Corte Especial
DIREITO
CIVIL. METODOLOGIA DE FIXAÇÃO DE DANOS MORAIS DEVIDOS A PARENTES DE
VÍTIMAS DE DANO MORTE NA HIPÓTESE DE NÚCLEOS FAMILIARES COM DIFERENTE
NÚMERO DE MEMBROS.
Na
fixação do valor da reparação pelos danos morais sofridos por parentes
de vítimas mortas em um mesmo evento, não deve ser estipulada de forma
global a mesma quantia
reparatória para cada grupo familiar se, diante do fato de uma vítima
ter mais parentes que outra, for conferido tratamento desigual a lesados
que se encontrem em idêntica situação de abalo psíquico, devendo,
nessa situação, ser adotada metodologia de arbitramento que leve em
consideração a situação individual de cada parente de cada vítima do
dano morte. Na atual sistemática constitucional, o
conceito de dano moral deve levar em consideração, eminentemente, a
dignidade da pessoa humana – vértice valorativo e fundamental do Estado
Democrático de Direito – conferindo-se à lesão de natureza
extrapatrimonial dimensões mais amplas, em variadas perspectivas. Dentre
essas perspectivas, tem-se o caso específico de falecimento de um
parente próximo – como a morte do esposo, do companheiro ou do pai.
Nesse caso, o dano
experimentado pelo ofendido qualifica-se como dano psíquico, conceituado
como o distúrbio ou perturbação causado à pessoa através de sensações
anímicas desagradáveis, em que a pessoa
é atingida na sua parte interior, anímica ou psíquica, através de
inúmeras sensações dolorosas e importunantes, como, por exemplo, a
ansiedade, a angústia, o sofrimento, a tristeza, o vazio, o
medo, a insegurança, o desolamento e outros. A reparabilidade do dano
moral possui função meramente satisfatória, que objetiva a suavização de
um pesar, insuscetível de restituição ao
statu quo ante. A justa indenização, portanto, norteia-se por
um juízo de ponderação, formulado pelo julgador, entre a dor suportada
pelos familiares e a capacidade econômica de ambas as partes –
além da seleção de um critério substancialmente equânime. Nessa linha, a
fixação de valor reparatório global por núcleo familiar,
justificar-se-ia apenas se a todos os lesados que se
encontrem em idêntica situação fosse conferido igual tratamento. De
fato, não se mostra equânime a diferenciação do valor indenizatório tão
somente pelo fato de o núcleo familiar de uma
vítima do dano morte ser mais numeroso do que o de outra. Dessa forma,
deve ser adotada metodologia de arbitramento que leve em consideração a
situação individual de cada lesado e, diante da inexistência de
elementos concretos, atrelados a laços familiares ou afetivos, que
fundamentem a discriminação entre os familiares das vítimas, deve ser
fixado idêntico valor de reparação para cada familiar lesado.
EREsp 1.127.913-RS, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 4/6/2014 (Vide Informativo n.
505).
Primeira Seção
SÚMULA n. 514
A
CEF é responsável pelo fornecimento dos extratos das contas
individualizadas vinculadas ao FGTS dos Trabalhadores participantes do
Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, inclusive para fins de
exibição em juízo, independentemente do período em discussão.
SÚMULA n. 515
A reunião de execuções fiscais contra o mesmo devedor constitui faculdade do Juiz.
Segunda Seção
DIREITO
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. TERMO INICIAL DA PRESCRIÇÃO NAS DEMANDAS POR
INDENIZAÇÃO DO SEGURO DPVAT NOS CASOS DE INVALIDEZ PERMANENTE DA VÍTIMA.
RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ).
No
que diz respeito ao termo inicial do prazo prescricional nas demandas
por indenização do seguro DPVAT que envolvem invalidez permanente da
vítima: a) o termo inicial do prazo prescricional é a
data em que o segurado teve ciência inequívoca do caráter permanente da
invalidez; e b) exceto nos casos de invalidez permanente notória, a
ciência inequívoca do caráter permanente da invalidez depende de
laudo médico, sendo relativa a presunção de ciência. Sobre o
tema em análise, o STJ editou a Súmula 278, segundo a qual “O termo
inicial do prazo prescricional, na ação de
indenização, é a data em que o segurado teve ciência inequívoca da
incapacidade laboral”. Com o advento desse enunciado, sepultou-se o
entendimento de que o termo inicial da prescrição seria sempre a
data do acidente, independentemente do tipo de lesão. Persiste, porém,
controvérsia no que se refere à necessidade, ou não, de um laudo médico
para que a vítima do acidente (beneficiária do seguro)
tenha ciência inequívoca da invalidez permanente (total ou parcial).
Essa controvérsia tem gerado três entendimentos jurisprudenciais
diversos. O primeiro considera que a invalidez permanente depende de uma
declaração médica, sem a qual não há como presumir a ciência da vítima.
No segundo há uma ligeira mitigação do primeiro, pois se aceita a
presunção de ciência
inequívoca, independentemente de laudo médico, mas somente nas hipóteses
em que a invalidez é notória, como nos casos de amputação de membro. O
laudo médico, nesses casos, serviria mais para aferir
o grau de invalidez, do que para constatá-la. Interessante destacar que o
fato de a invalidez permanente ser uma consequência imediata do
acidente, não implica, necessariamente, ciência inequívoca da vítima. A
perda do baço, por exemplo, somente chegará ao conhecimento de uma
vítima leiga em Medicina se essa informação lhe for prestada por um
médico. Nesses casos, ainda que a lesão seja imediata, a
ciência da vítima só ocorrerá em momento posterior. Voltando às teses
acerca da ciência da invalidez, o terceiro entendimento admite que essa
ciência possa ser presumida, conforme as circunstâncias do
caso. Colhe-se da jurisprudência do STJ, por exemplo, julgado no qual o
Tribunal de origem entendeu que o longo decurso de tempo entre o
acidente e a data do laudo, além da não submissão das vítimas a
tratamento,
permite que se presuma a ciência da invalidez. Posto isso, cumpre
verificar o enquadramento dos entendimentos jurisprudenciais acima
delineados nas hipóteses do art. 334 do CPC, transcrito a seguir: “Não
dependem de prova os
fatos: I - notórios; II - afirmados por uma parte e confessados pela
parte contrária; III - admitidos, no processo, como incontroversos; IV -
em cujo favor milita presunção legal de existência ou de veracidade”. O
primeiro entendimento, que exige um laudo médico para que se considere a
ciência inequívoca da vítima, está de acordo com esse dispositivo legal
(a contrario sensu), pois o laudo médico é uma
prova documental. O segundo entendimento também está de acordo, pois o
caráter permanente da invalidez em hipóteses como amputação de membro
constitui fato notório para a vítima, enquadrando-se no
inciso I, supra. O terceiro entendimento, contudo, parece afrontar o
disposto no art. 334 do CPC, por não haver norma legal que autorize o
julgador a presumir a ciência da invalidez a partir de circunstâncias
fáticas como o
decurso do tempo, a não submissão a tratamento ou a interrupção deste.
Essa questão deve ser contextualizada à realidade brasileira em que a
maioria das vítimas se submetem a tratamento médico
e fisioterápico custeado pelo SUS (Sistema Único de Saúde), que
sabidamente é bastante demorado nesses casos em que não há mais risco de
vida. Desse modo, o fato de a vítima não persistir no
tratamento iniciado, não pode ser utilizado para fulminar seu direito à
indenização, se não há previsão legal nesse sentido. Há de se ressaltar,
ademais, que por mais que as vítimas sintam a
redução em sua capacidade laboral ao longo dos anos, esse fato não é
suficiente para autorizá-las a pleitear a indenização, pois a legislação
do DPVAT exige mais do que mera incapacidade
laboral, exige invalidez “permanente”. E esse caráter permanente da
invalidez é inalcançável ao leigo em Medicina. Para se afirmar que uma
lesão é permanente, ou seja, sem perspectiva
terapêutica, é necessário concluir pela inviabilidade de qualquer dos
tratamentos disponíveis, o que não é possível sem conhecimentos médicos.
Frise-se que não se pode confundir ciência
da lesão (ou da incapacidade) com ciência do caráter permanente da
invalidez, pois esta última só é possível com auxílio médico. De outra
parte, cabe refletir sobre a possibilidade de
manipulação do prazo prescricional por parte da vítima. Há a preocupação
de que a vítima, depois de transcorrido o prazo prescricional, obtenha
um novo laudo médico e ajuíze a
ação, omitindo, por má-fé, a existência de um laudo médico mais antigo.
Entretanto, cabe frisar que, no Direito brasileiro, a má-fé não pode ser
presumida. Então, caso a seguradora
desconfie dessa manipulação do prazo prescricional, cabe-lhe diligenciar
junto ao IML para saber se a vítima submeteu-se, ou não, a exame médico
em data anterior. Do contrário, há de prevalecer, como
termo inicial da prescrição, a data indicada no laudo médico apresentado
pela vítima. REsp
1.388.030-MG, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 11/6/2014.
DIREITO
PROCESSUAL CIVIL. LEGITIMIDADE E COISA JULGADA EM EXECUÇÃO INDIVIDUAL
DE SENTENÇA COLETIVA QUE JULGOU QUESTÃO REFERENTE A EXPURGOS
INFLACIONÁRIOS SOBRE CADERNETAS DE POUPANÇA. RECURSO REPETITIVO (ART.
543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ).
A
sentença proferida pelo Juízo da 12ª Vara Cível da Circunscrição
Especial Judiciária de Brasília-DF, na ação civil coletiva n.
1998.01.1.016798-9, que
condenou o Banco do Brasil ao pagamento de diferenças decorrentes de
expurgos inflacionários sobre cadernetas de poupança ocorridos em
janeiro de 1989 (Plano Verão), é aplicável, por força da coisa
julgada, indistintamente a todos os detentores de caderneta de poupança
do Banco do Brasil, independentemente de sua residência ou domicílio no
Distrito Federal, reconhecendo-se ao beneficiário o direito de ajuizar o
cumprimento individual da sentença coletiva no Juízo de seu domicílio ou
no Distrito Federal; os poupadores ou seus sucessores detêm
legitimidade ativa – também por força da coisa julgada –,
independentemente de fazerem parte ou não dos quadros associativos do
IDEC, de ajuizarem o cumprimento individual da sentença coletiva
proferida na ação civil pública n. 1998.01.1.016798-9, pelo Juízo da
12ª Vara Cível da Circunscrição Especial Judiciária de Brasília-DF. Inicialmente,
é oportuno elucidar que o Instituto de Defesa do Consumidor – IDEC
ajuizou ação coletiva contra
o Banco do Brasil, a qual foi distribuída à 19ª Vara Cível do Fórum
Central da Comarca de São Paulo. Acolhendo exceção de incompetência
aforada pelo próprio Banco do Brasil, ao
fundamento de que “o objetivo do IDEC é obter uma única sentença,
permitindo a todos o recebimento dos índices expurgados da poupança, sem
que cada um dos poupadores tenha que promover sua demanda
individualmente”, o Poder Judiciário do Estado de São Paulo concluiu que
a ação deveria ter sido proposta na sede do Banco do Brasil, situado no
Distrito Federal, em razão de abranger toda uma coletividade de
âmbito nacional. O Juízo da 12ª Vara Cível da Circunscrição Especial
Judiciária de Brasília, ao qual foi redistribuída a ação coletiva,
proferiu sentença, rejeitando a
preliminar de inépcia da inicial, arguida sob o fundamento de não ter
sido delimitada a abrangência da ação, reconheceu o âmbito nacional da
demanda e o efeito erga omnes da ação,
confirmando a competência da Justiça do Distrito Federal para o
processamento do feito. Julgado o mérito da causa, o Banco do Brasil foi
condenado, de forma genérica, observado o art. 95 do CDC, a incluir o
índice de
48,16% no cálculo do reajuste dos valores depositados nas contas de
poupança mantidos em janeiro de 1989, até o advento da MP 32/1989, tudo a
ser apurado em liquidação de sentença. A referida sentença foi
integralmente confirmada pelas instâncias superiores, a despeito da
irresignação recursal do Banco do Brasil para restringir os feitos da
sentença aos limites da competência territorial, conforme a
interpretação do art. 16 da Lei da Ação Civil Pública. Destaque-se que a
sentença é clara ao afirmar a sua abrangência nacional e o efeito erga omnes, assertiva
que não perde a sua
força dispositiva em razão de estar formalmente situada no âmbito da
parte da sentença destinada à fundamentação, sem ter sido formalmente
reproduzida no dispositivo. Nesse passo, pode-se afirmar que
não cabe restringir os efeitos subjetivos da sentença após o trânsito em
julgado se na ação civil pública foi pedida eficácia nacional da
sentença a ser proferida – motivo esse da
declinação da competência da Justiça Paulista para a do Distrito Federal
– e se tais razões foram expressamente acolhidas pelo juízo de primeiro
grau e confirmadas pelas instâncias superiores,
rejeitando-se o pleito de limitação dos efeitos da sentença ao
território do Distrito Federal, deduzido precisamente com base no art.
16 (REsp 1.348.425-DF, Quarta Turma, DJe 24/5/2013). Convém ressaltar
que a doutrina
preceitua ser a coisa julgada um pressuposto negativo endereçado ao juiz
do processo futuro – que deve exercer o seu poder-dever de abstenção,
sem exercer qualquer juízo de valor acerca da sentença –, pois
inclui sob o manto da intangibilidade pan-processual tanto as questões
deduzidas como as que poderiam tê-lo sido. Por isso, no plano coletivo,
aproxima-se a coisa julgada de uma norma legal e traz embutida ou
pressuposta a exegese feita
judicialmente, já definida quanto aos seus campos subjetivo e objetivo
de aplicação. Ademais, da leitura das decisões que foram prolatadas na
ação coletiva, fica nítido que o provimento jurisdicional deve
contemplar todos aqueles que mantinham conta de poupança com o Banco do
Brasil, e não apenas aqueles poupadores vinculados ao IDEC. Portanto,
não há dúvida de que a sentença prolatada na ação
coletiva fixou o índice expurgado e abrangeu, indistintamente, todos
aqueles que mantinham conta de poupança com o Banco, em janeiro de 1989
(Plano Verão). Esclareça-se que, existindo coisa julgada material, só
mediante ações autônomas de impugnação – ação rescisória ou querela nullitatis insanabilis –, com amplo contraditório e participação como parte do
substituto processual que manejou a ação coletiva, se poderia cogitar sua desconstituição. REsp
1.391.198-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 13/8/2014.
Terceira Seção
DIREITO
PROCESSUAL PENAL MILITAR. COMPETÊNCIA PARA JULGAMENTO DE CRIME DE
DESACATO CONTRA MILITAR QUE ESTEJA REALIZANDO POLICIAMENTO NAVAL.
Compete
à Justiça Militar da União processar e julgar ação penal promovida
contra civil que tenha cometido crime de desacato contra militar da
Marinha do Brasil em atividade de patrulhamento
naval. Nos termos do art. 9º, III, “d”, do CPM, considera-se
crime militar, em tempo de paz, os delitos praticados por civil, ainda
que fora do lugar sujeito à administração militar, contra militar em
função de natureza militar, ou no desempenho de serviço de vigilância,
garantia e preservação da ordem pública, administrativa ou judiciária,
quando legalmente requisitado para aquele fim, ou em
obediência a determinação legal superior. A função militar é atribuição
específica conferida por lei ao militar, como integrante das forças
armadas, exercitadas com
características próprias da instituição militar, sobrelevando-se o poder
legal conferido à autoridade militar. Vale destacar que, segundo a
doutrina, a CF e a legislação infraconstitucional não
fazem distinção entre as atribuições primárias e subsidiárias na
definição da competência da justiça militar. Nesse contexto, deve-se
reconhecer como militar o crime praticado por
civil contra militar no exercício das funções que lhe foram legalmente
atribuídas, seja ela de caráter subsidiário ou não. CC 130.996-PA, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 12/2/2014.
Primeira Turma
DIREITO TRIBUTÁRIO. DEMORA INJUSTIFICADA DA ADMINISTRAÇÃO NA CONCESSÃO DO BENEFÍCIO DE EX-TARIFÁRIO.
A concessão do benefício de ex-tarifário alcança a importação realizada entre o pedido do referido benefício fiscal e a sua efetiva concessão,
se a administração fazendária demorar injustificadamente a analisar e conceder o benefício. A concessão do benefício fiscal denominado ex-tarifário
consiste na isenção ou
redução de alíquota do imposto de importação, a critério da
administração fazendária, para o produto desprovido de similar nacional,
sob a condição de comprovação
dos requisitos pertinentes. Sobre o referido benefício cabe uma
interpretação sistemática e a incidência do princípio da razoabilidade. É
certo que a autorização de desembaraço
aduaneiro com suspensão de tributos constitui ato discricionário do
Ministro de Estado da Fazenda (art. 12 do Decreto-Lei 2.472/1988),
sujeito, portanto, a juízo de oportunidade e conveniência. Porém, a
injustificada
demora da Administração na análise do pedido de concessão de regime ex-tarifário,
por se tratar de importação de mercadoria sem similar nacional, somente
concluída após a
internação do bem, não pode prejudicar o contribuinte que atuou com
prudente antecedência, sob pena de flagrante e direta ofensa ao
princípio da razoabilidade. Assim, deve-se assegurar ao requerente a
redução de alíquota do imposto de importação, nos termos da legislação
de regência. Não haveria lógica em entender de modo diferente, pois
acarretaria a situação de o
requerente, apesar de iniciar o procedimento para concessão do benefício
fiscal, apresentar os documentos exigidos e preencher todos os
requisitos necessários, não se beneficiar do ex-tarifário, mas somente
abrir portas para que seus concorrentes paguem o imposto de importação com a alíquota reduzida. REsp
1.174.811-SP, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, julgado em 18/2/2014.
Segunda Turma
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADES CONCOMITANTES PRESTADAS SOB O RGPS E PRINCÍPIO DA UNICIDADE DE FILIAÇÃO.
O
segurado que manteve dois vínculos concomitantes com o RGPS – um na
condição de contribuinte individual e outro como empregado público –
pode utilizar as contribuições
efetivadas como contribuinte individual na concessão de aposentadoria
junto ao RGPS, sem prejuízo do cômputo do tempo como empregado público
para a concessão de aposentadoria sujeita ao Regime Próprio, diante da
transformação do emprego público em cargo público. De fato, o
contribuinte possuía dois vínculos com o Regime Geral, um na condição de
contribuinte individual e outro como empregado
público, regido pela CLT. Entretanto, o tempo de serviço e as
contribuições recolhidas na condição de contribuinte individual não se
confundem com o vínculo empregatício mantido como
servidor público. Assim, não há óbice para utilizar o tempo prestado ao
estado no regime celetista para fins de aposentadoria estatutária e as
contribuições como contribuinte individual na
concessão da aposentadoria previdenciária por tempo de contribuição, não
havendo falar em violação ao princípio da unicidade de filiação.
Ademais, o art. 96 da Lei 8.213/1991 veda
apenas que o mesmo lapso temporal, durante o qual o segurado exerceu
simultaneamente uma atividade privada e outra sujeita a regime próprio
de previdência, seja computado em duplicidade, o que não é o caso, pois
não
há contagem em duplicidade, uma é decorrente da contratação celetista, e
outra da condição de contribuinte individual. AgRg no REsp 1.444.003-RS, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 8/5/2014.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. DIGITALIZAÇÃO DOS AUTOS E GUARDA PESSOAL DE DOCUMENTOS.
Não
pode ato infralegal (resolução de Tribunal) impor à parte autora o
dever de providenciar a digitalização das peças dos autos, tampouco o
dever de guarda pessoal de alguns
dos documentos físicos do processo, ainda que os autos sejam
provenientes de outro juízo ou instância. Dispõe o § 5º do art.
12 da Lei 11.419/2006 que “A digitalização de autos em
mídia não digital, em tramitação ou já arquivados, será precedida de
publicação de editais de intimações ou da intimação pessoal das partes e
de seus procuradores, para
que, no prazo preclusivo de 30 (trinta) dias, se manifestem sobre o
desejo de manterem pessoalmente a guarda de algum dos documentos
originais.” Ademais, o mesmo diploma legal estabelece em seu art. 18 que
“Os órgãos do Poder
Judiciário regulamentarão esta Lei, no que couber, no âmbito de suas
respectivas competências.” Por sua vez, o TRF-4ª Região regulamentou a
matéria por meio da Resolução 17/2010, art. 17,
§ 2º: “No juízo competente, a parte autora será intimada para retirar os
autos físicos em 30 (trinta) dias, e providenciar a digitalização,
ficando responsável pela guarda dos documentos.”
Conforme se verifica, a lei concede às partes e/ou aos seus procuradores
a faculdade de exercerem a opção pela guarda pessoal de algum dos
documentos originais dos autos físicos. O que a lei previu como
faculdade, o ato
infralegal do TRF transformou em dever processual. A circunstância de o
art. 18 da lei em tela delegar em favor do Judiciário o poder de
regulamentá-la naturalmente não consubstancia autorização para criar
obrigações não previstas na lei (que em momento algum impõe à parte
autora o dever de providenciar a digitalização dos autos remetidos por
outro juízo e de conservar em sua guarda as peças
originais). REsp 1.448.424-RS, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 22/5/2014 (Vide Informativo n. 524).
DIREITO PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. HIPÓTESE DE NÃO SUJEIÇÃO DE SENTENÇA A REEXAME NECESSÁRIO.
Não
se sujeita ao reexame necessário, ainda que a Fazenda Pública tenha
sido condenada a pagar honorários advocatícios, a sentença que extinguiu
execução fiscal em
razão do acolhimento de exceção de pré-executividade pela qual se
demonstrara o cancelamento, pelo Fisco, da inscrição em dívida ativa que
lastreava a execução. Em
relação à dívida ativa da Fazenda Pública, a lei somente prevê a remessa
oficial em caso de sentença de procedência nos respectivos embargos do
devedor (art. 475, II, do CPC). O CPC nada dispôs
sobre o instituto do reexame necessário na hipótese do decisum
que acolhe exceção de pré-executividade, tendo em vista tratar-se esse
meio impugnativo de criação jurisprudencial. Se a
matéria suscitada em exceção de pré-executividade fosse ventilada em
embargos do devedor, o acolhimento do pedido, contra a argumentação
fazendária, acarretaria a incidência do art. 475 do CPC. Por
coerência, se a extinção da execução fiscal decorrer de acolhimento de
exceção de pré-executividade, o reexame necessário somente deverá ser
afastado na hipótese em que a
Fazenda Pública, intimada para se manifestar sobre a referida objeção
processual, a ela expressamente anuiu. Já a condenação ao pagamento dos
encargos de sucumbência, por si só, não enseja a
aplicação do art. 475 do CPC. A imposição do dever de pagamento dos
honorários advocatícios possui natureza condenatória, mas reflete mera
decorrência da derrota da parte, de modo que, se se
entender que representa, por si, hipótese sujeita ao disposto no art.
475 do CPC, o procedimento da submissão ao duplo grau de jurisdição
constituirá regra aplicável em qualquer hipótese, isto é,
nos casos de julgamento com ou sem resolução do mérito, conclusão
inadmissível. Dessa forma, somente a condenação ao pagamento dos
honorários que tenha por fonte causadora a derrota da Fazenda
Pública em relação ao conteúdo da exceção de pré-Executividade é que
estará sujeita ao reexame necessário (aplicação, por analogia, da Súmula
325 do STJ). Caso a
execução fiscal seja encerrada por força do cancelamento da CDA (art. 26
da Lei 6.830/1980), seja este motivado por reconhecimento expresso da
Fazenda Pública quanto à procedência das alegações
lançadas na objeção pré-executiva, seja por iniciativa de ofício do
Fisco, o cabimento em si da condenação ao pagamento de verba honorária,
ou a discussão quanto ao seu montante, somente
poderá ser debatido por meio de recurso voluntário, não incidindo o art.
475, I, do CPC. REsp
1.415.603-CE, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 22/5/2014.
DIREITO TRIBUTÁRIO. PERIODICIDADE DE MULTA POR ATRASO NA ENTREGA DA DIMOF.
A
multa pela entrega tardia da Declaração de Informações sobre
Movimentação Financeira (Dimof) incide a cada mês de atraso – e não por
declaração
atrasada. Conforme os arts. 57 da MP 2.158-34/2001 e 4º e 7º da
Instrução Normativa 811/2008 da Secretaria da Receita Federal, a não
apresentação da Dimof até o último dia útil
do mês gera multa de R$ 5 mil por mês-calendário de atraso. Isto
significa a aplicação de uma multa de R$ 5 mil que se acumula com
periodicidade mensal, e não a cada 30 dias. A óbvia intenção
do legislador é a de forçar a entrega da declaração o quanto antes,
cominando multa que é majorada a cada mês – para cada mês de atraso
soma-se uma nova multa – e não a de fixar uma multa
para cada conjunto de informações não apresentado – para cada semestre
uma multa. Precedentes citados: REsp. 1.216.930-PR, Segunda Turma, DJe
15/3/2011, REsp 1.136.705-RS, Primeira Turma, DJe 1º/7/2010, REsp
1.118.587-SC,
Primeira Turma, DJe 6/11/2009. REsp 1.442.343-RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em
6/5/2014.
DIREITO TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA SOBRE VERBAS REFERENTES À MIGRAÇÃO DE PLANO DE BENEFÍCIOS DE PREVIDÊNCIA PRIVADA.
Incide
IRPF sobre os valores recebidos como incentivo à adesão ao processo de
repactuação do regulamento do plano de benefícios de previdência
privada. Consoante entendimento
do STJ, constatada a mudança no regulamento do plano previdenciário, se a
verba paga como incentivo à migração para o novo regime tem por
objetivo compensar uma eventual paridade com os ativos, que foi perdida
pelos
inativos com a adesão às mudanças do regulamento do fundo de previdência
privada, bem como compensar uma eventual paridade com os inativos que
permaneceram no regime original, a toda evidência que se submete ao
mesmo regime das verbas a que visa substituir. Assim, se as verbas pagas
aos inativos que não migraram de plano submetem-se ao IRPF e as verbas
pagas aos ativos também sofrem a mesma incidência, não há motivos para
crer
que as verbas pagas aos inativos que migraram de plano devam escapar da
incidência do tributo. Essas novas verbas herdam a mesma natureza
daquelas que foram suprimidas sendo assim remuneratórias e sujeitas ao
imposto de renda. Precedente
citado: REsp 1.173.279-AM, Segunda Turma, DJe 23/5/2012. AgRg no REsp 1.439.516-PR, Rel. Min. Humberto Martins,
julgado em 6/5/2014.
Terceira Turma
DIREITO AMBIENTAL. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA POR DANO AMBIENTAL PRIVADO.
O
particular que deposite resíduos tóxicos em seu terreno, expondo-os a
céu aberto, em local onde, apesar da existência de cerca e de placas de
sinalização informando a presença
de material orgânico, o acesso de outros particulares seja fácil,
consentido e costumeiro, responde objetivamente pelos danos sofridos por
pessoa que, por conduta não dolosa, tenha sofrido, ao entrar na
propriedade, graves
queimaduras decorrentes de contato com os resíduos. A
responsabilidade civil por danos ambientais, seja por lesão ao meio
ambiente propriamente dito (dano ambiental público), seja por ofensa a
direitos individuais (dano
ambiental privado), é objetiva, fundada na teoria do risco integral, em
face do disposto no art. 14, § 1º, da Lei 6.938/1981, que consagra o
princípio do poluidor-pagador. A responsabilidade objetiva fundamenta-se
na
noção de risco social, que está implícito em determinadas atividades,
como a indústria, os meios de transporte de massa, as fontes de energia.
Assim, a responsabilidade objetiva, calcada na teoria do risco, é
uma imputação atribuída por lei a determinadas pessoas para ressarcirem
os danos provocados por atividades exercidas no seu interesse e sob seu
controle, sem que se proceda a qualquer indagação sobre o elemento
subjetivo da conduta do agente ou de seus prepostos, bastando a relação
de causalidade entre o dano sofrido pela vítima e a situação de risco
criada pelo agente. Imputa-se objetivamente a obrigação de
indenizar a quem conhece e domina a fonte de origem do risco, devendo,
em face do interesse social, responder pelas consequências lesivas da
sua atividade independente de culpa. Nesse sentido, a teoria do risco
como cláusula geral de
responsabilidade civil restou consagrada no enunciado normativo do
parágrafo único do art. 927 do CC, que assim dispôs: “Haverá obrigação
de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos
especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida
pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de
outrem”. A teoria do risco integral constitui uma modalidade extremada
da teoria do risco em que o nexo
causal é fortalecido de modo a não ser rompido pelo implemento das
causas que normalmente o abalariam (v.g. culpa da vítima; fato de
terceiro, força maior). Essa modalidade é excepcional, sendo fundamento
para
hipóteses legais em que o risco ensejado pela atividade econômica também
é extremado, como ocorre com o dano nuclear (art. 21, XXIII, “c”, da CF
e Lei 6.453/1977). O mesmo ocorre com o dano ambiental (art. 225,
caput e § 3º, da CF e art. 14, § 1º, da Lei 6.938/1981), em
face da crescente preocupação com o meio ambiente. Nesse mesmo sentido,
extrai-se da doutrina que, na responsabilidade civil pelo dano
ambiental,
não são aceitas as excludentes de fato de terceiro, de culpa da vítima,
de caso fortuito ou de força maior. Nesse contexto, a colocação de
placas no local indicando a presença de material orgânico
não é suficiente para excluir a responsabilidade civil. REsp 1.373.788-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso
Sanseverino, julgado em 6/5/2014.
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. ADJUDICAÇÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS DO HERDEIRO DEVEDOR DE ALIMENTOS.
É
possível a adjudicação em favor do alimentado dos direitos hereditários
do alimentante, penhorados no rosto dos autos do inventário, desde que
observado os interesses dos demais
herdeiros, nos termos dos arts. 1.793 a 1.795 do CC. De fato, o
herdeiro pode ceder fração ideal da herança que lhe caiba, de modo
gratuito ou oneroso, total ou parcialmente, inclusive em favor de
terceiros (arts. 1.793 a
1.795 do CC), salvo se houver restrição em contrário (cláusula de
inalienabilidade). Frise-se que, ante a natureza universal da herança,
essa transferência não pode ser de um ou alguns bens determinados do
acervo, senão da fração ideal que toca ao herdeiro. Nesse passo, como é
facultado ao herdeiro dispor de seu quinhão hereditário, não é razoável
afastar a possibilidade de ele ser
“forçado” a transferir seus direitos hereditários aos seus credores,
especialmente quando se tratar de crédito de natureza alimentar.
Esclareça-se que a adjudicação, como a arrematação
e os demais atos expropriatórios do processo executivo, visa à
satisfação do crédito, por meio da transferência do bem penhorado ao
patrimônio de outrem, com o objetivo de satisfazer o crédito.
Assim, se “o devedor responde, para o cumprimento de suas obrigações,
com todos os seus bens presentes e futuros, salvo as restrições
estabelecidas em lei” (art. 591 do CPC); se, desde a abertura da
sucessão, a herança incorpora-se ao patrimônio do herdeiro, como bem
imóvel indivisível; e, se a adjudicação de bem imóvel é uma técnica
legítima de pagamento, produzindo o
mesmo resultado esperado com a entrega de certa quantia; conclui-se que
os direitos hereditários do alimentante podem ser adjudicados para a
satisfação de crédito alimentar. À vista do exposto, não há
empecilho legal à adjudicação de direitos hereditários, nos termos do
art. 685-A do CPC, desde que igualmente observadas as regras previstas
nos arts. 1.793 a 1.795 do CC, de modo a preservar o interesse de outros
herdeiros
eventualmente existentes. REsp 1.330.165-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 13/5/2014.
DIREITO
DO CONSUMIDOR. VÍCIO DO PRODUTO DECORRENTE DA INCOMPATIBILIDADE ENTRE O
VEÍCULO ADQUIRIDO E A QUALIDADE DO COMBUSTÍVEL COMERCIALIZADO NO
BRASIL.
O consumidor pode exigir a restituição do valor pago em veículo projetado para uso off-road adquirido
no mercado nacional na hipótese em que for obrigado a retornar
à concessionária, recorrentemente por mais de 30 dias, para sanar panes
decorrentes da incompatibilidade, não informada no momento da compra,
entre a qualidade do combustível necessário ao adequado funcionamento do
veículo e a do combustível disponibilizado nos postos nacionais,
persistindo a obrigação de restituir ainda que o consumidor tenha
abastecido o veículo com combustível de baixa qualidade recomendado para
a
utilização em meio rural. De início, esclareça-se que, nos
termos do art. 18 do CDC, “Os fornecedores de produtos de consumo
duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos
vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou
inadequados ao consumo a que se destinam (...)”. Assim, se o veículo
funciona com determinado combustível e é vendido no Brasil, deve-se
considerar
como uso normal o seu abastecimento com quaisquer das variedades desse
combustível comercializadas em território nacional. Se apenas uma dessas
variedades se mostrasse compatível com o funcionamento adequado do
motor, ainda seria
possível cogitar na não configuração de vício do produto, se o
consumidor houvesse sido adequadamente informado, no momento da compra,
de que o automóvel apenas poderia ser abastecido com a variedade
específica em questão. Acrescente-se que, se apenas determinado
combustível vendido fora do País, pela sua qualidade superior, é
compatível com as especificações do fabricante do automóvel,
é de se concluir que a utilização de quaisquer das variantes de
combustível ofertadas no Brasil mostram-se igualmente
contra-recomendadas. Ademais, há de se ressaltar que, na situação em
análise, o
comportamento do consumidor foi absolutamente desinfluente. Isso porque a
causalidade concorrente não afasta a responsabilidade civil do
fornecedor diante da inegável existência de vício do produto. Posto
isso, salienta-se que
o art. 18, § 1º, do CDC dispõe que, “Não sendo o vício sanado no prazo
máximo de trinta dias, pode o consumidor exigir (...) a restituição
imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem
prejuízo de eventuais perdas e danos”. O vício do produto ocorre quando o
produto não se mostra adequado ao fim a que se destina, incompatível
com o uso a que se propõe. Nessa conjuntura, não é
possível afirmar que o veículo, após visitar a oficina pela primeira
vez, tenha retornado sem vício, pois reincidiu nas panes e sempre pelo
mesmo motivo. Dessa forma, ainda que o veículo tenha retornado da
oficina
funcionando e que cada ordem de serviço tenha sido cumprida em menos de
30 dias, o vício não estava expurgado. A propósito, há de se ressaltar
que o veículo em questão foi projetado para uso off-road.
Portanto, é de se admitir que houvesse uma razoável expectativa do
consumidor em utilizar, senão habitualmente, ao menos eventualmente, a
variedade de combustível disponível em meio rural. Isso corresponde,
afinal, ao uso normal que se pode fazer do produto adquirido, dada a sua
natureza e finalidade. Assim, é de admitir que o consumidor deveria ter
sido, pelo menos, informado de forma adequada, no momento da compra,
que o veículo não
poderia ser abastecido com combustível recomendado para a utilização em
meio rural. Essa era uma informação que poderia interferir decisivamente
na opção de compra do bem e não poderia, por isso,
ser omitida, sob pena de ofensa ao dever de ampla informação. REsp 1.443.268-DF, Rel. Min. Sidnei
Beneti, julgado em 3/6/2014.
DIREITO
DO CONSUMIDOR. DANO MORAL NO CASO DE VEÍCULO ZERO QUILÔMETRO QUE
RETORNA À CONCESSINÁRIA POR DIVERSAS VEZES PARA REPAROS.
É
cabível reparação por danos morais quando o consumidor de veículo
automotor zero quilômetro necessita retornar à concessionária por
diversas vezes para reparar defeitos
apresentados no veículo adquirido. Precedentes citados: REsp
1.395.285-SP, Terceira Turma, DJe 12/12/2013; AgRg no AREsp 60.866-RS,
Quarta Turma, DJe 1/2/2012; e AgRg no AREsp 76.980-RS, Quarta Turma, DJe
24/8/2012. REsp 1.443.268-DF, Rel. Min. Sidnei Beneti, julgado em 3/6/2014.
DIREITO
PROCESSUAL CIVIL E DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO. COMPETÊNCIA PARA
RECONHECIMENTO DE DIREITO A MEAÇÃO DE BENS LOCALIZADOS FORA DO BRASIL.
Em
ação de divórcio e partilha de bens de brasileiros, casados e
residentes no Brasil, a autoridade judiciária brasileira tem competência
para, reconhecendo o direito à
meação e a existência de bens situados no exterior, fazer incluir seus
valores na partilha. O Decreto-lei 4.657/1942 (Lei de
Introdução às normas do Direito Brasileiro) prevê, no art. 7º,
§ 4º, que o regime de bens, legal ou convencional, deve obedecer “à lei
do país em que tiverem os nubentes domicílio, e, se este for diverso, a
do primeiro domicílio conjugal”. E, no art. 9º, que,
para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que
se constituírem. As duas regras conduzem à aplicação da legislação
brasileira, estando diretamente voltadas ao
direito material vigente para a definição da boa partilha dos bens entre
os divorciantes. Para o cumprimento desse mister, impõe-se ao
magistrado, antes de tudo, a atenção ao direito material, que não
excepciona
bens existentes fora do Brasil, sejam eles móveis ou imóveis. Se fosse
diferente, para dificultar o reconhecimento de direito ao consorte ou
vilipendiar o que disposto na lei brasileira atinente ao regime de bens,
bastaria que os bens de
raiz e outros de relevante valor fossem adquiridos fora das fronteiras
nacionais, inviabilizando-se a aplicação da norma a determinar a
distribuição equânime do patrimônio adquirido na constância da
união. A exegese não afronta o art. 89 do CPC, pois esse dispositivo
legal disciplina a competência internacional exclusiva do Poder
Judiciário brasileiro para dispor acerca de bens imóveis situados no
Brasil e para
proceder a inventário e partilha de bens (móveis e imóveis) situados no
Brasil. Dele se extrai que a decisão estrangeira que viesse a dispor
sobre bens imóveis ou móveis (estes em sede de inventário e
partilha) mostrar-se-ia ineficaz no Brasil. O reconhecimento de direitos
e obrigações relativos ao casamento, com apoio em normas de direito
material a ordenar a divisão igualitária entre os cônjuges do patrimônio
adquirido na constância da união, não exige que os bens móveis e imóveis
existentes fora do Brasil sejam alcançados, pela Justiça Brasileira, a
um dos contendores, demanda apenas a
consideração dos seus valores para fins da propalada equalização. REsp 1.410.958-RS, Rel.
Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 22/4/2014.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. LEGITIMIDADE DE PESSOA JURÍDICA PARA IMPUGNAR DECISÃO QUE DESCONSIDERE A SUA PERSONALIDADE.
A
pessoa jurídica tem legitimidade para impugnar decisão interlocutória
que desconsidera sua personalidade para alcançar o patrimônio de seus
sócios ou administradores, desde que o
faça com o intuito de defender a sua regular administração e autonomia –
isto é, a proteção da sua personalidade –, sem se imiscuir indevidamente na esfera de direitos dos
sócios ou administradores incluídos no polo passivo por força da desconsideração. Segundo
o art. 50 do CC, verificado “abuso da personalidade jurídica”, poderá o
juiz decidir que os
efeitos de certas e determinadas relações obrigacionais sejam estendidos
aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.
O referido abuso, segundo a lei, caracteriza-se pelo desvio de
finalidade da
pessoa jurídica ou pela confusão patrimonial entre os bens dos
sócios/administradores com os da pessoa moral. A desconsideração da
personalidade jurídica, em essência, está adstrita à
concepção de moralidade, probidade, boa-fé a que submetem os sócios e
administradores na gestão e administração da pessoa jurídica. Vale
também destacar que, ainda que a
concepção de abuso nem sempre esteja relacionada a fraude, a sua figura
está, segundo a doutrina, eminentemente ligada a prejuízo, desconforto,
intranquilidade ou dissabor que tenha sido acarretado a terceiro, em
decorrência de um uso desmesurado de um determinado direito. A rigor,
portanto, a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica
resguarda interesses de credores e também da própria sociedade
indevidamente
manipulada. Por isso, inclusive, segundo o enunciado 285 da IV Jornada
de Direito Civil, “a teoria da desconsideração, prevista no art. 50 do
Código Civil, pode ser invocada pela pessoa jurídica em seu favor”.
Nesse compasso, tanto o interesse na desconsideração ou na manutenção do
véu protetor, podem partir da própria pessoa jurídica, desde que, à luz
dos requisitos autorizadores da medida excepcional,
esta seja capaz de demonstrar a pertinência de seu intuito, o qual deve
sempre estar relacionado à afirmação de sua autonomia, vale dizer, à
proteção de sua personalidade. REsp 1.421.464-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 24/4/2014.
Quarta Turma
DIREITO CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO APÓS A MIGRAÇÃO ENTRE PLANOS DE PREVIDÊNCIA PRIVADA.
Havendo transação
prevendo a migração de participante ou assistido para outro plano de
benefícios de previdência privada, em termos previamente aprovados pelo
órgão público fiscalizador, não há direito adquirido consistente na
invocação do regulamento do plano primitivo para revisão do benefício
complementar, sobretudo se, ao tempo da
transação, ainda não forem preenchidas todas as condições para a
implementação do benefício previsto no regulamento primitivo. Incialmente,
a doutrina esclarece que, com a
homologação da transação, há “destruição de toda a relação jurídica”,
por isso o “que persiste – no terreno do direito material – é a
transação, negócio jurídico”. Ademais, a teor do art. 1.026 do CC/1916
(correspondente ao art. 848 do CC/2002), sendo nula qualquer das
cláusulas da transação, nula será esta. Com efeito,
apenas mediante o ajuizamento de ação anulatória prevista no art. 486 do
CPC, voltada à desconstituição de atos processuais inquinados de
qualquer das nulidades estabelecidas nos arts. 145 e 147 do CC/1916
(similares aos arts. 166 e 171 do CC/2002), poderá o interessado obter a
revogação de quaisquer atos praticados no desenrolar de procedimento
judicial, bem como da sentença homologatória da transação. Uma
vez acolhido o pedido anulatório, produzir-se-á o exclusivo e específico
efeito de desfazer esse ato, a que corresponde a restituição do
interessado ao statu quo ante, ou seja, à situação
anterior à sua realização. Ademais, o STJ entende que a transação, com
observância das exigências legais, sem demonstração de qualquer vício, é
ato jurídico perfeito e
acabado, não podendo o simples arrependimento unilateral de uma das
partes dar ensejo à anulação do acordo (REsp 617.285-SC, Quarta Turma,
DJ 5/12/2005). Além do mais, quanto à possível
invocação do diploma consumerista, é de observar que “o ponto de partida
do CDC é a afirmação do Princípio da Vulnerabilidade do Consumidor,
mecanismo que visa a garantir igualdade formal-material
aos sujeitos da relação jurídica de consumo, o que não quer dizer
compactuar com exageros” (REsp 586.316-MG, Segunda Turma, DJe
19/3/2009). Com efeito, ainda que perfilhado o entendimento acerca da
incidência do
CDC, é bem de ver que suas regras, valores e princípios são voltados a
conferir equilíbrio às relações contratuais, de modo que, ainda que
fosse constatada alguma nulidade da transação,
evidentemente implicaria o retorno ao statu quo ante, não
podendo, em hipótese alguma, resultar em enriquecimento a qualquer das
partes. Noutro giro, a doutrina preceitua que a migração de planos de
benefícios
geridos pela mesma entidade fechada de previdência privada ocorre num
contexto de amplo redesenho da relação contratual previdenciária, com o
concurso de vontades do patrocinador, da entidade fechada de previdência
complementar, por meio de seu conselho deliberativo, e autorização
prévia da Previc (que sucedeu a Secretaria de Previdência Complementar,
no tocante à atribuição legal de fiscalização e
supervisão das entidades de previdência privada fechada). De mais a
mais, havendo a migração de plano de benefícios de previdência privada,
não há falar em invocação do
regulamento do plano de benefícios primitivo, vigente por ocasião da
adesão do participante à relação contratual. Na hipótese em foco, à luz
da ab-rogada Lei 6.435/1977 e da LC 109/2001,
verifica-se que a legislação de regência, visando ao resguardado do
equilíbrio financeiro e atuarial do plano de custeio, sempre previu a
possibilidade de alteração do regulamento do plano de benefícios,
inclusive dos valores das contribuições e benefícios. Por isso, a teor
do parágrafo único do art. 17 e do § 1º do art. 68, ambos da LC
109/2001, só há falar em direito adquirido na
ocasião em que o participante preenche todas as condições para o
recebimento do benefício, tornando-se elegível ao benefício. Além disso,
esses mesmos artigos dispõem expressamente que as
alterações processadas nos regulamentos dos planos de benefícios
aplicam-se a todos os participantes das entidades fechadas, a partir de
sua aprovação pelo órgão regulador e fiscalizador, só sendo
considerado direito adquirido do participante os benefícios, a partir da
implementação de todas as condições estabelecidas para elegibilidade
consignadas no regulamento do respectivo plano. REsp 1.172.929-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 10/6/2014.
DIREITO
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE DE DEVEDOR SOLIDÁRIO E
IMPOSSIBILIDADE DE SE EXCUTIR BENS DE TERCEIRO ESTRANHO À AÇÃO DE
CONHECIMENTO.
Os
bens de terceiro que, além de não estar incluído no rol do art. 592 do
CPC, não tenha figurado no polo passivo de ação de cobrança não podem
ser atingidos por medida
cautelar incidental de arresto, tampouco por futura execução, sob a
alegação de existência de solidariedade passiva na relação de direito
material. De fato, conforme o art. 275, caput e
parágrafo único, do CC, é faculdade do credor escolher a qual ou a quais
devedores direcionará a cobrança do débito comum, sendo certo que a
propositura da ação de conhecimento contra um deles
não implica a renúncia à solidariedade dos remanescentes, que permanecem
obrigados ao pagamento da dívida. Ressalte-se que essa norma é de
direito material, restringindo-se sua aplicação ao momento de
formação do processo cognitivo, quando, então, o credor pode incluir no
polo passivo da demanda todos, alguns ou um específico devedor. Sob essa
perspectiva, a sentença somente terá eficácia em
relação aos demandados, não alcançando aqueles que não participaram da
relação jurídica processual, nos termos do art. 472 do CPC e conforme a
jurisprudência do STJ (REsp 1.169.968-RS,
Terceira Turma, DJe 17/3/2014; e AgRg no AREsp 275.477-CE, Primeira
Turma, DJe 8/4/2014). Ademais, extrai-se o mesmo entendimento da norma
prevista no art. 568 do CPC que, enumerando os possíveis sujeitos
passivos na execução,
refere-se expressamente ao “devedor reconhecido como tal no título
executivo”; não havendo, nesse dispositivo, previsão alguma quanto ao
devedor solidário que não figure no título judicial.
Além disso, a responsabilidade solidária precisa ser declarada em
processo de conhecimento, sob pena de tornar-se impossível a execução do
devedor solidário, ressalvados os casos previstos no art. 592 do mesmo
diploma processual, que prevê a possibilidade de excussão de bem de
terceiro estranho à relação processual. Ante o exposto, não é possível,
em virtude de alegação quanto à
eventual existência de solidariedade passiva na relação de direito
material, atingir bens de terceiro estranho ao processo de cognição e
que não esteja incluído no rol do art. 592 do CPC. Aliás, em
alguma medida, esse entendimento está contido na Súmula 268 do STJ
(segundo a qual o “fiador que não integrou a relação processual na ação
de despejo não responde pela execução
do julgado”), a qual, mutatis mutandis, deve ser também aplicada ao devedor que não tenha sido incluído no polo passivo de ação de cobrança. REsp 1.423.083-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 6/5/2014.
DIREITO
EMPRESARIAL E PROCESSUAL CIVIL. IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DE
CRÉDITO PERTENCENTE À SOCIEDADE ANÔNIMA PARA GARANTIR OBRIGAÇÃO DE
SÓCIO.
Não
cabe bloqueio judicial de parte de crédito cobrado em execução judicial
movida por sociedade anônima contra terceiro, na hipótese em que a
decisão judicial que o determina
é proferida em sede de ação cautelar movida por ex-cônjuge em face do
outro ex-consorte, a fim de garantir àquele direito a ações da referida
sociedade anônima, quando a participação
acionária já se encontra assegurada por sentença com trânsito em julgado
proferida em ação de sobrepartilha de bens sonegados. De fato,
o reconhecimento posterior do direito à meação
de cônjuge em relação às ações sonegadas traz como consequência natural
apenas a possibilidade de assunção da condição de acionista da
companhia, posição essa que
não garante a ele, por si só, direito sobre créditos da pessoa jurídica
em face de terceiros. Isso porque nenhum acionista tem direito de
apossamento sobre créditos pertencentes à pessoa jurídica, a serem
recebidos em ação ajuizada por esta em face de terceiros. Ressalte-se
que, nos termos do que dispõe o art. 109, I, da Lei 6.404/1976 (Lei das
Sociedades Anônimas), o que se garante ao acionista é a
participação nos lucros sociais da companhia, participação essa que
ocorre com o recebimento de dividendos, quando, na forma e no percentual
estabelecidos pelo estatuto da sociedade. Aponte-se, ainda, que o
direito à
percepção dividendos é antecedido por procedimento de relativa
complexidade, o que, em princípio, impede que tal direito (o recebimento
de dividendos) seja decantado de forma singela de um crédito a ser
recebido pela
sociedade em ação própria ajuizada contra terceiros. Por outra ótica,
mesmo que se buscasse os dividendos recebidos pelo outro ex-consorte
relativamente às ações sonegadas, com mais razão o
conflito não diria respeito à pessoa jurídica, que efetivamente pagara
dividendos a quem figurava como acionista da companhia e não deu causa a
possíveis ilegalidades – devendo eventuais prejuízos serem
recompostos perante quem, eventualmente, recebeu de forma indevida os
dividendos. De resto, a própria Lei das Sociedades Anônimas traz as
formas de constituição de garantias incidentes sobre ações da companhia,
o
que, em princípio, seria suficiente ao acautelamento da eficácia da
decisão proferida na sobrepartilha, que é a averbação do gravame nos
livros próprios – livro “Registro de
Ações Nominativas” ou nos livros da instituição financeira –, como prevê
o art. 40, hipótese em que o direito de preferência sobre as ações
seria oponível contra terceiros.
Por outra linha de fundamentação, reconhecer a condição de acionista de
ex-cônjuge, com direito a parcela das ações da companhia, e
posteriormente determinar que o patrimônio da própria pessoa
jurídica suporte o pagamento dos valores equivalentes ao que teria
direito o acionista, implica reconhecer um direito de recesso ou
retirada não previsto em lei, mediante uma espécie de dissolução parcial
da sociedade,
no tocante às ações sonegadas, o que contraria a própria essência das
sociedades anônimas. Com efeito, a decisão que determinou à sociedade
anônima o pagamento, com patrimônio
próprio, dos valores a que faria jus o acionista em razão de ações de
que é titular, procedeu, a toda evidência, a uma autorização de retirada
ou recesso sem previsão legal, e isso tudo sem
observância dos procedimentos mínimos de apuração em balanço especial e
no bojo de ação na qual a pessoa jurídica não figurou como parte,
circunstância que denuncia a
extrapolação dos limites subjetivos da coisa julgada. REsp 1.179.342-GO, Rel. Min. Luis Felipe
Salomão, julgado em 27/5/2014.
Quinta Turma
DIREITO PENAL. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO E CONCEITO TÉCNICO DE ARMA DE FOGO.
Não
está caracterizado o crime de porte ilegal de arma de fogo quando o
instrumento apreendido sequer pode ser enquadrado no conceito técnico de
arma de fogo, por estar quebrado e, de acordo com laudo
pericial, totalmente inapto para realizar disparos. De fato,
tem-se como típica a conduta de portar arma de fogo sem autorização ou
em desconformidade com determinação legal ou regulamentar, por se tratar
de
delito de perigo abstrato, cujo bem jurídico protegido é a incolumidade
pública, independentemente da existência de qualquer resultado
naturalístico. Nesse passo, a classificação do crime de porte ilegal
de arma de fogo como de perigo abstrato traz, em seu arcabouço teórico, a
presunção, pelo próprio tipo penal, da probabilidade de vir a ocorrer
algum dano pelo mau uso da arma. Com isso, flagrado o agente portando um
objeto eleito como arma de fogo, temos um fato provado – o porte do
instrumento – e o nascimento de duas presunções, quais sejam, de que o
objeto é de fato arma de fogo, bem como tem potencial lesivo. No
entanto,
verificado por perícia que o estado atual do objeto apreendido não
viabiliza sequer a sua inclusão no conceito técnico de arma de fogo,
pois quebrado e, consequentemente, inapto para realização de disparo,
não há como caracterizar o fato como crime de porte ilegal de arma de
fogo. Nesse caso, tem-se, indubitavelmente, o rompimento da ligação
lógica entre o fato provado e as mencionadas presunções. AgRg no AREsp 397.473-DF, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 19/8/2014.
DIREITO PENAL. DESCUMPRIMENTO DE MEDIDA PROTETIVA DE URGÊNCIA PREVISTA NA LEI MARIA DA PENHA.
O
descumprimento de medida protetiva de urgência prevista na Lei Maria da
Penha (art. 22 da Lei 11.340/2006) não configura crime de desobediência
(art. 330 do CP). De fato, a jurisprudência do
STJ firmou o entendimento de que, para a configuração do crime de
desobediência, não basta apenas o não cumprimento de uma ordem judicial,
sendo indispensável que inexista a previsão de
sanção específica em caso de descumprimento (HC 115.504-SP, Sexta Turma,
Dje 9/2/2009). Desse modo, está evidenciada a atipicidade da conduta,
porque a legislação previu alternativas para que ocorra o efetivo
cumprimento das medidas protetivas de urgência, previstas na Lei Maria
da Penha, prevendo sanções de natureza civil, processual civil,
administrativa e processual penal. Precedentes citados: REsp
1.374.653-MG, Sexta Turma, DJe
2/4/2014; e AgRg no Resp 1.445.446-MS, Quinta Turma, DJe 6/6/2014. RHC 41.970-MG, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 7/8/2014
(Vide Informativo n. 538).
Sexta Turma
DIREITO PROCESSUAL PENAL. NULIDADE DE QUEIXA-CRIME POR VÍCIO DE REPRESENTAÇÃO.
É
nula a queixa-crime oferecida por advogado substabelecido com reserva
de direitos por procurador que recebera do querelante apenas os poderes
da cláusula ad judicia et extra –
poderes para o foro em geral –, ainda que ao instrumento de
substabelecimento tenha sido acrescido, pelo substabelecente, poderes
especiais para a propositura de ação penal privada. De acordo
com o art. 44 do CPP, a
“queixa poderá ser dada por procurador com poderes especiais, devendo
constar do instrumento do mandato o nome do querelante e a menção do
fato criminoso, salvo quando tais esclarecimentos dependerem de
diligências que
devem ser previamente requeridas no juízo criminal”. Posto
isso, cabe esclarecer que a procuração é o instrumento pelo qual uma
pessoa nomeia outra de sua confiança como seu representante
(procurador), para agir em seu nome em determinada situação. É a
procuração que define o conteúdo, os limites e a extensão do poder de
representação. O substabelecimento, por sua vez,
é um ato de transferência dos poderes outorgados na procuração inicial
para que terceira pessoa possa praticar os mesmos atos, ou seja, é o
repasse de poderes. Em decorrência, ainda que o substabelecimento esteja
inserido na cláusula ad judicia, há limites objetivos que devem
ser observados quando da transferência desses poderes. Ou seja, apenas
aqueles originariamente outorgados podem ser transferidos.
Consequentemente, não
podem ser ampliados pelo substabelecente, visto que este lida com
poderes e direitos de terceiros, e não próprios. Destarte, o mandatário
só pode substabelecer aqueles poderes que lhe foram constituídos pelo
outorgante
originário, não sendo possível falar em transferência, pelo mencionado
instrumento, daquilo que não recebeu. Nessa conjuntura, se a procuração
firmada pelo querelante somente conferir os poderes da
cláusula ad judicia et extra, apenas estes podem ser objeto de
transferência aos substabelecidos. Assim, deve ser tida por inexistente a
inclusão, ao substabelecer, de poderes especiais para a propositura de
ação penal privada, se eles não constavam do mandato originário.
Portanto, cabe reconhecer a nulidade da queixa-crime, por vício de
representação, tendo em vista que a procuração outorgada
para a sua propositura não atende às exigências do art. 44 do CPP. RHC 33.790-SP, Rel.
originário Min. Maria Thereza De Assis Moura, Rel. para Acórdão Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 27/6/2014.
DIREITO PROCESSUAL PENAL. POSSIBILIDADE DE SUBSTITUIÇÃO DE PRISÃO PREVENTIVA POR PRISÃO DOMICILIAR (ART. 318 DO CPP).
É
possível a substituição de prisão preventiva por prisão domiciliar,
quando demostrada a imprescindibilidade de cuidados especiais de pessoa
menor de 6 anos de idade (art. 318, III,
do CPP) e o decreto prisional não indicar peculiaridades concretas a
justificar a manutenção da segregação cautelar em estabelecimento
prisional. Na situação em análise,
não se mostra adequada a manutenção do encarceramento do paciente quando
presente um dos requisitos do art. 318 do CPP. Ademais, a prisão
domiciliar, na hipótese, revela-se adequada para garantir a ordem
pública, sobretudo por não haver, no decreto prisional, demonstração de
periculosidade concreta, a evidenciar que a cautela extrema seria a
única medida a tutelar a ordem pública. Além disso, a
substituição da prisão preventiva se justifica, por razões humanitárias,
além de ser útil e razoável como alternativa à prisão ad custodiam.
Ressalte-se a
posição central, em nosso ordenamento jurídico, da doutrina da proteção
integral e do princípio da prioridade absoluta, previstos no art. 227 da
CF, no ECA e, ainda, na Convenção Internacional dos
Direitos da Criança, ratificada pelo Decreto 99.710/1990. Portanto,
atendidos os requisitos legais e em nome da dignidade da pessoa humana,
bem como da proteção integral da criança, é possível substituir a
prisão preventiva do paciente por prisão domiciliar. HC 291.439-SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 22/5/2014.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Fale a verdade.