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segunda-feira, 30 de outubro de 2023

STJ: Banco responde por vazamento de dados que resultou em aplicação do “golpe do boleto” contra cliente

 








Banco responde por vazamento de dados que resultou em aplicação do “golpe do boleto” contra cliente

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que a instituição financeira responde pelo vazamento de dados pessoais sigilosos do consumidor, relativos a operações e serviços bancários, obtidos por criminosos para a prática de fraudes como o "golpe do boleto". Nesse tipo de estelionato, golpistas se passam por funcionários de um banco e emitem boleto falso para receberem indevidamente o pagamento feito pelo cliente.    

O colegiado reformou acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) e restabeleceu a sentença que condenou um banco a declarar válido o pagamento realizado por meio de boleto fraudado e devolver à cliente parcelas pagas indevidamente em contrato de financiamento.

De acordo com o processo, a cliente encaminhou e-mail para o banco solicitando informações sobre como quitar a operação. Dias depois, ela foi contatada pelo WhatsApp por uma suposta funcionária da instituição e recebeu um boleto no valor de cerca de R$ 19 mil. A cliente pagou o boleto, mas depois descobriu que o documento havia sido emitido por criminosos. 

Para o TJSP, o golpe contra a cliente foi aplicado por meio de negociações realizadas de maneira informal. O tribunal também considerou que as informações do boleto falso divergiam dos dados constantes do contrato de financiamento e que a consumidora falhou em seu dever de segurança e cautela.

Bancos respondem por danos causados em fraudes praticadas por terceiros

A ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso da cliente, explicou que, nos termos da tese fixada no julgamento do Tema Repetitivo 466 – que contribuiu para a edição da Súmula 479 do STJ –, as instituições bancárias respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno em caso de  fraudes praticadas por terceiros, tendo em vista que a responsabilidade decorre do risco da atividade.

Em relação aos chamados golpes de engenharia social, a relatora comentou que os criminosos costumam conhecer os dados pessoais das vítimas e, com base neles, usam técnicas psicológicas de persuasão – a exemplo da simulação de um atendimento bancário verdadeiro – como forma de atingir seu objetivo ilícito.

"Assim, para imputar a responsabilidade às instituições financeiras, no que tange ao vazamento de dados pessoais que culminaram na facilitação de estelionato, deve-se garantir que a origem do indevido tratamento seja o sistema bancário. Os nexos de causalidade e imputação, portanto, dependem da hipótese concretamente analisada", ponderou a ministra.

Nesse cenário, a ministra apontou que não poderia ser imputada ao banco a responsabilidade exclusiva no caso de vazamento de dados cadastrais básicos, como nome e CPF, porque essas informações podem ser obtidas por fontes alternativas. Por outro lado, caso os dados do consumidor sejam vinculados a operações e serviços bancários, a instituição tem o dever de armazenamento e proteção, sob pena de eventual vazamento configurar falha na prestação do serviço. 

LGPD também prevê responsabilidade por falhas de segurança

Nancy Andrighi destacou que, nos termos do artigo 44 da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), o tratamento de dados será irregular quando não fornecer a segurança que o titular espera, considerando-se o resultado e os riscos desse tratamento.

No caso analisado, a ministra reforçou que, segundo as informações dos autos, os criminosos detinham dados pessoais da cliente referentes às suas operações bancárias. A relatora também apontou que, embora o boleto falso tivesse diferenças em relação aos documentos verdadeiros, não se espera que uma pessoa comum seja sempre capaz de identificá-las.

Segundo a relatora, algumas circunstâncias pesam a favor da responsabilização do banco: o estelionatário tinha conhecimento de que a vítima era cliente da instituição financeira, sabia que ela encaminhou e-mail com a finalidade de quitar sua dívida e também possuía dados relativos ao financiamento. Essas informações, sobretudo os dados pessoais bancários, são sigilosas, e seu tratamento incumbe à entidade bancária com exclusividade, concluiu a ministra ao restabelecer a sentença.

Leia o acórdão no REsp 2.077.278.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 2077278

STJ: Banco do Brasil responde por saques indevidos e má gestão de valores em contas vinculadas ao Pasep

 Notícias

PRECEDENTES QUALIFICADOS
05/10/2023 07:10








Banco do Brasil responde por saques indevidos e má gestão de valores em contas vinculadas ao Pasep

Em julgamento de recursos repetitivos (Tema 1.150), a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) fixou três teses a respeito da responsabilidade do Banco do Brasil (BB) por saques indevidos ou má gestão dos valores em contas vinculadas ao Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Pasep):

1) o Banco do Brasil possui legitimidade passiva ad causam para figurar no polo passivo de demanda na qual se discute eventual falha na prestação do serviço quanto à conta vinculada ao Pasep, saques indevidos e desfalques, além da ausência de aplicação dos rendimentos estabelecidas pelo conselho diretor do referido programa;

2) a pretensão ao ressarcimento dos danos havidos em razão dos desfalques em conta individual vinculada ao Pasep se submete ao prazo prescricional decenal previsto pelo artigo 205 do Código Civil; e

3) o termo inicial para a contagem do prazo prescricional é o dia em que o titular, comprovadamente, toma ciência dos desfalques realizados na conta individual vinculada ao Pasep.

BB é responsável por administrar as contas vinculadas ao Pasep

O relator dos recursos, ministro Herman Benjamin, explicou que o Pasep foi instituído pela Lei Complementar 8/1970, que estabeleceu a competência do BB para administração do programa e manutenção das contas individualizadas para cada servidor, mediante o recebimento de comissão pelo serviço.

Segundo o ministro, o artigo 7º do Decreto 4.751/2003 previa que a gestão do Pasep ficaria a cargo do conselho diretor do fundo, sendo o BB responsável por administrar o programa (artigo 10), bem como por manter as contas individualizadas dos participantes, creditar a atualização monetária, os juros e o resultado das operações financeiras realizadas, processar as solicitações de saque e de retirada e efetuar os correspondentes pagamentos.

O Decreto 4.751/2003 foi revogado pelo Decreto 9.978/2019, o qual – lembrou o magistrado – não alterou significativamente as disposições então em vigor.

Responsabilidade decorrente da má gestão do banco

O ministro destacou que, desde a promulgação da Constituição Federal, a União deixou de depositar valores nas contas do Pasep do trabalhador, limitando a sua responsabilidade ao recolhimento mensal ao BB, nos termos do artigo 2º da LC 8/1970.

Uma vez que é de competência do banco a administração do programa, bem como a respectiva manutenção das contas individualizadas (artigo 5° da LC 8/1970), o relator concluiu que "a responsabilidade por eventuais saques indevidos ou má gestão dos valores depositados na conta do Pasep é atribuída à instituição gestora".

Herman Benjamin lembrou que o STJ possui orientação segundo a qual, em ações judiciais nas quais se pleiteia a recomposição do saldo existente em conta vinculada ao Pasep, a União deve figurar no polo passivo. No entanto, o ministro esclareceu que a controvérsia não trata de índices equivocados de responsabilidade do conselho gestor do fundo, mas de responsabilidade decorrente da má gestão do banco, derivada de saques indevidos ou de não aplicação dos índices de juros e correção monetária na conta do Pasep – havendo, portanto, legitimidade passiva do BB.

Prazo para reclamar começa com o conhecimento do fato pelo titular do direito

O relator também ressaltou que, para a jurisprudência do STJ, o prazo prescricional de cinco anos previsto no artigo 1º do Decreto-Lei 20.910/1932 não se aplica às pessoas jurídicas de direito privado, como o BB. Em vez disso, o prazo aplicável é o previsto no artigo 205 do Código Civil, o qual estabelece a prescrição em dez anos.

Por fim, o ministro observou que o STJ também entende que, conforme o princípio da actio nata, o curso do prazo prescricional do direito de reclamar é iniciado somente quando o titular do direito subjetivo violado passa a conhecer o fato e a extensão de suas consequências.

Leia o acórdão no REsp 1.895.936.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1895936REsp 1895941REsp 1951931

domingo, 29 de outubro de 2023

TST: Professora não receberá hora extra por preparo de aulas para ambiente virtual

 Professora não receberá hora extra por preparo de aulas para ambiente virtual

Para 5ª Turma, a interação online com alunos também já está incluída no salário contratual

Mulher trabalhando em notebook

Mulher trabalhando em notebook

26/10/23 - A Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou o pedido de uma professora de Bauru (SP) que pretendia receber horas extras pelo tempo gasto com a preparação de aulas e outras atividades na plataforma digital da instituição. Para o colegiado, essas tarefas também fazem parte das atividades extraclasse previstas na CLT e são abrangidas pela remuneração contratual da professora.

Plataforma virtual

Na ação trabalhista, a professora contou que, além de ministrar as aulas presenciais, ela alimentava o aplicativo do Instituto das Apóstolas do Sagrado Coração de Jesus. Segundo ela, os professores tinham de lançar no sistema a preparação semanal de conteúdo, para os alunos acessarem antes das aulas, preparar questões, inserir materiais didáticos, imagens e arquivos, enviar e receber e-mails dos alunos, fiscalizar seu acesso ao sistema para leitura e estudo e lançar notas e presenças no sistema. Essas tarefas demandariam cerca de três horas por semana para cada uma das duas disciplinas que lecionava.

Avanços tecnológicos

Por sua vez, a instituição de ensino argumentou que a professora era remunerada também por horas-atividade que abrangiam essas tarefas. Para o instituto, as atividades listadas por ela não representavam trabalho extra, mas apenas alteração na sistemática de trabalho em razão dos avanços tecnológicos.

Novas tarefas

O pedido de horas extras foi julgado improcedente pelo juízo de primeiro grau, mas o Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas/SP) reformou a sentença. Para o TRT, ficou comprovado que a implantação do sistema implicou a execução de tarefas diversas, fora do horário de aula, que não se confundiam com as atividades extraclasse. 

Atividade extraclasse

Segundo o relator do recurso de revista do empregador, ministro Breno Medeiros, toda atividade preparatória de aulas, fornecimento de materiais didáticos, avaliação e acompanhamento dos alunos é, em essência, compatível com a previsão legal da chamada atividade extraclasse (artigo 320 da  CLT), englobada pela remuneração contratual do professor. Na visão do ministro, a transposição dessas atividades para o ambiente virtual, por si só, não muda esse enquadramento jurídico.

Modernização

O ministro ressaltou que, com a modernização das atividades, a realização dessas tarefas é “fruto da necessidade atual de alcance maior do ensino por meio das novas plataformas tecnológicas, que passaram a ser uma regra no mercado de trabalho”. 

Por unanimidade, o colegiado excluiu as horas extras da condenação.

(Lourdes Tavares/CF)

Processo: RR-10866-19.2018.5.15.0091   

Esta matéria é meramente informativa.
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TST: Administrador terá parte da aposentadoria penhorada para pagar dívida trabalhista

 Administrador terá parte da aposentadoria penhorada para pagar dívida trabalhista

Para a 3ª Turma, a impenhorabilidade dos vencimentos não se aplica a parcelas de natureza alimentícia

Notas e moedas de real

Notas e moedas de real

26/10/23 - A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou o recurso de um administrador de empresas aposentado do Rio de Janeiro (RJ) contra a penhora de 20% de seus proventos de aposentadoria para o pagamento de dívidas trabalhistas. Segundo o colegiado, os valores devidos são de natureza alimentícia, o que torna possível a penhora do benefício.  

Dívida

Na ação originária, a Produtora de Áudio e Vídeo Ltda. foi condenada a pagar diversas parcelas, no total de cerca de R$ 60 mil, a um jornalista que havia prestado serviços à empresa. Como os valores não foram quitados, ele indicou ao juízo da 9ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro que o administrador, sócio minoritário da empresa e pai do sócio principal, recebia aposentadoria de R$ 3 mil, e o juízo, então, determinou o bloqueio de 30% dos vencimentos.

Remédios

Ao contestar a medida, o administrador informou que não tinha bens para oferecer à penhora. Disse que suas finanças haviam sido arruinadas pela crise econômica e que, aos 81 anos, morava de favor. A aposentadoria seria seu único meio de subsistência, usada em parte para comprar remédios. 

Prejuízo irremediável 

O juízo de primeiro grau reconsiderou sua decisão em razão da idade do executado, “que a princípio não possui outra fonte de renda, a fim de evitar possível prejuízo irremediável ao aposentado”.

Sem comprovação

Contudo, o Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (RJ) restabeleceu a penhora, porque todos os fatos alegados por ele, à exceção da idade, não foram comprovados. “O fato de ser idoso, por si só, não torna indevida a dívida assumida pelo administrador”, diz a decisão.

Limite

O relator do recurso do administrador no TST, ministro Alberto Balazeiro, explicou que o Código de Processo Civil (artigo 833, inciso IV) considera impenhoráveis os proventos de aposentadoria. Porém, o parágrafo 2º do mesmo dispositivo afasta essa determinação aos casos de pagamento de prestação alimentícia.

Com a vigência do novo CPC, o TST passou a admitir a penhora parcial sobre salários, vencimentos e proventos de aposentadoria do executado, desde que observado o limite de 50% previsto em outro dispositivo do Código (artigo 529, parágrafo 3º).

Após a decisão unânime, o administrador interpôs embargos de declaração, rejeitados pelo colegiado.

(Ricardo Reis/CF)

Processo: Ag-AIRR-10359-76.2013.5.01.0009

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TST: 2ª Turma afasta prescrição em caso de trabalho doméstico em condição análoga à escravidão

 2ª Turma afasta prescrição em caso de trabalho doméstico em condição análoga à escravidão

Segundo o colegiado, o Estado não pode compactuar com a impunidade em razão da passagem do tempo

Detalhe de mulher de chinelos limpando o chão

Detalhe de mulher de chinelos limpando o chão

27/10/23 - A Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho manteve a condenação de uma família de São Paulo (SP) que, por mais de 20 anos, manteve uma empregada doméstica em condições consideradas análogas à escravidão. Além de indenizações de R$ 350 mil por danos morais individuais e R$ 200 mil a título de indenização por dano moral coletivo, os patrões deverão pagar todos os direitos trabalhistas devidos desde 1998. Ao afastar a prescrição trabalhista, que restringe os pedidos aos cinco anos anteriores ao término do contrato, o colegiado ressaltou a imprescritibilidade do direito absoluto à não escravização.

Denúncia

A ação, ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) e pela Defensoria Pública da União (DPU), teve origem em denúncia repassada em junho de 2020 pelo então Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos de que, no endereço da família, uma trabalhadora idosa fora vítima de violência, maus tratos, tortura psíquica e exploração e estaria trancada no local, ferida. 

Resgate e prisão

O juízo da 53ª Vara do Trabalho de São Paulo autorizou a realização de diligência na casa e, na inspeção, o MPT e a equipe envolvida encontraram a trabalhadora “assustada e sozinha”. Foi apurado que ela vivia no local há três anos, sem receber salário regularmente. Os patrões haviam se mudado recentemente, e ela permanecera num cômodo sem banheiro nos fundos da casa, sem as chaves do prédio principal. “Vizinhos aplaudiam a chegada do grupo e fizeram fila na porta para voluntariamente prestarem depoimento, diante da indignação que sentiam com a situação”, registrou o MPT.

A dona da casa foi presa em flagrante por abandono de incapaz e omissão de socorro e indiciada pelo crime de reduzir alguém a condição análoga à de escravo (artigo 149 do Código Penal).

Mais de 20 anos

De acordo com os depoimentos colhidos, inclusive o da vítima, ela havia começado a trabalhar para a mãe da atual patroa em 1998, sem registro na carteira de trabalho. A partir de 2011, passou a morar com a família e a receber irregularmente, chegando a ficar meses sem salário. Em 2015, a família se mudou para a casa onde ela foi resgatada. Segundo seu relato, ela não recebia refeições e seu último salário fora de R$ 300 reais.

Sem banheiro

Desde o início da pandemia, ela havia sido proibida de entrar na casa, onde ficava o banheiro. Uma testemunha contou que, na única vez em que ela saiu de casa para passear com os cães nesse período, foi agredida pelo patrão. Os vizinhos também relataram que, recentemente, ela havia sofrido uma queda e passara a noite gritando, pedindo ajuda aos patrões, que não a socorreram.

Caridade

Após ser resgatada, a idosa se recusou a ir para um abrigo estadual, por medo da covid-19 e porque não queria abandonar o cachorro da casa - “sua única referência afetiva e emocional”. Um vizinho então aceitou abrigá-la e ao animal em sua casa. Segundo o MPT, ela não tinha nenhuma condição de subsistência, contando apenas com a caridade dos vizinhos.

Local temporário

Em sua defesa, os patrões sustentaram que, entre 1998 e 2011, a trabalhadora havia prestado serviços como diarista em várias residências e, em 2011, perdeu sua casa numa enchente. Por isso, eles teriam oferecido um lugar para ela morar, sem prestar nenhum serviço. Segundo eles, o cômodo que a idosa ocupava nos fundos da casa não era uma residência, mas um “local temporário” para ela guardar seus pertences até ter onde morar.

Trabalho escravo

Com base em diversos depoimentos e nas provas colhidas pelo MPT, o juízo de primeiro grau reconheceu que os patrões haviam submetido a trabalhadora a condições análogas ao trabalho escravo, além de abusos psicológicos, desrespeito moral e abandono. Assim, condenou-os a pagar R$ 250 mil de indenização por danos morais e R$ 100 mil por danos morais coletivos, a serem revertidos ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). 

Prescrição

A sentença também reconheceu o vínculo de emprego desde 1998 e condenou os patrões ao pagamento dos salários e demais parcelas decorrentes, como férias e 13º vencidos, observando-se a prescrição trabalhista, ou seja, o deferimento se limitou aos cinco anos anteriores.

Medo

O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região manteve a condenação e majorou as indenizações para R$ 350 mil e R$ 300 mil. Segundo o TRT, ficou claro que a trabalhadora, “pessoa humilde, tinha medo dos empregadores” e, nesse contexto, “criou-se uma espiral em que ela não conseguia se desvencilhar de sua lamentável situação”.

No recurso ao TST, os empregadores pretendiam reverter a condenação, e o MPT e a DPU questionavam a prescrição aplicada pelo TRT.

"Família”

A relatora, ministra Liana Chaib, observou que, nos casos envolvendo crime contra a humanidade e grave violação aos direitos fundamentais, a norma geral sobre a prescrição trabalhista deve ser interpretada sistematicamente. Segundo ela, na hipótese excepcional de submissão de trabalhador à condição análoga à de escravo, a restrição da liberdade moral e até mesmo física não lhe permite buscar a reparação de seus direitos. “A situação se agrava ainda mais quando ocorre em ambiente doméstico, em que a trabalhadora é mantida em situação de dependência e exploração, e, não raro, ludibriada pela justificativa falaciosa de que seria ‘como se fosse da família’”, ressaltou.

Imprescritível

De acordo com a relatora, a questão é tão relevante que a Procuradoria-Geral da República (PGR) ajuizou ação no Supremo Tribunal Federal (STF) para que esse crime seja imprescritível. “Embora as esferas penal e trabalhista não se confundam, o Estado não pode compactuar com a impunidade em razão da passagem do tempo, pois isso resultaria num salvo conduto ao explorador”, afirmou. 

Com esse fundamento, a Turma declarou imprescritível a pretensão, e a trabalhadora deverá receber todos os direitos trabalhistas desde 1998, conforme parâmetros estabelecidos na decisão.

Transgressão à dignidade

Quanto à caracterização do trabalho em condição análoga à de escravidão, a ministra observou que sua classificação penal abarca não apenas o trabalho forçado com privação da liberdade, mas também a sujeição a jornada exaustiva e condições degradantes de trabalho. “O ilícito penal parte do conceito de trabalho escravo contemporâneo, definido como aquele em que o labor é executado em flagrante transgressão à dignidade humana”, assinalou. 

Provas

No caso, a relatora ressaltou que o TRT, após exaustiva apreciação das provas, concluiu que este era o caso da trabalhadora, privada de salários e das mínimas condições de higiene, saúde e alimentação não somente depois de 2017, como alegavam os patrões. Os fatos e as provas que levaram a essa conclusão não podem ser reexaminados pelo TST (Súmula 126).

Dano coletivo

Em relação ao valor da indenização por dano moral coletivo, a ministra explicou que ela tem caráter meramente punitivo-pedagógico, porque a violação de direitos fundamentais pelo trabalho escravo é irreparável monetariamente. Assim, deve-se levar em conta a capacidade econômica dos ofensores - que, no caso, obtiveram o benefício da justiça gratuita. Por isso, a condenação, apenas nesse ponto, foi reduzida de R$ 300 mil para R$ 200 mil.

A decisão foi unânime.

(Carmem Feijó)

Processo: RRAg-1000612-76.2020.5.02.0053

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