atribuiu benefícios, mas nunca estabeleceu a possibilidade de abuso desses benefícios, sobretudo contra o patrimônio público. Ademais, não é imperativo que essa regulamentação seja feita por meio de norma hierárquica imediatamente inferior (decreto), consoante interpretação realizada a partir do art. 84, VI, da CF poderia sugerir. Isso porque, de acordo com o STF (RE 570.680-RS, Pleno, DJe 4/12/2009), a competência regulamentadora não é exclusiva do Presidente da República: "é compatível com a Carta Magna a norma infraconstitucional que atribui a órgão integrante do Poder Executivo da União a faculdade de estabelecer alíquotas do Imposto de Importação. Competência que não é privativa do Presidente da República". Além disso, mesmo que não fosse a expressa autorização legal para regulamentação da ajuda de custo, outras razões hermenêuticas e axiomáticas reforçam a legitimidade de resoluções que prescrevam a limitação temporal em análise, visto se tratar de medidas limitadoras que obedecem aos princípios da moralidade administrativa, da razoabilidade, da impessoalidade, da eficiência e da economicidade da gestão pública. Nesse sentido, ressalta-se que o fator temponão pode ser desconsiderado por ocasião da fixação de limites para a concessão de ajuda de custo, ante fundamentos atrelados à ratio do benefício, aos impactos financeiros da presente decisão, à conveniência e oportunidade da concessão e ao histórico do tratamento da matéria. Além do mais, ir além e questionar os termos em que estabelecido o limite temporal exigiria a invasão do mérito dos atos administrativos que estabelecessem essa limitação, o que é permitido apenas em hipótese excepcional de flagrante ilegalidade (AgRg no Ag 1.298.842-RJ, Segunda Turma, DJe 29/6/2010; e AgRg nos EDcl no REsp 902.419-RS, Segunda Turma, DJe 15/2/2008). De mais a mais, o CNJ e o STF ratificam essas limitações. Nesse sentido, cabe ressaltar a afirmação realizada pelo CNJ ao analisar pedido de ajuda de custo de magistrado (Pedidos de Providência 2007.10000007809 e 2007.10000011825): "Observo ainda que os decretos regulamentadores da ajuda de custo, no plano federal, limitam a concessão da ajuda de custo a um ano, ou seja, o magistrado não pode receber em período inferior a um ano mais de uma ajuda de custo. Esta regra deve ser seguida nas concessões de ajuda de custo, sob pena de conversão dos magistrados em peregrinos, contrariando inclusive a própria natureza da ajuda de custo, com o que a ajuda de custo somente é devida em remoções que ocorrerem em prazo superior a um ano". Seguindo a mesmaratio, a Resolução 382/2008 do STF, que dispõe sobre a concessão de ajuda de custo no âmbito do Supremo Tribunal Federal, assevera, em seu art. 9º, caput e I, que "Não será concedida ajuda de custo ao Ministro ou ao servidor que [...] tiver recebido indenização dessa espécie no período correspondente aos doze meses imediatamente anteriores, ressalvada a hipótese de retorno de ofício, de que trata o § 6º do art. 3º". REsp 1.257.665-CE, Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 8/10/2014, DJe 17/9/2015.
Corte Especial
DIREITO CIVIL. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS COMPENSATÓRIOS.
Incidem correção monetária e juros compensatórios sobre os depósitos judiciais decorrentes de processos originários do STJ. Aplicam-se as regras do mercado como parâmetro de atualização, de modo que a aplicação dos juros se faz com o intuito de "remuneração", enquanto que a correção monetária, com o de "atualização". Essa compreensão está disposta no ordenamento jurídico como norma extraída dos princípios constitucionais, notadamente, o da isonomia, porquanto repõe o equilíbrio entre os partícipes das relações econômicas. Se assim o é, obviamente que o sentido do direito será sempre o de recompor as perdas da moeda, por meio da correção monetária, e, ainda, recompensar o seu titular pelo tempo que ficou sem dela dispor, senão estaríamos diante de um enriquecimento ilícito. Pet 10.326-RJ, Rel. originário Min. Og Fernandes, Rel. para acórdão Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 5/8/2015, DJe 14/9/2015.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. TRÂMITE DO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO CONTRA DECISÃO FUNDAMENTADA NO ART. 543-C, § 7°, I, DO CPC.
Na hipótese em que for interposto agravo em recurso especial (art. 544 do CPC) contra decisão que nega seguimento a recurso especial com base no art. 543-C, § 7°, I, do CPC, o STJ remeterá o agravo do art. 544 do CPC ao Tribunal de origem para sua apreciação como agravo interno.No julgamento da QO no Ag 1.154.599-SP (Corte Especial, DJe 12/5/2011), o STJ assentou o entendimento de que não cabe agravo em recurso especial (art. 544 do CPC) contra decisão que nega seguimento a recurso especial com base no art. 543-C, § 7º, I, do CPC, podendo a parte interessada manejar agravo interno ou regimental na origem, demonstrando a especificidade do caso concreto. Entretanto, o art. 544 do CPC prevê o cabimento de agravo contra a decisão que não admite o recurso especial sem fazer distinção acerca do fundamento utilizado para a negativa de seguimento do apelo extraordinário. O não cabimento do agravo em recurso especial (art. 544 do CPC), na hipótese em que o recurso especial sobrestado na origem tiver o seu seguimento denegado quando o acórdão recorrido coincidir com a orientação do STJ, deriva de interpretação adotada por este Tribunal Superior, a fim de obter a máxima efetividade da sistemática dos recursos representativos da controvérsia, implementada pela Lei 11.672/2008. A par disso, se equivocadamente a parte interpuser o agravo do art. 544 do CPC contra a referida decisão, por não configurar erro grosseiro, cabe ao STJ remeter o recurso ao Tribunal de origem para sua apreciação como agravo interno. AgRg no AREsp 260.033-PR, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 5/8/2015, DJe 25/9/2015.
Primeira Seção
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. TERMO INICIAL DE APOSENTADORIA ESPECIAL.
Se, no momento do pedido administrativo de aposentadoria especial, o segurado já tiver preenchido os requisitos necessários à obtenção do referido benefício, ainda que não os tenha demonstrado perante o INSS, o termo inicial da aposentadoria especial concedida por meio de sentença será a data do aludido requerimento administrativo, e não a data da sentença. O art. 57, § 2º, da Lei 8.213/1991 confere à aposentadoria especial o mesmo tratamento dado à aposentadoria por idade quanto à fixação do termo inicial, qual seja, a data de entrada do requerimento administrativo para todos os segurados, exceto o segurado empregado. Desse modo, a comprovação extemporânea de situação jurídica já consolidada em momento anterior não tem o condão de afastar o direito adquirido do segurado, impondo-se o reconhecimento do direito ao benefício previdenciário no momento do requerimento administrativo, quando preenchidos os requisitos para a concessão da aposentadoria. Nessa ordem de ideias, quando o segurado já tenha preenchido os requisitos para a concessão da aposentadoria especial ao tempo do requerimento administrativo, afigura-se injusto que somente venha a receber o benefício a partir da data da sentença ao fundamento da ausência de comprovação do tempo laborado em condições especiais naquele primeiro momento. Pet 9.582-RS, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 26/8/2015, DJe 16/9/2015.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL E SUBSTITUIÇÃO DE FIANÇA BANCÁRIA POR PENHORA DE DEPÓSITO DE QUANTIA DESTINADA À DISTRIBUIÇÃO DE DIVIDENDOS.
Em sede de execução fiscal, a Fazenda Pública não tem direito de substituir a fiança bancária prestada pela sociedade empresária executada e anteriormente aceita pelo ente público por penhora de depósito de quantia destinada à distribuição de dividendos aos acionistas da devedora, a não ser que a fiança bancária se mostre inidônea.Consoante já proclamou a Primeira Turma, ao julgar o REsp 53.652-SP (DJ 13/3/1995), "o inciso II do art. 15 da Lei 6.830/80, que permite à Fazenda Pública, em qualquer fase do processo, postular a substituição do bem penhorado, deve ser interpretado com temperamento, tendo em conta o princípio contido no art. 620 do Código de Processo Civil, segundo o qual 'quando por vários meios o credor promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso', não convivendo com exigências caprichosas, nem com justificativas impertinentes". De outro lado, o art. 32 da Lei 4.357/1964 veda a distribuição de lucros se a sociedade empresária estiver em débito não garantido com a Fazenda Pública. Ocorre que, na hipótese em foco, a execução fiscal já estava garantida pela fiança bancária, e essa garantia já havia sido aceita pela Fazenda Pública expressamente. Assim, não haveria razão para a proibição de distribuição de dividendos, e não seria razoável a substituição da garantia - já oferecida e aceita - pela penhora em dinheiro (dividendos a serem distribuídos aos acionistas da sociedade empresária executada). Assim, a substituição pretendida pela Fazenda Pública só seria cabível se houvesse razão para afastar a idoneidade da fiança bancária, sob pena de impor ao executado injustificável gravame. Importa ressaltar que o caso em análise não se assemelha ao do EREsp 1.077.039-RJ (Primeira Seção, DJe 12/4/2011): neste, buscava-se a substituição da penhora em dinheiro pela fiança bancária; todavia, a partir de voto proferido no referido precedente, conclui-se que, uma vez aceita a fiança bancária prestada como garantia à execução fiscal, somente o executado poderia promover a substituição. E, caso a penhora tenha sido efetuada sobre dinheiro, ainda assim poderia haver a substituição pela fiança bancária, se comprovado que está sendo realizada em obediência ao princípio da menor onerosidade. Precedente citado: AgRg no AgRg no REsp 1.109.560-RS, Primeira Turma, DJe 30/8/2010. EREsp 1.163.553-RJ, Rel. originário e voto vencedor Min. Arnaldo Esteves Lima, Rel. para o acórdão Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 22/4/2015, DJe 14/9/2015.
Primeira Turma
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. ADICIONAL DE 25% PREVISTO NO ART. 45 DA LEI 8.213/1991 (GRANDE INVALIDEZ).
O segurado já aposentado por tempo de serviço e/ou por contribuição que foi posteriormente acometido de invalidez que exija assistência permanente de outra pessoa não tem direito ao acréscimo de 25% sobre o valor do benefício que o aposentado por invalidez faz jus em razão de necessitar dessa assistência (art. 45, caput, da Lei 8.213/1991). Isso porque o mencionado dispositivo legal restringiu sua incidência ao benefício de aposentadoria por invalidez, não podendo, assim, ser estendido a outras espécies de benefícios previdenciários. REsp 1.533.402-SC, Rel. Min. Sérgio Kukina, julgado em 1º/9/2015, DJe 14/9/2015.
Segunda Turma
DIREITO TRIBUTÁRIO. ICMS SOBRE SERVIÇOS DE TV POR ASSINATURA VIA SATÉLITE.
Caso o prestador de serviços de televisão por assinatura via satélite forneça pacote de canais por valor fixo mensal para assinantes localizados em outros estados federados, deve-se recolher o ICMS em parcelas iguais para as unidades da Federação em que estiverem localizados o prestador e o tomador. De fato, nos termos do art. 11, III, "c-1", da LC 87/1996 (com redação da LC 102/2000), regra geral, o local da operação ou da prestação, para os efeitos da cobrança do ICMS, é, tratando-se de prestação onerosa de serviço de comunicação, o do estabelecimento ou domicílio do tomador do serviço, quando prestado por meio de satélite. Todavia, o parágrafo 6º do referido artigo traz uma exceção para os casos de serviços não medidos e cujo preço seja cobrado por períodos definidos. Por serviço medido, entende-se que o usuário paga pelo serviço efetivamente utilizado, como por exemplo, os serviços de água, telefonia, luz etc. Nos serviços de televisão por assinatura, o pagamento não é variável pelo tempo de utilização. O assinante opta por um pacote de canais e por ele pagará um valor fixo mensalmente. Logo, entende-se que o serviço prestado pela empresa de televisão por assinatura não é medido e o preço será cobrado por períodos definidos, qual seja, mensal. Desse modo, aplica-se ao caso o disposto no art. 11, § 6º, da LC 87/1996, segundo o qual se deve recolher o ICMS em partes iguais para as unidades da Federação em que estiverem localizados o prestador e o tomador. REsp 1.497.364-GO, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 3/9/2015, DJe 14/9/2015.
DIREITO TRIBUTÁRIO. INCLUSÃO DO ICMS NA BASE DE CÁLCULO DA CONTRIBUIÇÃO SUBSTITUTIVA PREVISTA NA LEI 12.546/2011.
A parcela relativa ao ICMS, ressalvada a retenção decorrente do regime de substituição tributária (ICMS-ST) e demais deduções legais, inclui-se no conceito de receita bruta para fins de determinação da base de cálculo da contribuição substitutiva instituída pelos arts. 7º e 8º da Lei 12.546/2011. De fato, a EC 42/2003 possibilitou a substituição gradual, total ou parcial, da contribuição incidente sobre a folha de salários (art. 195, I, "a", da CF) pela incidente sobre a receita ou o faturamento. Nesse sentido, a Lei 12.546/2011 instituiu a contribuição substitutiva incidente sobre a receita bruta das empresas abrangidas pela desoneração da folha. Quanto a isso, convém esclarecer que, pela sistemática da não-cumulatividade, o conceito de receita bruta é mais amplo, não se aplicando, ao caso, o precedente da Suprema Corte (RE 240.785-MG, Tribunal Pleno, DJe 15/12/2014) que tratou das contribuições ao PIS/Pasep e da COFINS regidas pela Lei 9.718/1998, sob a ótica da sistemática cumulativaNessa linha intelectiva, o STJ, por ocasião do julgamento do REsp 1.330.737-SP, Primeira Seção, julgado em 10/6/2015, submetido ao rito do art. 543-C do CPC, pacificou o entendimento de que é possível a inclusão na receita bruta de parcela relativa a tributos recolhidos a título próprio, refletindo a orientação sufragada nas Súmulas 191 e 258 do TFR e 68 e 94 do STJ. Mutatis mutandis, deve ser aplicada a mesma lógica para as contribuições previdenciárias substitutivas em razão da identidade do fato gerador (receita bruta). Destaque-se, finalmente, que a retenção do ICMS que se faz a título de substituição tributária (ICMS-ST) não se insere no conceito de receita bruta, pois a própria legislação tributária reconhece que tais valores são meros ingressos na contabilidade da empresa (responsável tributário por substituição ou agente arrecadador) que será entregue ao Fisco. REsp 1.528.604-SC, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 8/9/2015, DJe 17/9/2015.
Terceira Turma
DIREITO CIVIL. MODIFICAÇÃO DE PLANO DE SAÚDE COLETIVO EMPRESARIAL COM O FIM DE EVITAR A INEXEQUIBILIDADE DO MODELO ANTIGO (EXCEÇÃO DE RUÍNA).
Os empregados demitidos sem justa causa e os aposentados que contribuíram para plano de saúde coletivo empresarial que tenha sido extinto não têm direito de serem mantidos nesse plano se o estipulante (ex-empregador) e a operadora redesenharam o sistema estabelecendo um novo plano de saúde coletivo a fim de evitar o seu colapso (exceção da ruína) ante prejuízos crescentes, desde que tenham sido asseguradas aos inativos as mesmas condições de cobertura assistencial proporcionadas aos empregados ativos. Inicialmente, cabe asseverar que um plano de saúde pode ser: (a) individual ou familiar: em que a pessoa física contrata diretamente com a operadora ou por intermédio de um corretor autorizado; ou (b) coletivo: contratado por uma sociedade empresária, conselho, sindicato ou associação junto à operadora de planos de saúde para oferecer assistência médica e/ou odontológica às pessoas vinculadas às mencionadas entidades, bem como a seus dependentes. Um plano de saúde coletivo, por sua vez, pode ser: (b.1) por adesão: contratado por pessoas jurídicas de caráter profissional, classista ou setorial, como conselhos, sindicatos e associações profissionais; ou (b.2) empresarial: contratado por sociedade empresária, para garantir assistência à saúde dos seus funcionários e de seus respectivos dependentes em razão do vínculo empregatício ou estatutário. No que diz respeito a plano de saúde coletivo empresarial (b.2) - ou seja, à hipótese em análise -, realmente, é garantido ao inativo (o empregado demitido sem justa causa ou o aposentado) que contribuiu para o plano de saúde em decorrência do vínculo empregatício o direito de manutenção da sua condição de beneficiário "nas mesmas condições de cobertura assistencial de que gozava quando da vigência do contrato de trabalho, desde que assuma o seu pagamento integral" (arts. 30 e 31 da Lei 9.656/1998). Nesse contexto, de acordo com o art. 2º, II, da RN 279/2011 da ANS, deve-se entender por "mesmas condições de cobertura assistencial" a "mesma segmentação e cobertura, rede assistencial, padrão de acomodação em internação, área geográfica de abrangência e fator moderador, se houver, do plano privado de assistência à saúde contratado para os empregados ativos", de modo a inexistir, na hipótese em análise, direito adquirido a modelo de plano de saúde ou de custeio. Nesse sentido, aliás, a Quarta Turma do STJ (REsp 531.370-SP, DJe 6/9/2012) decidiu que, embora seja garantida aos empregados demitidos sem justa causa e aos aposentados "a manutenção no plano de saúde coletivo nas mesmas condições de assistência médica e de valores de contribuição, desde que assuma o pagamento integral desta", os valores de contribuição poderão "variar conforme as alterações promovidas no plano paradigma, sempre em paridade com os que a ex-empregadora tiver que custear". De fato, pela exceção da ruína - instituto que, conforme definição doutrinária, representa a circunstância liberatória decorrente da "situação de ruína em que o devedor poderia incorrer, caso a execução do contrato, atingida por alterações fácticas, não fosse sustida" -, o vínculo contratual original pode sofrer ação liberatória e adaptadora às novas circunstâncias da realidade, com a finalidade de manter a relação jurídica sem a quebra do sistema, sendo imprescindível a cooperação mútua para modificar o contrato do modo menos danoso às partes. É por isso que, nos contratos cativos de longa duração, também chamados de relacionais, baseados na confiança, o rigorismo e a perenidade do vínculo existente entre as partes podem sofrer, excepcionalmente, algumas flexibilizações, a fim de evitar a ruína do sistema e da empresa, devendo ser respeitados, em qualquer caso, a boa-fé, que é bilateral, e os deveres de lealdade, de solidariedade (interna e externa) e de cooperação recíprocos. Além do mais, ressalte-se que a onerosidade excessiva é vedada tanto para o consumidor quanto para o fornecedor, nos termos do art. 51, § 2º, da Lei 8.078/1990. Cumpre destacar, também, que a função social e a solidariedade nos planos de saúde coletivos assumem grande relevo, tendo em vista o mutualismo existente, caracterizador de um pacto tácito entre as diversas gerações de empregados passados, atuais e futuros (solidariedade intergeracional), trazendo o dever de todos para a viabilização do próprio contrato de assistência médica. Desse modo, na hipótese em apreço, não há como preservar indefinidamente a sistemática contratual original se verificada a exceção de ruína. REsp 1.479.420-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 1º/9/2015, DJe 11/9/2015.
DIREITO DO CONSUMIDOR. RESPONSABILIZAÇÃO CIVIL DE FRANQUEADORA EM FACE DE CONSUMIDOR.
A franqueadora pode ser solidariamente responsabilizada por eventuais danos causados a consumidor por franqueada. No contrato de franquia empresarial, estabelece-se um vínculo associativo entre sociedades empresárias distintas, o qual, conforme a doutrina, caracteriza-se pelo "uso necessário de bens intelectuais do franqueador (franchisor) e a participação no aviamento do franqueado (franchise)". Dessa forma, verifica-se, novamente com base na doutrina, que o contrato de franquia tem relevância apenas na estrita esfera das empresas contratantes, traduzindo uma clássica obrigação contratual inter partes. Ademais, o STJ já decidiu por afastar a incidência do CDC para a disciplina da relação contratual entre franqueador e franqueado (AgRg no REsp 1.193.293-SP, Terceira Turma, DJe 11/12/2012; e AgRg no REsp 1.336.491-SP, Quarta Turma, DJe 13/12/2012). Aos olhos do consumidor, entretanto, trata-se de mera intermediação ou revenda de bens ou serviços do franqueador, que é fornecedor no mercado de consumo, ainda que de bens imateriais. Aliás, essa arquitetura comercial - na qual o consumidor tem acesso a produtos vinculados a uma empresa terceira, estranha à relação contratual diretamente estabelecida entre consumidor e vendedor - não é novidade no cenário consumerista e, além disso, não ocorre apenas nos contratos de franquia. Desse modo, extraindo-se dos arts. 14 e 18 do CDC a responsabilização solidária por eventuais defeitos ou vícios de todos que participem da introdução do produto ou serviço no mercado (REsp 1.058.221-PR, Terceira Turma, DJe 14/10/2011; e REsp 1.309.981-SP, Quarta Turma, DJe 17/12/2013) - inclusive daqueles que organizem a cadeia de fornecimento -, as franqueadoras atraem para si responsabilidade solidária pelos danos decorrentes da inadequação dos serviços prestados em razão da franquia, tendo em vista que cabe a elas a organização da cadeia de franqueados do serviço. REsp 1.426.578-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 23/6/2015, DJe 22/9/2015.
Quarta Turma
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. ARREMATAÇÃO DE BEM IMÓVEL MEDIANTE PAGAMENTO EM PRESTAÇÕES.
A arrematação de bem imóvel mediante pagamento em prestações (art. 690, § 1º, do CPC) não pode ser realizada por preço inferior ao da avaliação, mesmo que realizada em segunda praça. De fato, a jurisprudência do STJ possui entendimento firmado de que, "malsucedida a primeira praça, a arrematação do bem imóvel pode ser concretizada em segunda praça, por valor inferior ao da avaliação" (REsp 229.304-SP, Terceira Turma, DJ de 9/10/2006), observando-se apenas os casos de caracterização de preço vil (arts. 692, caput, e 701 do CPC). Naqueles casos, contudo, a forma de pagamento então admitida era, em conformidade com o art. 690, caput, do CPC, "com dinheiro à vista, ou a prazo de 3 (três) dias, mediante caução idônea" - na redação anterior à Lei 11.832/2006 -, não se referindo à hipótese excepcional do art. 700 do CPC, revogado pela mesma lei. Neste caso, a hipótese é de arrematação de bem imóvel, em segunda praça, mediante pagamento em prestações, nos termos do previsto no art. 690, § 1º, do CPC, com a redação introduzida pela Lei 11.382/2006, segundo o qual, "Tratando-se de bem imóvel, quem estiver interessado em adquiri-lo em prestações poderá apresentar por escrito sua proposta, nunca inferior à avaliação, com oferta de pelo menos 30% (trinta por cento) à vista, sendo o restante garantido por hipoteca sobre o próprio imóvel". A questão que se coloca é saber se, frustrada a primeira hasta pública, a arrematação de bem imóvel em segunda praça, mediante pagamento em prestações, poderá ser feita por preço inferior ao da avaliação, nos termos do previsto no art. 686, VI, do CPC, que possui a seguinte redação: "Não requerida a adjudicação e não realizada a alienação particular do bem penhorado, será expedido o edital de hasta pública, que conterá: [...] a comunicação de que, se o bem não alcançar lanço superior à importância da avaliação, seguir-se-á, em dia e hora que forem desde logo designados entre os dez e os vinte dias seguintes, a sua alienação pelo maior lanço (art. 692)". O aparente conflito entre as normas processuais confrontadas - art. 686, VI, e art. 690, § 1º, ambos do CPC - resolve-se pelo princípio da especialidade, segundo o qual a lei especial afasta a aplicação da lei geral (lex especialis derrogat generali). Pelo critério da especialidade, o art. 686, VI, do CPC, que estabelece as regras para a alienação de bens, móveis ou imóveis, em hasta pública, apresenta-se, portanto, como norma geral em relação ao art. 690, § 1º, do mesmo diploma legal, que trata especificamente da arrematação de bens imóveis em prestações - norma especial. Em vista disso, deve ser afastada a incidência do art. 686, VI, do CPC, reconhecendo-se como prevalente, na espécie, o disposto no art. 690, § 1º, do CPC. Nesses termos, não parece possível admitir-se, mesmo em segunda praça, que, em se tratando de imóvel adquirido em prestações, a arrematação se realize por preço inferior ao valor de avaliação do bem. Isso porque, estabelecendo-se, de modo enfático, que, "Tratando-se de bem imóvel, quem estiver interessado em adquiri-lo em prestações poderá apresentar por escrito sua proposta, nunca inferior à avaliação [...]" (art. 690, §1º, do CPC), o dispositivo legal em questão não deixa dúvidas quanto à intenção do legislador de não admitir que a aquisição do imóvel, em tais condições, se faça por preço inferior ao da avaliação. De fato, o vocábulo "nunca", em sua acepção única de advérbio, significa "em tempo algum; em nenhum tempo; jamais" (Dicionário Aurélio), e a lei, como se sabe, não contém, ou não deve conter, palavras inúteis. Portanto, parece inequívoca a intenção do legislador de impedir, na hipótese específica de que cuida - a arrematação de bem imóvel em prestações - que a aquisição se realize por preço inferior ao da avaliação, mesmo que em segunda praça. REsp 1.340.965-MG, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 3/9/2015, DJe 11/9/2015.
Quinta Turma
DIREITO PENAL. APLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DO NE BIS IN IDEM.
O agente que, numa primeira ação penal, tenha sido condenado pela prática de crime de roubo contra uma instituição bancária não poderá ser, numa segunda ação penal, condenado por crime de roubo supostamente cometido contra o gerente do banco no mesmo contexto fático considerado na primeira ação penal, ainda que a conduta referente a este suposto roubo contra o gerente não tenha sido sequer levada ao conhecimento do juízo da primeira ação penal, vindo à tona somente no segundo processo. De fato, conquanto o suposto roubo contra o gerente do banco não tenha sido sequer levado ao conhecimento do juízo da primeira ação penal, ele se encontra sob o âmbito de incidência do princípio ne bis in idem, na medida em que praticado no mesmo contexto fático da primeira ação. Além disso, do contrário ocorreria violação da garantia constitucional da coisa julgada. Sobre o tema, há entendimento doutrinário no sentido de que "Com o trânsito em julgado da sentença condenatória, o ato adquire a autoridade de coisa julgada, tornando-se imutável tanto no processo em que veio a ser proferida a decisão (coisa julgada formal) quanto em qualquer outro processo onde se pretenda discutir o mesmo fato criminoso objeto da decisão original (coisa julgada material). No direito brasileiro, a sentença condenatória evita se instaure novo processo contra o réu condenado, em razão do mesmo fato, quer para impingir ao sentenciado acusação mais gravosa, quer para aplicar-lhe pena mais elevada". Portanto, não há se falar, na hipótese em análise, em arquivamento implícito, inadmitido pela doutrina e pela jurisprudência, tendo em vista que não se cuida de fatos diversos, mas sim de um mesmo fato com desdobramentos diversos e apreciáveis ao tempo da instauração da primeira ação penal. Ademais, a doutrina sustenta que "a proibição (ne) de imposição de mais de uma (bis) consequência jurídico-repressiva pela prática dos mesmos fatos (idem) ocorre, ainda, quando o comportamento definido espaço-temporalmente imputado ao acusado não foi trazido por inteiro para apreciação do juízo. Isso porque o objeto do processo é informado pelo princípio da consunção, pelo qual tudo aquilo que poderia ter sido imputado ao acusado, em referência a dada situação histórica e não o foi, jamais poderá vir a sê-lo novamente. E também se orienta pelos princípios da unidade e da indivisibilidade, devendo o caso penal ser conhecido e julgado na sua totalidade - unitária e indivisivelmente - e, mesmo quando não o tenha sido, considerar-se-á irrepetivelmente decidido". Assim, em Direito Penal, "deve-se reconhecer a prevalência dos princípios do favor rei, favor libertatis e ne bis in idem, de modo a preservar a segurança jurídica que o ordenamento jurídico demanda" (HC 173.397-RS, Sexta Turma, DJe de 17/3/2011). HC 285.589-MG, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 4/8/2015, DJe 17/9/2015.
DIREITO PENAL. INCIDÊNCIA DA ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA.
O fato de o denunciado por furto qualificado pelo rompimento de obstáculo ter confessado a subtração do bem, apesar de ter negado o arrombamento, é circunstância suficiente para a incidência da atenuante da confissão espontânea (art. 65, III, "d", do CP). Isso porque, consoante entendimento sufragado no âmbito do STJ, mesmo que o agente tenha confessado parcialmente os fatos narrados na exordial acusatória, deve ser beneficiado com a atenuante genérica da confissão espontânea (HC 322.077-SP, Quinta Turma, DJe 3/8/2015; e HC 229.478-RJ, Sexta Turma, DJe 2/6/2015). HC 328.021-SC, Rel. Min. Leopoldo de Arruda Raposo (Desembargador convocado do TJ-PE), julgado em 3/9/2015, DJe 15/9/2015.
DIREITO PENAL. NÃO INCIDÊNCIA DA ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA.
O fato de o denunciado por roubo ter confessado a subtração do bem, negando, porém, o emprego de violência ou grave ameaça, é circunstância que não enseja a aplicação da atenuante da confissão espontânea (art. 65, III, "d", do CP). Isso porque a atenuante da confissão espontânea pressupõe que o réu reconheça a autoria do fato típico que lhe é imputado. Ocorre que, no caso, o réu não admitiu a prática do roubo denunciado, pois negou o emprego de violência ou de grave ameaça para subtrair o bem da vítima, numa clara tentativa de desclassificar a sua conduta para o crime de furto. Nesse contexto, em que se nega a prática do tipo penal apontado na peça acusatória, não é possível o reconhecimento da circunstância atenuante. Precedente citado: HC 98.280-RS, Quinta Turma, DJe 30/11/2009. HC 301.063-SP, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 3/9/2015, DJe 18/9/2015.
DIREITO PENAL. NÃO OBRIGATORIEDADE DE LICITAÇÃO POR PARTE DE CONDOMÍNIO EDILÍCIO EM QUE ENTE PÚBLICO SEJA PROPRIETÁRIO DE FRAÇÃO IDEAL.
O síndico de condomínio edilício formado por frações ideais pertencentes a entes públicos e particulares, ao conceder a sociedade empresária o direito de explorar serviço de estacionamento em área de uso comum do prédio sem procedimento licitatório, não comete o delito previsto no art. 90 da Lei 8.666/1993 ("Frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o caráter competitivo do procedimento licitatório, com o intuito de obter, para si ou para outrem, vantagem decorrente da adjudicação do objeto da licitação"). O condomínio edilício é ente despersonalizado regido pelo Direito Privado (arts. 1.331 e seguintes do Código Civil e Lei 4.591/1964 e alterações posteriores). Registre-se que os condomínios edilícios não figuram dentre aqueles entes obrigados a licitar mencionados no art. 37, XXI, da CF ou na Lei 8.666/1993. Com efeito, o só fato de entes públicos serem proprietários de frações ideais de um imóvel não determina que os atos do condomínio necessitem ser praticados à luz do Direito Público, mormente a contratação de bens e serviços, como a exploração de área comum (estacionamento). O Poder Público, quando participa de um condomínio edilício, por si só, não tem prevalência sobre os demais condôminos. Assim, não pode obrigá-los a seguir regras aplicáveis apenas à Administração Pública, sob pena de subverter a própria natureza do instituto, obstando os procedimentos rotineiros indispensáveis ao cumprimento das atividades de gestão do condomínio. Sendo assim, não há necessidade da discussão sequer sobre se há maioria de fração ideal do imóvel pelo o Poder Público. O STJ, em julgado relativo à extinção de condomínio em que uma das partes era o Poder Público, já se pronunciou pela aplicação do Direito Privado, não obstante o regime especial de alienação de bens públicos (REsp 655.787-MG, DJU de 5/9/2005). Dessa forma, desnecessário seguir a Lei 8.666/1993, por não se tratar de órgão público ou ente público obrigado a licitar ou, ainda, de relação de Direito Público, mas de Direito Privado, sendo atípica a conduta em análise. REsp 1.413.804-MG, Rel. Min. Reynaldo Fonseca, julgado em 8/9/2015, DJe 16/9/2015.
DIREITO PENAL. CONCESSÃO DE TRABALHO EXTERNO EM EMPRESA DA FAMÍLIA.
O fato de o irmão do apenado ser um dos sócios da empresa empregadora não constitui óbice à concessão do benefício do trabalho externo, ainda que se argumente sobre o risco de ineficácia da realização do trabalho externo devido à fragilidade na fiscalização. Com efeito, a execução criminal visa ao retorno do condenado ao convívio em sociedade, com o escopo de reeducá-lo e ressocializá-lo, sendo que o trabalho é essencial para esse processo. Nesse contextoé importante considerar que os riscos de ineficácia da realização de trabalho externo em empresa familiar, sob o argumento de fragilidade na fiscalização, não podem ser óbice à concessão do referido benefício. Em primeiro lugar, porque é muito difícil para o apenado conseguir emprego. Impedir que o preso seja contratado por parente é medida que reduz ainda mais a possibilidade de vir a conseguir uma ocupação lícita e, em consequência, sua perspectiva de reinserção na sociedade. Em segundo lugar, porque o Estado deve envidar todos os esforços possíveis no sentido de ressocializar os transgressores do Direito Penal, a fim de evitar novas agressões aos bens jurídicos da coletividade. Ademais, o Estado possui a atribuição de fiscalizar o efetivo cumprimento do trabalho extramuros, estando autorizado a revogar a benesse nas hipóteses elencadas no parágrafo único do art. 37 da LEP. Além disso, não há qualquer vedação na LEP quanto à concessão de trabalho externo em empresa da família do sentenciado. HC 310.515-RSRel. Min. Felix Fischer, julgado em 17/9/2015, DJe 25/9/2015.
Sexta Turma
DIREITO PROCESSUAL PENAL. UTILIZAÇÃO DA JUSTIFICAÇÃO CRIMINAL PARA NOVA OITIVA DA VÍTIMA.
A via adequada para nova tomada de declarações da vítima com vistas à possibilidade de sua retratação é o pedido de justificação (art. 861 do CPC), ainda que ela já tenha se retratado por escritura pública. A justificação é o único meio que se presta para concretizar essa nova prova a fim de instruir pedido de revisão criminal, pois não serve para a ação revisional prova produzida unilateralmente, como a juntada da declaração da vítima firmada em cartório no sentido de que o condenado não foi o autor do crime. Tal prova só é válida se, necessariamente, for produzida na justificação judicial com as cautelas legais (RvCr 177-DF, Terceira Seção, DJ 4/8/1997). Ademais, a retratação da vítima nada mais é do que uma prova substancialmente nova. Desse modo, não há razão para não garantir ao condenado, diante do princípio da verdade real, a possibilidade de, na ação revisional, confrontar essa retratação - se confirmada em juízo - com os demais elementos de convicção coligidos na instrução criminal.RHC 58.442-SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 25/8/2015, DJe 15/9/2015.
DIREITO PENAL. CONSUMAÇÃO DO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS NA MODALIDADE ADQUIRIR.
A conduta consistente em negociar por telefone a aquisição de droga e também disponibilizar o veículo que seria utilizado para o transporte do entorpecente configura o crime de tráfico de drogas em sua forma consumada - e não tentada -, ainda que a polícia, com base em indícios obtidos por interceptações telefônicas, tenha efetivado a apreensão do material entorpecente antes que o investigado efetivamente o recebesse.Inicialmente, registre-se que o tipo penal em análise é de ação múltipla ou conteúdo variado, pois apresenta várias formas de violação da mesma proibição, bastando, para a consumação do crime, a prática de uma das ações ali previstas. Nesse sentido, a Segunda Turma do STF (HC 71.853-RJ, DJ 19/5/1995) decidiu que a modalidade de tráfico "adquirir" completa-se no instante em que ocorre a avença entre comprador e vendedor. De igual forma, conforme entendimento do STJ, incide no tipo penal, na modalidade "adquirir", o agente que, embora sem receber a droga, concorda com o fornecedor quanto à coisa, não havendo necessidade, para a configuração do delito, de que se efetue a tradição da droga adquirida, pois que a compra e venda se realiza pelo consenso sobre a coisa e o preço (REsp 1.215-RJ, Sexta Turma, DJ 12/3/1990). Conclui-se, pois, que a negociação com aquisição da droga e colaboração para seu transporte constitui conduta típica, encontrando-se presente a materialidade do crime de tráfico de drogas. HC 212.528-SC, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 1º/9/2015, DJe 23/9/2015.
DIREITO PENAL. SUJEITO ATIVO DE CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL.
Podem ser sujeitos ativos do crime previsto no art. 6º da Lei 7.492/1986 pessoas naturais que se fizeram passar por membro ou representante de pessoa jurídica que não tinha autorização do Bacen para funcionar como instituição financeira. O art. 6º da Lei 7.492/1986 prevê como crime contra o Sistema Financeiro Nacional a conduta de induzir ou manter em erro sócio, investidor ou repartição pública competente, relativamente a operação ou situação financeira, sonegando-lhe informação ou prestando-a falsamente. Segundo entendimento doutrinário, o tipo penal em questão visa "resguardar a confiança inerente às relações jurídicas e negociais existentes entre os agentes em atuação no sistema financeiro - sócios das instituições financeiras, investidores e os órgãos públicos que atuam na fiscalização do mercado - e, secundariamente, protegê-los contra prejuízos potenciais, decorrentes da omissão ou prestação falsa de informações pertinentes a operações financeiras da instituição, ou acerca de sua situação financeira". O conceito de instituição financeira encontra-se definido no art. 1º da Lei 7.492/1986, segundo o qual "considera-se instituição financeira, para efeito desta lei, a pessoa jurídica de direito público ou privado, que tenha como atividade principal ou acessória, cumulativamente ou não, a captação, intermediação ou aplicação de recursos financeiros (Vetado) de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira, ou a custódia, emissão, distribuição, negociação, intermediação ou administração de valores mobiliários". São abrangidos, por equiparação, "a pessoa jurídica que capte ou administre seguros, câmbio, consórcio, capitalização ou qualquer tipo de poupança, ou recursos de terceiros e a pessoa natural que exerça quaisquer das atividades referidas neste artigo, ainda que de forma eventual" (art. 1º, parágrafo único, I e II, da Lei 7.492/1986). Tutela-se, portanto, o exercício clandestino e desautorizado de atividades financeiras. Trata-se de crime comum, que não exige peculiar qualidade do sujeito ativo. REsp 1.405.989-SP, Rel. originário Min. Sebastião Reis Júnior, Rel. para o acórdão Min. Nefi Cordeiro, julgado em 18/8/2015, DJe 23/9/2015.
DIREITO PENAL. DIFERENÇA ENTRE ESTELIONATO E CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL.
Configura o crime contra o Sistema Financeiro do art. 6º da Lei 7.492/1986 - e não estelionato, do art. 171 do CP - a falsa promessa de compra de valores mobiliários feita por falsos representantes de investidores estrangeiros para induzir investidores internacionais a transferir antecipadamente valores que diziam ser devidos para a realização das operações. Não obstante a aparente semelhança com o delito de estelionato ("Art. 171. Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro mediante artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento"), entre eles há clara distinção. O delito do art. 6º da Lei 7.492/1986 ("Induzir ou manter em erro, sócio, investidor ou repartição pública competente, relativamente a operação ou situação financeira, sonegando-lhe informação ou prestando-a falsamente") constitui crime formal, e não material (não é necessária a ocorrência de resultado, eventual prejuízo econômico caracteriza mero exaurimento); não prevê o especial fim de agir do sujeito ativo ("para si ou para outrem"); não exige, como elemento obrigatório, o meio fraudulento (artifício, ardil, etc.), apenas a prestação de informação falsa ou omissão de informação verdadeira. Ademais, eventual conflito aparente de normas penais resolve-se pelo critério da especialidade do delito contra o Sistema Financeiro (art. 6º da Lei 7.492/1986) em relação ao estelionato (art. 171 do CP). Por fim, a conduta em análise, configura dano ao Sistema Financeiro Nacional, pois abalada a confiança inerente às relações negociais no mercado mobiliário, induzindo em erro investidores que acreditaram na existência e na legitimidade de quem se apresentou como instituição financeira. REsp 1.405.989-SP, Rel. originário Min. Sebastião Reis Júnior, Rel. para o acórdão Min. Nefi Cordeiro, julgado em 18/8/2015, DJe 23/9/2015.
DIREITO PENAL. NÃO CARACTERIZAÇÃO DE ATENUANTE INOMINADA.
Não caracteriza circunstância relevante anterior ao crime (art. 66 do CP) o fato de o condenado possuir bons antecedentes criminais. A atenuante inominada é entendida como uma circunstância relevante, anterior ou posterior ao delito, não disposta em lei, mas que influencia no juízo de reprovação do autor. Excluem-se, portanto, os antecedentes criminais, que já são avaliados na fixação da pena-base e expressamente previstos como circunstância judicial do art. 59 do CP. REsp 1.405.989-SP, Rel. para o acórdão Min. Nefi Cordeiro, julgado em 18/8/2015, DJe 23/9/2015.
DIREITO PENAL. HIPÓTESE QUE NÃO CARACTERIZA CONTINUIDADE DELITIVA.
Não há continuidade delitiva entre os crimes do art. 6º da Lei 7.492/1986 (Lei dos Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional) e os crimes do art. 1º da Lei 9.613/1998 (Lei dos Crimes de "Lavagem" de Dinheiro). Há continuidade delitiva, a teor do art. 71 do CP, quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica crimes da mesma espécie e, em razão das condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devam os delitos seguintes ser havidos como continuação do primeiro. Assim, não incide a regra do crime continuado na hipótese, pois os crimes descritos nos arts. 6º da Lei 7.492/1986 e 1º da Lei 9.613/1998 não são da mesma espécie. REsp 1.405.989-SP, Rel. originário Min. Sebastião Reis Júnior, Rel. para acórdão Min. Nefi Cordeiro, julgado em 18/8/2015, DJe 23/9/2015.