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domingo, 3 de março de 2013

IMUNIDADE RECIPROCA


1    IMUNIDADE RECIPROCA

Entre ás espécies de imunidade convém destacar a imunidade recíproca. Por ser a mesma a espécie de imunidade defendida para a empresa prestadora de serviço público postal, dedica-se tópico próprio para análise específica desta modalidade de imunidade.
A imunidade recíproca está prevista no artigo 150, inciso VI, alínea “a’ da CRFB, com a redação de que não é permitido instituir impostos sobre o patrimônio, a renda e os serviços uns dos outros. Em outras palavras, significa que as pessoas políticas não podem, não tem competência para cobrar tributos umas das outras, incluindo nesse contexto às autarquias, as empresas públicas e às fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público.
Por uma melhor compreensão, convém analisar os elementos sobre os quais não é permitida a instituição de impostos, a saber, patrimônio, renda e serviço.  O primeiro significa uma universalização de bens móveis e imóveis, direitos e obrigações pertencentes aos entes políticos, a exemplo de uma empresa pública. A segunda, diz respeito a todo e qualquer numerário auferido pela venda de um bem, recebimento de um direito ou pela prestação de serviços públicos. O terceiro elemento se refere a todos os serviços públicos prestados em favor dos administrados, pelo próprio Estado ou por quem lhes faça às vezes, a exemplo da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos e o serviço público postal.
Do ponto de vista doutrinário, no entendimento de Costa, temos as seguintes ponderações:[1]
“deve-se entender por patrimônio uma universalidade de bens, móveis e imóveis, direitos e obrigações, referida a um titular [.........]Renda, por sua vez, é todo  rendimento obtido a partir de um bem ou direito.Por fim,há que se entender que os serviços referidos na norma constitucional são os públicos”
Ora, com base nos preceitos exarados nos dois parágrafos  anteriores, verifica-se que uma Empresa pública se enquadra no  conceito de patrimônio. Desse modo, a imunidade recíproca protege este complexo de coisas (empresa) da incidência de qualquer espécie tributária.  Destarte, tratando-se de patrimônio público, não cabe a exigência de qualquer tributo. No mesmo conduto, sobre as rendas e serviços da empresa não haverá qualquer embaraço tributária, todavia, deve esta ter como finalidade os fins públicos como forma de prover a sociedade de serviços públicos essenciais e necessários.
    Toda imunidade tem por fim a realização de finalidades Constitucionais. Assim,a  imunidade recíproca está alicerçada em valores que a Constituição Federal visa resguardar, a exemplo dos direitos fundamentais e a construção de uma sociedade justa, conseqüentemente,a erradicação da pobreza, redução das desigualdades sociais e a promoção do bem  social.
Nesse esteiro a imunidade recíproca significa dizer que cada ente político, apesar de possuir competência tributária, não a possui para imposição, sobre os outros entes, impostos[2].
Em outra forma de expressão, não obstante a previsão expressa da imunidade recíproca no texto constitucional, sua eventual inexistência não teria o condão de excluir tal regra do ordenamento jurídico brasileiro, haja vista a sua intrínseca relação com o princípio federativo[3].
Em consonância com o entendimento doutrinário citado anteriormente, a imunidade recíproca existiria, mesmo se na Constituição Federal não houvesse de forma expressa, ainda assim, não teria competência tributária os entes políticos para tributarem uns aos outros. Tal conclusão se baseia em princípios constitucionais, a exemplo do Pacto Federativo e Isonomia, conforme veremos a seguir.

1.1     O pacto federativo, a isonomia e a imunidade recíproca

O pacto federativo está preceituado no art. 1°, caput, da Constituição Federal, onde se verifica que a Federação do Brasil, é formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito federal.
Ora, se é uma união indissolúvel, significa que não pode haver qualquer obstáculo que possa por em risco a unicidade. Assim, nesse contexto, a competência para instituir tributos, não prospera, ou seja, não há competência e tampouco capacidade contributiva das pessoas políticas, suas fundações, autarquias e empresas públicas Delegatárias de serviços públicos.
Na base conceitual de Filho, o pacto federativo se apresenta na seguinte conjuntura:[4]
“A ordem total, a ordem da Federação, apresenta dois aspecto diversos embora complementares: um aspecto unitário e um aspecto societário.Isso corresponde aliás á estrutura íntima do Estado federal que é um Estado mas composto de Estados.O Estado federal é um Estado e, por isso, apresenta um aspecto unitário, quer no plano internacional, quer no mero plano interno.No plano internacional, esse aspecto se manifesta em sua unidade de personalidade[......]No plano interno essa unicidade se manifesta antes de mais nada pela existência de um ordenamento jurídico(constitucional ou não) próprio ao todo, com organização completa, competente em todo território e sobre todos os habitantes desse território.Todavia, é também o Estado federal uma sociedade de Estados. Daí que, no típico Estado federal, os Estados membros de algum modo participam do governo do todo(seja por existir um órgão no ordenamento total cuja função é representá-los- um Senado- seja por elegerem eles o chefe de Estado e do governo”.

Diante de tais ponderações, verifica-se na própria Constituição Federal, a repartição de competências entre Estados, União e Municípios, a saber: repartição de competência legislativa, a repartição de competência administrativa, a repartição de competência tributária e a divisão de rendas, nos termos dos artigos 21 a 24 da Constituição Federal.
No exercício de tais competências não pode haver obstáculos de uns para com os propósitos dos outros e, com isso, não poderá haver qualquer tributação sobre as finalidades dos entes políticos, seja no patrimônio, na renda ou serviços, haja vista a unicidade de propósitos. Em suma, as partes não podem prejudicar o todo.
No conduto de Ibanêz,a imunidade recíproca está fundamentada no seguinte: [5]
“a imunidade recíproca decorre do princípio federativo porque a federação implica autonomia política, administrativa e legislativa dos entes federados. A eventual tributação de um ente pelo outro redundaria  no exercício  de uma soberania que inexiste na relação harmônica em que não pode haver ingerência de um na autonomia do outro”

Na conjuntura teórica do Carrazza, a imunidade recíproca é decorrência dos princípios federativo e da isonomia, nos seguintes termos:[6]
“Este princípio decorre seja do princípio federativo, seja do principio da isonomia(igualdade jurídica das pessoas políticas).Decorre do princípio federativo porque, se uma pessoa política pudesse exigir imposto de outra, fatalmente acabaria por interferir em sua autonomia. Sim porque, cobrando-lhe impostos, poderia levá-la a situação de grande dificuldade econômica , a ponto de impedi-la de levar avante seus objetivos institucionais.Ora, isso a Constituição absolutamente não tolera, tanto que inscreveu nas cláusulas pétreas que  não será sequer objeto de deliberação a proposta de emenda constitucional tendente a abolir a forma federativa de Estado(art.60,§4°,I)”.

Noutra fonte, mais precisamente, Ibanêz, a isonomia significa que:[7]
Entre as pessoas políticas, reina a absoluta igualdade jurídica, não havendo a sobreposição de umas sobre as outras, pelo menos não em termos jurídicos. Assim, evidente que não podem sujeitar-se á incidência de impostos.Segundo considerável parcela da doutrina, a imunidade tributária recíproca atende a dois princípios constitucionais:o principio federativo e o princípio da igualdade, que, na área tributária é examinado de acordo o critério da capacidade econômica.
Em mais um posicionamento, na baila teórica de Pestana, verifica-se:[8]
“Prevalece na nossa ordem constitucional à isonomia entre as pessoas políticas de direito constitucional interno, corolário do regime federativo brasileiro; não se cogita de distribuição hierárquica entre essas pessoas, mas, sim, de competências específicas outorgadas pela Carta Brasileira”.
Portanto, do contexto doutrinário anteriormente relatado, destacam-se três pontos relevantes, quais sejam: a igualdade jurídica, a autonomia e a capacidade econômica. O primeiro diz respeito ao princípio da isonomia, os entes políticos são iguais juridicamente, respeitadas as desigualdades Constitucionais; o segundo está diretamente ligado ao pacto federativo e, significa governo de si próprio, delimitado pela Constituição, sem interferências dos outros entes, porém, em observância ao poder soberano; o terceiro, diz respeito à capacidade contributiva, a titularidade da riqueza das pessoas políticas.
Por tudo o exposto, as pessoas políticas não manifestam capacidade econômica para pagar tributos, os recursos auferidos são para a realização das suas finalidades, não sendo possível qualquer espécie de embaraço tributário.

1.2     A interpretação da imunidade recíproca

O fenômeno da exigência tributária não pode ser imposto de forma ilimitada, sob pena de afronta a princípios consagrados pela Constituição Federal. Em outras palavras, a tributação desenfreada e desordenada não é admitida em nosso ordenamento jurídico.
Diante desse fato, necessário se faz a utilização das diversas formas de interpretação quando se trata da temática imunidade, haja vista que não são apenas os princípios explícitos que limitam a ganância impositiva dos entes políticos em arrecadar cada vez mais. Assim, é primordial uma interpretação mais abrangente  quando  se cuida de limitar o poder tributante, principalmente em relação a imunidade tributária recíproca, de modo que o fim social pretendido pela imunidade seja totalmente alcançado.
Pela base teórica de Hugo de Brito, acerca da forma mais adequada para interpretar as normas jurídicas em geral, a saber:[9]
“sendo possível mais de uma interpretação, todas razoáveis, ajustadas aos elementos sistemáticos e teleológicos, deve prevalecer aquela que melhor realize os princípios constitucionais e permita a solução que mais se aproxime dos valores essenciais que ao Direito Cumpre realizar- a saber, a segurança e a justiça[......}O elemento literal é de pobreza franciscana, e utilizado isoladamente pode levar a verdadeiros absurdos, de sorte que o hermenêutico pode e deve utilizar todos os elementos da interpretação, especialmente o elemento sistemático, absolutamente indispensável  em qualquer trabalho sério de interpretação, e ainda o elemento teleológico , de notável valia na determinação do significado das normas jurídicas”.
Na continuidade conceitual, para melhor esclarecimento, constata-se que existem na doutrina alguns meios de interpretação, com os quais pode o  interprete trabalhar e conhecer as significações que a leitura dos textos do direito positivo desperta, desse modo, amplia-se o horizonte, por conseqüência estabelece contatos com valores intrínsecos ao caso concreto, distancia-se da interpretação literal e consagra a segurança jurídica.
Nesse esteiro doutrinário, elencam-se algumas formas de interpretação, qual seja: econômica, literal, benigna, sistemática, teleológica, histórica e sociológica.
A interpretação econômica considera em primeiro lugar os efeitos econômicos preceituados pela norma jurídica, ou seja, vislumbra-se o lado econômico na relação tributária do fisco com o contribuinte.
Na interpretação literal, busca o interprete o significado gramatical da lei, o que importa é o sentido restrito da palavra, vale o que está escrito, não leva em cona outros aspectos do ordenamento jurídico.
Destarte, com relação à interpretação benigna, temos as diretivas conceituais do artigo 112 do Código Tributário Nacional, onde se estabelece que a lei tributária que define infrações, ou lhes comina penalidades, interpreta-se da maneira mais favorável ao acusado. Assim sendo, as dúvidas quando do conflito entre fisco e contribuinte, segundo este conceito devem ser resolvidas em favor do contribuinte, parte mais frágil na relação, principalmente, considerando a restrição que a tributação provoca no direito de propriedade.
 Por interpretação sistemática entende-se o método que se utiliza de todas as possibilidades existentes no ordenamento jurídico, isto seja não considera apenas a norma isoladamente no contexto em que ela se insere, mas no todo da qual ela é parte.
Mediante a interpretação teleológica, o intérprete busca adequar a finalidade da lei ao caso concreto, por conseqüente realizar a vontade coletiva nela contida, ou seja, na aplicação das normas contidas em uma lei ou na Constituição Federal, o objetivo maior é a concretização dos fins sociais a que a regra se dirige e os anseios do bem comum.
No esteiro da interpretação histórica, o intérprete busca conhecer os motivos que levaram os legisladores a elaborarem a lei, estuda a relação da lei com o momento de sua edição, isto seja análise do passado para decidir o caso concreto no presente.
Por outro modo, na conjuntura de elementos da interpretação sociológica, o intérprete verifica a finalidade social da lei, analisa-se o aspecto da necessidade social a ser realizada, o fim para o qual a lei foi criada.
Ora, diante de tais possibilidades interpretavas,considerando o fim social de toda imunidade, a interpretação que deve ser dada nos casos de incompetência para tributar será aquela que mais se aproxime da finalidade coletiva, ou seja, necessário um equilíbrio entre o fim público almejado com a imunidade e o desejo insaciável de arrecadar.
No pensar doutrinário, precisamente na esteira conceitual de Hugo de Brito, a imunidade tem abrangência ampla, indo além de impostos, nos seguintes termos:[10]
“Em edições anteriores afirmamos que a imunidade refere-se apenas aos impostos. Não aos demais tributos. Hoje, porém, já não pensamos assim.A imunidade, para ser efetiva, para cumprir suas finalidades, deve ser abrangente. Nenhum tributo pode ficar de fora de seu alcance”.
Noutra posição doutrinária, no trilhar de Costa,as imunidades devem ser interpretadas de forma sistêmica e teleológica, com fundamento em princípios constitucionais, na forma de expressão seguinte:[11]
“As normas imunizantes tem seus objetivos facilmente identificáveis pelo interprete, porquanto estampados na Constituição, quase sempre de modo explícito. A partir da identificação do objetivo(ou objetivos) da norma imunizante, deve o intérprete realizar a interpretação mediante a qual o mesmo será atingido em sua plenitude, sem restrições ou alargamentos do espectro eficacional da norma, não autorizados pela própria Lei Maior.Em outras palavras, a interpretação há de ser teleológica e sistemática- vale dizer, consentânea com os princípios constitucionais envolvidos e o contexto a que se refere.Em nosso entender a interpretação da norma imunizante deve ser efetuada de molde a efetivar o principio ou liberdade por ela densificado. O alcance da norma há que se conformar com a eficácia do principio ou liberdade. Portanto,interpretação que não conduza a esse desfecho é inadmissível”.

Dos pontos doutrinários em discussão, extrai-se a idéia de que a interpretação não deve ser restritiva (literal), tampouco extensiva, mas um pensar interpretativo que seja na medida certa, no equilíbrio necessário para a realização dos valores do Estado contido na norma imunizante.
Todavia, surge uma duvida com a leitura do preceito inserido no artigo 111 do CTN, qual seja:”interpreta-se literalmente a legislação tributária que disponha sobre outorga de isenção”. Ora se na isenção interpreta-se literalmente, na imunidade também será da mesma forma?
Sobre este dispositivo pondera Hugo de Brito, assim, conforme segue:[12]
“Assim, a regra do artigo 111 do Código tributário Nacional há de ser entendida no sentido de que as normas reguladoras das matérias ali mencionadas não comportam integração por equidade. Sendo possível mais de uma interpretação, todas razoáveis, ajustadas aos elementos sistemáticos e teleológicos, devem prevalecer aquela que melhor realize os princípios constitucionais e permita a solução que mais se aproxime dos valores essenciais que o Direito cumpre relizar- a saber, a segurança e a justiça. È inadequado o entendimento segundo o qual a interpretação das normas reguladoras das matérias previstas no art. 111 do Código Tributário não admite outros métodos, ou elementos de interpretação, além do literal”.
Nessa ordem conceitual, verifica-se que nem mesmo o preceito estabelecido expressamente no artigo 111 do CTN, de que as isenções são interpretadas literalmente, tem o condão suficiente de afastar outros métodos de interpretação da norma. Dessa feita, as isenções quando postas em análise serão inicialmente verificadas sobre a ótica literal, todavia, possível é a utilização de outros meios.
No pensar doutrinário de Leopoldo, as isenções são interpretadas em principio restritivamente, haja vista a regra expressa no Código Tributário Nacional, enquanto as imunidades, por não estarem no mesmo regramento e terem por objetivos a proteção de valores políticos, interpreta de forma ampliativa, conforme se escreve a seguir:[13]
“Não há norma expressa em nosso ordenamento jurídico que determine o modo como deve ser feita a interpretação das normas de imunidade, ao contrário das isenções [........]Assim, entende-se que ás isenções cabe interpretação literal não no sentido de que deve ser utilizado exclusivamente o método literal de interpretação, mas no sentido de que se inicia  o processo exegético a partir da literalidade(que traduz o conteúdo indisponível daquilo que objetiva comunicar)mas também de que devem ser levados em consideração os demais métodos(sistemático, teleológico e histórico) para que o significado da norma não se afaste da razoabilidade e da harmonia do sistema jurídico pátrio.........Cabe, dessa forma, ás imunidades, principalmente em razão de sua finalidade, interpretação ampliativa”.
Do ponto de vista jurisprudencial, no mesmo sentido, o Supremo tribunal Federal em consonância com o pensamento doutrinário, expressa que o  elemento literal não basta para solucionar casos concretos de isenções.A construção sistêmica será necessária, caso a literalidade não seja adequada[14].
Isso posto, significa que as isenções terão uma interpretação aproximada com o elemento literal, não fugindo do contexto de outras espécies de interpretação, a exemplo da sistêmica, teleológica e histórica. Por outro lado, as imunidades, que pela natureza extremamente ligada a valores sociais e princípios constitucionais, também pela falta de regra expressa, interpreta-se de modo amplo.

1.3     A imunidade recíproca aplicada às estatais

As estatais são empresas públicas e sociedade de economia mista, com personalidade jurídica de direito privado, criadas com o objetivo de explorarem atividades econômicas em sentido estrito e em sentido amplo.
Nessa ordem, as atividades econômicas em sentido estrito, é toda prestação de serviços em concorrência com os particulares, nos termos do artigo 173 da Constituição Federal. Por outro lado, serviços em sentido amplo, é toda prestação de serviços públicos, nos termos da Constituição Federal, artigo 175.
Dessarte,bebendo na fonte doutrinária, nos termos conceituais de Marcelo Alexandrino e Vicente Paula, as empresas públicas e sociedades de economia mistas têm as seguintes características:[15]
“As empresas públicas e sociedade de economia mista que atuam na exploração de atividades econômicas (de produção ou comercialização de bens ou prestação de serviços de natureza privada) são as entidades que, embora integrantes da Administração Pública em sentido formal, mais se aproximam das pessoas privadas. Somente se submetem a preceitos de direito público expressos no próprio texto constitucional, ou em leis administrativas, desde que, nesse caso, sejam derivados de normas constitucionais explicitas ou implícitas.......As empresas públicas e sociedade de economia mista prestadoras de serviços públicos, embora sejam, pessoas jurídicas de direito privado, estão sujeitas a diversas regras e princípios de direito público, especialmente como decorrência do postulado da continuidade dos serviços públicos.....Em face dessa dualidade de atividades desempenhadas pelas empresas públicas  e pelas sociedades de economia mista(exploração de atividade econômica ou prestação de serviços públicos)temos regimes jurídicos distintos, a saber:
a)aquelas que dedicam á exploração de atividades econômicas sujeitam-se predominantemente, sobretudo no exercício de suas atividades-fim, ao regime jurídico próprio das empresas privadas, conforme o art. 173 da Constituição Federal;
b)aquelas que se dedicam á prestação de serviços públicos sujeitam-se predominantemente, sobretudo no exercício de suas atividades-fins, ao regime jurídico de direito público,  nos termos do art.175 da Constituição Federal.

Por certo, consoante as preceituações doutrinária, temos duas situações importantes, a saber: a criação de empresas públicas ou sociedade de economia mista para prestar serviços públicos, as quais estão sujeitas ao regime jurídico público, por conseguinte, gozam dos privilégios da Administração Pública, dentre os quais os benéficos fiscais.
Noutra ponta, as empresas públicas e sociedade de economia mista, criadas para executarem atividades econômicas de produção ou comercialização. São regidas pelo direito privado, não gozam dos privilégios da Administração Pública, participam da livre concorrência e sujeitam-se a mesma carga tributária das empresas privadas.
Outro ponto que merece destaque diz respeito à forma descentralizada de prestação dos serviços públicos, que nos termos do artigo 175 da Constituição Federal temos a concessão e a permissão, sempre através de licitação (delegação). Também existe a autorização, nos termos do artigo 21, incisos XI e XII, do mesmo diploma legal. Todavia, daremos ênfase a delegação e outorga.
Nesse sentido, em conformidade a Alexandrino e Vicente, na forma descentralizada os serviços serão prestados mediante outorga e delegação, expressos da seguinte maneira:[16]
“[....] há criação por lei,ou autorização legal para instituição, de uma entidade com personalidade jurídica própria, á  qual é atribuída a titularidade da prestação daquele serviço.Esta entidade pode ser uma autarquia, uma empresa pública, uma sociedade de economia mista ou uma fundação pública.No caso de serviços prestados por entidades da administração indireta, diz-se que há outorga do serviço. A outorga será feita pela lei específica que crie ou autorize a criação da entidade;a lei, desde logo, enumera as competências da entidade que está sendo instituída , ou cuja criação está sendo autorizada.São exemplos de serviços descentralizados prestados pela administração indireta:o serviço de transporte ferroviário urbano prestado pela TRENSURB, empresa pública federal,o serviço postal prestado pela ECT, empresa pública federal,os serviços de abastecimento de água prestados por empresas públicas estaduais etc[....]A delegação consiste em transferir ao particular, sempre temporariamente, a incumbência de prestar, mediante remuneração, determinado serviço público. A titularidade do serviço, em qualquer hipótese, permanece sendo do Poder Público, que possui o poder dever de fiscalização da adequada prestação do serviço, podendo, sempre que verificada alguma falta, nele intervir de diversas formas, inclusive decretando a caducidade  da delegação, o que acarreta a reversão do serviço para ele, Poder Público.

Por último, eles enfatizam, nos seguintes termos:[17] 
“Em síntese, entendemos que as empresas públicas e sociedades de economia mista cuja criação tenha sido autorizada em lei para a prestação de determinado serviço público prestam-no como titulares;receberam da lei  o serviço, por outorga; não são, nem podem ser, concessionária ou permissionária desse mesmo serviço”

Assim, depois da contextualização doutrinária acerca dos meios e formas de prestação de serviços públicos, fica cristalino o entendimento de que as empresas públicas que prestam serviços por outorga, fazem às vezes do Estado nos termos outorgados por lei e, portanto, são regidas pelo direito público e gozam da imunidade recíproca, desse modo, suas rendas, serviços e patrimônio não sofrerão qualquer obstáculo tributário.
A imunidade recíproca para as empresas que prestam serviços públicos de prestação obrigatória e exclusiva do Estado, é reconhecida, pela doutrina e pelo Superior Tribunal de Federal(STF). Nesse sentido, no pensar de Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo, temos a seguinte contextualização para o §2° do art 150, da CRFB:[18]
“Em que pese à literalidade do citado §2° do art. 150-que alude, tão-somente, a autarquias e fundações públicas - nossa Corte Constitucional, em diversos julgados, decidiu que as empresas públicas e sociedades de economia mista que prestem serviços públicos de prestação obrigatória pelo Estado fazem jus á imunidade tributária recíproca. Essa orientação – algo surpreendente – reforçou sobremaneira a constatação de que as empresas públicas e sociedades de economia mista estão sujeitas a regimes jurídicos significativamente distintos, conforme o seu objeto.

Sem dúvidas, a imunidade recíproca para as empresas delegatárias(tem a outorga por lei) de serviços públicos, está em consonância com os anseios sociais, preceitos e princípios consagrados pela Carta Maior, visa prover a sociedade de serviços públicos essenciais e necessários.
Nessa esteira, a riqueza estatal está direcionada para atingir fins públicos, não pode os entes políticos embaraçar os objetivos uns dos outros com a exigência tributária, mesmo que a riqueza seja uma empresa que faça às vezes do Estado e integre o patrimônio deste. Desse modo, abrangida pela Imunidade recíproca está todas as empresas públicas e sociedade de economia mista prestadoras de serviços públicos obrigatórios.
A expressão teórica de Sant Anna,justifica a imunidade das delegatárias de serviços públicos, conforme se extrai das seguintes considerações:[19]
“Portanto, o fato de serem entes estatais já garante á imunidade recíproca a suas finalidades. Precisamente as dúvidas residem em quem estará executando o serviço, auferindo renda, ou constituindo patrimônio não for o ente político, mas entidades da administração indireta. Dessa forma, como se compreende bens como as coisas de propriedade pública e integrantes do serviço público, móveis e imóveis, corpóreos  ou não, inclusive complexos de coisas, como uma empresa ou um estabelecimento, se quer que a imunidade tenha exatamente esse alcance{......}Enfim, todos os meios de execuções operadas por essas pessoas , sob várias modalidades, para realização dos fins que a Constituição expressa ou implicitamente comete, serão abrangidas pela imunidade recíproca”.

Dessa arte,diante do fato de serem entes estatais e todas a ações estarem direcionadas para consecução dos fins públicos, oportuno destacar que mesmo que tais empresas ou sociedades de economia mistas, que tem a outorga para fazer as vezes do Estado, venham a prestarem algum outro serviço que tenha natureza econômica,não preponderante,autorizado em lei, não deverão sofrer qualquer embaraço tributário .A atividade preponderante é o serviços público, uma minoria de outros serviços não desqualifica a condição de outorgada e de imune.
Ora, se o texto Constitucional, no artigo 150,§3°, expressa que não se aplicam as vedações ao patrimônio, á renda e aos serviços, relacionados com a exploração de atividades econômicas regidas pelas normas aplicáveis a empreendimentos privados, logo, por meio de uma interpretação sistemática e sociológica, conclui-se que tem atividades econômicas regidas por normas aplicáveis a empreendimentos públicos, desse modo, para estas situações aplica-se a imunidade.
 Em outra ponta de explicação, a lei que outorga o serviço obrigatório, de modo a facilitar o ônus, também autoriza outros serviços, desse modo, são tais situações regidas pelo direito público, portanto, alcançadas pela imunidade recíproca. 
O ponto de vista expresso anteriormente beseia-se nas seguintes palavras do Carrazza:[20]
“Portanto, não é dado a uma pessoa política, por meio de impostos, criar embaraços ou anular a ação de outra. E esta vedação cobre a universalidade de seus bens, aí compreendidas as rendas advindas até mesmo de preços públicos, bastando que sejam carreadas para a realização dos objetivos que a Constituição lhe comete”

Por fim, a imunidade recíproca para as estatais prestadoras de serviços públicos, como exemplo a ECT, se justifica por vários motivos, dentre tantos, os que se segue:
a)      Não determinam livremente o valor da contraprestação, que é regulada por lei ou por ato do Poder executivo;
b)      A contraprestação não é suficiente, não há equilíbrio em muitas situações entre o custo da atuação estatal e o valor cobrado;
c)      Presta serviço por determinação constitucional ou por força de lei, portanto, um serviço obrigatório, trata-se de um ônus a ser cumprido com eficiência e continuidade; no caso da ECT, o ônus vai mais além, necessário uma prestação universal, em todos os cantos do Brasil;
d)     As exigências fiscais acabariam por mutilar em parte, a renda ou o patrimônio destas empresas, por conseqüência, criaria obstáculo ao cumprimento das atividades públicas essenciais, pelas quais estas empresas foram criadas;
e)      A imunidade recíproca para as estatais está em consonância ao principio da isonomia e do princípio fundamental do pacto federativo;
f)       Na prestação de serviços público as estatais são administração pública, estarão sujeita ao regime jurídico administrativo, dessa feita, tem as despesas fixadas, não gozam da flexibilidade dos particulares, não almejam lucro como estes.
g)        A prestação do serviço público visa à concretização de direitos fundamentais, no caso da ECT, o sigilo da correspondência e a comunicação;
h)      O serviço púbico tem por fundamento a dignidade da pessoa humana;
i)        O serviço público tem por foco a concretização de objetivos fundamentais, a saber: garantir o desenvolvimento nacional; redução das desigualdades sociais e regionais e promoção do bem de todos;
j)        No caso da ECT, a mesma goza da imunidade direta (da mesma forma que a União) e da indireta (aquela das autarquias e fundações instituídas e mantidas pelo poder público), nos termos do art. 12, do decreto lei 509/69.
Nessa ordem de idéias, a Empresas Brasileira de Correios e Telégrafos (EBCT), empresa pública, prestadora de serviços públicos postal, nos termos da lei 6538/78 e artigo 21, inciso X da Constituição Federal, por fazer às vezes do Estado, cujo capital pertence integralmente a União, está abrangida pela imunidade recíproca, conforme exposições do próximo capítulo.



[1]              COSTA. Regina Helena. Imunidades Tributárias: teoria e análise da jurisprudência do STF. São Paulo: Editora Malheiros, 2006, pg. 139

[2]        ROCHA, João Marcelo.Direito Tributário.Rio de Janeiro:Editora ferreira, 2009, pg.211
[3]              IBANÊZ.Andre Pereira.Imunidade Tributária Recíproca a Experiência do Direito Norte Americano.Porto Alegre:Livraria do Advogado,2010, pg.45
[4]              FILHO, Manoel Gonçalves Ferreira.Curso de Direito Constitucional.São Paulo:Editora Saraiva, 2007,pg.60 e 61.
[5]              IBANÊZ, André Pereira. Imunidade Tributária Recíproca a Experiência do Direito Norte americano. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2010,pg.46
[6]              CARRAZZA. Roque Antonio. A imunidade tributária das Empresas Estatais Delegatárias de Serviços Públicos. São Paulo: Editora Malheiros, 2004,pg.27.

[7]              IBANÊZ, André Pereira. Imunidade Tributária Recíproca a Experiência do Direito Norte americano. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2010,pg.47
[8]              PESTANA, Marcio. O Princípio da Imunidade Tributária.São Paulo:Editora revistas dos Tribunais,2001,pg.82

[9]              MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Editora Malheiros, 2010, pg. 121

[10]             MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Editora Malheiros, 2010, pg. 300

[11]             COSTA. Regina Helena. Imunidades Tributárias: teoria e análise da jurisprudência do STF. São Paulo: Editora Malheiros, 2006, pg. 115

[12]                    [12] MACHADO, Hugo de Brito.Op cit, pg. 121
[13]             LEOPOLDO,Ana Caroline Kruger de Lima.A Interpretação das Imunidades.Porto Alegre:Livraria do Advogado Editora, 2010,pg. 21

[14]         “Em regra, a interpretação da legislação tributária sobre isenção é restritiva, salvo quando, por construção sistêmica, tal critério não atenda aos princípios posto no ordenamento jurídico fiscal”( Recurso Especial N° 85.289\SP, realizado em 05\09\96, nos termos do voto do Ministro José Delgado, relator).


[15]             ALEXANDRINO, Marcelo e PAULO,Vicente.Direito Administrativo Descomplicado.São Paulo:Método, 2008,pg.78
[16]             ALEXANDRINO, Marcelo e PAULO,Vicente.Direito Administrativo Descomplicado.São Paulo:Método, 2008,pg. 572 e 573
[17]             ALEXANDRINO, Marcelo e PAULO,Vicente.Op cit, pg. 84
[18]             ALEXANDRINO, Marcelo e PAULO,Vicente.Direito Administrativo Descomplicado.São Paulo:Método, 2008,pg. 88
[19]             SANT`ANNA, Carlos Soares.Imunidade de Empresas Públicas Prestadoras de Serviços Públicos.São Paulo:MP Editora, 2005,pg 47.

[20]       CARRAZZA. Roque Antonio. A imunidade tributária das Empresas Estatais Delegatárias de Serviços Públicos. São Paulo: Editora Malheiros, 2004,pg 30.

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