A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) recebeu, por
maioria de votos, denúncia no Inquérito (INQ) 3564 contra o deputado
federal João Lyra (PSD/AL), administrador da Laginha Agro Industrial
S/A, que passará a responder a ação penal pela suposta prática dos
crimes previstos nos artigos 149 e 207 do Código Penal – redução a
condição análoga à de escravo e aliciamento de trabalhadores. Para o
relator do caso, ministro Ricardo Lewandowski, existe na denúncia lastro
probatório inicial a permitir a abertura da persecução penal.
Consta dos autos que fiscalização realizada em agosto de 2010 pelo
Grupo Especial de Fiscalização Rural no Setor Sucroalcooleiro do Estado
de Minas Gerais na empresa administrada pelo parlamentar encontrou
trabalhadores em condições degradantes. Falta de água potável, condições
de higiene e trabalho exaustivo foram relatados em depoimentos colhidos
pelos fiscais do Ministério do Trabalho, do Ministério Público e da
Polícia Federal. Os trabalhadores relataram que eram oriundos de estados
como Piauí, Maranhão e Alagoas, onde haviam sido aliciados para
trabalharem no corte de cana para a empresa Laginha, no interior do
Estado.
Escravos
Ao analisar o pedido de abertura de ação penal, o ministro
Lewandowski lembrou que o Plenário da Corte já analisou, no julgamento
do Inquérito 3412, o conceito moderno do crime de redução a condição
análoga à de escravo. O entendimento atual é de que não existe mais a
figura dos grilhões, não há mais feitores armados. O que pesa hoje para
configurar esse delito é que o trabalhador viva em condições de trabalho
exaustivas, degradantes e indignas. Já não é mais necessário o uso da
força física, frisou o ministro.
Nesse sentido, o relator revelou que os depoimentos colhidos no
local, bem como as fotos juntadas aos autos, mostram falta de água
filtrada e fresca para os trabalhadores, alojamentos sem ventilação, sem
forro na cobertura, instalações sanitárias precárias, camas e colchões
inadequados, inadequação dos locais para alimentação, falta de
sanitários no local de trabalho e instalações elétricas improvisadas,
entre outros.
Além disso, os trabalhadores eram submetidos a jornadas exaustivas de
trabalho, sem intervalo, e acabavam comprometendo todos seus recursos
com pagamento de aluguel, água e alimentação, não sobrando dinheiro
sequer para tentar voltar para seus municípios de origem.
Para o ministro, os fatos narrados na denúncia amoldam-se, em princípio, ao disposto no artigo 149 do Código Penal.
Aliciamento
Quando ao crime de aliciamento, o relator disse que a denúncia narra
que os trabalhadores seriam trazidos de estados com Piauí, Maranhão e
Alagoas a mando de João Lyra. Depoimentos mostram que os trabalhadores
foram transportados em ônibus clandestinos, pagaram transporte e
alimentação durante a viagem, e que quando chegaram ao destino, tiveram
que dormir no chão até que pudessem adquirir colchões.
Diante desses fatos, o ministro entendeu presentes indícios do crime
previsto no artigo 207 do CP e votou pelo recebimento da denúncia quanto
a esse ponto.
O ministro Gilmar Mendes divergiu na votação quanto à abertura de ação penal por esses dois delitos.
Fraude
Apenas a denúncia pelo suposto crime de fraude a direitos
trabalhistas (artigo 203 do CP) não foi recebida. Isso porque, de acordo
com o relator, o delito teria sido alcançado pela prescrição ainda em
2012, antes mesmo de o processo chegar ao STF.
MB/EH
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