Súmulas
SÚMULA 516
A
contribuição de intervenção no domínio econômico para o Incra
(Decreto-Lei n. 1.110/1970), devida por empregadores rurais e urbanos,
não foi extinta pelas Leis ns.
7.787/1989, 8.212/1991 e 8.213/1991, não podendo ser compensada com a
contribuição ao INSS. Primeira Seção, aprovada em 25/2/2015, DJe 2/3/2015.
SÚMULA 517
São
devidos honorários advocatícios no cumprimento de sentença, haja ou não
impugnação, depois de escoado o prazo para pagamento voluntário, que se
inicia
após a intimação do advogado da parte executada. Corte Especial, aprovada em 26/2/2015, DJe 2/3/2015.
SÚMULA 518
Para
fins do art. 105, III, a, da Constituição Federal, não é cabível
recurso especial fundado em alegada violação de enunciado de súmula. Corte Especial,
aprovada em 26/2/2015, DJe 2/3/2015.
SÚMULA 519
Na hipótese de rejeição da impugnação ao cumprimento de sentença, não são cabíveis honorários advocatícios. Corte Especial, aprovada em
26/2/2015, DJe 2/3/2015.
Corte Especial
DIREITO PROCESSUAL CIVIL E PROCESSUAL PENAL. LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL PARA ATUAR NO ÂMBITO DO STJ.
O
Ministério Público Estadual tem legitimidade para atuar diretamente
como parte em recurso submetido a julgamento perante o STJ. O
texto do § 1° do art. 47 da LC 75/1993 é
expresso no sentido de que as funções do Ministério Público Federal
perante os Tribunais Superiores da União somente podem ser exercidas por
titular do cargo de Subprocurador-Geral da República. A par disso,
deve-se perquirir quais as funções que um Subprocurador-Geral da
República exerce perante o STJ. É evidente que o Ministério Público,
tanto aquele organizado pela União quanto aquele estruturado pelos
Estados, pode ser parte e custos legis, seja no âmbito cível ou
criminal. Nesse passo, tendo a ação (cível ou penal) sido proposta pelo
Ministério Público Estadual perante o primeiro grau de
jurisdição, e tendo o processo sido alçado ao STJ por meio de recurso, é
possível que esse se valha dos instrumentos recursais necessários na
defesa de seus interesses constitucionais. Nessas
circunstâncias, o Ministério Público Federal exerce apenas uma de suas
funções, qual seja: a de custos legis. Isto é, sendo o recurso
do Ministério Público Estadual, o Ministério
Público Federal, à vista do ordenamento jurídico, pode opinar pelo
provimento ou pelo desprovimento da irresignação. Assim, cindido em um
processo o exercício das funções do Ministério
Público (o Ministério Público Estadual sendo o autor da ação, e o
Ministério Público Federal opinando acerca do recurso interposto nos
respectivos autos), não há razão legal, nem
qualquer outra ditada pelo interesse público, que autorize restringir a
atuação do Ministério Público Estadual enquanto parte recursal,
realizando sustentações orais, interpondo agravos regimentais contra
decisões, etc. Caso contrário, seria permitido a qualquer outro autor
ter o referido direito e retirar-se-ia do Ministério Público Estadual,
por exemplo, o direito de perseguir a procedência de ações
penais e de ações de improbidade administrativa imprescindíveis à ordem
social. EREsp
1.327.573-RJ, Rel. originário e voto vencedor Min. Ari Pargendler,
Rel. para acórdão Min. Nancy Andrighi, julgado em 17/12/2014, DJe
27/2/2015.
DIREITO CIVIL. OBRIGAÇÃO PELO PAGAMENTO DE COMISSÃO DE CORRETAGEM.
Inexistindo
pactuação dispondo em sentido contrário, a obrigação de pagar a
comissão de corretagem é daquele que efetivamente contrata o corretor. Na
forma
do art. 722 do CC, o contrato de corretagem é aquele por meio do qual
alguém se obriga a obter para outro um ou mais negócios de acordo com as
instruções recebidas. Essa relação não pode existir em
virtude de mandato, de prestação de serviços ou de qualquer relação de
dependência. A pessoa que contrata o serviço do corretor é denominada de
comitente. Observe-se que, no mercado, há
hipóteses em que é o proprietário (vendedor) do imóvel que busca alguém
para comprá-lo. Em outras, o contrário ocorre, ou seja, é o comprador
que busca a aquisição de imóvel.
Em qualquer dos casos, a partir do momento em que o corretor é chamado
para ingressar na relação entre comprador e devedor, passa a ser devida a
sua comissão. O encargo, pois, do pagamento da remuneração desse
trabalho depende, em muito, da situação fática contratual objeto da
negociação, devendo ser considerado quem propõe ao corretor nela
intervir. Independentemente dessas situações, existindo efetiva
intermediação pelo corretor, as partes podem, livremente, pactuar como
se dará o pagamento da comissão de corretagem. Há, porém, casos em que
tanto o comprador quanto o vendedor se acham desobrigados desse
encargo, pois entendem que ao outro compete fazê-lo. Há casos ainda em
que essa pactuação nem sequer existe, porquanto nada acordam as partes a
respeito, daí surgindo a interpretação que se ampara no art.
724 do CC. Em face dessas dúvidas ou omissões e em virtude da proposta
dirigida inicialmente ao corretor, conforme acima exposto, é justo que a
obrigação de pagar a comissão de corretagem seja de quem
efetivamente contrata o corretor, isto é, do comitente, que busca o
auxílio daquele, visando à aproximação com outrem cuja pretensão,
naquele momento, está em conformidade com seus interesses, seja como
comprador ou como vendedor. Ressalte-se ainda que, quando o comprador
vai ao mercado, pode ocorrer que seu interesse se dê por bem que está
sendo vendido já com a intervenção de corretor. Aí, inexistindo
convenção das partes, não lhe compete nenhuma obrigação quanto à
comissão de corretagem, pois o corretor já foi anteriormente contratado
pelo vendedor. Diferente é a hipótese em que o
comprador, visando à aquisição de bem, contrate o corretor para que, com
base em seu conhecimento de mercado, busque bem que lhe interesse.
Nessa situação, a tratativa inicial com o corretor foi do próprio
comprador. REsp 1.288.450-AM, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 24/2/2015, DJe
27/2/2015.
Segunda Seção
DIREITO ADMINISTRATIVO E DO CONSUMIDOR. DANO MORAL IN RE IPSA NO CASO DE EXTRAVIO DE CARTA REGISTRADA.
Se
a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) não comprovar a
efetiva entrega de carta registrada postada por consumidor nem
demonstrar causa excludente de responsabilidade, há de se
reconhecer o direito a reparação por danos morais in re ipsa, desde que o consumidor comprove minimamente a celebração do contrato de entrega da carta registrada. Nesse caso, deve-se reconhecer a
existência de dano moral in re ipsa, que exonera o consumidor
do encargo de demonstrar o dano que, embora imaterial, é de notória
existência. De fato, presume-se que ninguém remete uma carta, ainda mais
registrada, sem que seja importante o seu devido e oportuno recebimento
pelo destinatário, independentemente do seu conteúdo. Assim,
simplesmente negar esse dano seria pactuar com a má prestação de serviço
que
estaria autorizada mediante a mera devolução do valor pago na confiança
de que o serviço fosse satisfatoriamente executado. Além do mais, não se
trata de aborrecimento sem maiores consequências, mas de
ineficiência com graves consequências, porquanto o serviço contratado
não executado frustrou a finalidade do recebimento oportuno. Ademais, a
contratação de serviços postais oferecidos pelos Correios por
meio de tarifa especial, para envio de carta registrada – que permite o
posterior rastreamento pelo próprio órgão de postagem –, revela a
existência de contrato de consumo, devendo a fornecedora responder
objetivamente ao cliente por danos morais advindos da falha do serviço
quando não comprovada a efetiva entrega. Além disso, é verdade que o
STF, por ocasião do julgamento da ADPF 46-DF (Tribunal Pleno, DJe
26/2/2010),
fixou como atividades típicas de Estado, objeto de monopólio, aquelas
previstas no art. 9º da Lei 6.538/1978, entre as quais se encontra
arrolada a expedição e a entrega de cartas e cartões-postais (inciso I).
Aliás, como bem assentado pela doutrina, “sendo o princípio maior o da
livre iniciativa (leia-se, também, livre concorrência), somente em
hipóteses restritas e constitucionalmente previstas poderá o Estado
atuar diretamente, como empresário, no domínio econômico. Essas exceções
se resumem aos casos de: a) imperativo da segurança nacional (CF, art.
173, caput); b) relevante interesse coletivo (CF, art. 173, caput);
c) monopólio outorgado pela União (e.g., CF, art. 177)”. Portanto, o
caso ora em análise revela o exercício de típico serviço público (art.
21, X, da CF), relevante ao interesse social, exercido por
meio de monopólio ou privilégio conferido aos Correios (art. 9º da Lei
6.538/1978), a quem incumbe o “recebimento, transporte e entrega no
território nacional, e a expedição, para o exterior, de carta e
cartão-postal”, o que acarreta sua responsabilidade objetiva (art. 37, §
6º, da CF e arts. 14 e 22 do CDC). EREsp 1.097.266-PB, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 10/12/2014, DJe 24/2/2015.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. CABIMENTO DE RECURSO ESPECIAL SOB ALEGAÇÃO DE OFENSA A DIREITO ADQUIRIDO E ATO JURÍDICO PERFEITO.
Cabe
recurso especial – e não recurso extraordinário – para examinar se
ofende o art. 6º da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro
(LINDB) a
interpretação feita pelo acórdão recorrido dos conceitos legais de
direito adquirido e de ato jurídico perfeito a qual ensejou a aplicação
de lei nova a situação jurídica já
constituída quando de sua edição. Embora o tema não seja
pacífico, não se desconhece que há acórdãos do STJ segundo os quais,
havendo dispositivo constitucional com o mesmo
conteúdo da regra legal cuja violação se alega – como é o caso do
direito adquirido e do ato jurídico perfeito –, a questão é
constitucional, não suscetível de
apreciação na via do recurso especial. Todavia, a jurisprudência do STF
orienta-se no sentido de que não cabe recurso extraordinário por ofensa
aos princípios constitucionais da legalidade, do devido processo
legal, da coisa julgada, do direito adquirido, entre outros, se, para
apreciá-la, for necessária a interpretação de legislação ordinária (AgRg
no AG 135.632-RS, Primeira Turma, DJ 3/9/1999). Os conceitos
de direito adquirido, ato jurídico perfeito e coisa julgada são dados
por lei ordinária (art. 6º da LINDB), sem aptidão, portanto, para inibir
o legislador infraconstitucional. Assim, se a lei ordinária contiver
regra de cujo texto se extraia ordem de retroatividade, em prejuízo de
situação jurídica anteriormente constituída, a ofensa será direta ao
art. 5º, XXXVI, da CF, passível de exame em recurso
extraordinário. Diversamente, caso se cuide de decidir acerca da
aplicação da lei nova a determinada relação jurídica existente quando de
sua edição, a questão será
infraconstitucional, impugnável mediante recurso especial. REsp 1.124.859-MG, Rel. originário Min. Luis
Felipe Salomão, Rel. para acórdão Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 26/11/2014, DJe 27/2/2015.
DIREITO CIVIL. NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA, NA PARTILHA, DAS NORMAS VIGENTES AO TEMPO DA AQUISIÇÃO DOS BENS.
Ainda
que o término do relacionamento e a dissolução da união estável tenham
ocorrido durante a vigência da Lei 9.278/1996, não é possível aplicar
à partilha do patrimônio formado antes da vigência da referida lei a
presunção legal de que os bens adquiridos onerosamente foram fruto de
esforço comum dos conviventes (art. 5º da Lei 9.278/1996), devendo-se
observar o ordenamento jurídico vigente ao tempo da aquisição de cada
bem a partilhar. Antes da Lei 9.278/1996, a partilha de bens ao
término da união estável dava-se mediante a
comprovação – e na proporção respectiva – do esforço direto ou indireto
de cada companheiro para a formação do patrimônio amealhado durante a
convivência (Súmula 380 do
STF). Apenas com a referida Lei, estabeleceu-se a presunção legal
relativa de comunhão dos bens adquiridos a título oneroso durante a
união estável (art. 5º da Lei 9.278/1996), excetuados os casos em que
existe estipulação em sentido contrário (caput do art. 5º) e os
casos em que a aquisição patrimonial decorre do produto de bens
anteriores ao início da união (§ 1º do art.
5º). Os bens adquiridos anteriormente à Lei 9.278/1996 têm a propriedade
– e, consequentemente, a partilha ao término da união – disciplinada
pelo ordenamento jurídico vigente quando da respectiva
aquisição. Com efeito, a aquisição da propriedade dá-se no momento em
que se aperfeiçoam os requisitos legais para tanto. Desse modo, a
titularidade dos bens não pode ser alterada por lei posterior em
prejuízo ao direito adquirido e ao ato jurídico perfeito (art. 5, XXXVI,
da CF e art. 6º da LINDB). Cumpre esclarecer, a propósito, que os
princípios legais que regem a sucessão e a partilha de bens não se
confundem: a sucessão é disciplinada pela lei em vigor na data do óbito;
a partilha de bens, ao contrário – seja em razão do término, em vida,
do relacionamento, seja em decorrência do
óbito do companheiro ou cônjuge – deve observar o regime de bens e o
ordenamento jurídico vigente ao tempo da aquisição de cada bem a
partilhar. A aplicação da lei vigente ao término do
relacionamento a todo o período de união implicaria expropriação do
patrimônio adquirido segundo a disciplina da lei anterior, em manifesta
ofensa ao direito adquirido e ao ato jurídico perfeito, além de
causar insegurança jurídica, podendo atingir até mesmo terceiros.
Ademais, deve-se levar em consideração que antes da edição da Lei
9.278/1996 os companheiros não dispunham de instrumento eficaz
para, caso desejassem, dispor sobre a forma de aquisição do patrimônio
durante a união estável. Efetivamente, como não havia presunção legal de
meação de bens entre conviventes,
não havia sequer razão para que os conviventes fizessem estipulação
escrita em contrário a direito dispositivo inexistente. REsp 1.124.859-MG, Rel. originário Min. Luis Felipe Salomão, Rel. para acórdão Min. Maria Isabel
Gallotti, julgado em 26/11/2014, DJe 27/2/2015.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. ALCANCE DA REGRA DE ISENÇÃO DE CUSTAS PROCESSUAIS DA LACP E DO CDC.
Não
é possível estender a regra de isenção prevista no art. 18 da Lei
7.347/1985 (LACP) e no art. 87 da Lei 8.078/1990 (CDC) à propositura de
ações ou
incidentes processuais que não estão previstos nos referidos artigos. Isso
porque a regra contida nos referidos dispositivos legais – que isenta o
autor de ações civis públicas e de ações
coletivas do adiantamento de custas, emolumentos, honorários periciais e
quaisquer outras despesas –, por ser regra de isenção tributária, deve
ser interpretada restritivamente (art. 111 do CTN). Com efeito,
observa-se
que as custas judiciais têm, de fato, natureza tributária, sendo
consideradas taxas nos termos do art. 145, II, da CF. Essa qualificação
jurídica já foi reiteradamente afirmada, tanto pela jurisprudência do
STJ (REsp 1.107.543-SP, Primeira Seção, DJe 26/4/2010 e REsp
1.199.760-DF, Primeira Turma, DJe 15/4/2011) quanto do STF (ADI 1.772
MC-MG, Pleno, DJ 8/9/2000). É possível, portanto, o confronto entre as
isenções
estabelecidas na LACP e no CDC com a regra do art. 111 do CTN. Nesse
contexto, diante da necessidade de se conferir às regras de isenção
tributária interpretação restritiva, as disposições dos
arts. 18 da LACP e 87 do CDC só impedem o adiantamento das custas
judiciais em ações civis públicas, em ações coletivas que tenham por
objeto relação de consumo e na ação cautelar
prevista no art. 4º da LACP, não tendo o condão de impedir a antecipação
das custas nos demais tipos de ação, como, por exemplo, em ações
rescisórias ou em incidentes processuais.
PET 9.892-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 11/2/2015, DJe 3/3/2015.
DIREITO
PROCESSUAL CIVIL. INCIDENTE PROCESSUAL DE IMPUGNAÇÃO AO VALOR DA CAUSA E
RECOLHIMENTO DE CUSTAS JUDICIAIS NO ÂMBITO DO STJ.
Não
se pode exigir, no âmbito do STJ, o recolhimento de custas judiciais
quando se tratar de incidente processual de impugnação ao valor da
causa, conforme a Lei 11.636/2007. As
custas judiciais são tributos da espécie taxa, prevista no art. 145, II,
da CF, razão pela qual só podem ser fixadas em lei específica, dado o
princípio constitucional da reserva legal para a
instituição ou aumento de tributo (STF, RE 116.208-MG, Tribunal Pleno,
DJ 8/6/1990; e STJ, AI no RMS 31.170-SP, Corte Especial, DJe 23/5/2012).
No âmbito do STJ, a Lei 11.636/2007 dispõe sobre as custas judiciais
devidas nos
processos de competência originária e recursal. Como a impugnação ao
valor da causa não consta na Lei 11.636/2007, não se pode exigir o
recolhimento das custas judiciais nesse tipo de incidente processual.
PET 9.892-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 11/2/2015, DJe 3/3/2015.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. IMPUGNAÇÃO AO VALOR DA CAUSA EM AÇÃO RESCISÓRIA.
Em
sede de ação rescisória, o valor da causa, em regra, deve corresponder
ao da ação principal, devidamente atualizado monetariamente, exceto se
houver comprovação
de que o benefício econômico pretendido está em descompasso com o valor
atribuído à causa, hipótese em que o impugnante deverá demonstrar, com
precisão, o valor correto que entende devido para a
ação rescisória, instruindo a inicial da impugnação ao valor da causa
com os documentos necessários à comprovação do alegado. Precedentes
citados: Pet 8.707-GO, Segunda
Seção, DJe 29/8/2014; EDcl na Pet 5.541-SP, Terceira Seção, DJe
11/2/2010; e AgRg na AR 4.277-DF, Primeira Seção, DJe 10/11/2009. PET 9.892-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 11/2/2015, DJe 3/3/2015.
Primeira Turma
DIREITO ADMINISTRATIVO E TRIBUTÁRIO. PENA DE PERDA DE VEÍCULO CONDUTOR DE MERCADORIA SUJEITA À PENA DE PERDIMENTO.
Dá
ensejo à pena de perda do veículo a conduta dolosa do transportador que
utiliza veículo próprio para conduzir ao território nacional mercadoria
estrangeira sujeita
à pena de perdimento, independentemente de o valor do veículo ser
desproporcional ao valor das mercadorias apreendidas. De fato, o
inciso V do art. 104 do Decreto-Lei 37/1966 dispõe que a pena de perda
do veículo
é aplicada “quando o veículo conduzir mercadoria sujeita à pena de
perda, se pertencente ao responsável por infração punível com aquela
sanção”. Nessa mesma linha, o inciso V do
art. 688 do Decreto 6.759/2009, por sua vez, dispõe que se aplica a pena
de perdimento do veículo, por configurar dano ao Erário, “quando o
veículo conduzir mercadoria sujeita a perdimento, se pertencente ao
responsável por infração punível com essa penalidade”. Nesse contexto,
até mesmo em atenção ao que dispõe a Súmula Vinculante 10 do STF, não se
mostra adequado que se afaste a
norma legal em razão da simples comparação entre os valores das
mercadorias e do veículo que as transporta, ao pretexto de observância
do princípio da proporcionalidade, salvo se declarada sua
inconstitucionalidade. Além disso, “na aplicação da lei, o juiz atenderá
aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum”
(art. 5º da LINDB). Nesse passo, não há
dúvidas de que a legislação aduaneira, ao tratar da pena de perdimento
de veículo, é severa em razão de uma finalidade nítida, como coibir a
sonegação tributária, por meio do
descaminho ou de contrabando. Nessa linha, deve-se entender, como acima
assinalado, que a pena de perdimento do veículo (inciso V do art. 688 do
Decreto 6.759/2009 e inciso V do art. 104 do Decreto-Lei 37/1966),
refere-se à conduta dolosa
do transportador na internalização de sua própria mercadoria em veículo
de sua propriedade. REsp
1.498.870-PR, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 12/2/2015, DJe 24/2/2015.
DIREITO TRIBUTÁRIO. GARANTIA ESTENDIDA E BASE DE CÁLCULO DO ICMS.
O
valor pago pelo consumidor final ao comerciante a título de “seguro de
garantia estendida” não integra a base de cálculo do ICMS incidente
sobre a operação de
compra e venda da mercadoria. Inicialmente, convém esclarecer
que o “seguro de garantia estendida” é um contrato de adesão voluntária
estabelecido entre o consumidor (segurado) e uma sociedade seguradora,
sendo rotineiramente oferecido e comercializado pela empresa que vendeu a
mercadoria, que intermedeia o negócio. Ressalte-se que essa modalidade
de seguro foi inicialmente regulamentada pelo Conselho Nacional de
Seguros Privados (CNSP) por meio
das Resoluções 122/2005 e 296/2013. De acordo com tais regulamentos,
essa espécie de seguro tem por escopo fornecer ao segurado/consumidor a
extensão e/ou complementação de garantia original da mercadoria
adquirida. Importa mencionar, ainda, que a Resolução CNSP 296/2013, em
seu art. 13, esclarece expressamente que é “vedado condicionar a compra
do bem à contratação do seguro de garantia estendida, assim
como condicionar a concessão de desconto no seu preço à aquisição do
seguro”. De outro lado, a base de cálculo do ICMS, segundo a Lei Kandir
(LC 87/1996), é o valor da operação pelo
qual se deu a circulação da mercadoria. O imposto, portanto, não está
limitado ao preço da mercadoria, abrangendo também o valor relativo às
condições estabelecidas e assim exigidas do
comprador como pressuposto para a própria realização do negócio. Essa é a
inteligência do inciso II do § 1º do art. 13 da LC 87/1996, o qual
dispõe que devem integrar a base de cálculo:
(a) os seguros, juros e demais importâncias pagas, recebidas ou
debitadas, bem como descontos concedidos sob condição; e (b) o frete,
caso o transporte seja efetuado pelo próprio remetente ou por sua conta e
ordem e seja
cobrado em separado. Nessa linha intelectiva, destaque-se que a doutrina
ensina que o ICMS deve ser cobrado sobre o prêmio de seguro relativo ao
risco do transporte que é contratado e pago pelo vendedor (remetente) e
exigido do comprador
para a concretização do negócio, pois, nesse caso, tal quantia está
compreendida no valor da operação. A par disso, e ponderando os
elementos supramencionados, verifica-se que o “seguro de garantia
estendida” não se subsume ao art. 13, § 1º, II, “a”, da LC 87/1996,
pelas razões seguintes. A uma, o pagamento do prêmio dessa modalidade de
seguro não deve ser exigido do comprador como
condição indispensável para a aquisição da mercadoria. Isso porque o
seguro em questão é de adesão voluntária, podendo, ou não, ser
contratado diretamente pelo consumidor final.
Além disso, o seguro não é pago pelo vendedor para depois ser exigido do
comprador, na composição do preço da operação, para o fechamento do
negócio; essa, sim, hipótese de
incidência do art. 13, § 1º, II, “a”, da LC 87/1996. A duas, o seguro de
garantia estendida, conforme dispõe o art. 1º da Resolução CNSP 122, de
3/5/2005 e o art. 1º da Resolução
CNSP 296, de 25/10/2013, pode ser contratado pelo consumidor quando da
aquisição do bem ou posteriormente, durante o prazo de garantia do
fabricante, o que denota que esse negócio jurídico, embora relacionado, é
autônomo e subsequente à operação de compra, sendo possível a sua
contratação depois de já circulada a mercadoria (fato gerador do ICMS),
configurando, portanto, nova relação
jurídica e, por isso, não pode compor o valor da operação anterior já
concretizada. A três, porque os valores pagos pelo consumidor ao
comerciante devem ser repassados à companhia seguradora por
força contratual da parceria, não configurando, portanto, receita do
varejista na espécie. Assim, a garantia estendida é estabelecida entre o
consumidor e a empresa seguradora, inexistindo relação
jurídico-tributária entre o fisco e o comerciante que possa imputar ao
último o dever de recolher tributo sobre receita pertencente a terceiro,
sob pena de afronta ao princípio da capacidade contributiva.
Entretanto, apenas,
se o “seguro de garantia estendida” vier a ser indevidamente exigido
pelo comerciante, como condição do negócio, a fim de reduzir, por meio
de simulação, a base de cálculo do ICMS, poderá o
fisco autuar essa conduta irregular do contribuinte com espeque no
princípio da realidade (art. 116, I, do CTN). REsp
1.346.749-MG, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 10/2/2015, DJe 4/3/2015.
DIREITO TRIBUTÁRIO. INCIDÊNCIA DA COFINS SOBRE RECEITA PROVENIENTE DE LOCAÇÃO DE VAGAS EM ESTACIONAMENTO DE SHOPPING CENTER.
Compõe a base de cálculo da COFINS a receita proveniente da locação de vagas em estacionamento de shopping center
ou de centros comerciais de prestação de
serviços ou de venda de produtos, mesmo que esses estejam constituídos
na forma de condomínio e que não haja a intervenção de terceira pessoa
jurídica empresária. Mesmo na forma de
condomínio – destituído de personalidade jurídica – e sem a intervenção de terceira pessoa jurídica empresária, o shopping center
ou o centro comercial de prestação de
serviços ou venda de produtos é considerado unidade econômica autônoma
para fins de tributação, nos termos do art. 126, III, do CTN. Assim, se o
empreendimento gera renda por meio de locação de bens
e/ou prestação de serviços – mesmo que em benefício de sua
infraestrutura ou a favor dos condôminos – sem a intervenção de terceira
pessoa jurídica empresária, os valores que
recebe compõem a base de cálculo de contribuições sociais (no caso, a
COFINS), porquanto referidos valores fazem parte de seu faturamento. A
propósito, nos termos do art. 2º da LC 70/1991, a COFINS incide
“sobre o faturamento mensal, assim considerado a receita bruta das
vendas de mercadorias, de mercadorias e serviços e de serviço de
qualquer natureza”. Ademais, o STJ, em diversos casos, tem entendido
pela legalidade da
incidência da COFINS sobre receitas provenientes da administração e
locação procedidas por shopping centers. Ora, se há incidência
da contribuição sobre a administração
e locação das lojas e salas comerciais (AgRg no Ag 1.213.712-PR, Segunda
Turma, DJe 8/10/2010; e AgRg no REsp 1.164.449-PR, Segunda Turma, DJe
4/2/2011), não há falar em não incidência na locação de
vagas de estacionamento, as quais, igualmente àquelas, são bens imóveis
aptos à locação e obtenção de renda. Além disso, cumpre mencionar que a
Primeira Seção do STJ, por
ocasião do julgamento do REsp 1.141.065-SC (DJe 1º/2/2010), realizado
sob a sistemática do art. 543-C do CPC, no qual decidiu pela incidência
da COFINS nas receitas provenientes de locação de mão de obra,
fez-se peculiar menção à semelhança do caso com os dos shopping centers. Portanto, nessa linha, e ressalvadas as devidas diferenças entre os casos, se o empreendimento aufere renda da locação de
vagas de estacionamento e/ou outra espécie de prestação de serviços, essa renda deve compor a base de cálculo da COFINS. REsp 1.301.956/RJ, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 10/2/2015, DJe 20/2/2015.
Segunda Turma
DIREITO ADMINISTRATIVO. INDENIZAÇÃO PARA FINS DE DESAPROPRIAÇÃO QUANDO A ÁREA MEDIDA FOR MAIOR DO QUE A ESCRITURADA.
Se,
em procedimento de desapropriação por interesse social, constatar-se
que a área medida do bem é maior do que a escriturada no Registro de
Imóveis, o expropriado
receberá indenização correspondente à área registrada, ficando a
diferença depositada em Juízo até que, posteriormente, se complemente o
registro ou se defina a titularidade para o pagamento a quem
de direito. A indenização devida deverá considerar a área
efetivamente desapropriada, ainda que o tamanho real seja maior do que o
constante da escritura, a fim de não se configurar enriquecimento sem
causa em
favor do ente expropriante. Precedentes citados: REsp 1.286.886-MT,
Segunda Turma, DJe 22/5/2014; REsp 1.395.490-PE, Segunda Turma, DJe
28/2/2014; e REsp 1.321.842-PE, Segunda Turma, DJe 24/10/2013. REsp 1.466.747-PE, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 24/2/2015, DJe 3/3/2015.
DIREITO ADMINISTRATIVO. TERMO INICIAL DA PRESCRIÇÃO DE PRETENSÃO INDENIZATÓRIA DECORRENTE DE TORTURA E MORTE DE PRESO.
O
termo inicial da prescrição de pretensão indenizatória decorrente de
suposta tortura e morte de preso custodiado pelo Estado, nos casos em
que não chegou a ser ajuizada
ação penal para apurar os fatos, é a data do arquivamento do inquérito
policial. Precedentes citados: REsp 618.934-SC, Primeira Turma,
DJ 13/12/2004; REsp 591.419-RS, Primeira Turma, DJ 25/10/2004; e AgRg
no Ag
972.675-BA, Segunda Turma, DJe 13/3/2009. REsp 1.443.038-MS, Rel. Ministro Humberto Martins, julgado em 12/2/2015,
DJe 19/2/2015.
DIREITO FINANCEIRO. RESTRIÇÃO À TRANSFERÊNCIA DE RECURSOS FEDERAIS A MUNICÍPIO.
A
restrição para transferência de recursos federais a Município que
possui pendências no Cadastro Único de Exigências para Transferências
Voluntárias
(CAUC) não pode ser suspensa – art. 26 da Lei 10.522/2002 – sob a
justificativa de que os recursos destinam-se a reforma de prédio
público. De fato, o STJ firmou o entendimento que, na hipótese
de
transferência de recursos federais à municipalidade destinados a ações
sociais e a ações em faixa de fronteira, a anotação desabonadora junto
ao SIAFI e CADIN deve ter seus efeitos suspensos. No
entanto, em que pese a infraestrutura urbana estar inclusa no rol dos
direitos a cidades sustentáveis, a reforma de prédio público não pode
ser enquadrada no conceito de ação social previsto no art. 26 da Lei
10.522/2002. A interpretação da expressão “ações sociais” não pode ser
ampla a ponto de incluir hipóteses não apontadas pelo legislador, haja
vista que, se assim se procedesse, qualquer
atuação governamental em favor da coletividade seria passível de
enquadramento nesse conceito. Assim, interpretando o art. 26 da Lei
10.522/2002, verifica-se que a ação social é referente às
ações que objetivam atender a direitos sociais assegurados aos cidadãos,
cuja realização é obrigatória por parte do Poder Público. Precedentes
citados: AgRg no AgRg no REsp 1.416.470-CE, Segunda
Turma, DJe 27/11/2014; e REsp 1.372.942-AL, Primeira Turma, DJe
11/4/2014. AgRg no REsp 1.439.326-PE, Rel. Min.
Mauro Campbell Marques, julgado em 24/2/2015, DJe 2/3/2015.
DIREITO TRIBUTÁRIO. ISENÇÃO DE IMPOSTO DE RENDA SOBRE PROVENTOS ORIUNDOS DE PREVIDÊNCIA PRIVADA COMPLEMENTAR.
São
isentos do imposto de renda os proventos percebidos de fundo de
previdência privada a título de complementação da aposentadoria por
pessoa física acometida de uma das
doenças arroladas no art. 6º, XIV, da Lei 7.713/1988. Isso
porque a isenção do imposto de renda prevista no art. 6º, XIV, da Lei
7.713/1988 – da qual faz jus pessoa física portadora de doença
grave arrolada nesse inciso que receba proventos de aposentadoria ou
reforma – engloba benefício complementar pago por entidade de
previdência privada. É preciso ressaltar que o regime da previdência
privada é
facultativo e baseia-se na constituição de reservas que garantam o
benefício contratado, nos termos do art. 202 da CF e da exegese do art.
1º da LC 109/2001. Assim, o capital acumulado em plano de previdência
privada
representa patrimônio destinado à geração de aposentadoria – ainda que
intitulada de complementar –, possuindo natureza previdenciária,
mormente ante o fato de estar inserida na seção sobre
Previdência Social da CF (EREsp 1.121.719-SP, Segunda Seção, DJe
4/4/2014), o que legitima a isenção sobre a parcela complementar. Além
disso, o caráter previdenciário da aposentadoria privada
encontra respaldo no próprio Regulamento do Imposto de Renda (Decreto
3.000/1999), que estabelece a isenção sobre os valores decorrentes da
complementação de aposentadoria no § 6º do seu art. 39: “As
isenções de que tratam os incisos XXXI e XXXIII também se aplicam à
complementação de aposentadoria, reforma ou pensão”. Ademais, conforme a
doutrina, “os planos previdenciários
privados têm por ponto principal permitir uma continuidade no padrão de
vida da pessoa, numa fase madura da vida”. Nesse sentido, a isenção
concedida aos portadores de doença grave consubstancia benefício
fiscal que visa abrandar o impacto da carga tributária sobre a renda
necessária à sua subsistência e sobre os custos inerentes ao tratamento
da doença, legitimando um “padrão de vida” o mais digno
possível diante do estado de enfermidade. Precedente citado: REsp
1.204.516-PR, Segunda Turma, DJe 23/11/2010. REsp
1.507.320-RS, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 10/2/2015, DJe 20/2/2015.
Terceira Turma
DIREITO DO CONSUMIDOR. CASO DE INAPLICABILIDADE DO CDC.
Não
há relação de consumo entre o fornecedor de equipamento
médico-hospitatar e o médico que firmam contrato de compra e venda de
equipamento de ultrassom com
cláusula de reserva de domínio e de indexação ao dólar americano, na
hipótese em que o profissional de saúde tenha adquirido o objeto do
contrato para o desempenho de sua atividade econômica.
Com efeito, consumidor é toda pessoa física ou jurídica que
adquire ou utiliza, como destinatário final, produto ou serviço oriundo
de um fornecedor. Assim, segundo a teoria subjetiva ou finalista,
adotada
pela Segunda Seção do STJ, destinatário final é aquele que ultima a
atividade econômica, ou seja, que retira de circulação do mercado o bem
ou o serviço para consumi-lo, suprindo uma necessidade ou
satisfação própria. Por isso, fala-se em destinatário final econômico (e
não apenas fático) do bem ou serviço, haja vista que não basta ao
consumidor ser adquirente ou usuário,
mas deve haver o rompimento da cadeia econômica com o uso pessoal a
impedir, portanto, a reutilização dele no processo produtivo, seja na
revenda, no uso profissional, na transformação por meio de
beneficiamento ou
montagem ou em outra forma indireta. Desse modo, a relação de consumo
(consumidor final) não pode ser confundida com relação de insumo
(consumidor intermediário). Na hipótese em foco, não se pode
entender que a aquisição do equipamento de ultrassom, utilizado na
atividade profissional do médico, tenha ocorrido sob o amparo do CDC. REsp 1.321.614-SP, Rel. originário Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Rel. para acórdão Min. Ricardo Villas
Bôas Cueva, julgado em 16/12/2014, DJe 3/3/2015.
DIREITO CIVIL. MAXIDESVALORIZAÇÃO DO REAL EM FACE DO DÓLAR AMERICANO E TEORIAS DA IMPREVISÃO E DA ONEROSIDADE EXCESSIVA.
Tratando-se de
relação contratual paritária – a qual não é regida pelas normas
consumeristas –, a maxidesvalorização do real em face do
dólar americano ocorrida a partir de janeiro de 1999 não autoriza a
aplicação da teoria da imprevisão ou da teoria da onerosidade excessiva,
com intuito de promover a revisão de cláusula de
indexação ao dólar americano. Com efeito, na relação contratual, a regra é a observância do princípio pacta sunt servanda,
segundo o qual o contrato faz lei entre as partes e, por
conseguinte, impõe ao Estado o dever de não intervir nas relações
privadas. Ademais, o princípio da autonomia da vontade confere aos
contratantes ampla liberdade para estipular o que lhes convenha, desde
que
preservada a moral, a ordem pública e os bons costumes, valores que não
podem ser derrogados pelas partes. Desse modo, a intervenção do Poder
Judiciário nos contratos, à luz da teoria da imprevisão ou da
teoria da onerosidade excessiva, exige a demonstração de mudanças
supervenientes das circunstâncias iniciais vigentes à época da
realização do negócio, oriundas de evento imprevisível
(teoria da imprevisão) e de evento imprevisível e extraordinário (teoria
da onerosidade excessiva), que comprometam o valor da prestação,
demandando tutela jurisdicional específica, tendo em vista, em especial,
o disposto nos arts. 317, 478 e 479 do CC. Nesse passo, constitui
pressuposto da aplicação das referidas teorias, a teor dos arts. 317 e
478 do CC, como se pode extrair de suas próprias denominações, a
existência
de um fato imprevisível em contrato de execução diferida, que imponha
consequências indesejáveis e onerosas para um dos contratantes. A par
disso, o histórico inflacionário e as sucessivas
modificações no padrão monetário experimentados pelo País desde longa
data até julho de 1994, quando sobreveio o Plano Real, seguido de
período de relativa estabilidade até a
maxidesvalorização do real em face do dólar, ocorrida a partir de
janeiro de 1999, não autorizam concluir pela inexistência de risco
objetivo nos contratos firmados com base na cotação da moeda
norte-americana, em se tratando de relação contratual paritária. REsp 1.321.614-SP,
Rel.
originário Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Rel. para acórdão Min.
Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 16/12/2014, DJe 3/3/2015.
DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. HIPÓTESE DE INAPLICABILIDADE DA TEORIA DA BASE OBJETIVA OU DA BASE DO NEGÓCIO JURÍDICO.
A
teoria da base objetiva ou da base do negócio jurídico tem sua
aplicação restrita às relações jurídicas de consumo, não sendo aplicável
às contratuais puramente civis. A teoria da base objetiva
difere da teoria da imprevisão por prescindir da imprevisibilidade de
fato que determine oneração excessiva de um dos contratantes. Pela
leitura do art.
6°, V, do CDC, basta a superveniência de fato que determine
desequilíbrio na relação contratual diferida ou continuada para que seja
possível a postulação de sua revisão ou
resolução, em virtude da incidência da teoria da base objetiva. O
requisito de o fato não ser previsível nem extraordinário não é exigido
para a teoria da base objetiva, mas tão
somente a modificação nas circunstâncias indispensáveis que existiam no
momento da celebração do negócio, ensejando onerosidade ou desproporção
para uma das partes. Com efeito, a teoria da
base objetiva tem por pressuposto a premissa de que a celebração de um
contrato ocorre mediante consideração de determinadas circunstâncias, as
quais, se modificadas no curso da relação contratual,
determinam, por sua vez, consequências diversas daquelas inicialmente
estabelecidas, com repercussão direta no equilíbrio das obrigações
pactuadas. Nesse contexto, a intervenção judicial se daria nos casos
em que o contrato fosse atingido por fatos que comprometessem as
circunstâncias intrínsecas à formulação do vínculo contratual, ou seja,
sua base objetiva. Em que pese sua relevante inovação, a
referida teoria, ao dispensar, em especial, o requisito de
imprevisibilidade, foi acolhida em nosso ordenamento apenas para as
relações de consumo, que demandam especial proteção. Ademais, não se
admite a
aplicação da teoria do diálogo das fontes para estender a todo direito
das obrigações regra incidente apenas no microssistema do direito do
consumidor. De outro modo, a teoria da quebra da base objetiva poderia
ser
invocada para revisão ou resolução de qualquer contrato no qual haja
modificação das circunstâncias iniciais, ainda que previsíveis,
comprometendo em especial o princípio pacta sunt
servanda e, por conseguinte, a segurança jurídica. Por fim,
destaque-se que, no tocante às relações contratuais puramente civis,
quer dizer, ao desamparo das normas protetivas do CDC, a adoção
da teoria da base objetiva, a fim de determinar a revisão de contratos,
poderia, em decorrência da autuação jurisdicional, impor indesejáveis
prejuízos reversos àquele que teria, em tese, algum
benefício com a superveniência de fatos que atinjam a base do negócio. REsp 1.321.614-SP,
Rel.
originário Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Rel. para acórdão Min.
Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 16/12/2014, DJe 3/3/2015.
DIREITO
CIVIL. DEVOLUÇÃO DOS VALORES PAGOS A TÍTULO DE TAXA DE ARRENDAMENTO EM
VIRTUDE DE DEFEITOS NA CONSTRUÇÃO DE IMÓVEL INCLUÍDO NO PROGRAMA DE
ARRENDAMENTO RESIDENCIAL.
Havendo
vícios de construção que tornem precárias as condições de
habitabilidade de imóvel incluído no Programa de Arrendamento
Residencial (PAR), não
configura enriquecimento sem causa a condenação da CEF a devolver aos
arrendatários que optaram pela resolução do contrato o valor pago a
título de taxa de arrendamento. O PAR objetiva, nos termos do
art. 10 da Lei 10.188/2001, o atendimento da necessidade de moradia da
população de baixa renda, sob a forma de arrendamento residencial com
opção de compra. A CEF, como agente-gestor do Fundo de Arrendamento
Residencial,
é responsável tanto pela aquisição como pela construção dos imóveis, que
permanecem de propriedade do referido fundo até que os particulares que
firmaram contratos de arrendamento com
opção de compra possam exercer o ato de aquisição no final do contrato.
Assim, compete à CEF a responsabilidade pela entrega aos arrendatários
de bens imóveis aptos à moradia, respondendo por
eventuais vícios de construção. Em que pese a aquisição do imóvel
arrendado configurar uma opção do arrendatário ao final do período do
arrendamento, o PAR visa a sanar o problema da
moradia das populações de baixa renda, e o alcance desse objetivo,
inegavelmente, dar-se-ia com a aquisição, ao final, do imóvel objeto do
arrendamento. Frise-se que a própria escolha de um arrendamento, em vez
da locação, já enuncia, ao menos em tese, a pretensão do arrendatário de
vir a adquirir o imóvel. Assim, pela total incúria com o bem que
entrega ao arrendamento, a CEF inviabiliza a opção
pela aquisição do imóvel. Aliás, essas alternativas conferidas aos
adquirentes desses imóveis estão previstas no art. 18 do CDC, quando
regula os efeitos dos vícios de qualidade do produto. Desse modo,
inexiste enriquecimento sem causa (arts. 884 e 885 do CC), pois há
motivo para a devolução aos arrendatários dos valores por eles
despendidos para residir em imóvel que apresentou assomados problemas
decorrentes de
vícios de construção. REsp 1.352.227-RN, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 24/2/2015,
DJe 2/3/2015.
DIREITO CIVIL. DIREITO EXCLUSIVO DO PESQUISADOR À EXPLORAÇÃO DA JAZIDA.
O
terceiro que explorou clandestinamente área objeto de outorga para
pesquisa de viabilidade de lavra de minérios deve indenizar o particular
que possuía o direito de pesquisa e de lavra.
Ainda que o Estado seja o proprietário exclusivo das reservas
minerais existentes no solo e subsolo, ao concessionário particular é
garantida a propriedade do produto de sua exploração, fazendo emergir da
nossa ordem constitucional o princípio do livre acesso aos recursos
minerais. Nesse cenário, o Código de Mineração trouxe o importante
instituto da prioridade, ou seja: cumpridas as determinações legais,
o minerador faz jus à obtenção de um título minerário, obedecida a
prioridade prevista no art. 11, “a”, do Decreto-Lei 227/1967.
Desse modo, para fins de fixação do direito de
prioridade, o referido dispositivo estabelece que se tomará em
consideração a data do requerimento relativo à pesquisa ou à exploração
de área considerada livre. Concedido o alvará de
pesquisa e verificada a viabilidade da exploração em conclusão dos
trabalhos de pesquisa, o autorizatário terá o prazo decadencial ânuo
para requerer a concessão da lavra ou negociar seu direito com
terceiros (arts. 31 e 32 do Decreto-Lei 227/1967, ambos com redação dada
pela Lei 6.403/1976). Daí se extrai que, uma vez autorizada a pesquisa
para fins de mineração, nasce para o autorizatário o direito
subjetivo e exclusivo à futura exploração da mina, como decorrência do
direito de prioridade, durante o prazo decadencial de um ano, contado da
aprovação do relatório final da pesquisa. Portanto, fixado
legalmente o direito subjetivo à futura concessão da lavra como
decorrência da autorização de pesquisa, a exploração indevida, exercida
clandestina e ilicitamente por terceiro, que não detinha
nenhum título minerário, resulta em prejuízo injusto ao legítimo
autorizatário. Dano esse que, portanto, deve ser-lhe integralmente
ressarcido na esteira do art. 927 do CC. REsp 1.471.571-RO, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 10/2/2015, DJe 26/2/2015.
DIREITO EMPRESARIAL. PROTESTO DE CHEQUE NÃO PRESCRITO.
É
legítimo o protesto de cheque efetuado contra o emitente depois do
prazo de apresentação, desde que não escoado o prazo prescricional
relativo à ação
cambial de execução. De fato, o lapso prescricional para a
execução de cheque é de 6 meses após o prazo de apresentação – que é de
30 dias, contados da emissão, se da
mesma praça; ou de 60 dias, se de praça diversa, nos termos do art. 59
da Lei 7.357/1985. Por sua vez, o protesto é, em regra, facultativo,
pois dele não necessita o credor para exigir em juízo a
obrigação constante do título cambial. Nas circunstâncias, porém, em que
o exercício do direito depende, por exigência legal, do protesto, será
considerado necessário. Assim, a exigência
de realização do protesto antes de expirado o prazo de apresentação
prevista no art. 48 da Lei 7.357/1985 é dirigida apenas ao protesto
necessário, isto é, contra os coobrigados, para o exercício
do direito de regresso, e não em relação ao emitente do título.
Portanto, nada impede o protesto facultativo do cheque, mesmo que
apresentado depois do prazo mencionado no art. 48, c/c o art. 33, ambos
da Lei 7.357/1985. Isso
porque o protesto do título pode ser utilizado pelo credor com outras
finalidades que não o ajuizamento da ação de execução do título
executivo. Findo o prazo previsto no caput do art. 48 da Lei
7.357/1985, o credor tem a faculdade de cobrar seu crédito por outros meios, sendo legítima a realização do protesto. REsp 1.297.797-MG, Rel. João Otávio de Noronha, julgado em 24/2/2015, DJe 27/2/2015.
Quarta Turma
DIREITO CIVIL. INAPLICABILIDADE DE PRAZO DECADENCIAL NOS CASOS DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE.
O
prazo decadencial de 4 anos estabelecido nos arts. 178, § 9º, VI e 362
do CC/1916 (correspondente ao art. 1.614 do CC/2002) aplica-se apenas
aos casos em que se pretende, exclusivamente, desconstituir
o reconhecimento de filiação, não tendo incidência nas investigações de
paternidade, nas quais a anulação do registro civil constitui mera
consequência lógica da procedência do
pedido. Precedentes citados: REsp 259.768-RS, Quarta Turma, DJ
22/3/2004; REsp 714.969-MS, Quarta Turma, DJ 22/3/2010; e RESP
987.987-SP, Terceira Turma, DJ 5/9/2008. AgRg no REsp 1.259.703-MS, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 24/2/2015, DJe 27/2/2015.
DIREITO
EMPRESARIAL. LEI APLICÁVEL NO CASO DE PEDIDO DE REGISTRO DE DESENHO
INDUSTRIAL EM ANDAMENTO QUANDO DA VIGÊNCIA DA LEI DE PROPRIEDADE
INDUSTRIAL.
Na
hipótese em que o pedido de registro de desenho industrial tenha sido
formulado quando vigente o revogado Código de Propriedade Industrial
(Lei 5.772/1971) e a concessão do registro tenha
ocorrido já na vigência da Lei de Propriedade Industrial (Lei
9.279/1996), a divulgação do objeto de registro ocorrida durante o
“período de graça” (art. 96, § 3º, da Lei 9.279/1996)
não afasta a caracterização do requisito da “novidade”, ainda que não
realizado previamente requerimento de garantia de prioridade (art. 7º da
Lei 5.772/1971). De acordo com o revogado Código
de Propriedade Industrial, encontrar-se-ia o desenho industrial no
“estado da técnica” quando tornado público antes do depósito, perdendo,
assim, o requisito da “novidade”, sem o qual o registro não
poderia ser concedido (art. 6º). Excepcionalmente, seria autorizada a
publicidade antes do depósito desde que previamente requerida a
denominada “garantia de prioridade”, destinada a permitir que a
invenção, o
modelo ou o desenho industrial fossem submetidos a entidades científicas
ou apresentadas em exposições oficiais ou oficialmente reconhecidas
(arts. 7º e 8º). A Lei 5.772/1971 foi revogada pela Lei 9.279, publicada
no DOU
de 15/5/1996, que passou a vigorar integralmente em 15/5/1997, na forma
do art. 243. A nova lei modificou a definição do “estado da técnica” e,
reflexamente, do requisito da “novidade”, que permaneceu sendo
exigido. A “garantia de prioridade”, por sua vez, disciplinada nos arts.
7º e 8º do diploma anterior, foi substituída pelo denominado “período
de graça” regido no § 3º do art. 96 da nova
Lei, segundo o qual: “Não será considerado como incluído no estado da
técnica o desenho industrial cuja divulgação tenha ocorrido durante os
180 (cento e oitenta) dias que precederem a data do
depósito ou a da prioridade reivindicada, se promovida nas situações
previstas nos incisos I a III do art. 12”. Posto isso, surge a seguinte
controvérsia: qual a legislação aplicável para definir
“estado de técnica” e o requisito material da “novidade” na hipótese em
que o pedido de registro do desenho industrial tenha sido formulado
quando vigente a Lei 5.772/1971 e a concessão do registro tenha
ocorrido já na vigência da Lei 9.279/1996? A propósito do tema, a nova
Lei dispôs, em seu art. 229, que aos “pedidos em andamento serão
aplicadas as disposições desta Lei, exceto quanto à
patenteabilidade das substâncias, matérias ou produtos obtidos por meios
ou processos químicos e as substâncias, matérias, misturas ou produtos
alimentícios, químico-farmacêuticos e medicamentos de
qualquer espécie, bem como os respectivos processos de obtenção ou
modificação, que só serão privilegiáveis nas condições estabelecidas nos
arts. 230 e 231”
(redação original, posteriormente modificada pela Lei 10.196/2001).
Desse modo, na situação em análise, incidirá a primeira parte desse
dispositivo – que determina a aplicação da Lei
9.279/1996 aos pedidos em andamento –, já que o desenho industrial
objeto de registro não se insere nas exceções discriminadas pelo artigo,
relacionadas à patenteabilidade de produtos e processos químicos,
farmacêuticos e alimentícios. Observe-se que, quando o legislador
desejou fosse indeferido o pedido em andamento que não preenchesse os
requisitos materiais da lei anterior, ele o fez expressamente (vide art.
229-A da Lei
9.279/1996), situação essa que não ocorre na hipótese em apreço, na qual
se deve aplicar a nova Lei. Não se trata propriamente de fazer
retroagir a lei aos casos consolidados, decididos pelo INPI, mas de
reconhecer que cabe ao Poder Legislativo modificar os requisitos para a
concessão de patentes de invenção e de modelo de utilidade e de registro
de desenho industrial e de marca. Assim como a lei pode modificar, por
exemplo, os
requisitos para a usucapião antes da sua aquisição, as hipóteses de
retomada de imóveis locados e as regras pertinentes à herança e aos
limites de construção civil (leis de posturas), pode
também alterar as hipóteses relativas à possibilidade de concessão de
registro de propriedade industrial. Frise-se, de mais a mais, que o STF,
analisando o art. 117 da Lei 5.772/1972 (dispositivo semelhante ao art.
229 da Lei
9.279/1996), considerou o art. 9º da Lei 5.772/1972 – que relacionou as
invenções “não privilegiáveis” – aplicável aos pedidos em andamento
quando este diploma entrou em vigor (RE
93.679-3/RJ, Plenário, DJ de 9/3/1984). Ora, assim como a lei nova pode
restringir as hipóteses de privilégio, também pode ampliá-las mediante
alteração dos requisitos materiais respectivos, aplicando-as
aos pedidos em andamento. Ante o exposto, nos termos do art. 96 da Lei
9.279/1996, o desenho industrial, no caso em análise, não se encontra
inserido no “estado da técnica”, não estando descaracterizado, por esse
motivo, o requisito material de “novidade”. REsp 1.050.659-RJ, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em
24/2/2015, DJe 4/3/2015.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. INAPLICABILIDADE DA TEORIA DA RELATIVIZAÇÃO DA COISA JULGADA.
A
mera alegação de que houve um erro de julgamento não é apta a
justificar a aplicação da teoria da relativização da coisa julgada com
vistas a desconstituir
decisão que, em sede de incidente de habilitação de crédito, fixou
equivocadamente os honorários advocatícios com base no § 3º do art. 20
do CPC – quando deveria ter utilizado o § 4º do
referido dispositivo –, ainda que o valor dos honorários seja excessivo e
possa prejudicar os demais credores concursais. Preliminarmente,
registre-se que a jurisprudência do STJ tem aplicado a teoria da
relativização da coisa julgada, contudo o tem feito apenas em situações
excepcionais, nas quais a segurança jurídica, que é o seu princípio
informador, tiver que ceder em favor de outros
princípios ou valores mais importantes, como a busca da verdade real
(nas ações sobre filiação cujas decisões transitadas em julgado
conflitem com resultados de exames de DNA posteriores), a força
normativa da Constituição e a máxima eficácia das normas constitucionais
(nas execuções de títulos judiciais fundados em norma declarada
inconstitucional pelo STF) e a justa indenização (nas
ações de desapropriação que estabelecem indenizações excessivas ou
incompatíveis com a realidade dos fatos). O que se percebe na teoria em
questão é a preocupação em
compatibilizar a segurança jurídica, princípio informador do instituto
processual da coisa julgada, com a justiça e a constitucionalidade das
decisões judiciais, valores maiores que informariam todo o ordenamento
jurídico. Assim, o mero argumento de que houve aplicação equivocada de
um dispositivo legal não enseja a aplicação da teoria da relativização
da coisa julgada. Afinal, magistrados não
são seres humanos infalíveis e estão, como todas as pessoas, sujeitos a
erros. Ocorre que, para a correção desses erros, o arcabouço
jurídico-processual confere às partes os meios cabíveis,
notadamente o vasto sistema recursal, bem como a via extrema da ação
rescisória. Ademais, é temerário afirmar genericamente que sentenças erradas ou injustas
não devem ser acobertadas
pelo manto de imutabilidade da coisa julgada material, permitindo-se
que, nesses casos, elas sejam revistas a qualquer tempo,
independentemente da propositura de ação rescisória. Nessa medida, o
grau de incerteza e
insegurança que se instauraria comprometeria o próprio exercício da
jurisdição, em afronta ao Estado de Direito e aos seus princípios
norteadores. Na hipótese em foco, o erro decorrente da
aplicação equivocada do § 3° do art. 20 do CPC, em vez do § 4° do
referido dispositivo, mesmo gerando um crédito excessivamente elevado,
não tem o condão de afastar a imutabilidade da coisa julgada,
ainda que o pagamento do referido valor possa prejudicar os demais
credores concursais. Caso contrário, abrir-se-ia a possibilidade de que
em todos os processos concursais (falência, recuperação judicial,
liquidação extrajudicial, concurso de credores, etc.) os créditos
representados por títulos judiciais transitados em julgado fossem
casuisticamente revistos, em prejuízo, frise-se mais uma vez, da
segurança
jurídica que a coisa julgada visa garantir e preservar. REsp
1.163.649-SP, Rel. Min. Marco Buzzi,
julgado em 16/9/2014, DJe 27/2/2015.
Quinta Turma
DIREITO PENAL. EFEITOS DA SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DE CRÉDITO TRIBUTÁRIO NA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA.
A
prescrição da pretensão punitiva do crime de apropriação indébita
previdenciária (art. 168-A do CP) permanece suspensa enquanto a
exigibilidade do crédito
tributário estiver suspensa em razão de decisão de antecipação dos
efeitos da tutela no juízo cível. Isso porque a decisão cível
acerca da exigibilidade do crédito
tributário repercute diretamente no reconhecimento da própria existência
do tipo penal, visto ser o crime de apropriação indébita previdenciária
um delito de natureza material, que pressupõe, para
sua consumação, a realização do lançamento tributário definitivo. RHC 51.596-SP,
Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 3/2/2015, DJe 24/2/2015.
DIREITO PROCESSUAL PENAL. VALIDADE DO DEPOIMENTO SEM DANO NOS CRIMES SEXUAIS CONTRA CRIANÇA E ADOLESCENTE.
Não
configura nulidade por cerceamento de defesa o fato de o defensor e o
acusado de crime sexual praticado contra criança ou adolescente não
estarem presentes na oitiva da vítima
devido à utilização do método de inquirição denominado “depoimento sem
dano”, precluindo eventual possibilidade de arguição de vício diante da
falta de alegação de
prejuízo em momento oportuno e diante da aquiescência da defesa à
realização do ato processual apenas com a presença do juiz, do
assistente social e da servidora do Juízo. Em se tratando de
crime
sexual contra criança e adolescente, justifica-se a inquirição da vítima
na modalidade do “depoimento sem dano”, em respeito à sua condição
especial de pessoa em desenvolvimento, procedimento
aceito no STJ, inclusive antes da deflagração da persecução penal,
mediante prova antecipada (HC 226.179-RS, Quinta Turma, DJe 16/10/2013).
Ademais, o STJ tem entendido que a inércia da defesa, em
situações semelhantes à presente, acarreta preclusão de eventual vício
processual, mormente quando não demonstrado o prejuízo concreto ao réu,
incidindo, na espécie, o art. 563 do CPP, que
acolheu o princípio pas de nullité sans grief (HC 251.735-RS, Sexta Turma, DJe 14/4/2014). RHC 45.589-MT, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 24/2/2015, DJe
3/3/2015.
Sexta Turma
DIREITO
PENAL. INOCORRÊNCIA DA EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE PELO PAGAMENTO DO
DÉBITO PREVIDENCIÁRIO APÓS O TRÂNSITO EM JULGADO DA CONDENAÇÃO.
Nos
crimes de apropriação indébita previdenciária (art. 168-A do CP), o
pagamento do débito previdenciário após o trânsito em julgado da
sentença
condenatória não acarreta a extinção da punibilidade. O art. 9º
da Lei 10.684/2003 dispõe que: “É suspensa a pretensão punitiva do
Estado, referente aos crimes previstos nos arts.
1º e 2º da Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e nos arts. 168A e
337A do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal,
durante o período em que a pessoa jurídica relacionada com o agente
dos aludidos crimes estiver incluída no regime de parcelamento. § 1º A
prescrição criminal não corre durante o período de suspensão da
pretensão punitiva. § 2º Extingue-se a
punibilidade dos crimes referidos neste artigo quando a pessoa jurídica
relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos
oriundos de tributos e contribuições sociais, inclusive acessórios”. O
referido dispositivo trata da extinção da punibilidade pelo pagamento da
dívida antes do trânsito em julgado da condenação, uma vez que faz
menção expressa à pretensão punitiva do
Estado. Dessa forma, não há que se falar em extinção da punibilidade
pelo pagamento quando se trata de pretensão executória, como na hipótese
em análise. Precedente do STJ: RHC 29.576-ES, Quinta
Turma, DJe 26/2/2014. Precedente do STF: QO na AP 613-TO, Plenário, DJe
4/6/2014. HC 302.059-SP, Rel. Min. Maria
Thereza de Assis Moura, julgado em 5/2/2015, DJe 11/2/2015.
DIREITO PENAL. HIPÓTESE DE CONFIGURAÇÃO DE CRIME ÚNICO DE ROUBO.
No
delito de roubo, se a intenção do agente é direcionada à subtração de
um único patrimônio, estará configurado apenas um crime, ainda que, no
modus operandi, seja utilizada violência ou grave ameaça contra mais de uma pessoa para a consecução do resultado pretendido. Realmente,
há precedente da Sexta Turma do STJ no sentido de que “Se
num único contexto duas pessoas têm seu patrimônio ameaçado, sendo que
uma delas foi efetivamente roubada, configura-se concurso formal de
crimes em sua forma homogênea” (HC 100.848-MS, DJe 12/5/2008).
Entretanto,
trata-se de situação distinta do caso aqui analisado, visto que, da
simples leitura de trecho da ementa do acórdão mencionado, observa-se
que a configuração do concurso de crimes decorreu não da
existência de ameaça a mais de uma vítima, mas sim da intenção do agente
direcionada à subtração de mais de um patrimônio. Em suma, como o roubo
é um crime contra o patrimônio,
deve-se concluir que, se a intenção do agente é direcionada à subtração
de um único patrimônio, estará configurado apenas um crime, ainda que,
no modus operandi, seja utilizada
violência ou grave ameaça contra mais de uma pessoa. AgRg no REsp 1.490.894-DF, Rel. Min.
Sebastião Reis Júnior, julgado em 10/2/2015, DJe 23/2/2015.
DIREITO PENAL. REMIÇÃO DA PENA PELO ESTUDO EM DIAS NÃO ÚTEIS.
A remição da pena pelo estudo deve ocorrer independentemente de a atividade estudantil ser desenvolvida em dia não útil.
O art. 126 da Lei 7.210/1984 dispõe que a
contagem de tempo para remição da pena pelo estudo deve ocorrer à razão
de 1 dia de pena para cada 12 horas de frequência escolar, não havendo
qualquer ressalva sobre a consideração apenas dos dias
úteis para realização da referida contagem, sendo, inclusive,
expressamente mencionada a possibilidade de ensino a distância. AgRg no REsp 1.487.218-DF, Rel. Min. Ericson Maranho (Desembargador convocado do TJ/SP), julgado em 5/2/2015, DJe
24/2/2015.
DIREITO PROCESSUAL PENAL. NECESSIDADE DE APRECIAÇÃO DAS TESES SUSCITADAS NA DEFESA PRELIMINAR.
Após
a fase de apresentação de resposta à acusação, o magistrado, ao
proferir decisão que determina o prosseguimento do processo, deverá ao
menos aludir
àquilo que fora trazido na defesa preliminar, não se eximindo também da
incumbência de enfrentar questões processuais relevantes e urgentes.
De fato, na fase do art. 397 do CPP, nada impede que o juiz
faça consignar fundamentação de forma não exauriente, sob pena de
decidir o mérito da causa. Contudo, o julgador deve ao menos aludir
àquilo que fora trazido na defesa preliminar. Incumbe-lhe, ainda,
enfrentar
questões processuais relevantes e urgentes ao confirmar o aceite da
exordial acusatória. Com efeito, a inauguração do processo penal, por
representar significativo gravame ao status dignitatis, deve,
sim, ser
motivada. Dessa maneira, suprimida tão importante fase procedimental,
preciosa conquista democrática do Processo Penal pátrio, de rigor é o
reconhecimento da nulidade. RHC 46.127-MG, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 12/2/2015, DJe
25/2/2015.
DIREITO PROCESSUAL PENAL. VALIDADE DE ATOS PROCESSUAIS PRATICADOS ANTES DE CAUSA SUPERVENIENTE DE MODIFICAÇÃO DA COMPETÊNCIA.
No
caso em que, após iniciada a ação penal perante determinado juízo,
ocorra modificação da competência em razão da investidura do réu em
cargo que
atraia foro por prerrogativa de função, serão válidos os atos
processuais – inclusive o recebimento da denúncia – realizados antes da
causa superveniente de modificação da competência,
sendo desnecessária, no âmbito do novo juízo, qualquer ratificação
desses atos, que, caso ocorra, não precisará seguir as regras que
deveriam ser observadas para a prática, em ação
originária, de atos equivalentes aos atos ratificados. Realmente, reconhecida a incompetência, a posteriori,
de determinado juízo, deve o processo ser encaminhado ao juízo
competente, que pode aproveitar os
atos já praticados. Nesse sentido, a jurisprudência do STF afirma que,
nos casos de incompetência absoluta, é possível a ratificação tanto dos
atos sem caráter decisório quanto dos atos
decisórios (AgR no RE 464.894-PI, Segunda Turma, DJe 15/8/2008). Nesse
contexto, verifica-se que a ratificação de atos processuais é
procedimento intrinsecamente ligado à ideia de nulidade por
incompetência
relativa ou absoluta superveniente. Não se trata, contudo, do caso aqui
analisado, em que, após iniciada a ação penal, ocorre modificação da
competência em razão da investidura, pelo réu, no
curso do processo, em cargo que atraia foro por prerrogativa de função.
De fato, a competência, quando fixada a partir de regras do sistema, a priori,
não se modifica, em obediência ao princípio do juiz
natural. No entanto, uma das hipóteses em que se dá a modificação da
competência, sem ofensa ao referido princípio, ocorre quando há
alteração ratione personae, fruto do cargo ou da
função que alguém venha a ocupar no curso do processo. Assim, iniciada a
ação penal perante determinado juízo, com a superveniência de condição
que atraia o foro especial por prerrogativa de
função, deve o processo ser remetido, no estado em que se encontra, ao
novo juízo competente. Nesse caso, devem ser mantidos íntegros todos os
atos processuais até então praticados, sob pena de
violação ao princípio tempus regit actum, uma vez que o juiz
era competente antes da modificação. Desnecessária, portanto, qualquer
ratificação, visto que os atos até então
praticados são válidos. Ademais, ainda que, por mero preciosismo, ocorra
a ratificação, ela não precisará seguir as regras que deveriam ser
observadas para a prática, em ação
originária, de atos equivalentes aos atos ratificados. Isso significa
dizer que a ratificação do recebimento de denúncia ofertada em primeiro
grau não precisaria ser apreciada pelo colegiado do Tribunal competente
para
o julgamento da ação originária, sendo possível ao relator realizar
monocraticamente essa ratificação, conforme, aliás, já se manifestou o
STF (RHC 120.356-DF, Primeira Turma, DJe de 30/10/2014).
HC 238.129-TO, Rel. originária Min. Maria Thereza de Assis Moura, Rel. para acórdão Min. Rogerio
Schietti Cruz, julgado em 16/9/2014, DJe 25/2/2015.
DIREITO
PROCESSUAL PENAL. REQUERIMENTO DE SUSTENTAÇÃO ORAL REALIZADO APÓS O
HORÁRIO LIMITE DETERMINADO PELA PRESIDÊNCIA DO ÓRGÃO JULGADOR.
O
advogado que teve deferido pedido de sustentação oral previamente
formulado ao relator por meio de petição e que compareceu à sessão de
julgamento antes de apreciada a
apelação pelo colegiado não pode ser impedido de exercer o seu direito
sob a justificativa de que, no dia da sessão de julgamento, não se
inscreveu, antes do término do horário fixado pela
Presidência do órgão julgador, para sustentação. A CF assegura,
como alguns de seus princípios fundamentais, a observância do devido
processo legal, da ampla defesa e do contraditório.
Vistos, portanto, como um direito da parte, o contraditório e o respeito
a todas as regras que subjazem ao devido processo legal se concretizam
no exercício dos poderes processuais necessários para agir ou
defender-se em
juízo e para poder influir de modo positivo no convencimento judicial.
São, desse modo, entendidos como o direito à observância das normas que
evitam a lesão ao próprio direito da parte, tornando-se, portanto,
uma garantia para o correto desenvolvimento do processo. Ademais, o art.
133 da CF também dispõe que o advogado é indispensável à administração
da justiça, o que demonstra a importância da
sua atuação no processo judicial. Sob essa perspectiva, a Lei 8.906/1994
estabelece, em seu art. 2º, § 2º, que “No processo judicial, o advogado
contribui, na postulação de decisão favorável
ao seu constituinte, ao convencimento do julgador, e seus atos
constituem múnus público”. Por ser o advogado um partícipe no processo
de administração da justiça, é assegurado a esse profissional,
dentre outras prerrogativas, a possibilidade de realizar sustentação
oral. Cabe ressaltar que a sustentação oral permite ao advogado
apresentar pessoalmente ao colegiado os argumentos indicados, por
escrito, nas peças
processuais e, ainda, buscar, com o poder da fala, melhor explicitar
dados fáticos e jurídicos inerentes à causa sob julgamento. É importante
ferramenta para chamar a atenção, durante a realização
do próprio julgamento, de pontos relevantes a serem analisados pelo
órgão julgador, oportunizando aos magistrados que não tiveram a
possibilidade de manusear o processo, de terem conhecimento dos
principais pontos a serem
discutidos. A realização da sustentação oral proporciona, portanto,
maior lisura ao julgamento, condizente com a finalidade precípua de todo
e qualquer processo, qual seja, a busca da justiça. Considerando o
viés do respeito ao devido processo legal, o CPP ainda estabelece, no
parágrafo único do art. 610, que, “Anunciado o julgamento pelo
presidente, e apregoadas as partes, com a presença destas ou à sua
revelia, o
relator fará a exposição do feito e, em seguida, o presidente concederá,
pelo prazo de 10 (dez) minutos, a palavra aos advogados ou às partes
que a solicitarem e ao procurador-geral, quando o requerer, por igual
prazo”. Dessa forma, não é possível cercear o direito do advogado de
realizar a sustentação oral em um processo que ainda não tenha sido
apreciado, apesar de ele estar presente no momento do julgamento,
tão somente porque não se inscreveu, antes do horário fixado pela
Presidência do órgão julgador, para a realização de pedido de
sustentação oral. Ressalte-se, por fim, que não
há ilegalidade alguma no fato de se estabelecerem regramentos para, em
reforço às normas regimentais de cada tribunal, conferir maior
racionalidade e eficiência no desenvolvimento das sessões; mas, havendo
conflito
entre direito da parte (e do advogado) de realizar sustentação oral já
deferida e eventual restrição regulamentar, há de prevalecer aquele
direito. REsp 1.388.442-DF, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 18/12/2014, DJe 25/2/2015.
DIREITO PROCESSUAL PENAL. UTILIZAÇÃO POR ÓRGÃO PÚBLICO DE BEM APREENDIDO.
É
possível a aplicação analógica dos arts. 61 e 62 da Lei 11.343/2006
para admitir a utilização pelos órgãos públicos de aeronave apreendida
no
curso da persecução penal de crime não previsto na Lei de Drogas,
sobretudo se presente o interesse público de evitar a deterioração do
bem. Isso porque, em primeiro lugar, de acordo com o art. 3º
do CPP, a lei processual penal admitirá interpretação extensiva e
aplicação analógica, bem como o suplemento dos princípios gerais de
direito. Assim, é possível, sobretudo porque permitido
pelo próprio CPP, o uso da analogia, que consiste em processo de
integração por meio do qual se aplica a uma determinada situação para a
qual inexiste hipótese normativa própria um preceito que regula
hipótese semelhante. Ressalte-se, ainda, que, para o uso da analogia,
não importam a natureza da situação concreta e a natureza do diploma de
onde se deve extrair a norma reguladora. Em segundo lugar, porque a
exigência
contida no art. 61 da Lei 11.343/2006, referente à existência de
interesse público ou social, encontra-se cumprida no presente caso, qual
seja, evitar a deterioração do bem apreendido. Por fim, em terceiro
lugar, porque
a preocupação em se prevenir que a demora nos processos judiciais venha a
propiciar a degeneração do bem apreendido é atual, existindo,
inclusive, no projeto do novo Código de Processo Penal (PL 8.045/2010),
seção específica a tratar do tema, sob o título “Da utilização dos bens
por órgãos públicos”, o que demonstra a efetiva ocorrência de lacuna no
Código atualmente em
vigor, bem como a clara intenção de supri-la. Decisão monocrática
citada: Inq 603, Min. Paulo Gallotti, DJ 14/11/2008. REsp 1.420.960-MG, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 24/2/2015, DJe 2/3/2015.
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