Recursos Repetitivos
DIREITO
ADMINISTRATIVO. COMPETÊNCIA PARA FISCALIZAR PRESENÇA DE FARMACÊUTICO EM
DROGARIAS E FARMÁCIAS. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES.
8/2008-STJ).
Os
Conselhos Regionais de Farmácia possuem competência para fiscalização e
autuação das farmácias e drogarias, quanto ao cumprimento da exigência
de manterem
profissional legalmente habilitado (farmacêutico) durante todo o período
de funcionamento dos respectivos estabelecimentos, sob pena de esses
incorrerem em infração passível de multa, nos termos do art. 24 da Lei
3.820/1960, c/c o art. 15 da Lei 5.991/1973. A interpretação
dos dispositivos legais atinentes à matéria em apreço (arts. 10, “c”, e
24 da Lei 3.820/1960 e art. 15 da Lei 5.991/1973) conduz ao
entendimento de que os Conselhos Regionais de Farmácia são competentes
para promover a fiscalização das farmácias e drogarias em relação à
permanência de profissionais legalmente habilitados
durante o período integral de funcionamento das empresas farmacêuticas.
Já a atuação da Vigilância Sanitária está circunscrita ao licenciamento
do estabelecimento e à sua
fiscalização no que tange ao cumprimento de padrões sanitários relativos
ao comércio exercido, convivendo, portanto, com as atribuições a cargo
dos Conselhos. É o que se depreende, claramente, do
disposto no art. 21 da Lei 5.991/1973. Precedentes citados: EREsp
380.254-PR, Primeira Seção, DJ 8/8/2005; REsp 1.085.436-SP, Segunda
Turma, DJe 3/2/2011; AgRg no REsp 975.172-SP, Primeira Turma, DJe
17/12/2008. REsp 1.382.751-MG, Rel. Min. Og Fernandes, Primeira Seção, julgado em 12/11/2014, DJe 2/2/2015.
DIREITO
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. UTILIZAÇÃO DA TABELA PRICE NOS CONTRATOS DO
SFH. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ).
A
análise acerca da legalidade da utilização da Tabela Price – mesmo que
em abstrato – passa, necessariamente, pela constatação da eventual
capitalização de juros (ou incidência de juros compostos, juros sobre
juros ou anatocismo), que é questão de fato e não de direito, motivo
pelo qual não cabe ao STJ tal apreciação, em
razão dos óbices contidos nas Súmulas 5 e 7 do STJ; é exatamente por
isso que, em contratos cuja capitalização de juros seja vedada, é
necessária a interpretação de cláusulas
contratuais e a produção de prova técnica para aferir a existência da
cobrança de juros não lineares, incompatíveis, portanto, com
financiamentos celebrados no âmbito do Sistema Financeiro de
Habitação (SFH) antes da vigência da Lei 11.977/2009, que acrescentou o
art. 15-A à Lei 4.380/1964; em se verificando que matérias de fato ou
eminentemente técnicas foram tratadas como exclusivamente de direito,
reconhece-se o cerceamento, para que seja realizada a prova pericial. No
âmbito do SFH, a Lei 4.380/1964, em sua redação original, não previa a
possibilidade de cobrança de juros capitalizados, vindo à
luz essa permissão apenas com a edição da Lei 11.977/2009, que
acrescentou ao diploma de 1964 o art. 15-A. Daí o porquê de a
jurisprudência do STJ ser tranquila em afirmar que, antes da vigência da
Lei
11.977/2009, era vedada a cobrança de juros capitalizados em qualquer
periodicidade nos contratos de mútuo celebrados no âmbito do SFH. Esse
entendimento foi, inclusive, sufragado em sede de julgamento de recurso
especial repetitivo,
submetido ao rito do art. 543-C do CPC, nos seguintes termos: “Nos
contratos celebrados no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação, é
vedada a capitalização de juros em qualquer periodicidade. Não
cabe ao STJ, todavia, aferir se há capitalização de juros com a
utilização da Tabela Price, por força das Súmulas 5 e 7” (REsp
1.070.297-PR, Segunda Seção, DJe 18/9/2009). No referido
precedente, a Segunda Seção decidiu ser matéria de fato e não de direito
a possível capitalização de juros na utilização da Tabela Price, sendo
exatamente por isso que as insurgências
relativas a essa temática dirigidas ao STJ esbarram nos óbices das
Súmulas 5 e 7 do STJ. A despeito disso, nota-se, ainda, a existência de
divergência sobre a capitalização de juros na Tabela Price nas
instâncias ordinárias, uma vez que os diversos tribunais de justiça das
unidades federativas, somados aos regionais federais, manifestam, cada
qual, entendimentos diversos sobre a utilização do Sistema Francês de
amortização de financiamentos. Nessa linha intelectiva, não é possível
que uma mesma tese jurídica – saber se a Tabela Price, por si só,
representa capitalização de juros – possa
receber tratamento absolutamente distinto, a depender da unidade da
Federação ou se a jurisdição é federal ou estadual. A par disso, para
solucionar a controvérsia, as “regras de experiência
comum” e as “as regras da experiência técnica” devem ceder à necessidade
de “exame pericial” (art. 335 do CPC), cabível sempre que a prova do
fato “depender do conhecimento especial de
técnico” (art. 420, I, do CPC). Realmente, há diversos trabalhos
publicados no sentido de não haver anatocismo na utilização da Tabela
Price, porém há diversos outros em direção
exatamente oposta. As contradições, os estudos técnicos dissonantes e as
diversas teorizações demonstram o que já se afirmou no REsp
1.070.297-PR, Segunda Seção, DJe 18/9/2009: em matéria de
Tabela Price, nem “sequer os matemáticos chegam a um consenso”. Nessa
seara de incertezas, cabe ao Judiciário conferir a solução ao caso
concreto, mas não lhe cabe imiscuir-se em terreno movediço nos
quais os próprios experts tropeçam. Isso porque os juízes não
têm conhecimentos técnicos para escolher entre uma teoria matemática e
outra, mormente porque não há perfeito consenso
neste campo. Dessa maneira, o dissídio jurisprudencial quanto à
utilização ou à vedação da Tabela Price decorre, por vezes, dessa
invasão do magistrado ou do tribunal em questões
técnicas, estabelecendo, a seu arbítrio, que o chamado Sistema Francês
de Amortização é legal ou ilegal. Por esses motivos não pode o STJ –
sobretudo, e com maior razão, porque não tem
contato com as provas dos autos – cometer o mesmo equívoco por vezes
praticado pelas instâncias ordinárias, permitindo ou vedando, em
abstrato, o uso da Tabela Price. É que, se a análise acerca da
legalidade da
utilização do Sistema Francês de Amortização passa, necessariamente,
pela averiguação da forma pela qual incidiram os juros, a legalidade ou a
ilegalidade do uso da Tabela Price não pode ser
reconhecida em abstrato, sem apreciação dos contornos do caso concreto.
Desse modo, em atenção à segurança jurídica, o procedimento adotado nas
instâncias ordinárias deve ser ajustado, a fim
de corrigir as hipóteses de deliberações arbitrárias ou divorciadas do
exame probatório do caso concreto. Isto é, quando o juiz ou o tribunal, ad nutum,
afirmar a legalidade ou ilegalidade da Tabela
Price, sem antes verificar, no caso concreto, a ocorrência ou não de
juros capitalizados (compostos ou anatocismo), haverá ofensa aos arts.
131, 333, 335, 420, 458 ou 535 do CPC, ensejando, assim, novo julgamento
com base nas provas
ou nas consequências de sua não produção, levando-se em conta, ainda, o
ônus probatório de cada litigante. Assim, por ser a capitalização de
juros na Tabela Price questão de fato, deve-se
franquear às partes a produção da prova necessária à demonstração dos
fatos constitutivos do direito alegado, sob pena de cerceamento de
defesa e invasão do magistrado em seara técnica com a
qual não é afeito. Ressalte-se que a afirmação em abstrato acerca da
ocorrência de capitalização de juros quando da utilização da Tabela
Price, como reiteradamente se constata, tem dado azo a
insurgências tanto dos consumidores quanto das instituições financeiras,
haja vista que uma ou outra conclusão dependerá unicamente do ponto de
vista do julgador, manifestado quase que de forma ideológica, por
vez às cegas e desprendida da prova dos autos, a qual, em não raros
casos, simplesmente inexiste. Por isso, reservar à prova pericial essa
análise, de acordo com as particularidades do caso concreto, beneficiará
tanto
os mutuários como as instituições financeiras, porquanto nenhuma das
partes ficará ao alvedrio de valorações superficiais do julgador acerca
de questão técnica. Precedentes citados: AgRg no AREsp
219.959-SP, Terceira Turma, DJe 28/2/2014; AgRg no AREsp 420.450-DF,
Quarta Turma, DJe 7/4/2014; AgRg no REsp 952.569-SC, Quarta Turma, DJe
19/8/2010; e REsp 894.682-RS, DJe 29/10/2009. REsp 1.124.552-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Corte Especial, julgado em 3/12/2014, DJe 2/2/2015.
DIREITO
DO CONSUMIDOR. REPRODUÇÃO DE REGISTRO ORIUNDO DE CARTÓRIO DE PROSTETO
EM BANCO DE DADOS DE ÓRGÃO DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. RECURSO REPETITIVO
(ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ).
Diante
da presunção legal de veracidade e publicidade inerente aos registros
de cartório de protesto, a reprodução objetiva, fiel, atualizada e clara
desses dados na base de
órgão de proteção ao crédito – ainda que sem a ciência do consumidor –
não tem o condão de ensejar obrigação de reparação de danos. Nos
termos da CF,
o direito de acesso à informação encontra-se consagrado no art. 5º,
XXXIII, que preceitua que todos têm direito a receber dos órgãos
públicos informações de seu interesse particular, ou
de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob
pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja
imprescindível à segurança da sociedade e do Estado. Além disso, o art.
37,
caput, da CF estabelece ser a publicidade princípio que informa
a administração pública, e o cartório de protesto exerce serviço
público. Nesse passo, observa-se que o art. 43, § 4°, do
CDC disciplina as atividades dos cadastros de inadimplentes,
estabelecendo que os bancos de dados e cadastros relativos a
consumidores, os serviços de proteção ao crédito e congêneres são
considerados entidades
de caráter público. Nessa linha de intelecção, consagrando o princípio
da publicidade imanente, o art. 1º, c/c art. 5º, III, ambos da Lei
8.935/1994 (Lei dos Cartórios), estabelecem que os
serviços de protesto são destinados a assegurar a publicidade,
autenticidade e eficácia dos atos jurídicos. Ademais, por um lado, a
teor do art. 1º, caput, da Lei 9.492/1997 (Lei do Protesto) e
das demais
disposições legais, o protesto é o ato formal e solene pelo qual se
prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação (ou a recusa do
aceite) originada em títulos e outros documentos de dívida.
Por outro lado, o art. 2º do mesmo diploma esclarece que os serviços
concernentes ao protesto são garantidores da autenticidade, publicidade,
segurança e eficácia dos atos jurídicos. Com efeito, o registro do
protesto de título de crédito ou outro documento de dívida é de domínio
público, gerando presunção de veracidade do ato jurídico, dado que
deriva do poder certificante que é conferido
ao oficial registrador e ao tabelião. A par disso, registre-se que não
constitui ato ilícito o praticado no exercício regular de um direito
reconhecido, nos termos do art. 188, I, do CC. Dessa forma, como os
órgãos de sistema de proteção ao crédito exercem atividade lícita e
relevante ao divulgar informação que goza de fé pública e domínio
público, não há falar
em dever de reparar danos, tampouco em obrigatoriedade de prévia
notificação ao consumidor (art. 43, § 2º, do CDC), sob pena de violação
ao princípio da publicidade e mitigação da
eficácia do art. 1º da Lei 8.935/1994, que estabelece que os cartórios
extrajudiciais se destinam a conferir publicidade aos atos jurídicos
praticados por seus serviços. Ademais, é bem de ver que as
informações prestadas pelo cartório de protesto não incluem o endereço
do devedor, de modo que a exigência de notificação resultaria em
inviabilização da divulgação
dessas anotações. Igualmente, significaria negar vigência ou, no mínimo,
esvair a eficácia do disposto no art. 29, caput, da Lei
9.492/1997 que, a toda evidência, deixa nítida a vontade do
legislador de que os órgãos de sistema de proteção ao crédito tenham
acesso aos registros atualizados dos protestos tirados e cancelados.
Outrossim, é bem de ver que os cadastros e dados de consumidores devem
ser objetivos, claros e verdadeiros (art. 43, § 1º, do CDC). Assim, caso
fosse suprimida a informação sobre a existência do protesto – ainda que
com posterior pagamento ou cancelamento –, os bancos de dados
deixariam de ser objetivos e verdadeiros. Precedentes citados: AgRg no
AgRg no AREsp 56.336-SP, Quarta Turma, DJe 1/9/2014; AgRg no AREsp
305.765-RJ, Terceira Turma, DJe 12/6/2013. REsp 1.444.469-DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, julgado em 12/11/2014, DJe 16/12/2014.
DIREITO
DO CONSUMIDOR. REPRODUÇÃO DE REGISTRO ORIUNDO DE CARTÓRIO DE
DISTRIBUIÇÃO EM BANCO DE DADOS DE ÓRGÃO DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. RECURSO
REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ).
Diante
da presunção legal de veracidade e publicidade inerente aos registros
do cartório de distribuição judicial, a reprodução objetiva, fiel,
atualizada e clara
desses dados na base de órgão de proteção ao crédito – ainda que sem a
ciência do consumidor – não tem o condão de ensejar obrigação de
reparação de danos.
Nos termos da CF, o direito de acesso à informação encontra-se
consagrado no art. 5º, XXXIII, que preceitua que todos têm direito a
receber dos órgãos públicos informações de
seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão
prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas
aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do
Estado.
Além disso, o art. 37, caput, da Carta Magna estabelece ser a
publicidade princípio que informa a administração pública. Nesse passo,
observa-se que o art. 43, § 4°, do CDC disciplina as atividades
dos cadastros de inadimplentes, estabelecendo que os bancos de dados e
cadastros relativos a consumidores, os serviços de proteção ao crédito e
congêneres são considerados entidades de caráter
público. De modo semelhante, o cartório de distribuição judicial exerce
serviço público. Nessa linha de intelecção, consagrando o princípio da
publicidade imanente, o art. 1º, c/c o
art. 5º, VII, ambos da Lei 8.935/1994 (Lei dos Cartórios), estabelecem
que os serviços de registros de distribuição são destinados a assegurar a
publicidade, autenticidade e eficácia dos atos
jurídicos. Nesse sentido, “uma das formas pelas quais os órgãos de
proteção ao crédito (SPC/Serasa) obtêm dados para alimentar os seus
cadastros é mediante informações constantes
nos cartórios de distribuição de processos judiciais, o que conseguem
por meio de convênios firmados com o Poder Judiciário de cada Estado da
Federação. Nos termos do art. 5º, incs. XXXIII e LX, da
CF, e do art. 155 do CPC, os dados sobre processos, existentes nos
cartórios distribuidores forenses, são informações públicas (salvo, é
claro, os dados dos processos que correm sob segredo de justiça),
eis que publicadas na Imprensa Oficial, e, portanto, de acesso a
qualquer interessado, mediante pedido de certidão, conforme autoriza o
parágrafo único do art. 155, do CPC. Portanto, se os órgãos de
proteção ao crédito reproduzem fielmente o que consta no cartório de
distribuição a respeito de determinado processo de execução, não se lhes
pode tolher que forneçam tais dados
públicos aos seus associados, sob pena de grave afronta ao Estado
Democrático de Direito, que prima, como regra, pela publicidade dos atos
processuais [...] Com efeito, a existência de processo de execução
constitui,
além de dado público, fato verdadeiro, que não pode ser omitido dos
cadastros mantidos pelos órgãos de proteção ao crédito; porquanto tal
supressão equivaleria à
eliminação da notícia da distribuição da execução, no distribuidor
forense, algo que não pode ser admitido. Aliás, o próprio CDC prevê
expressamente que os cadastros e dados de
consumidores devem ser objetivos, claros e verdadeiros (art. 43, § 1º).
Assim, se se suprimisse a informação sobre a existência do processo de
execução, os bancos de dados deixariam de ser objetivos e
verdadeiros.” (REsp 866.198-SP, Terceira Turma, DJ 5/2/2007). A par
disso, registre-se que não constitui ato ilícito aquele praticado no
exercício regular de um direito reconhecido, nos termos do art. 188, I,
do CC.
Dessa forma, como os órgãos de sistema de proteção ao crédito exercem
atividade lícita e relevante ao divulgar informação que goza de fé
pública e domínio público (como
as constantes de cartórios de distribuição judicial), não há falar em
dever de reparar danos, tampouco em obrigatoriedade de prévia
notificação ao consumidor (art. 43, § 2º, do CDC), sob
pena de violação ao princípio da publicidade e mitigação da eficácia do
art. 1º da Lei 8.935/1994, que estabelece que os cartórios
extrajudiciais se destinam a conferir publicidade aos atos
jurídicos praticados por seus serviços. Ademais, é bem de ver que as
informações prestadas pelo cartório de distribuição não incluem o
endereço do devedor, de modo que a
exigência de notificação resultaria em inviabilização da divulgação
dessas anotações. Portanto, diante da presunção legal de veracidade e
publicidade inerente aos registros dos
cartórios de distribuição judicial, não há cogitar em ilicitude ou
eventual abuso de direito por parte do órgão do sistema de proteção ao
crédito que se limitou a reproduzir
informações fidedignas constantes dos registros dos cartórios de
distribuição. Precedentes citados: REsp 1.148.179-MG, Terceira Turma,
DJe 5/3/2013; AgRg no AgRg no AREsp 56.336-SP, Quarta Turma, DJe
1º/9/2014;
AgRg no AREsp 305.765-RJ, Terceira Turma, DJe 12/6/2013; HC 149.812-SP,
Quinta Turma, DJe 21/11/2011; e Rcl 6.173-SP, Segunda Seção, DJe
15/3/2012. REsp 1.344.352-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, julgado em 12/11/2014, DJe 16/12/2014.
DIREITO
EMPRESARIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL DE DEVEDOR PRINCIPAL E TERCEIROS
DEVEDORES SOLIDÁRIOS OU COOBRIGADOS EM GERAL. RECURSO REPETITIVO (ART.
543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ).
A
recuperação judicial do devedor principal não impede o prosseguimento
das execuções nem induz suspensão ou extinção de ações ajuizadas contra
terceiros devedores solidários ou coobrigados em geral, por garantia
cambial, real ou fidejussória, pois não se lhes aplicam a suspensão
prevista nos arts. 6º, caput, e 52, III, ou a novação a que se refere
o art. 59, caput, por força do que dispõe o art. 49, § 1º, todos da Lei
11.101/2005. De fato, a recuperação judicial divide-se, essencialmente, em duas fases: (a) a primeira inicia-se com o
deferimento de seu processamento (arts. 6º, caput, e 52, III, da Lei 11.101/2005); e (b) a segunda, com a aprovação do plano pelos credores reunidos em assembleia, seguida da concessão da
recuperação por sentença (arts. 57 e 58, caput) ou, excepcionalmente, pela concessão forçada da recuperação pelo juiz, nas hipóteses previstas nos incisos do § 1º do art. 58
(Cram Down). No que diz respeito à primeira fase (a),
uma vez deferido o processamento da recuperação, entre outras
providências a serem adotadas pelo magistrado, determina-se a suspensão
de todas as
ações e execuções. É o que prescreve o art. 6º, caput, da Lei
11.101/2005: “A decretação da falência ou o deferimento do processamento
da recuperação judicial
suspende o curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face
do devedor, inclusive aquelas dos credores particulares do sócio
solidário”. No mesmo sentido, o art. 52, III, do mesmo
diploma legal: “Estando em termos a documentação exigida no art. 51
desta Lei, o juiz deferirá o processamento da recuperação judicial e, no
mesmo ato: [...] III – ordenará a suspensão de
todas as ações ou execuções contra o devedor, na forma do art. 6º desta
Lei, permanecendo os respectivos autos no juízo onde se processam,
ressalvadas as ações previstas nos §§ 1º,
2º e 7º do art. 6º desta Lei e as relativas a créditos excetuados na
forma dos §§ 3º e 4º do art. 49 desta Lei [...]”. A par disso,
ressalte-se ainda que, em não raras vezes, o devedor
solidário é, também, sócio da pessoa jurídica em recuperação. Contudo,
os devedores solidários da obrigação – que tem como devedor principal a
empresa recuperanda –
não podem alegar em seu favor a parte final do caput do
referido art. 6º como fundamento do pedido de suspensão das ações
individuais ajuizadas contra eles, invocando, assim, a redação que
determina a suspensão das ações não apenas contra o devedor principal,
mas também “aquelas dos credores particulares do sócio solidário”. Isso
porque o caput do art. 6º da Lei
11.101/2005, no que concerne à suspensão das ações por ocasião do
deferimento da recuperação, alcança os sócios solidários, figuras
presentes naqueles tipos societários em que
a responsabilidade pessoal dos consorciados não é subsidiária ou
limitada às suas respectivas quotas/ações, como é o caso, por exemplo,
da sociedade em nome coletivo (art. 1.039 do CC/2002) e da sociedade
em comandita simples, no que concerne aos sócios comanditados (art.
1.045 do CC/2002). Diferentemente, é a situação dos devedores solidários
ou coobrigados, haja vista que para eles a disciplina é exatamente
inversa, prevendo o § 1º do art. 49, expressamente, a preservação de
suas obrigações na eventualidade de ser deferida a recuperação judicial
do devedor principal: “Os credores do devedor em
recuperação judicial conservam seus direitos e privilégios contra os
coobrigados, fiadores e obrigados de regresso”. Portanto, não há falar
em suspensão da execução direcionada a codevedores
ou a devedores solidários pelo só fato de o devedor principal ser
sociedade cuja recuperação foi deferida, pouco importando se o executado
é também sócio da recuperanda ou não, uma vez não
se tratar de sócio solidário. Nesse sentido, aliás, o Enunciado 43 da I
Jornada de Direito Comercial realizada pelo CJF/STJ determina que a
“suspensão das ações e execuções previstas no art.
6º da Lei n. 11.101/2005 não se estende aos coobrigados do devedor”. Sob
outro enfoque, no tocante à segunda fase (b), a aprovação do
plano opera – diferentemente da primeira fase –
novação dos créditos, e a decisão homologatória constitui, ela própria,
novo título executivo judicial. É o que dispõe o art. 59, caput
e § 1º, da Lei 11.101/2005:
“O plano de recuperação judicial implica novação dos créditos anteriores
ao pedido, e obriga o devedor e todos os credores a ele sujeitos, sem
prejuízo das garantias, observado o disposto no § 1º
do art. 50 desta Lei [...] § 1º A decisão judicial que conceder a
recuperação judicial constituirá título executivo judicial, nos termos
do art. 584, inciso III, do caput da Lei nº 5.869, de 11
de janeiro de 1973 - Código de Processo Civil”. Antes de prosseguir, a
respeito da novação comum, destaque-se que os arts. 364 e 365 do CC
prescrevem, respectivamente, que “A novação extingue os
acessórios e garantias da dívida, sempre que não houver estipulação em
contrário. Não aproveitará, contudo, ao credor ressalvar o penhor, a
hipoteca ou a anticrese, se os bens dados em garantia
pertencerem a terceiro que não foi parte na novação” e que “Operada a
novação entre o credor e um dos devedores solidários, somente sobre os
bens do que contrair a nova obrigação
subsistem as preferências e garantias do crédito novado. Os outros
devedores solidários ficam por esse fato exonerados”. A despeito disso,
as execuções intentadas contra a empresa recuperanda e seus garantes
não podem ser extintas nos termos dos referidos arts. 364 e 365 do CC.
De igual sorte, as garantias concedidas não podem ser restabelecidas em
caso de futura decretação de falência, apesar do disposto no art. 61, §
2º, da Lei 11.101/2005, segundo o qual “Decretada a falência, os
credores terão reconstituídos seus direitos e garantias nas condições
originalmente contratadas, deduzidos os valores eventualmente pagos e
ressalvados os atos validamente praticados no âmbito da recuperação
judicial”. Tudo isso porque a novação prevista na lei civil é bem
diversa daquela disciplinada na Lei 11.101/2005. Se a
novação civil faz, como regra, extinguir as garantias da dívida,
inclusive as reais prestadas por terceiros estranhos ao pacto (art. 364
do CC), a novação decorrente do plano de recuperação traz, como
regra, ao reverso, a manutenção das garantias (art. 59, caput,
da Lei 11.101/2005), as quais só serão suprimidas ou substituídas
“mediante aprovação expressa do credor titular da respectiva
garantia”, por ocasião da alienação do bem gravado (art. 50, § 1º). Além
disso, a novação específica da recuperação desfaz-se na hipótese de
falência, quando
então os “credores terão reconstituídos seus direitos e garantias nas
condições originalmente contratadas” (art. 61, § 2º). Daí se conclui que
o plano de recuperação judicial
opera uma novação sui generis e sempre sujeita a condição
resolutiva – que é o eventual descumprimento do que ficou acertado no
plano –, circunstância que a diferencia, sobremaneira, daquela
outra, comum, prevista na lei civil. Dessa forma, muito embora o plano
de recuperação judicial opere novação das dívidas a ele submetidas, as
garantias reais ou fidejussórias são preservadas,
circunstância que possibilita ao credor exercer seus direitos contra
terceiros garantidores e impõe a manutenção das ações e execuções
aforadas em face de fiadores, avalistas ou coobrigados em
geral. Importa ressaltar que não haveria lógica no sistema se a
conservação dos direitos e privilégios dos credores contra coobrigados,
fiadores e obrigados de regresso (art. 49, § 1º, da Lei 11.101/2005)
dissesse respeito apenas ao interregno temporal que medeia o deferimento
da recuperação e a aprovação do plano, cessando tais direitos após a
concessão definitiva com a decisão judicial. Precedentes
citados: REsp 1.326.888-RS, Quarta Turma, DJe 5/5/2014; REsp
1.269.703-MG, Quarta Turma, DJe 30/11/2012; AgRg no REsp 1.334.284-MT,
Terceira Turma, DJe 15/9/2014; AgRg nos EDcl no REsp 1.280.036-SP,
Terceira Turma, DJe 5/9/2013; e EAg 1.179.654-SP,
Segunda Seção, DJe 13/4/2012. REsp 1.333.349-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda
Seção, julgado em 26/11/2014, DJe 2/2/2015.
Corte Especial
DIREITO
PROCESSUAL CIVIL. POSSIBILIDADE DE SE CONHECER DE AGRAVO DE INSTRUMENTO
NÃO INSTRUÍDO COM A CERTIDÃO DE INTIMAÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA.
O
termo de abertura de vista e remessa dos autos à Fazenda Nacional
substitui, para efeito de demonstração da tempestividade do agravo de
instrumento (art. 522 do CPC) por ela interposto, a
apresentação de certidão de intimação da decisão agravada (art. 525, I, do CPC). De
fato, o art. 525, I, do CPC determina que o agravo de instrumento deve
ser instruído,
“obrigatoriamente, com cópias da decisão agravada, da certidão da
respectiva intimação e das procurações outorgadas aos advogados do
agravante e do agravado”. A simples
interpretação literal do referido dispositivo poderia levar à rápida
conclusão de que a referida certidão seria requisito extrínseco, sem o
qual o recurso não ultrapassaria, sequer, a barreira da
admissibilidade. Entretanto, a interpretação literal não é, em algumas
ocasiões, a mais adequada, especialmente em se tratando de leis
processuais, as quais têm a finalidade precípua de resguardar o
regular exercício do direito das partes litigantes. Assim, na linha do
pensamento da moderna doutrina processual a respeito da necessidade de
primazia da finalidade das normas de procedimento, na busca por uma
prestação
jurisdicional mais breve e efetiva, a interpretação das regras
processuais deve levar em conta não apenas o cumprimento da norma em si
mesma, mas seu escopo, seu objetivo, sob pena de se privilegiar o
formalismo em detrimento do
próprio direito material buscado pelo jurisdicionado. Nessa linha
intelectiva, se for possível verificar a tempestividade do agravo de
instrumento por outro meio, atingindo-se, assim, a finalidade da
exigência formal, deve-se, em
atenção ao princípio da instrumentalidade das formas, considerar
atendido o pressuposto e conhecer-se do recurso. Com efeito, a Fazenda
Nacional tem a prerrogativa de ser intimada das decisões, por meio da
concessão de
vista pessoal dos autos (arts. 38 da LC 73/1993, 6º, § 1º e § 2º, da Lei
9.028/1995, 20 da Lei 11.033/2004 e 25 da Lei 6.830/1980), razão pela
qual o prazo para a apresentação de recurso por essa tem
início a partir da data em que há concessão da referida vista pessoal a
ela. Dessa forma, a certidão de concessão de vistas dos autos pode ser
considerada como elemento suficiente da demonstração da
tempestividade do agravo de instrumento, substituindo a certidão de
intimação legalmente prevista. Importa ressaltar que esse tratamento não
pode, via de regra, ser automaticamente conferido aos litigantes que
não
possuem a prerrogativa de intimação pessoal, sob pena de se admitir que o
início do prazo seja determinado pelo próprio recorrente, a partir da
data de vista dos autos, a qual pode ser posterior ao efetivo termo
inicial do
prazo recursal, que, via de regra, é a data da publicação da mesma
decisão (EREsp 683.504-SC, Corte Especial, DJe 1/7/2013). Precedentes
citados: REsp 1.259.896-PE, Segunda Turma, DJe 17/9/2013; e REsp
1.278.731-DF, Segunda
Turma, DJe 22/9/2011. REsp 1.376.656-SP, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Corte Especial, julgado em 17/12/2014, DJe
2/2/2015.
Primeira Seção
DIREITO ADMINISTRATIVO. OBTENÇÃO DE RECEITA ALTERNATIVA EM CONTRATO DE CONCESSÃO DE RODOVIA.
Concessionária
de rodovia pode cobrar de concessionária de energia elétrica pelo uso
de faixa de domínio de rodovia para a instalação de postes e passagem de
cabos
aéreos efetivadas com o intuito de ampliar a rede de energia, na
hipótese em que o contrato de concessão da rodovia preveja a
possibilidade de obtenção de receita alternativa decorrente de
atividades vinculadas
à exploração de faixas marginais. O caput do art. 11
da Lei 8.987/1995 (Lei de Concessões e Permissões) prescreve que, “No
atendimento às peculiaridades de cada serviço
público, poderá o poder concedente prever, em favor da concessionária,
no edital de licitação, a possibilidade de outras fontes provenientes de
receitas alternativas, complementares, acessórias ou de projetos
associados, com ou sem exclusividade, com vistas a favorecer a
modicidade das tarifas, observado o disposto no art. 17 desta Lei”.
Ressalte-se que, como a minuta do contrato de concessão deve constar no
edital – conforme dispõe
o art. 18, XIV, da Lei 8.987/1995 –, o mencionado art. 11, ao citar “no
edital”, não inviabiliza que a possibilidade de aferição de outras
receitas figure apenas no contrato, haja vista se tratar de parte
integrante do edital. Sendo assim, desde que haja previsão no contrato
de concessão da rodovia, permite-se a cobrança, a título de receita
alternativa, pelo uso de faixa de domínio, ainda que a cobrança recaia
sobre concessionária de serviços de distribuição de energia elétrica.
Ademais, havendo previsão contratual, não há como prevalecer o teor do
art. 2º do Decreto 84.398/1980 em detrimento do
referido art. 11 da Lei 8.987/1995. Precedente citado: REsp 975.097-SP,
Primeira Seção, DJe 14/5/2010. EREsp
985.695-RJ, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 26/11/2014, DJe 12/12/2014.
DIREITO TRIBUTÁRIO. DESCONTO DE CRÉDITOS DO VALOR APURADO A TÍTULO DE CONTRIBUIÇÃO AO PIS E DA COFINS.
É
cabível o aproveitamento, na verificação do crédito dedutível da base
de cálculo da contribuição ao PIS e da COFINS, das despesas e custos
inerentes
à aquisição de combustíveis, lubrificantes e peças de reposição
utilizados em veículos próprios dos quais faz uso a empresa para
entregar as mercadorias que comercializa. Isso
porque o creditamento pelos insumos previsto nos arts. 3º, II, da Lei
10.833/2003 e da Lei 10.637/2002 abrange os custos com peças,
combustíveis e lubrificantes utilizados por empresa que, conjugada com a
venda de mercadorias, exerce
também a atividade de prestação de serviços de transporte da própria
mercadoria que revende. De fato, o art. 3º, II, da Lei 10.833/2003
registra expressamente que a pessoa jurídica poderá descontar
créditos calculados em relação aos bens e serviços utilizados como
insumo na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou
produtos destinados à venda,
inclusive combustíveis e lubrificantes. Dessa forma, importante
ressaltar que é o próprio dispositivo legal que dá, expressamente, à
pessoa jurídica o direito ao creditamento pelos bens utilizados como
insumo na
prestação de serviços, incluindo no conceito desses bens os combustíveis
e lubrificantes. Ademais, fato incontroverso é o de que o valor do
transporte da mercadoria vendida está embutido no preço de venda
(faturamento), como custo que é da empresa, ingressando assim na base de
cálculo das contribuições ao PIS/COFINS (receita bruta). Com o custo do
transporte e o correspondente aumento do preço de venda, há
evidente agregação de valor, pressuposto da tributação e também da
aplicação da não cumulatividade. Por certo, a vedação do creditamento em
casos como o presente teria por
únicos efeitos (a) forçar a empresa vendedora/transportadora a registrar
em cláusula contratual que as despesas da tradição (frete) estariam a
cargo do comprador, fornecendo a ele o serviço, ou (b) terceirizar a
atividade de transporte de suas mercadorias para uma outra empresa que
possivelmente seria criada dentro de um mesmo grupo econômico apenas
para se fazer planejamento tributário, com renovados custos burocráticos
(custos de
conformidade à legislação tributária, empresarial e trabalhista para a
criação de uma nova empresa). Em suma, caracterizada a prestação de
serviços de transporte, ainda que associada
à venda de mercadorias que comercializa, há de ser reconhecido o direito
ao creditamento pelo valor pago na aquisição das peças, combustíveis e
lubrificantes necessários a esse serviço, tendo em
vista que são insumos para a prestação do serviço. REsp 1.235.979-RS, Rel.
originário Min. Herman Benjamin, Rel. para acórdão Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 16/12/2014, DJe 19/12/2014.
Segunda Seção
DIREITO CIVIL. LIMITES À APLICABILIDADE DO ART. 50 DO CC.
O
encerramento das atividades da sociedade ou sua dissolução, ainda que
irregulares, não são causas, por si sós, para a desconsideração da
personalidade
jurídica a que se refere o art. 50 do CC. Para a aplicação da
teoria maior da desconsideração da personalidade social – adotada pelo
CC –, exige-se o dolo das pessoas naturais que estão por
trás da sociedade, desvirtuando-lhe os fins institucionais e servindo-se
os sócios ou administradores desta para lesar credores ou terceiros. É a
intenção ilícita e fraudulenta, portanto, que autoriza, nos
termos da teoria adotada pelo CC, a aplicação do instituto em comento.
Especificamente em relação à hipótese a que se refere o art. 50 do CC,
tratando-se de regra de exceção, de
restrição ao princípio da autonomia patrimonial da pessoa jurídica,
deve-se restringir a aplicação desse disposto legal a casos extremos, em
que a pessoa jurídica tenha sido instrumento para fins
fraudulentos, configurado mediante o desvio da finalidade institucional
ou a confusão patrimonial. Dessa forma, a ausência de intuito
fraudulento afasta o cabimento da desconsideração da personalidade
jurídica, ao menos
quando se tem o CC como o microssistema legislativo norteador do
instituto, a afastar a simples hipótese de encerramento ou dissolução
irregular da sociedade como causa bastante para a aplicação do disregard
doctrine. Ressalte-se que não se quer dizer com isso que o
encerramento da sociedade jamais será causa de desconsideração de sua
personalidade, mas que somente o será quando sua dissolução ou
inatividade irregulares tenham o fim de fraudar a lei, com o
desvirtuamento da finalidade institucional ou confusão patrimonial.
Assim é que o enunciado 146, da III Jornada de Direito Civil, orienta o
intérprete a adotar exegese
restritiva no exame do artigo 50 do CC, haja vista que o instituto da
desconsideração, embora não determine a despersonalização da sociedade –
visto que aplicável a certo ou determinado negócio e
que impõe apenas a ineficácia da pessoa jurídica frente ao lesado –,
constitui restrição ao princípio da autonomia patrimonial. Ademais,
evidenciando a interpretação restritiva que se deve
dar ao dispositivo em exame, a IV Jornada de Direito Civil firmou o
enunciado 282, que expressamente afasta o encerramento irregular da
pessoa jurídica como causa para desconsideração de sua personalidade: “O
encerramento
irregular das atividades da pessoa jurídica, por si só, não basta para
caracterizar abuso da personalidade jurídica”. Entendimento diverso
conduziria, no limite, em termos práticos, ao fim da autonomia
patrimonial da pessoa jurídica, ou seja, regresso histórico incompatível
com a segurança jurídica e com o vigor da atividade econômica.
Precedentes citados: AgRg no REsp 762.555-SC, Quarta Turma, DJe
25/10/2012;
e AgRg no REsp 1.173.067/RS, Terceira Turma, DJe 19/6/2012. EREsp 1.306.553-SC, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti,
julgado em 10/12/2014, DJe 12/12/2014.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. LIMITES DA IMPENHORABILIDADE DE QUANTIA TRANSFERIDA PARA APLICAÇÃO FINANCEIRA.
É
impenhorável a quantia oriunda do recebimento, pelo devedor, de verba
rescisória trabalhista posteriormente poupada em mais de um fundo de
investimento, desde que a soma dos valores
não seja superior a quarenta salários mínimos. De fato, a
jurisprudência do STJ vem interpretando a expressão salário, prevista no
inciso IV do art. 649 do CPC, de forma ampla, de modo que todos os
créditos decorrentes da atividade profissional estão abrangidos pela
impenhorabilidade. Cabe registrar, entretanto, que a Segunda Seção do
STJ definiu que a remuneração protegida é apenas a última
percebida – a do último mês vencido – e, mesmo assim, sem poder
ultrapassar o teto constitucional referente à remuneração de ministro do
STF (REsp 1.230.060-PR, DJe 29/8/2014). Após esse
período, eventuais sobras perdem a proteção. Todavia, conforme esse
mesmo precedente do STJ, a norma do inciso X do art. 649 do CPC merece
interpretação extensiva, de modo a permitir a impenhorabilidade, até o
limite de quarenta salários mínimos, de quantia depositada não só em
caderneta de poupança, mas também em conta corrente ou em fundos de
investimento, ou guardada em papel-moeda. Dessa maneira, a Segunda
Seção admitiu que é possível ao devedor poupar, nesses referidos meios,
valores que correspondam a até quarenta salários mínimos sob a regra da
impenhorabilidade. Por fim, cumpre esclarecer que, de acordo
com a Terceira Turma do STJ (REsp 1.231.123-SP, DJe 30/8/2012), deve-se
admitir, para alcançar esse patamar de valor, que esse limite incida em
mais de uma aplicação financeira, na medida em que, de qualquer modo, o
que se deve
proteger é a quantia equivalente a, no máximo, quarenta salários
mínimos. EREsp
1.330.567-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 10/12/2014, DJe 19/12/2014.
Terceira Seção
DIREITO PENAL. COMPETÊNCIA PARA PROCESSAR E JULGAR CRIME PREVISTO NO ART. 297, § 4º, DO CP.
Compete
à Justiça Federal – e não à Justiça Estadual – processar e julgar o
crime caracterizado pela omissão de anotação de vínculo
empregatício na CTPS (art. 297, § 4º, do CP). A Terceira Seção
do STJ modificou o entendimento a respeito da matéria, posicionando-se
no sentido de que, no delito tipificado no art. 297, § 4º, do
CP – figura típica equiparada à falsificação de documento público –, o
sujeito passivo é o Estado e, eventualmente, de forma secundária, o
particular – terceiro prejudicado com a
omissão das informações –, circunstância que atrai a competência da
Justiça Federal, conforme o disposto no art. 109, IV, da CF (CC
127.706-RS, Terceira Seção, DJe 3/9/2014). Precedente
citado: AgRg no CC 131.442-RS, Terceira Seção, DJe 19/12/2014. CC
135.200-SP, Rel. originário Min. Nefi Cordeiro, Rel. para
acórdão Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 22/10/2014, DJe 2/2/2015.
DIREITO PROCESSUAL PENAL. TERMO INICIAL DO PRAZO PARA O MP RECORRER.
Quando
o Ministério Público for intimado pessoalmente em cartório, dando
ciência nos autos, o seu prazo recursal se iniciará nessa data, e não
no dia da remessa dos autos ao seu departamento administrativo. Isso
porque o prazo recursal para o MP inicia-se na data da sua intimação
pessoal. Trata-se de entendimento extraído da leitura dos dispositivos
legais que
regem a matéria (arts. 798, § 5º, e 800, § 2º, do CPP), que visa
garantir a igualdade de condições entre as partes no processo penal.
Precedentes citados: AgRg nos EREsp 310.417-PB, Terceira Seção,
DJe 27/3/2008; REsp 258.826-TO, Sexta Turma, DJe 7/12/2009; e AgRg no
REsp 1.102.059-MA, Quinta Turma, DJe 13/10/2009. EREsp 1.347.303-GO, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 10/12/2014, DJe 17/12/2014.
Primeira Turma
DIREITO
PROCESSUAL CIVIL. ATUAÇÃO DA PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA NACIONAL
(PGFN) EM CAUSA DE COMPETÊNCIA DA PROCURADORIA-GERAL DA UNIÃO (PGU).
O
fato de a PGFN ter atuado em defesa da União em causa não fiscal de
atribuição da PGU não justifica, por si só, a invalidação de todos os
atos de processo
no qual não se evidenciou – e sequer se alegou – qualquer prejuízo ao
ente federado, que exercitou plenamente o seu direito ao contraditório e
à ampla defesa, mediante oportuna apresentação de
diversas teses jurídicas eloquentes e bem articuladas, desde a primeira
instância e em todos os momentos processuais apropriados. Ainda
que se reconheça, na hipótese em análise, o erro consistente na
atuação da PGFN em causa de natureza não fiscal de competência da PGU,
deve prevalecer a consideração de que a parte representada pelos dois
órgãos é a mesma, a União, e teve ela a
oportunidade de realizar o seu direito de defesa, o que efetivamente fez
de modo pleno, mediante arguições competentes e oportunas, deduzindo
diversas teses defensivas, todas eloquentes e bem articuladas, desde a
primeira instância e
em todos os momentos processuais. Assim, não resta espaço algum para
enxergar nódoa no direito constitucional que assegura o contraditório e a
ampla defesa. A propósito, se não houve prejuízo – e, a
rigor, não houve sequer alegação de prejuízo –, não é viável que sejam
simples e sumariamente descartados todos os atos processuais, como se
não vigorassem os princípios da
economicidade, da instrumentalidade das formas, da razoável duração do
processo, e como se não tivesse relevância o brocardo segundo o qual ne pas de nullité sans grief. REsp 1.037.563-SC, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 25/11/2014, DJe 3/2/2015.
Segunda Turma
DIREITO ADMINISTRATIVO. DESNECESSIDADE DE INSCRIÇÃO DE DETERMINADOS PROFISSIONAIS NO CONSELHO REGIONAL DE EDUCAÇÃO FÍSICA.
Não
é obrigatória a inscrição, nos Conselhos de Educação Física, dos
professores e mestres de dança, ioga e artes marciais (karatê, judô,
tae-kwon-do, kickboxing, jiu-jitsu, capoeira e outros) para o exercício
de suas atividades profissionais. Isso porque o disposto nos
arts. 2º e 3º da Lei 9.696/1998 estabelece quais são as competências do
profissional de educação física e definem, expressa e restritivamente,
quais serão aqueles obrigatoriamente inscritos nos Conselhos Regionais,
quais sejam, os detentores de diploma em Educação Física e
aqueles que, à época da edição da referida lei, exerciam atividades
próprias dos profissionais de educação física. Assim, a Resolução
46/2002 do Conselho Federal de
Educação Física (CONFEF), ao dispor que entre os profissionais de
educação física estavam inseridos aqueles especializados em lutas,
danças, ioga, entre outros, exigindo destes o registro no Conselho,
extrapolou o previsto no normativo federal. Portanto, não pode a
mencionada resolução modificar o rol de profissionais a serem inscritos
no Conselho, violando expressa disposição legal. Precedente citado: REsp
1.012.692-RS, Primeira Turma, DJe 16/5/2011. REsp 1.450.564-SE, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 16/12/2014, DJe
4/2/2015.
DIREITO ADMINISTRATIVO. INCIDÊNCIA DO FGTS SOBRE O TERÇO CONSTITUCIONAL DE FÉRIAS.
A
importância paga pelo empregador a título de terço constitucional de
férias gozadas integra a base de cálculo do Fundo de Garantia do Tempo
de Serviço (FGTS). O
FGTS é um direito autônomo dos trabalhadores urbanos e rurais de índole
social e trabalhista, não possuindo caráter de imposto nem de
contribuição previdenciária. Assim, não é
possível a sua equiparação com a sistemática utilizada para fins de
incidência de contribuição previdenciária e imposto de renda, de modo
que é irrelevante a natureza da verba trabalhista
(remuneratória ou indenizatória/compensatória) para fins de incidência
da contribuição ao FGTS. Nesse passo, o fato de o legislador optar por
excluir da incidência do FGTS as mesmas parcelas de que trata o
art. 28, § 9º, da Lei 8.212/1991 – apesar da aproximação dos conceitos –
não significa que pretendeu igualar a contribuição previdenciária à
mesma base de incidência do FGTS,
tratando-se de técnica legislativa. Realizando uma interpretação
sistemática da norma de regência, verifica-se que somente em relação às
verbas expressamente excluídas pela lei é que
não haverá a incidência do FGTS. Desse modo, impõe-se a incidência do
FGTS sobre o terço constitucional de férias (gozadas), pois não há
previsão legal específica acerca da sua
exclusão, não podendo o intérprete ampliar as hipóteses legais de não
incidência. Cumpre registrar que essa orientação é adotada no âmbito do
TST, que “tem adotado o entendimento
de que incide o FGTS sobre o terço constitucional, desde que não se
trate de férias indenizadas”. Ressalte-se que entendimento em sentido
contrário implica prejuízo ao empregado que é o destinatário
das contribuições destinadas ao Fundo efetuadas pelo empregador. A
propósito, cumpre esclarecer que no caso nas férias indenizadas há
expressa previsão legal de não incidência do FGTS, conforme se
extrai da redação do art. 15, § 6º, da Lei 8.036/1990, c/c o art. 28, §
9º, “d”, da Lei 8.212/1991. Por fim, vale destacar que o terço
constitucional de férias diferencia-se do abono
pecuniário previsto no art. 143 da CLT, haja vista que este representa
uma opção do trabalhador de converter em dinheiro 1/3 dos dias de férias
a que tem direito, enquanto o terço constitucional de férias
representa um direito constitucionalmente previsto aos trabalhadores
urbanos e rurais que tem por finalidade ampliar a capacidade financeira
do trabalhador durante seu período de férias. Dessa forma, não há que se
falar em
bis in idem. Precedente citado do TST: (RR - 81300-05.2007.5.17.0013, 7ª Turma, DEJT 9/11/2012). REsp
1.436.897-ES, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 4/12/2014, DJe 19/12/2014.
DIREITO ADMINISTRATIVO. INCIDÊNCIA DO FGTS SOBRE OS PRIMEIROS QUINZE DIAS QUE ANTECEDEM O AUXÍLIO-DOENÇA.
A
importância paga pelo empregador durante os primeiros quinze dias que
antecedem o afastamento por motivo de doença integra a base de cálculo
do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço
(FGTS). O FGTS é um direito autônomo dos trabalhadores urbanos e
rurais de índole social e trabalhista, não possuindo caráter de imposto
nem de contribuição previdenciária. Assim, o fato de
o Estado fiscalizar e garantir esse direito, com vistas à efetivação
regular dos depósitos, não transmuda em sujeito ativo do crédito dele
proveniente. O Estado intervém para assegurar o cumprimento da
obrigação por parte da empresa, em proteção ao direito social do
trabalhador. Dessa forma, não é possível a sua equiparação com a
sistemática utilizada para fins de incidência
de contribuição previdenciária e imposto de renda, de modo que é
irrelevante a natureza da verba trabalhista (remuneratória ou
indenizatória/compensatória) para fins de incidência do FGTS. Consiste
o FGTS, pois, em um depósito bancário vinculado, pecuniário,
compulsório, realizado pelo empregador em favor do trabalhador, visando
formar uma espécie de poupança para este, que poderá ser sacado nas
hipóteses legalmente previstas. De mais a mais, nos termos do art. 60, caput,
da Lei 8.213/1991, “o auxílio-doença será devido ao segurado empregado a
contar do décimo sexto dia do afastamento da
atividade, e, no caso dos demais segurados, a contar da data do início
da incapacidade e enquanto ele permanecer incapaz”. Nesse passo, no que
se refere ao segurado empregado, durante os primeiros quinze dias
consecutivos ao do afastamento
da atividade por motivo de doença, incumbe ao empregador efetuar o
pagamento do seu salário integral (art. 60, § 3º, da Lei 8.213/1991). No
mesmo sentido, os arts. 28, II, do Decreto 99.684/1990 e 15, § 5º, da
Lei
8.036/1990 impõem a obrigatoriedade de realização do depósito do FGTS na
hipótese de interrupção do contrato de trabalho decorrente de licença
para tratamento de saúde de até 15 dias.
Ressalte-se, por fim, que entendimento em sentido contrário implica
prejuízo ao empregado que é o destinatário das contribuições destinadas
ao Fundo efetuadas pelo empregador. REsp 1.448.294-RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 9/12/2014, DJe 15/12/2014.
DIREITO ADMINISTRATIVO. NÃO INCIDÊNCIA DO FGTS SOBRE O AUXÍLIO-CRECHE.
A
importância paga pelo empregador referente ao auxílio-creche não
integra a base de cálculo do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço
(FGTS). O FGTS é um direito
autônomo dos trabalhadores urbanos e rurais de índole social e
trabalhista, não possuindo caráter de imposto nem de contribuição
previdenciária. Assim, o fato de o Estado fiscalizar e garantir esse
direito, com vistas à efetivação regular dos depósitos, não transmuda em
sujeito ativo do crédito dele proveniente. O Estado intervém para
assegurar o cumprimento da obrigação por parte da
empresa, em proteção ao direito social do trabalhador. Dessa forma, não é
possível a sua equiparação com a sistemática utilizada para fins de
incidência de contribuição
previdenciária e imposto de renda, de modo que é irrelevante a natureza
da verba trabalhista (remuneratória ou indenizatória/compensatória) para
fins de incidência do FGTS. Consiste o FGTS, pois, em um
depósito bancário vinculado, pecuniário, compulsório, realizado pelo
empregador em favor do trabalhador, visando formar uma espécie de
poupança para este, que poderá ser sacado nas hipóteses
legalmente previstas. De mais a mais, a CF previu, no seu art. 7º, XXV,
entre os direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, a assistência
gratuita aos filhos e dependentes em creches e pré-escolas. O objetivo
do instituto é
ressarcir despesas efetuadas com o pagamento da creche de livre escolha
da empregada-mãe, ou outra modalidade de prestação de serviço desta
natureza. Nesse passo, verifica-se que o art. 28, § 9º, “s”, da
Lei 8.212/1990 expressamente exclui o reembolso creche da base de
incidência do FGTS. Ademais, há muito, a Fazenda Nacional aponta uma
distinção entre o reembolso-creche (que não integra o salário de
contribuição em razão de expressa previsão legal) e o auxílio-creche,
especialmente para fins de incidência de contribuição previdenciária.
Contudo, essa argumentação não
encontra amparo na jurisprudência desta Corte, que se firmou no sentido
de que “O Auxílio-creche não integra o salário-de-contribuição” (Súmula
310 do STJ). Destarte, não obstante a
maximização das hipóteses de incidência do FGTS constitua princípio que
atende à sua finalidade precípua, não se justifica afastar a sua
incidência em relação ao
“reembolso-creche” e determinar a sua incidência sobre o
“auxílio-creche”, quando o pagamento da verba – independentemente da
forma – ocorra em conformidade com a legislação trabalhista.
Além disso, em que pese a distinção procedimental sustentada pela
Fazenda, tanto o auxílio creche quanto o reembolso creche possuem a
mesma finalidade, ressarcir a trabalhadora pelos gastos efetuados com a
creche dos seus
filhos menores de 6 anos, em virtude de a empresa não manter em
funcionamento uma creche em seu próprio estabelecimento, conforme
determina o art. 389 da CLT. Ressalte-se, por oportuno, que o FGTS
destina-se a garantir o tempo de
serviço do trabalhador e, no caso do auxílio-creche, esse requisito não
está presente, na medida em que se destina a reembolsar o trabalhador
das despesas que este teve que efetuar em virtude do não oferecimento da
creche por parte do empregador. Assim, diante da análise da legislação
de regência (art. 15, § 6º, da Lei 8.036/1990, c/c o art. 28, § 9º, “s”,
da Lei 8.212/1991), impõe-se a
conclusão no sentido de que o auxílio-creche (da mesma forma que o
reembolso-creche) não integra a base de cálculo do FGTS. REsp 1.448.294-RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 9/12/2014, DJe 15/12/2014.
DIREITO TRIBUTÁRIO. RESPONSABILIDADE POR DÉBITOS PREVIDENCIÁRIOS NÃO PAGOS POR INCORPORADORA IMOBILIÁRIA FALIDA.
Na
hipótese de paralisação de edificação de condomínio residencial, em
razão da falência da incorporadora imobiliária, e tendo a obra sido
retomada
posteriormente pelos adquirentes das unidades imobiliárias
comercializadas – condôminos –, estes não podem ser responsabilizados
pelo pagamento de contribuições previdenciárias referentes
à etapa da edificação que se encontrava sob a responsabilidade exclusiva
da incorporadora falida. Nos termos do art. 30, II, da Lei
8.212/1991, “exclui-se da responsabilidade solidária perante a
Seguridade
Social o adquirente de prédio ou unidade imobiliária que realizar a
operação com empresa de comercialização ou incorporador de imóveis,
ficando estes solidariamente responsáveis com o
construtor”. Vale dizer, o construtor é responsável pelas dívidas
previdenciárias, mas não o é o adquirente de unidade imobiliária que
realizar a operação com empresa de
comercialização ou incorporador de imóveis. Nota-se que a lei protege a
boa-fé dos adquirentes que comercializam com empresas construtoras, não
só como mecanismo de justiça, mas também como
instrumento de garantia, de forma que as relações contratuais na área da
construção civil se desenvolvam em um sistema de segurança. No caso,
até o momento em que a obra estava sob a responsabilidade da
pessoa jurídica, é inegável que os condôminos encontravam-se na condição
de adquirentes das unidades comercializadas pela construtora, e não
como construtores, não sendo possível, portanto,
imputar aos condôminos a responsabilidade tributária, já que estariam
acobertados pela exceção prevista no inciso VII do art. 30 da Lei
8.212/1991. Precedente citado: REsp 961.246-SC, Primeira Turma, DJe
10/12/2009.
REsp 1.485.379-SC, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 16/12/2014, DJe 4/2/2015.
DIREITO TRIBUTÁRIO. EMPRESAS OPTANTES PELO SIMPLES E SUSPENSÃO DO IPI.
O
benefício da suspensão do IPI na saída do produto do estabelecimento
industrial (art. 29 da Lei 10.637/2002) não se estende às empresas
optantes pelo SIMPLES. O
tratamento diferenciado instituído às microempresas e às empresas de
pequeno porte, simplificando o cumprimento de suas obrigações
administrativas, tributárias e previdenciárias, estabelece o
recolhimento
de tributos de forma unificada e, em relação ao IPI, prescreve que ele
incide cumulado com outros impostos, por alíquota fixa sobre a receita
bruta. Essa sistemática de arrecadação já institui forma de
benefício fiscal que determina pagamento único e que, consequentemente,
exclui qualquer outra vantagem estabelecida às demais empresas, até
porque, contrario sensu, a extensão do benefício quanto
à suspensão do IPI da saída do estabelecimento industrial (art. 29 da
Lei 10.637/2002) conduziria à concessão de dupla vantagem – uma,
decorrente do recolhimento mitigado do IPI pela opção ao
SIMPLES, e outra, pela sua total exclusão – sem expressa previsão legal.
Precedentes citados: AgRg no Ag 1.171.321-SC, Primeira Turma, DJe
9/4/2010; e AgRg no REsp 986.560-PR, DJe 11/5/2009. REsp 1.497.591-PE, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 9/12/2014, DJe 15/12/2014.
Terceira Turma
DIREITO CIVIL. DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE EM CONTA DE PARTICIPAÇÃO.
Aplica-se
subsidiariamente às sociedades em conta de participação o art. 1.034 do
CC, o qual define de forma taxativa as hipóteses pelas quais se admite a
dissolução judicial das sociedades. Apesar de despersonificadas
e de os seus sócios possuírem graus de responsabilidade distintos, as
sociedades em conta de participação decorrem da união de
esforços, com compartilhamento de responsabilidades, comunhão de
finalidade econômica e existência de um patrimônio especial garantidor
das obrigações assumidas no exercício da empresa. Não
há diferença ontológica entre as sociedades em conta de participação e
os demais tipos societários personificados, distinguindo-se quanto aos
efeitos jurídicos unicamente em razão da dispensa de
formalidades legais para sua constituição. Sendo assim, admitindo-se a
natureza societária dessa espécie empresarial, deve-se reconhecer a
aplicação subsidiária do art. 1.034 do CC – o qual define
de forma taxativa as hipóteses pelas quais se admite a dissolução
judicial das sociedades – às sociedades em conta de participação, nos
termos do art. 996 do CC, enquanto ato inicial que rompe o
vínculo jurídico entre os sócios. Ora, as sociedades não personificadas,
diversamente das universalidades despersonalizadas, decorrem de um
vínculo jurídico negocial e, no mais das vezes, plurissubjetivo.
São contratos relacionais multilaterais de longa duração, os quais podem
ser rompidos pela vontade das partes, em consenso ou não, porquanto não
se pode exigir a eternização do vínculo contratual.
E é essa a finalidade do instituto jurídico denominado dissolução. Por
fim, ressalte-se que, somente após esse ato inicial, que dissolve as
amarras contratuais entre os sócios, inicia-se o procedimento de
liquidação. E, nesta fase, sim, a ausência de personalidade jurídica
terá clara relevância, impondo às sociedades em conta de participação um
regime distinto dos demais tipos
societários. Isso porque a especialização patrimonial das sociedades em
conta de participação só tem efeitos entre os sócios, nos termos do § 1º
do art. 994 do CC, de forma a existir, perante
terceiros, verdadeira confusão patrimonial entre o sócio ostensivo e a
sociedade. Assim, inexistindo possibilidade material de apuração de
haveres, disciplinou o art. 996 do mesmo diploma legal que a liquidação
dessas sociedades deveriam seguir o procedimento relativo às prestações
de contas, solução que era adotada mesmo antes da vigência do novo
Código Civil. Dessa forma, o procedimento especial de
prestação de contas refere-se tão somente à forma de sua liquidação,
momento posterior à dissolução do vínculo entre os sócios ostensivo e
oculto. Contudo, essa disciplina da
liquidação não afasta nem poderia atingir o ato inicial, antecedente
lógico e necessário, qual seja, a extinção do vínculo contratual de
natureza societária por meio da
dissolução. REsp 1.230.981-RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 16/12/2014,
DJe 5/2/2015.
DIREITO CIVIL. ALIENAÇÃO, SEM CONSENTIMENTO DO COMPANHEIRO, DE BEM IMÓVEL ADQUIRIDO NA CONSTÂNCIA DA UNIÃO ESTÁVEL.
A
invalidação da alienação de imóvel comum, fundada na falta de
consentimento do companheiro, dependerá da publicidade conferida à união
estável,
mediante a averbação de contrato de convivência ou da decisão
declaratória da existência de união estável no Ofício do Registro de
Imóveis em que cadastrados os bens comuns, ou da
demonstração de má-fé do adquirente. A Lei 9.278/1996, em seu
art. 5º, ao dispor acerca dos bens adquiridos na constância da união
estável, estabeleceu serem eles considerados fruto do
trabalho e da colaboração comum, passando a pertencer a ambos os
conviventes, em condomínio e em partes iguais, salvo estipulação
contrária em contrato escrito. Dispôs, ainda, que a
administração do patrimônio comum dos conviventes compete a ambos,
questão também submetida ao poder de disposição dos conviventes. Nessa
perspectiva, conforme entendimento doutrinário, a
alienação de bem co-titularizado por ambos os conviventes, na esteira do
citado artigo, sem a anuência de um dos condôminos, representaria
alienação – pelo menos em parte – de coisa alheia,
caracterizando uma venda “a non domino”, ou seja, um ato
ilícito. Por outro lado, inolvidável a aplicabilidade, em regra, da
comunhão parcial de bens à união estável, consoante o disposto no
caput do art. 1.725 do CC. E, especialmente acerca da
disponibilidade dos bens, em se tratando de regime que não o da
separação absoluta, consoante disciplinou o CC no seu art. 1.647, nenhum
dos cônjuges
poderá, sem autorização do outro, alienar ou gravar de ônus real os bens
imóveis. A interpretação dessas normas, ou seja, do art. 5º da Lei
9.278/1996 e dos já referidos arts. 1.725 e 1.647 do
CC, fazendo-as alcançar a união estável, não fosse pela subsunção mesma,
esteia-se, ainda, no fato de que a mesma ratio – que
indisfarçavelmente imbuiu o legislador a estabelecer a outorga
uxória e marital em relação ao casamento – mostra-se presente em relação
à união estável; ou seja, a proteção da família (com a qual, aliás,
compromete-se o
Estado, seja legal, seja constitucionalmente). Todavia, levando-se em
consideração os interesses de terceiros de boa-fé, bem como a segurança
jurídica necessária para o fomento do comércio
jurídico, os efeitos da inobservância da autorização conjugal em sede de
união estável dependerão, para a sua produção (ou seja, para a eventual
anulação da
alienação do imóvel que integra o patrimônio comum) da existência de uma
prévia e ampla notoriedade dessa união estável. No casamento, ante a
sua peculiar conformação registral,
até mesmo porque dele decorre a automática alteração de estado de pessoa
e, assim, dos documentos de identificação dos indivíduos, é ínsita essa
ampla e irrestrita publicidade. Projetando-se
tal publicidade à união estável, a anulação da alienação do imóvel
dependerá da averbação do contrato de convivência ou do ato decisório
que declara a união
no Registro Imobiliário em que inscritos os imóveis adquiridos na
constância da união. A necessidade de segurança jurídica, tão cara à
dinâmica dos negócios na sociedade
contemporânea, exige que os atos jurídicos celebrados de boa-fé sejam
preservados. Em outras palavras, nas hipóteses em que os conviventes
tornem pública e notória a sua relação, mediante
averbação, no registro de imóveis em que cadastrados os bens comuns, do
contrato de convivência ou da decisão declaratória da existência da
união estável, não se poderá
considerar o terceiro adquirente do bem como de boa-fé, assim como não
seria considerado caso se estivesse diante da venda de bem imóvel no
curso do casamento. Contrariamente, não havendo o referido registro da
relação na matrícula dos imóveis comuns, ou não se demonstrando a má-fé
do adquirente, deve-se presumir a sua boa-fé, não sendo possível a
invalidação do negócio
que, à aparência, foi higidamente celebrado. Por fim, não se olvide que o
direito do companheiro prejudicado pela alienação de bem que integrava o
patrimônio comum remanesce sobre o valor obtido com a
alienação, o que deverá ser objeto de análise em ação própria em que se
discuta acerca da partilha do patrimônio do casal. REsp 1.424.275-MT, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 4/12/2014, DJe 16/12/2014.
DIREITO CIVIL. INSUBSISTÊNCIA DE CLÁUSULA DE IRREVOGABILIDADE E DE IRRETRATABILIDADE EM CONVENÇÃO DE CONDOMÍNIO.
Ainda
que, na vigência do CC/1916, tenha sido estipulado, na convenção
original de condomínio, ser irrevogável e irretratável cláusula que
prevê a
divisão das despesas do condomínio em partes iguais, admite-se ulterior
alteração da forma de rateio, mediante aprovação de 2/3 dos votos dos
condôminos, para que as expensas sejam suportadas na
proporção das frações ideais. De fato, não há como obrigar –
sem que haja previsão legal – que os atuais condôminos ou os eventuais
futuros adquirentes das unidades fiquem
eternamente submetidos às regras impostas na convenção original. Basta
imaginar a existência de condomínios centenários, cujas unidades
imobiliárias já passaram por várias
gerações de proprietários sem que remanescesse nenhum proprietário
original. Nesse cenário, ao admitir a perpetuação de cláusula pétrea,
estar-se-ia engessando de maneira desarrazoada a
vontade dos condôminos e a soberania das deliberações assembleares, que
nem mesmo pela unanimidade de votos poderiam alterar as cláusulas
gravadas pela irrevogabilidade e pela irretratabilidade. Na hipótese em
análise, reforça a legitimidade da alteração o fato de ser aprovada pela
maioria dos condôminos e de obedecer ao quórum legal de 2/3 dos
condôminos (art. 1.351 do CC/2002), observando-se a forma de rateio
(na proporção da fração ideal) prevista no novo Código Civil (art.
1.336, I), o que afasta qualquer alegação, por parte de eventual
condômino que não concorde com a modificação,
de ofensa aos princípios da razoabilidade, da proporcionalidade ou da
vedação ao enriquecimento ilícito. Além disso, tendo em vista a natureza
estatutária da convenção de condomínio, que
autoriza a aplicação imediata do regime jurídico previsto no novo Código
Civil, não há espaço para falar em violação do direito adquirido e do
ato jurídico perfeito (REsp 722.904-RS,
Terceira Turma, DJ 1º/7/2005; e REsp 1.169.865-DF, Quarta Turma, DJe
2/9/2013). REsp 1.447.223-RS,
Rel.
originário Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Rel. para acórdão Min.
Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 16/12/2014, DJe 5/2/2015.
DIREITO
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECONHECIMENTO DA LEGALIDADE DE COMINAÇÃO DE
MULTA DIÁRIA EM AÇÃO DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS EM FACE DAS
PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO.
É cabível a cominação de multa diária – astreintes – em ação de exibição de documentos movida por usuário de serviço de
telefonia celular para obtenção de informações acerca do endereço de IP (Internet Protocol) de onde teriam sido enviadas, para o seu celular, diversas mensagens anônimas agressivas, por meio do
serviço de SMS disponibilizado no sítio eletrônico da empresa de telefonia. De
fato, a Súmula 372 do STJ estabelece não ser cabível a aplicação de
multa cominatória na
ação de exibição de documentos, entendimento esse posteriormente
ratificado em sede de recurso repetitivo (REsp 1.333.988-SP, Segunda
Seção, DJe 11/4/2014). Essa orientação jurisprudencial,
todavia, não se aplica ao caso em questão. Não se trata de uma ação de
exibição de documentos propriamente dita, uma vez que não se busca a
prova de fatos contra a demandada, mas a
identificação do terceiro responsável pela autoria de atos ilícitos.
Desse modo, não é igualmente aplicável a determinação contida no art.
359 do CPC (presunção de veracidade
dos fatos afirmados pela parte requerente da exibição dos documentos),
pois não se busca a prova de fatos contra a demandada, mas a
identificação do terceiro responsável pela autoria de atos ilícitos. Em
situações como a dos autos, em que a busca e apreensão de documentos e a
confissão não surtiriam os efeitos esperados, a fixação de astreintes
mostra-se a medida mais adequada para garantir a
eficácia da decisão que determina o fornecimento de informações de dados
de usuário em sítio eletrônico. Por fim, destaque-se que não se está
aqui desconsiderando o entendimento sumular, mas
apenas se estabelecendo uma distinção em face das peculiaridades do caso
– técnica das distinções (distinguishing). REsp 1.359.976-PB, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 25/11/2014, DJe 2/12/2014.
DIREITO DO CONSUMIDOR. RESCISÃO DE CONTRATO DE ARRENDAMENTO MERCANTIL VINCULADO A CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE AUTOMÓVEL.
Na
hipótese de rescisão de contrato de compra e venda de automóvel firmado
entre consumidor e concessionária em razão de vício de qualidade do
produto, deverá ser
também rescindido o contrato de arrendamento mercantil do veículo
defeituoso firmado com instituição financeira pertencente ao mesmo grupo
econômico da montadora do veículo (banco de montadora).
Inicialmente, esclareça-se que o microssistema normativo do CDC
conferiu ao consumidor o direito de demandar contra quaisquer dos
integrantes da cadeia produtiva com o objetivo de alcançar a plena
reparação de
prejuízos sofridos no curso da relação de consumo. Ademais, a regra do
art. 18 do CDC, ao regular a responsabilidade por vício do produto,
deixa expressa a responsabilidade solidária entre todos os fornecedores
integrantes da cadeia de consumo. Nesse sentido, observe-se que as
regras do art. 7º, § único, e do art. 25, § 1º, do CDC, estatuem
claramente que, “havendo mais de um responsável pela causação do
dano, todos responderão pela reparação prevista nesta e nas Seções
anteriores.” Amplia-se, assim, o nexo de imputação para abranger pessoas
que, no sistema tradicional do Código Civil,
não seriam atingidas, como é o caso da instituição financeira integrante
do mesmo grupo econômico da montadora. Na hipótese ora em análise, não
se trata de instituição financeira que
atua como “banco de varejo” – apenas concedendo financiamento ao
consumidor para aquisição de um veículo novo ou usado sem vinculação
direta com o fabricante –, mas sim de
instituição financeira que atua como “banco de montadora”, isto é, que
integra o mesmo grupo econômico da montadora que se beneficia com a
venda de seus automóveis, inclusive estipulando juros mais baixos
que a média do mercado para esse segmento para atrair o público
consumidor para os veículos da sua marca. É evidente, assim, que o banco
da montadora faz parte da mesma cadeia de consumo, sendo também
responsável pelos vícios ou defeitos do veículo objeto da negociação. REsp
1.379.839-SP, Rel. originária Min. Nancy Andrighi, Rel. para Acórdão Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 11/11/2014, DJe 15/12/2014.
DIREITO
PROCESSUAL CIVIL. IMPOSSIBILIDADE DE DESISTÊNCIA DO RECURSO PRINCIPAL
APÓS A CONCESSÃO DE ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA EM SEDE DE RECURSO
ADESIVO.
Concedida
antecipação dos efeitos da tutela em recurso adesivo, não se admite a
desistência do recurso principal de apelação, ainda que a petição de
desistência tenha sido apresentada antes do julgamento dos recursos. De
fato, a apresentação da petição de desistência na hipótese em análise
demonstra pretensão incompatível
com o princípio da boa-fé processual e com a própria regra que faculta
ao recorrente não prosseguir com o recurso, a qual não deve ser
utilizada como forma de obstaculizar a efetiva proteção ao direito
lesionado. Isso porque, embora tecnicamente não se possa afirmar que a
concessão da antecipação dos efeitos da tutela represente o início do
julgamento da apelação, é evidente que a decisão
proferida pelo relator, ao satisfazer o direito material reclamado,
passa a produzir efeitos de imediato na esfera jurídica das partes,
evidenciada a presença dos seus requisitos (prova inequívoca e
verossimilhança da
alegação). Além disso, deve-se considerar que os arts. 500, III, e 501
do CPC – que permitem a desistência do recurso sem a anuência da parte
contrária – foram inseridos no Código de 1973,
razão pela qual, em caso como o aqui analisado, a sua interpretação não
pode prescindir de uma análise conjunta com o art. 273 do CPC – que
introduziu a antecipação dos efeitos da tutela no
ordenamento jurídico pátrio por meio da Lei 8.952, apenas no ano de
1994, como forma de propiciar uma prestação jurisdicional mais célere e
justa –, bem como com o princípio da boa-fé processual,
que deve nortear o comportamento das partes em juízo (de que são
exemplos, entre outros, os arts. 14, II, e 600 do CPC, introduzidos,
respectivamente, pelas Leis 10.358/2001 e 11.382/2006). Ante o exposto, a
solução adequada
para o caso em apreço desborda da aplicação literal dos arts. 500, III, e
501 do CPC, os quais têm função apenas instrumental, devendo ser
adotada uma interpretação teleológica que, associada
aos demais artigos mencionados, privilegie o escopo maior de efetividade
do direito material buscado pelo sistema, que tem no processo um
instrumento de realização da justiça. REsp 1.285.405-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 16/12/2014, DJe 19/12/2014.
Quarta Turma
DIREITO CIVIL. INAPLICABILIDADE DE PROTEÇÃO DO DIREITO AUTORAL A MODELO FOTOGRAFADO.
O modelo fotografado não é titular de direitos autorais oponíveis contra a editora da revista que divulga suas fotos. De
fato, o ordenamento jurídico brasileiro, de forma ampla
e genérica, confere à fotografia proteção própria de direito autoral
(art. 7º, VII, da Lei 9.610/1998 – Lei de Direitos Autorais – e art. 2
da Convenção de Berna). Ocorre que, se o
próprio conceito de direito autoral está ontologicamente relacionado com
processo de criação – afora os direitos conexos dos executantes e
outros –, a proteção deve incidir em benefício
daquele que efetivamente criou a obra protegida. Quanto a esse aspecto,
aliás, o art. 11 da Lei de Direitos Autorais prescreve que “Autor é a
pessoa física criadora de obra literária, artística ou
científica”. Dessa maneira, em se tratando de fotografia, para efeitos
de proteção do direito autoral das obras artísticas, o autor – e,
portanto, o titular do direito autoral – é o fotógrafo
(e não o fotografado). Isso porque é o fotógrafo, detentor da técnica e
da inspiração, quem coordena os demais elementos complementares ao
retrato do objeto – como iluminação – e capta
a oportunidade do momento e o transforma em criação intelectual, digna,
portanto, de tutela como manifestação de cunho artístico. O fotografado,
conquanto seja titular de direitos da personalidade (como a imagem, a
honra e a intimidade), nada cria. Dele não emana nenhuma criação do
espírito exteriorizada como obra artística. Sua imagem compõe obra
artística de terceiros. Nesse sentido, a Terceira Turma do STJ
já decidiu que a “fotografia é obra protegida por direito do autor, e,
ainda que produzida na constância de relação de trabalho, integra a
propriedade imaterial do fotógrafo, não importando se
valorada como obra de especial caráter artístico ou não” (REsp
1.034.103-RJ, DJe 21/9/2010). Ressalte-se, todavia, que o fotografado
tem direito de imagem, cuja violação poderia, realmente, ensejar
indenizações. REsp 1.322.704-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 23/10/2014,
DJe 19/12/2014.
DIREITO CIVIL. VÍCIO REDIBITÓRIO E PRAZO DECADENCIAL.
Quando
o vício oculto, por sua natureza, só puder ser conhecido mais tarde
(art. 445, § 1°, CC), o adquirente de bem móvel terá o prazo de trinta
dias (art. 445,
caput, do CC), a partir da ciência desse defeito, para exercer o
direito de obter a redibição ou abatimento no preço, desde que o
conhecimento do vício ocorra dentro do prazo de cento e oitenta dias da
aquisição do bem. O prazo decadencial para exercício do direito de obter a redibição ou abatimento no preço de bem móvel é o previsto no caput do
art. 445 do CC, isto é,
trinta dias. O § 1º do art. 445 do CC apenas delimita que, se o vício
somente se revelar mais tarde, em razão de sua natureza, o prazo de 30
dias fluirá a partir do conhecimento desse defeito, desde que revelado
até
o prazo máximo de 180 dias, com relação aos bens móveis. Desse modo, no
caso de vício oculto em coisa móvel, o adquirente tem o prazo máximo de
cento e oitenta dias para perceber o vício e, se o
notar neste período, tem o prazo de decadência de trinta dias, a partir
da verificação do vício, para ajuizar a ação redibitória. Nesse sentido,
o enunciado 174 do CJF dispõe que: “Em
se tratando de vício oculto, o adquirente tem os prazos do caput do art.
445 para obter redibição ou abatimento do preço, desde que os vícios se
revelem nos prazos estabelecidos no parágrafo primeiro, fluindo,
entretanto, a partir do conhecimento do defeito”. REsp 1.095.882-SP, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado
em 9/12/2014, DJe 19/12/2014.
DIREITO EMPRESARIAL. ABUSIVIDADE DA VIGÊNCIA POR PRAZO INDETERMINADO DE CLÁUSULA DE NÃO CONCORRÊNCIA.
É
abusiva a vigência, por prazo indeterminado, da cláusula de “não
restabelecimento” (art. 1.147 do CC), também denominada “cláusula de não
concorrência”. O art. 1.147 do CC estabelece que “não havendo
autorização expressa, o alienante do estabelecimento não pode fazer
concorrência ao adquirente, nos cinco anos subsequentes
à transferência”. Relativamente ao referido artigo, foi aprovado o
Enunciado 490 do CJF, segundo o qual “A ampliação do prazo de 5 (cinco)
anos de proibição de concorrência pelo alienante ao
adquirente do estabelecimento, ainda que convencionada no exercício da
autonomia da vontade, pode ser revista judicialmente, se abusiva”. Posto
isso, cabe registrar que se mostra abusiva a vigência por prazo
indeterminado da
cláusula de “não restabelecimento”, pois o ordenamento jurídico pátrio,
salvo expressas exceções, não se coaduna com a ausência de limitações
temporais em cláusulas
restritivas ou de vedação do exercício de direitos. Assim, deve-se
afastar a limitação por tempo indeterminado, fixando-se o limite
temporal de vigência por cinco anos contados da data do contrato,
critério razoável adotado no art. 1.147 do CC/2002. REsp 680.815-PR, Rel. Min. Raul
Araújo, julgado em 20/3/2014, DJe 3/2/2015.
Quinta Turma
DIREITO PENAL. PORTE DE ARMA DE FOGO POR POLICIAL CIVIL APOSENTADO.
O
porte de arma de fogo a que têm direito os policiais civis (arts. 6º da
Lei 10.826/2003 e 33 do Decreto 5.123/2014) não se estende aos
policiais aposentados. Isso porque, de acordo com
o art. 33 do Decreto 5.123/2004, que regulamentou o art. 6º da Lei
10.826/2003, o porte de arma de fogo está condicionado ao efetivo
exercício das funções institucionais por parte dos policiais, motivo
pelo qual
não se estende aos aposentados. Precedente citado: RMS 23.971-MT,
Primeira Turma, DJe 16/4/2008. HC 267.058-SP,
Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 4/12/2014, DJe 15/12/2014.
DIREITO PENAL. MORTE INSTANTÂNEA DA VÍTIMA E OMISSÃO DE SOCORRO COMO CAUSA DE AUMENTO DE PENA.
No
homicídio culposo, a morte instantânea da vítima não afasta a causa de
aumento de pena prevista no art. 121, § 4°, do CP – deixar de prestar
imediato socorro à
vítima –, a não ser que o óbito seja evidente, isto é, perceptível por
qualquer pessoa. Com efeito, o aumento imposto à pena decorre
do total desinteresse pela sorte da vítima. Isso
é evidenciado por estar a majorante inserida no § 4° do art. 121 do CP,
cujo móvel é a observância do dever de solidariedade que deve reger as
relações na sociedade brasileira (art. 3º, I, da CF).
Em suma, o que pretende a regra em destaque é realçar a importância da
alteridade. Assim, o interesse pela integridade da vítima deve ser
demonstrado, a despeito da possibilidade de êxito, ou não, do socorro
que
possa vir a ser prestado. Tanto é que não só a omissão de socorro majora
a pena no caso de homicídio culposo, como também se o agente “não
procura diminuir as consequências do seu ato, ou foge
para evitar a prisão em flagrante”. Cumpre destacar, ainda, que o dever
imposto ao autor do homicídio remanesce, a não ser que seja evidente a
morte instantânea, perceptível por qualquer pessoa. Em outras
palavras, havendo dúvida sobre a ocorrência do óbito imediato, compete
ao autor da conduta imprimir os esforços necessários para minimizar as
consequências do fato. Isso porque “ao agressor, não cabe,
no momento do fato, presumir as condições físicas da vítima, medindo a
gravidade das lesões que causou e as consequências de sua conduta. Tal
responsabilidade é do especialista médico, autoridade
científica e legalmente habilitada para, em tais circunstâncias,
estabelecer o momento e a causa da morte” (REsp 277.403-MG, Quinta
Turma, DJ 2/9/2002). Precedente citado do STF: HC 84.380-MG, Segunda
Turma, DJ 3/6/2005. HC 269.038-RS, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 2/12/2014, DJe 19/12/2014.
DIREITO PENAL. ESTELIONATO JUDICIAL E USO DE DOCUMENTO FALSO.
Não
se adequa ao tipo penal de estelionato (art. 171, § 3º, do CP) –
podendo, contudo, caracterizar o crime de uso de documento falso (art.
304 do CP) – a conduta do advogado que,
utilizando-se de procurações com assinatura falsa e comprovantes de
residência adulterados, propôs ações indenizatórias em nome de terceiros
com objetivo de obter para si vantagens indevidas, tendo as
irregularidades sido constadas por meio de perícia determinada na
própria demanda indenizatória. De fato, não se configura o
crime de estelionato judiciário (art. 171, § 3º, do CP) quando é
possível ao magistrado, durante o curso do processo, ter acesso às
informações que caracterizam a fraude. Não se desconhece a existência de
posicionamento doutrinário e jurisprudencial, inclusive do STJ,
no sentido de que não se admite a prática do delito de estelionato por
meio do ajuizamento de ações judiciais (RHC 31.344-PR, Quinta Turma, DJe
26/3/2012; e HC 136.038-RS, Sexta Turma, DJe 30/11/2009). Contudo, em
recente
julgado, a Quinta Turma do STJ firmou o entendimento de que quando não é
possível ao magistrado, durante o curso do processo, ter acesso às
informações que caracterizam a fraude, é viável a
configuração do crime de estelionato (AgRg no HC 248.211-RS, Quinta
Turma, DJe 25/4/2013). No caso em análise, constata-se que fora
determinada a realização de perícia na documentação acostada pelo
advogado, o que revela que a suposta fraude perpetrada era passível de
ser descoberta pelas vias ordinárias no curso do processo, o que afasta o
crime de estelionato. Todavia, observa-se que o agente teria se
utilizado de
procurações e comprovantes de residência falsos para ingressar com ações
cíveis, sendo certo que tais documentos são hábeis a caracterizar o
delito previsto no artigo 304 do CP, conforme
entendimento da doutrina e da jurisprudência. RHC 53.471-RJ, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 4/12/2014, DJe
15/12/2014.
DIREITO PENAL. QUALIFICADORA DA DESTREZA NO CRIME DE FURTO.
No
crime de furto, não deve ser reconhecida a qualificadora da “destreza”
(art. 155, § 4º, II, do CP) caso inexista comprovação de que o agente
tenha se valido de
excepcional – incomum – habilidade para subtrair a coisa que se
encontrava na posse da vítima sem despertar-lhe a atenção. Efetivamente,
não configuram essa qualificadora os atos dissimulados comuns aos
crimes contra o patrimônio – que, por óbvio, não são praticados às
escancaras. A propósito, preleciona a doutrina que essa qualificadora
significa uma “especial habilidade capaz de impedir que a
vítima perceba a subtração realizada em sua presença. É a subtração que
se convencionou chamar de punga. A destreza pressupõe uma atividade
dissimulada, que exige habilidade incomum, aumentando o
risco de dano ao patrimônio e dificultando sua proteção”. Nesse passo,
“a destreza constitui a habilidade física ou manual empregada pelo
agente na subtração, fazendo com que a vítima
não perceba o seu ato. É o meio empregado pelos batedores de carteira, pick-pockets
ou punguistas, na gíria criminal brasileira. O agente adestra-se,
treina, especializa-se, adquirindo habilidade tal com as mãos e
dedos que a subtração ocorre como um passe de mágica, dissimuladamente.
Por isso, a prisão em flagrante (próprio) do punguista afasta a
qualificadora, devendo responder por tentativa de furto simples; na
verdade, a
realidade prática comprovou exatamente a inabilidade do incauto”. Dispõe
ainda a doutrina que “Destreza: é a agilidade ímpar dos movimentos de
alguém, configurando uma especial habilidade. O batedor de
carteira (figura praticamente extinta diante da ousadia dos criminosos
atuais) era o melhor exemplo. Por conta da agilidade de suas mãos,
conseguia retirar a carteira de alguém, sem que a vítima percebesse. Não
se trata do
'trombadinha', que investe contra a vítima, arrancando-lhe, com
violência, os pertences”. REsp
1.478.648-PR, Rel. Min. Newton Trisotto (desembargador convocado do TJ/SC), julgado em 16/12/2014, DJe 2/2/2015.
DIREITO PROCESSUAL PENAL. PROGRESSÃO DE REGIME DO REINCIDENTE CONDENADO PELO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS.
A
progressão de regime para os condenados por tráfico de entorpecentes e
drogas afins dar-se-á, se o sentenciado for reincidente, após o
cumprimento de 3/5 da pena, ainda que a
reincidência não seja específica em crime hediondo ou equiparado. O
§ 2º do art. 2º da Lei 8.072/1990 determina que a transferência de
regime para os condenados por delito hediondo ou equiparado
dar-se-á após o resgate de 2/5 da pena, se o sentenciado for primário, e
3/5, se reincidente. O STJ, interpretando especificamente esse
dispositivo legal, firmou o entendimento de que o legislador não fez
menção
à necessidade de a reincidência – que impõe o cumprimento de prazo maior
da pena – ser específica em crime hediondo ou equiparado para que
incida o prazo de 3/5 para fins de progressão de regime. Em outras
palavras, ao exigir que os condenados por delitos hediondos ou
assemelhados, se reincidentes, cumpram lapso maior para serem
progredidos de regime, a lei não diferenciou as modalidades de
reincidência, de modo que deve ser exigido do
apenado reincidente, em qualquer caso, independentemente da natureza do
delitos antes cometido, o lapso de 3/5. Precedentes citados: HC
273.774-RS, Quinta Turma, DJe 10/10/2014; e HC 238.592-RJ, Sexta Turma,
DJe 18/2/2014. REsp 1.491.421-RS, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 4/12/2014, DJe 15/12/2014.
DIREITO PROCESSUAL PENAL. INCOMPATIBILIDADE ENTRE PRISÃO PREVENTIVA E REGIME ABERTO OU SEMIABERTO.
Caso
o réu seja condenado a pena que deva ser cumprida em regime inicial
diverso do fechado, não será admissível a decretação ou manutenção de
prisão
preventiva na sentença condenatória. Inicialmente, insta
consignar que a prisão cautelar deve ser considerada exceção, já que,
por meio desta medida, priva-se o réu de seu jus libertatis
antes do pronunciamento condenatório definitivo, consubstanciado na
sentença transitada em julgado. Nesse passo, a prisão preventiva,
enquanto medida de natureza cautelar, não pode ser utilizada como
instrumento de
punição antecipada do réu (STF: HC 93.498-MS, Segunda Turma, DJe de
18/10/2012; STJ: AgRg no RHC 47.220-MG, Quinta Turma, DJe de
29/8/2014; e RHC 36.642-RJ, Sexta Turma, DJe de 29/8/2014). Dessa forma,
estabelecido o regime
aberto ou semiaberto como o inicial para o cumprimento de pena, a
decretação da prisão preventiva inviabiliza o direito de recorrer em
liberdade, na medida em que impõe a segregação cautelar ao recorrente,
até o trânsito em julgado, sob o fundamento de estarem presentes os
requisitos ensejadores da prisão preventiva insertos no art. 312 do CPP.
Ao admitir essa possibilidade, chegar-se-ia ao absurdo de ser mais
benéfico ao
réu renunciar ao direito de recorrer e iniciar imediatamente o
cumprimento da pena no regime estipulado do que exercer seu direito de
impugnar a decisão perante o segundo grau. Nessa medida, a manutenção ou
a
imposição da prisão cautelar consistiria flagrante vulneração do
princípio da proporcionalidade. Além disso, a prevalecer o referido
entendimento, dar-se-á maior efetividade e relevância
à medida de natureza precária (manutenção da segregação cautelar) em
detrimento da sentença condenatória (título judicial que, por sua
natureza, realiza o exame exauriente da
quaestio). Por conseguinte, a individualização da pena cederá
espaço, indevidamente, à providência de cunho nitidamente provisório e
instrumental, subvertendo a natureza e finalidade do processo e
de suas medidas cautelares. É bem verdade que a jurisprudência ora
dominante no âmbito do STJ tem se orientado pela compatibilidade entre o
regime diverso do fechado imposto na sentença e a negativa do apelo em
liberdade, desde
que adequadas as condições da prisão provisória às regras do regime
imposto. Entretanto, esse posicionamento implica, na prática, o
restabelecimento da orientação jurisprudencial antes prevalente
na jurisprudência STF, que admitia a execução provisória da pena,
atualmente rechaçada, ao entendimento de que ela vulnera o princípio da
presunção de não culpabilidade inserto no art.
5º, LVII, da CF. Isso porque, se a sentença condenatória ainda não
transitou em julgado, só se permite a segregação em decorrência da
imposição de prisão cautelar, cuja principal
característica, como já ressaltado, significa segregação total do réu.
Em outras palavras, a prisão cautelar não admite temperamento para
ajustar-se a regime imposto na sentença diverso do
fechado. Imposto regime mais brando, significa que o Estado-Juiz, ao
aplicar as normas ao caso concreto, concluiu pela possibilidade de o réu
poder iniciar o desconto da reprimenda em circunstâncias que não se
compatibilizam com a
imposição/manutenção de prisão provisória. Caso seja necessário, poderá
se valer, quando muito, de medidas alternativas diversas à prisão,
previstas no art. 319 do CPP,
inquestionavelmente mais adequadas à hipótese. Precedentes citados do
STF: HC 118.257-PI, Segunda Turma, DJe 6/3/2014; HC 115.786-MG, Segunda
Turma, DJe 20/8/2013; e HC 114.288-RS, Primeira Turma, DJe 7/6/2013. RHC 52.407-RJ, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 10/12/2014, DJe 18/12/2014.
DIREITO PROCESSUAL PENAL. UTILIZAÇÃO DE ATOS INFRACIONAIS PARA JUSTIFICAR PRISÃO PREVENTIVA PARA A GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA.
A
anterior prática de atos infracionais, apesar de não poder ser
considerada para fins de reincidência ou maus antecedentes, pode servir
para justificar a manutenção da
prisão preventiva como garantia da ordem pública. Precedentes citados: RHC 44.207-DF, Quinta Turma, DJe 23/5/2014; e RHC 43.350-MS, Sexta Turma, DJe 17/9/2014. RHC 47.671-MS, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 18/12/2014, DJe 2/2/2015.
DIREITO PROCESSUAL PENAL. INEXISTÊNCIA DE CASA DE ALBERGADO E CUMPRIMENTO DA PENA EM LOCAL COMPATÍVEL.
A
inexistência de casa de albergado na localidade da execução da pena não
gera o reconhecimento de direito ao benefício da prisão domiciliar
quando o paciente estiver
cumprindo a reprimenda em local compatível com as regras do regime
aberto. O STJ tem admitido, excepcionalmente, a concessão da
prisão domiciliar quando não houver local adequado ao regime prisional
imposto. Todavia,
na hipótese em que o paciente, em face da inexistência de casa de
albergado, esteja cumprindo pena em local compatível com as regras do
regime aberto – tendo o juízo da execução providenciado a
infraestrutura necessária, atento ao princípio da razoabilidade e da
proporcionalidade –, não se vislumbra o necessário enquadramento nas
hipóteses excepcionais de concessão do regime prisional
domiciliar. HC 299.315-RS, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 18/12/2014, DJe 2/2/2015.
Sexta Turma
DIREITO PENAL. FURTO QUALIFICADO PRATICADO DURANTE O REPOUSO NOTURNO.
A
causa de aumento de pena prevista no § 1° do art. 155 do CP – que se
refere à prática do crime durante o repouso noturno – é aplicável tanto
na forma simples
(caput) quanto na forma qualificada (§ 4°) do delito de furto. Isso porque esse entendimento está em consonância, mutatis mutandis,
com a posição firmada pelo STJ no julgamento do Recurso Especial
Repetitivo 1.193.194-MG, no qual se afigurou possível o reconhecimento
do privilégio previsto no § 2º do art. 155 do CP nos casos de furto
qualificado (art. 155, § 4º, do CP), máxime se presentes os requisitos.
Dessarte, nessa linha de raciocínio, não haveria justificativa plausível
para se aplicar o § 2° do art. 155 do CP e deixar de impor o § 1° do
referido artigo, que, a propósito, compatibiliza-se com as
qualificadoras previstas no § 4° do dispositivo. Ademais, cumpre
salientar que o § 1° do art. 155 do CP refere-se à causa de aumento,
tendo aplicação apenas na terceira fase da dosimetria, o que não revela
qualquer prejuízo na realização da dosimetria da pena com arrimo no
método trifásico. Cabe registrar que não se desconhece o entendimento da
Quinta Turma do STJ segundo o qual somente será cabível
aplicação da mencionada causa de aumento quando o crime for perpetrado
na sua forma simples (caput do art. 155). Todavia, o fato é
que, após o entendimento exarado em 2011 no julgamento do EREsp
842.425-RS, no qual
se evidenciou a possibilidade de aplicação do privilégio (§ 2°) no furto
qualificado, não há razoabilidade em negar a incidência da causa de
aumento (delito cometido durante o repouso noturno) na mesma
situação em que presente a forma qualificada do crime de furto. Em
outras palavras, uma vez que não mais se observa a ordem dos parágrafos
para a aplicação da causa de diminuição (§ 2º),
também não se considera essa ordem para imposição da causa de aumento (§
1º). HC
306.450-SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 4/12/2014, DJe 17/12/2014.
DIREITO PENAL. INAPLICABILIDADE DO ARREPENDIMENTO POSTERIOR AO CRIME DE MOEDA FALSA.
Não se aplica o instituto do arrependimento posterior ao crime de moeda falsa. No
crime de moeda falsa – cuja consumação se dá com a falsificação da
moeda,
sendo irrelevante eventual dano patrimonial imposto a terceiros –, a
vítima é a coletividade como um todo, e o bem jurídico tutelado é a fé
pública, que não é passível de
reparação. Desse modo, os crimes contra a fé pública, semelhantes aos
demais crimes não patrimoniais em geral, são incompatíveis com o
instituto do arrependimento posterior, dada a impossibilidade
material de haver reparação do dano causado ou a restituição da coisa
subtraída. REsp
1.242.294-PR, Rel. originário Min. Sebastião Reis Júnior, Rel. para acórdão Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 18/11/2014, DJe 3/2/2015.
DIREITO PENAL. CONFIGURAÇÃO DO CRIME DE CAMBISMO.
Para
a configuração do crime de cambismo (Vender ingressos de evento
esportivo, por preço superior ao estampado no bilhete), previsto no art.
41-F da Lei 10.671/2003, não há
necessidade de comprovação de que, no momento da oferta, não havia
ingressos disponíveis na bilheteria. Trata-se de comportamento
dotado de reprovabilidade penal, pela simples razão de envolver a
exploração, artificiosa, de um bem finito: a quantidade de lugares nos
estádios. Dessa maneira, abusando de certo privilégio decorrente de se
chegar antes ao guichê, adquirem-se mais unidades, que são vendidas
com ágio. É desinfluente a circunstância, eventual, de ainda existirem
ingressos à venda nas bilheterias. A uma porque o tipo penal,
expressamente, a tal não se refere. A duas porque, pela simples conduta
enunciada no
modelo incriminador, o bem jurídico já é afetado, porquanto se
materializa exploração do preço, em mercado de bem finito, operado por
um único fornecedor. Gera-se indevida especulação,
promovendo a daninha quebra da isonomia, que seria assegurada pela
exclusividade nas vendas. RHC 47.835-RJ, Rel. Min.
Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 9/12/2014, DJe 19/12/2014.
DIREITO PROCESSUAL PENAL. EFEITOS DO ARQUIVAMENTO DO INQUÉRITO POLICIAL PELO RECONHECIMENTO DE LEGÍTIMA DEFESA.
Promovido
o arquivamento do inquérito policial pelo reconhecimento de legítima
defesa, a coisa julgada material impede a rediscussão do caso penal em
qualquer novo
feito criminal, descabendo perquirir a existência de novas provas.
Isso porque a decisão judicial que define o mérito do caso penal, mesmo
no arquivamento do inquérito policial, gera efeitos de coisa julgada
material.
Ademais, a decisão judicial que examina o mérito e reconhece a atipia ou
a excludente da ilicitude é prolatada somente em caso de convencimento
com grau de certeza jurídica pelo magistrado. Assim, na dúvida se o fato
deu-se em legítima defesa, a previsão legal de presença de suporte
probatório de autoria e materialidade exigiria o desenvolvimento da
persecução criminal. Ressalte-se que a permissão de desarquivamento
do inquérito pelo surgimento de provas novas contida no art. 18 do CPP e
na Súmula 524/STF somente tem incidência quando o fundamento do
arquivamento for a insuficiência probatória - indícios de autoria e
prova do crime. Pensar o contrário permitiria a reabertura de inquéritos
por revaloração jurídica e afastaria a segurança jurídica das soluções
judiciais de mérito, como no
reconhecimento da extinção da punibilidade, da atipia ou de excludentes
da ilicitude. Precedente citado do STJ: RHC 17.389-SE, Quinta Turma, DJe
7/4/2008. Precedente citado do STF: HC 80.560-GO, Primeira Turma, DJe
30/3/2001. REsp 791.471-RJ, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 25/11/2014, DJe 16/12/2014.
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