CORTE ESPECIAL
PROCESSO |
EREsp 1.698.526-SP, Rel. Min. Benedito Gonçalves,
Rel. Acd. Min. Maria Thereza de Assis Moura, Corte Especial, por
maioria, julgado em 05/02/2020, DJe 22/05/2020
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RAMO DO DIREITO | DIREITO PROCESSUAL CIVIL |
TEMA |
Convênio
OAB e Defensoria Pública. Honorários advocatícios. Execução nos
próprios autos. Possibilidade. Ação de conhecimento. Participação do
Estado. Irrelevância.
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DESTAQUE |
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Havendo
convênio entre a Defensoria Pública e a OAB possibilitando a atuação
dos causídicos quando não houver defensor público para a causa, os
honorários advocatícios podem ser executados nos próprios autos, mesmo
se o Estado não tiver participado da ação de conhecimento.
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INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR |
A
questão controvertida cinge-se a saber se é, ou não, possível a
execução, nos próprios autos de ação de alimentos, de honorários
advocatícios a serem suportados pelo Estado, porque arbitrados em favor
de advogado atuante na ação como defensor dativo da pessoa menor de
idade promovente, ainda que o Estado, na condição de responsável pelo
pagamento, não tenha participado da lide na fase de conhecimento.
O advogado, quando atua como defensor dativo, o faz porque na
localidade não há Defensoria Pública. Vale
dizer, nessas hipóteses, existe um convênio entre a Defensoria Pública e
a Ordem dos Advogados do Brasil, que possibilita a atuação dos
causídicos quando não houver defensor público para a causa,
mediante remuneração previamente estipulada em tabela.
Na
espécie, ao sentenciar, o magistrado arbitrou a verba honorária
conforme disposto na tabela do convênio.
Porém, o Estado pagou só uma parte e não se permitiu a execução do
montante restante nos autos da ação de alimentos, obrigando o advogado a
ajuizar ação ordinária para tanto.
Se o advogado atuou como defensor dativo, fazendo as vezes da
Defensoria Pública, tem o direito de receber e executar o valor que lhe
foi fixado pelo juiz na sentença proferida na causa. Caso
contrário, se houver a necessidade de ajuizamento de ação ordinária para
recebimento dos honorários, não vai ter advogado para assumir esse
papel da defensoria.
Com efeito, se tiver de promover uma ação específica contra a
Fazenda Pública, os advogados serão muito resistentes em aceitar a
função de advogado dativo, porque terão de trabalhar não
só na ação para a qual foram designados, mas também numa outra ação que
terão de propor contra a Fazenda Pública.
Assim,
o fato de o Estado
não ter participado da lide na ação de conhecimento não impede que ele
seja intimado a pagar os honorários, que são de sua responsabilidade em
razão de convênio celebrado entre a Defensoria
Pública e a Ordem dos Advogados do Brasil, em cumprimento de sentença.
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PRIMEIRA SEÇÃO
PROCESSO |
CC 147.746-SP, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho,
Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 27/05/2020, DJe
04/06/2020
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RAMO DO DIREITO | DIREITO PROCESSUAL CIVIL |
TEMA |
Alienação
judicial eletrônica. Bens em comarca diversa. Carta precatória para
realização dos atos. Desnecessidade. Simples acesso à internet. Competência do
juízo da execução.
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DESTAQUE |
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Compete ao juízo da execução realizar a alienação judicial eletrônica, ainda que o bem esteja situado em comarca diversa.
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INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR |
Os
procedimentos relativos à alienação judicial por meio eletrônico, na
forma preconizada pelo art. 882, § 1º, do Código Fux (CPC/2015), têm por
finalidade facilitar a participação dos licitantes, reduzir custos e
agilizar processos de execução, primando pelo atendimento dos princípios
da publicidade, da celeridade e da segurança.
Tal
modelo de leilão revela maior eficácia diante da inexistência de
fronteiras no ambiente virtual, permitindo que o leilão judicial alcance
um número incontável de
participantes em qualquer lugar do País, além de propiciar maior
divulgação, baratear o processo licitatório e ser infinitamente mais
célere em relação ao leilão presencial, rompendo
trâmites burocráticos e agilizando o processo de venda do bem objeto de
execução.
Aliás,
destaca-se que o Conselho Nacional de Justiça editou a
Resolução n. 236/2016, regulamentando os procedimentos relativos à
alienação judicial por meio eletrônico, dispondo, em seu art. 16, que os
bens penhorados serão oferecidos em site designado pelo
juízo da execução (art. 887, § 2º), com descrição detalhada e
preferencialmente por meio de recursos multimídia, para melhor aferição
de suas características e de seu estado de
conservação.
Logo,
cabe ao magistrado atentar para essa relevante alteração trazida pelo
novel estatuto processual, utilizando-se desse poderoso instrumento de
alienação judicial do bem penhorado em processo executivo, que tornou
inútil e obsoleto deprecar os atos de alienação dos bens para satisfação
do crédito, já que a alienação
pela rede mundial dispensa o comparecimento dos interessados no local da
hasta pública.
Portanto,
considerando que a alienação eletrônica permite ao interessado
participar do
procedimento mediante um acesso simples à internet, sem necessidade de
sua presença no local da hasta, tem-se por justificada a recusa do
cumprimento da carta precatória pelo Juízo deprecado, visto que não há
motivos para que a realização do ato de alienação judicial eletrônica
seja praticada em comarca diversa daquela do Juízo da Execução.
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SEGUNDA SEÇÃO
PROCESSO |
REsp 1.756.283-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão,
Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 11/03/2020, DJe
03/06/2020
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RAMO DO DIREITO | DIREITO CIVIL, DIREITO DO CONSUMIDOR |
TEMA |
Plano
de saúde ou seguro saúde. Reembolso de despesas médico-hospitalares
previstas em cláusula contratual. Prazo prescricional decenal.
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DESTAQUE |
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É
decenal o prazo prescricional aplicável ao exercício da pretensão de
reembolso de despesas médico-hospitalares alegadamente cobertas pelo
contrato de plano de
saúde (ou de seguro saúde), mas que não foram adimplidas pela operadora.
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INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR |
Inicialmente,
ressalta-se que, consoante a jurisprudência do STJ, não incide a
prescrição ânua própria das relações securitárias nas demandas
em que se discutem direitos oriundos de planos de saúde ou de seguros
saúde, dada a natureza sui generis desses contratos.
A
presente pretensão reparatória
também não se confunde com aquela voltada à repetição do indébito
decorrente da declaração de nulidade de cláusula contratual
(estipuladora de reajuste por faixa etária), que foi
debatida pela Segunda Seção, por ocasião do julgamento dos Recursos
Especiais 1.361.182/RS e 1.360.969/RS, que observaram o rito dos
repetitivos. Destaca-se que a ratio decidendi dos recursos
especiais citados teve como
parâmetros: (a) a revisão de cláusula contratual de plano ou de seguro
de assistência à saúde tida por abusiva, com a repetição do indébito dos
valores pagos (fatos relevantes da causa); e (b)
a consequência lógica do reconhecimento do caráter ilegal ou abusivo do
contrato é a perda da causa que legitimava o seu pagamento, dando ensejo
ao enriquecimento sem causa e direito à restituição dos
valores pagos indevidamente, e, como resultado, atrai a incidência do
prazo prescricional trienal previsto no art. 206, § 3º, IV, do Código
Civil de 2002 (motivos jurídicos determinantes que conduziram à
conclusão).
Assim,
em havendo pontos de fato e de direito que diferenciam o presente caso
da hipótese de incidência delineada nos recursos piloto, não há falar em
tipificação do comando normativo posto, devendo-se afastar, por
conseguinte, o prazo trienal com fundamento no enriquecimento sem causa.
De
outro lado, revela-se evidente que a
hipótese dos autos encontra-se mesmo compreendida pela exegese adotada
pela Segunda Seção e na Corte Especial, quando dos julgamentos dos EREsp
1.280.825/RJ e EResp 1.281.594/SP respectivamente, no sentido de que,
nas
controvérsias relacionadas à responsabilidade contratual, aplica-se a
regra geral (art. 205 do Código Civil de 2002) que prevê dez anos de
prazo prescricional.
Assim,
diante
da inexistência de norma prescricional específica que abranja o
exercício da pretensão de reembolso de despesas médico-hospitalares
supostamente cobertas pelo contrato de plano de saúde (que não se
confunde com a pretensão de ressarcimento de enriquecimento sem causa),
deve incidir a regra da prescrição decenal estabelecida no art. 205 do
Código Civil de 2002.
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PROCESSO |
Rcl 37.521-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Segunda
Seção, por unanimidade, julgado em 13/05/2020, DJe 05/06/2020
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RAMO DO DIREITO | DIREITO PROCESSUAL CIVIL |
TEMA |
Recusa
tácita ao fornecimento de material genético pelo herdeiro e por
terceiros. Adoção de medidas indutivas, coercitivas e mandamentais
contra o herdeiro. Art. 139, IV, CPC.
Possibilidade.
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DESTAQUE |
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O
juiz deve adotar todas as medidas indutivas, mandamentais e
coercitivas, como autoriza o art. 139, IV, do CPC, com vistas a refrear a
renitência de quem deve fornecer o material para exame de DNA,
especialmente quando a presunção contida na Súmula 301/STJ se revelar
insuficiente para resolver a controvérsia.
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INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR |
O
propósito da presente reclamação é definir se a sentença que extinguiu o
processo sem resolução de mérito, sob fundamento de que deveria ser
respeitada a coisa julgada formada em anterior ação investigatória de
paternidade, afrontou a autoridade de decisão proferida por esta Corte
na ocasião do julgamento do REsp 1.632.750/SP. Na referida decisão,
determinou-se a apuração de eventual fraude no exame de DNA realizado na
primeira ação investigatória e a realização de novo exame para a
apuração de eventual existência de
vínculo biológico entre as partes.
O
acórdão desta Corte concluiu que o documento apresentado pela parte
configurava prova indiciária da alegada fraude ocorrida em
anterior exame de DNA e, em razão disso, determinou a reabertura da fase
instrutória. Dessa forma, não pode a sentença, valendo-se apenas
daquele documento, extrair conclusão diversa, no sentido de não ser ele
suficiente para a comprovação da fraude, sob pena de afronta à
autoridade da decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça.
Determinado
pelo STJ que fosse
realizado novo exame de DNA para apuração da existência de vínculo
biológico entre as partes, não pode a sentença, somente com base na
ausência das pessoas que deveriam fornecer o material
biológico, concluir pelo restabelecimento da coisa julgada que se formou
na primeira ação investigatória (e que foi afastada por esta Corte),
tampouco concluir pela inaplicabilidade da presunção contida na
Súmula 301/STJ, sem que sejam empreendidas todas as providências
necessárias para a adequada e exauriente elucidação da matéria fática.
A
impossibilidade
de condução do investigado "debaixo de vara" para a coleta de material
genético necessário ao exame de DNA não implica a impossibilidade de
adoção das medidas indutivas, coercitivas e
mandamentais autorizadas pelo art. 139, IV, do CPC/2015, com o propósito
de dobrar a sua renitência, que deverão ser adotadas, sobretudo, nas
hipóteses em que não se possa desde logo aplicar a presunção
contida na Súmula 301/STJ, ou quando se observar postura anticooperativa
de que resulte o non liquet instrutório em desfavor de quem adota postura cooperativa.
Por
fim,
aplicam-se aos terceiros que possam fornecer material genético para a
realização do novo exame de DNA as mesmas diretrizes anteriormente
formuladas, pois, a despeito de não serem legitimados passivos para
responder à
ação investigatória (legitimação ad processum), são eles legitimados para a prática de determinados e específicos atos processuais (legitimação ad actum),
observando-se, por analogia, o procedimento em contraditório delineado
nos arts. 401 a 404, do CPC/2015, que, inclusive, preveem a
possibilidade de adoção de medidas indutivas, coercitivas,
sub-rogatórias ou mandamentais ao
terceiro que se encontra na posse de documento ou coisa que deva ser
exibida.
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TERCEIRA SEÇÃO
PROCESSO |
CC 170.392-SP, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik,
Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 10/06/2020, DJe
16/06/2020
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RAMO DO DIREITO | DIREITO PENAL, DIREITO PROCESSUAL PENAL |
TEMA |
Investimento
de grupo em criptomoeda. Pirâmide financeira. Crime contra economia
popular. Evasão de divisas ou lavagem de dinheiro em detrimento de
interesses da União. Inocorrência.
Competência da Justiça Estadual.
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DESTAQUE |
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Ausentes
os elementos que revelem ter havido evasão de divisas ou lavagem de
dinheiro em detrimento de interesses da União, compete à Justiça
Estadual processar e julgar crimes
relacionados a pirâmide financeira em investimento de grupo em
criptomoeda.
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INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR |
A
Terceira Seção do STJ já se pronunciou no sentido de que a captação de
recursos decorrente de "pirâmide financeira" não se enquadra no conceito
de atividade financeira, razão pela qual o deslocamento do feito para a
Justiça Federal se justifica apenas se demonstrada a prática de evasão
de divisas ou de lavagem de dinheiro em detrimento de bens e serviços ou
interesse da União.
Registre-se
que o entendimento da Terceira Seção harmoniza-se com julgados da
Quinta e da Sexta Turmas do STJ que tipificaram condutas análogas às
descritas no presente conflito como crime contra a economia popular.
No
caso analisado, o juízo estadual declinou de sua competência para a
Justiça Federal, entendendo que se
trataria de um crime contra o Sistema Financeiro Nacional, uma vez que
se investiga um grupo de investimentos em criptomoedas ('bitcoin') e
que, na verdade, se trataria de pirâmide financeira.
No entanto, ao declinar da competência, o Juízo Estadual deixou de
verificar a prática, em tese, de crime contra a economia popular, cuja
apuração compete à Justiça Estadual, nos termos da
Súmula n. 498/STF, bem como não demonstrou especificidades do caso que
revelassem conduta típica praticada em prejuízo a bens, serviços ou
interesse da União.
Assim, ausentes elementos que revelem ter havido evasão de divisas
ou lavagem de dinheiro em detrimento de interesses da União, os autos
devem permanecer na Justiça Estadual.
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PROCESSO |
CC 172.464-MS, Rel. Min. Reynaldo Soares da
Fonseca, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 10/06/2020, DJe
16/06/2020
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RAMO DO DIREITO | DIREITO PENAL, DIREITO PROCESSUAL PENAL |
TEMA |
Transporte
de folhas de coca adquiridas na Bolívia. Planta proscrita que pode
originar substâncias entorpecentes e/ou psicotrópicas. Enquadramento no
tipo do § 1º, I, do art. 33 da Lei n.
11.343/2006. Competência da Justiça Federal.
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DESTAQUE |
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A
conduta de transportar folhas de coca melhor se amolda, em tese e para a
definição de competência, ao tipo descrito no § 1º, I, do art. 33 da
Lei n. 11.343/2006, que criminaliza o transporte
de matéria-prima destinada à preparação de drogas.
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INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR |
Questiona-se,
nos autos, se o transporte de folhas de coca amolda-se melhor ao
tráfico internacional de entorpecentes (art. 33 c/c 40, I e VII, da Lei
n. 11.343/2006) ou ao uso de droga para
consumo pessoal (art. 28 da Lei n. 11.343/2006), cuja resposta permite
definir se a competência para o julgamento da ação é da Justiça Federal,
ou do Juizado Especial criminal estadual.
No caso, a substância (4,4 kg de folhas de coca),
adquirida na Bolívia, foi localizada no estepe do veículo e seria
transportada até Uberlândia/MG para rituais de mascar, fazer infusão de
chá e até mesmo bolo, rituais esses associados à prática religiosa
indígena de Instituto ao qual pertenceria o acusado. Conforme o Laudo de
Perícia Criminal Federal, o material apreendido teria o potencial de
produzir, aproximadamente, de 4,4g (quatro gramas e quatro decigramas) a
23,53g (vinte e três gramas e cinquenta e três centigramas) de cocaína,
a depender da técnica de refino utilizada.
Não se questiona, portanto, a origem transnacional do
entorpecente. A definição da competência depende, assim, na hipótese em
exame, da tipificação da conduta como tráfico ou como
posse de droga para consumo próprio.
O
crime de uso de entorpecente para consumo próprio, previsto no art. 28
da Lei n. 11.343/2006, é de menor potencial ofensivo, o que determina
a competência do Juizado Especial estadual, já que ele não está previsto
em tratado internacional, e o art. 70 da Lei n. 11.343/2006 não o
inclui dentre os que devem ser julgados pela Justiça Federal.
Já
o tráfico de drogas é delito de tipo misto alternativo de conteúdo
variado, que pune, também, a conduta de quem importa ou adquire
substância entorpecente ou
matéria-prima destinada à sua fabricação.
Veja-se que o tipo do art. 28 da Lei de Drogas, em seu caput,
prevê vários núcleos, dentre os quais o
verbo "transportar", que corresponde à conduta do investigado. Contudo,
ele também vincula o transporte a "drogas", ou seja, a substância
entorpecente de uso proibido no país.
Ocorre que a folha de coca ("erythroxylum
coca lam") é classificada no Anexo I – Lista E – da Portaria/SVS n. 344,
de 12/5/1988 – que aprova o Regulamento Técnico sobre
substâncias e medicamentos sujeitos a controle especial como uma das
plantas proscritas que podem originar substâncias entorpecentes e/ou
psicotrópicas. Seja dizer, ela não é, em si, considerada droga. Com isso
em mente,
a conduta do investigado não se enquadra no caput do art. 28 da Lei n. 11.343/2006.
Tampouco
se amoldaria ao delito equiparado descrito no parágrafo 1º do art. 28,
uma vez
que o investigado não semeou, nem cultivou, nem colheu as folhas de coca
que transportava, já que admitiu tê-las comprado de uma índia do Acre.
Assim
sendo, por mais que sua
intenção confessada fosse a de consumir as folhas de coca, mascando-as,
fazendo chás ou preparando bolos em rituais indígenas de sua crença
religiosa, não se trataria de consumo de drogas e a conduta não
se amolda ao tipo do art. 28 da Lei n. 11.3434/2006.
Por sua vez, o caput do art. 33 criminaliza, entre outras condutas, a de transportar drogas. Mas, como se viu anteriormente, a folha de
coca não é droga. Porém pode ser classificada como matéria-prima ou insumo para sua fabricação.
Nesse
sentido, a conduta se amoldaria ao tipo descrito no
§ 1º, I, do art. 33 da Lei n. 11.343/2006 se, e apenas se, ficar
demonstrado, ao final do inquérito ou da ação penal que o intuito do
investigado era o de, com as folhas de coca, preparar drogas.
Desse modo, a conduta de transportar folhas
de coca melhor se amolda, em tese e para a definição de a competência,
ao tipo descrito no § 1º, I, do art. 33 da Lei n. 11.343/2006, que
criminaliza o
transporte de matéria-prima destinada à preparação de drogas.
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PROCESSO |
CC 171.206-SP, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik,
Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 10/06/2020, DJe
16/06/2020
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RAMO DO DIREITO | DIREITO PROCESSUAL PENAL |
TEMA |
Conflito de competência. Habeas corpus de preventivo para cultivo, uso, porte e produção artesanal da cannabis (maconha) para fins medicinais. Ausência de pedido de salvo conduto
para importação da planta ou de qualquer outra conduta transnacional. Competência da justiça estadual.
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DESTAQUE |
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Compete à Justiça Estadual o pedido de habeas corpus preventivo para viabilizar, para fins medicinais, o cultivo, uso, porte e produção artesanal da Cannabis
(maconha), bem como porte em outra unidade da federação, quando não demonstrada a internacionalidade da conduta.
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INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR |
O núcleo da controvérsia consiste em definir a competência para prestar jurisdição na hipótese de habeas corpus
preventivo para viabilizar o plantio de
maconha para fins medicinais. Os impetrantes objetivam ordem de salvo
conduto para que os pacientes possam cultivar artesanalmente a planta Canabis Sativa L, bem como usá-la e portá-la dentro do território nacional com fins
terapêuticos.
No
caso dos autos, em que os impetrantes objetivam impedir possível
constrangimento de autoridades estaduais, quais sejam, o Delegado Geral
da Polícia Civil e o
Comandante Geral da Polícia Militar, está configurada a competência do
juízo estadual de primeiro grau.
Ademais, o pedido em sede de habeas corpus
evidencia que os
impetrantes não intentam obter ordem judicial para viabilizar conduta
transnacional pelos pacientes. Constata-se que o pedido do habeas corpus fala em cultivo, uso, porte e produção artesanal da Cannabis, bem como
porte, ainda que em outra unidade da federação, e em nenhum momento indica a intenção de importar a Cannabis.
Não
há pedido de
importação a justificar a competência da justiça federal.
Consequentemente, não há motivo para supor que o juízo estadual teria
que se pronunciar acerca de autorização para a
importação da planta, invadindo competência da justiça federal. Ademais,
o uso medicinal da Cannabis no território pátrio de forma
legal, em razão de salvos-condutos concedidos pelo poder
judiciário, demonstra a possibilidade de aquisição da planta dentro do
território nacional, sem necessidade de recorrer à importação.
A
jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme quanto à
necessidade de demonstração de internacionalidade da conduta do agente
para reconhecimento da competência da justiça federal. Frise-se
ainda que o tráfico interestadual não tem o condão de deslocar a
competência para a justiça federal.
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PRIMEIRA TURMA
PROCESSO |
REsp 1.646.193-SP, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia
Filho, Rel. Acd. Min. Gurgel de Faria, Primeira Turma, por maioria,
julgado em 12/05/2020, DJe 04/06/2020
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RAMO DO DIREITO | DIREITO AMBIENTAL |
TEMA |
Reserva legal. Novo Código Florestal. Tempus regict actum. Art. 15. Irretroatividade. Área de preservação permanente - APP. Cômputo. Impossibilidade.
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DESTAQUE |
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O
art. 15 da Lei n. 12.651/2012, que admite o cômputo da área de
preservação permanente no cálculo do percentual de instituição da
reserva legal do
imóvel, não retroage para alcançar situações consolidadas antes de sua
vigência.
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INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR |
O
STF pronunciou a constitucionalidade do art. 15 da Lei n. 12.651/2012,
por entender que "o cômputo das Áreas de Preservação Permanente no
percentual de Reserva Legal
resulta de legítimo exercício, pelo legislador, da função que lhe
assegura o art. 225, § 1º, III, da Constituição, cabendo-lhe fixar os
percentuais de proteção que atendem da melhor forma
os valores constitucionais atingidos, inclusive o desenvolvimento
nacional (art. 3º, II, da CRFB) e o direito de propriedade (art. 5º,
XXII, da CRFB)".
Tais proposições
não embaraçam a compreensão de que as novas disposições normativas são irretroativas.
Isto
porque a Suprema Corte, ao assegurar a adequação da
lei com a Carta Constitucional, não inibiu a análise da aplicação
temporal do texto legal, no plano infraconstitucional, tarefa conferida
ao STJ. Com efeito, o próprio STF considerou que a discussão sobre a
retroatividade do art. 15 da Lei n. 12.651/2012 demanda exame de matéria
cognoscível no plano infraconstitucional.
Aqui
convém anotar que a Corte Especial do STJ, espelhada no STF,
entende que os conceitos de direito adquirido, de ato jurídico perfeito e
de coisa julgada não são fixados pela Constituição Federal, mas pela
legislação infraconstitucional. Desse modo, a
declaração de constitucionalidade do art. 15 da Lei n. 12.651/2012 não
desqualifica a aferição da aplicação imediata desse dispositivo aos
casos ocorridos antes de sua vigência.
Afastar
a aplicação do princípio da vedação do retrocesso para prestigiar o
princípio democrático, em face das "opções validamente eleitas
pelo legislador", que atuou mediante a "faculdade" conferida pelo art.
225, § 1º, III, da Constituição, como fez o Supremo Tribunal Federal,
não inibe a aplicação do princípio tempus
regit actum, que "orienta a aplicabilidade da lei no tempo,
considerando que o regime jurídico incidente sobre determinada situação
deve ser aquele em vigor no momento da materialização do fato" (AgInt
no REsp 1726737/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA,
julgado em 05/12/2019, DJe 11/12/2019).
Assim, sob o prisma de que as normas do novo Código Florestal não
retroagem para alcançar situações pretéritas, dado o prestígio ao princípio do tempus regit actum
e à proibição do retrocesso em matéria ambiental, a
instituição da área de reserva legal se impõe à luz da legislação
vigente ao tempo da infração ambiental, afastadas as disposições do art.
15 da Lei n. 12.651/2012.
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PROCESSO |
REsp 1.859.295-MG, Rel. Min. Sérgio Kukina,
Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 26/05/2020, DJe
29/05/2020
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RAMO DO DIREITO | DIREITO PROCESSUAL CIVIL, DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE |
TEMA |
Honorários de sucumbência. Arbitramento feito pelo Juízo da Infância e Juventude. Execução. Competência. Justiça especializada.
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DESTAQUE |
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O
juízo especializado da Justiça da Infância e da Juventude é competente
para o cumprimento e a efetivação do montante sucumbencial por ele
arbitrado.
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INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR |
Cinge-se
a controvérsia a definir de quem é a competência para executar a verba
honorária sucumbencial arbitrada pelo Juízo da Infância e da Juventude.
Da
combinada leitura dos arts. 148 e 152 do ECA, 24, § 1º, do Estatuto da
Advocacia e 516, II, do CPC/2015, depreende-se que, como regra, o
cumprimento da sentença, aí abarcada a
imposição sucumbencial, deve ocorrer nos mesmos autos em que se formou o
correspondente título exequendo e, por conseguinte, perante o juízo prolator do título.
Ressalte-se que tal solução longe está de inquinar ou contrariar as
estritas hipóteses de competência da Vara da Infância e Juventude (art.
148 do ECA), porquanto a postulada verba honorária decorreu
de discussão travada em causa cível que tramitou no próprio juízo menorista, razão pela qual não há falar, no caso, em desvirtuamento de sua competência executória.
Por
fim, impende realçar que a mesma Lei n. 8.069/1990 (ECA), por seu art.
152, assinala que "Aos procedimentos regulados nesta Lei aplicam-se
subsidiariamente as normas gerais previstas na
legislação processual pertinente", autorizando, no ponto, a supletiva
aplicação do referido art. 516, II, do vigente CPC, segundo o qual "O
cumprimento da sentença efetuar-se-á perante [...] o
juízo que decidiu a causa no primeiro grau de jurisdição".
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SEGUNDA TURMA
PROCESSO |
RMS 54.823-PB, Rel. Min. Assusete Magalhães,
Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 26/05/2020, DJe
05/06/2020
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RAMO DO DIREITO | DIREITO ADMINISTRATIVO, DIREITO PROCESSUAL CIVIL |
TEMA |
Mandado de segurança preventivo. Lançamento fiscal. Autoridade coatora. Secretário de Estado da Receita. Ilegitimidade.
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DESTAQUE |
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O
Secretário de Estado da Fazenda não está legitimado a figurar, como
autoridade coatora, em mandados de segurança que visam evitar a prática
de lançamento
fiscal.
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INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR |
Em
se tratando de obrigação acessória (aposição de selos de controle), a
autoridade coatora para figurar no mandado de segurança é aquela que tem
competência para exigir a observância da norma ou autuar o contribuinte
pelo descumprimento.
Nesse
sentido, a Primeira Seção do STJ deixou anotado que "a autoridade
coatora, no mandado de segurança, é aquela que pratica o ato, não a que
genericamente orienta os órgãos subordinados a respeito da aplicação da
lei no âmbito administrativo; mal endereçado o
writ, o processo deve ser extinto sem julgamento de mérito".
Por
sua vez, a Primeira Turma do STJ decidiu que, no regime do lançamento
por homologação, a
iminência de sofrer o lançamento fiscal, caso não cumpra a legislação de
regência, autoriza o sujeito passivo da obrigação tributária a impetrar
mandado de segurança contra a
exigência que considera indevida. Nesse caso, porém, autoridade coatora é
aquela que tem competência para o lançamento ex officio, que, certamente, não é o Secretário de Estado da
Receita.
Posteriormente,
a Primeira Turma do STJ reafirmou que o respectivo Secretário de Estado
da Fazenda não está legitimado a figurar, como autoridade coatora, em
mandados de
segurança que visam evitar a prática de lançamento fiscal.
Consoante
ficou assentado nos precedentes da Primeira Turma do STJ, "a autoridade
coatora desempenha duas
funções no mandado de segurança: a) uma, internamente, de natureza
processual, consistente em defender o ato impugnado pela impetração;
trata-se de hipótese excepcional de legitimidade ad processum,
em
que o órgão da pessoa jurídica, não o representante judicial desta,
responde ao pedido inicial; b) outra, externamente, de natureza
executiva, vinculada à sua competência administrativa; ela é quem cumpre
a ordem judicial. A legitimação da autoridade coatora deve ser aferida à
base das duas funções acima descritas; só o órgão capaz de as cumprir
pode ser a autoridade coatora. A pessoa
jurídica sujeita aos efeitos da sentença no mandado de segurança só
estará bem presentada no processo se houver correlação material entre as
atribuições funcionais da autoridade coatora e o
objeto litigioso; essa identificação depende de saber, à luz do direito
administrativo, qual o órgão encarregado de defender o ato atacado pela
impetração."
A recente jurisprudência da Segunda Turma do STJ
orienta-se no sentido de que o Secretário de Estado da Fazenda não
possui legitimidade para figurar, como autoridade coatora, em mandado de
segurança que visa
afastar exigência fiscal supostamente ilegítima.
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TERCEIRA TURMA
PROCESSO |
REsp 1.529.532-DF, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas
Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 09/06/2020, DJe
16/06/2020
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RAMO DO DIREITO | DIREITO CIVIL |
TEMA |
Alimentos devidos e não pagos. Acordo para exoneração da dívida. Possibilidade.
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DESTAQUE |
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É possível a realização de acordo com a finalidade de exonerar o devedor do pagamento de alimentos devidos e não pagos.
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INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR |
Inicialmente,
extrai-se do art. 1.707 do Código Civil que o direito aos alimentos
presentes e futuros é irrenunciável, não se aplicando às prestações
vencidas, nas quais o credor pode deixar de exercer a cobrança até mesmo
na fase executiva.
Com
efeito, a vedação legal à renúncia ao direito aos alimentos
decorre da natureza protetiva do instituto dos alimentos. Contudo, a
irrenunciabilidade atinge tão somente o direito, e não o seu exercício.
Note-se
que a irrenunciabilidade e a
vedação à transação estão limitadas aos alimentos presentes e futuros,
não havendo os mesmos obstáculos para os alimentos pretéritos.
No
caso, a extinção da execução em virtude da celebração de acordo em que o
débito foi exonerado não resultou em prejuízo, pois não houve renúncia
aos alimentos vincendos,
indispensáveis ao sustento dos alimentandos. As partes transacionaram
somente o crédito das parcelas específicas dos alimentos executados, em
relação aos quais inexiste óbice legal.
Nesse contexto, os alimentos pretéritos
perdem relevância, não havendo motivo para impor às partes integrantes
da relação alimentar empecilho à sua transação, tendo
em vista que, como assinalado, não decorreram prejuízos. Ademais,
destaca-se que, especialmente no âmbito do Direito de Família, é salutar
o estímulo à autonomia das partes para a realização
de acordo, de autocomposição, como instrumento para se alcançar o
equilíbrio e a manutenção dos vínculos afetivos.
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PROCESSO |
REsp 1.786.722-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi,
Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 09/06/2020, DJe
12/06/2020
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RAMO DO DIREITO | DIREITO CIVIL |
TEMA |
Acidente
em linha férrea. Transporte de passageiros. Responsabilidade civil
objetiva. Art. 734 do CC/2002. Teoria do risco criado. Art. 927,
parágrafo único, do CC/2002. Ato de vandalismo que resulta
no rompimento de cabos elétricos de vagão de trem. Rompimento do nexo
causal. Inocorrência. Padrões mínimos de qualidade no exercício da
atividade de risco. Fortuito interno.
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DESTAQUE |
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O
ato de vandalismo que resulta no rompimento de cabos elétricos de vagão
de trem não exclui a responsabilidade da concessionária/transportadora,
pois cabe a ela cumprir
protocolos de atuação para evitar tumulto, pânico e submissão dos
passageiros a mais situações de perigo.
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INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR |
Cinge-se
a controvérsia a definir se o acidente na linha férrea, evento causador
do dano moral sofrido pelo passageiro se enquadra nos riscos inerentes
aos serviços prestados pela
empresa de transporte , ou se se encontra fora desses riscos,
caracterizando um fortuito externo, apto a afastar sua responsabilidade
objetiva.
O CC/2002
determinou que a natureza jurídica da
responsabilidade civil do transportador é objetiva, nos termos do art.
734, de modo que, sobrevindo dano ao passageiro ou à sua bagagem durante
a execução do contrato, fica aquele obrigado a indenizar,
independentemente de
culpa, salvo se demonstrada a ocorrência de certas excludentes de
responsabilidade.
Na
responsabilidade civil objetiva, os danos deixam de ser considerados
acontecimentos extraordinários,
ocorrências inesperadas e atribuíveis unicamente à fatalidade ou à
conduta (necessariamente no mínimo) culposa de alguém, para se tornarem
consequências, na medida do possível, previsíveis e
até mesmo naturais do exercício de atividades inerentemente geradoras de
perigo, cujos danos demandam, por imperativo de solidariedade e justiça
social, a adequada reparação.
Para a responsabilidade objetiva da teoria do risco
criado, adotada pelo art. 927, parágrafo único, do CC/2002, o dever de
reparar exsurge da materialização do risco – da inerente e inexorável
potencialidade de qualquer atividade lesionar interesses alheios – em um
dano; da conversão do perigo genérico e abstrato em um prejuízo
concreto e individual. Assim, o exercício de uma atividade obriga a
reparar um
dano, não na medida em que tenha sido culposa (ou dolosa), porém na
medida em que tenha sido causal.
Anota-se
que a exoneração da responsabilidade objetiva ocorre com o
rompimento do nexo causal, sendo que, no fato de terceiro, pouco importa
que o ato tenha sido doloso ou culposo, sendo unicamente indispensável
que ele tenha sido a única e exclusiva causa do evento lesivo, isto é,
que se configure
como causa absolutamente independente da relação causal estabelecida
entre o dano e o risco do serviço.
Ademais,
na teoria do risco criado, somente o fortuito externo, a
impossibilidade absoluta – em qualquer contexto abstrato, e não
unicamente em uma situação fática específica – de que o risco inerente à
atividade tenha se concretizado no dano, é capaz de
romper o nexo de causalidade, isentando, com isso, aquele que exerce a
atividade da obrigação de indenizar.
Registra-se que o conceito de fortuito interno reflete um padrão de
comportamento, um standard de atuação, que nada mais representa
que a fixação de um quadrante à luz das condições mínimas esperadas do
exercício profissional, que deve ser
essencialmente dinâmico, e dentro das quais a concretização dos riscos
em dano é atribuível àquele que exerce a atividade.
Assim,
se a conduta do terceiro,
mesmo causadora do evento danoso, coloca-se nos lindes do risco do
transportador, mostrando-se ligada à sua atividade, então não configura
fortuito interno, não se excluindo a responsabilidade.
O contrato de transporte de passageiros
envolve a chamada cláusula de incolumidade, segundo a qual o
transportador deve empregar todos os expedientes que são próprios da
atividade para preservar a
integridade física do passageiro contra os riscos inerentes ao negócio,
durante todo o trajeto, até o destino final da viagem.
Na
hipótese, o ato de vandalismo não
foi a causa única e exclusiva da ocorrência do abalo moral sofrido pelo
passageiro, pois outros fatores, como o tumulto decorrente da falta de
informações sobre a causa, a gravidade e as precauções a serem
tomadas pelos passageiros diante das explosões elétricas no vagão de
trem que os transportava, aliada à falta de socorro às pessoas que se
jogavam nas vias férreas, contribuíram para as lesões
reportadas.
Dessa
forma, a incolumidade dos passageiros diante de eventos inesperados, mas
previsíveis, como o rompimento de um cabo elétrico, encontra-se
indubitavelmente inserida nos
fortuitos internos da prestação do serviço de transporte, pois o
transportador deve possuir protocolos de atuação para evitar o tumulto, o
pânico e a submissão dos passageiros a mais
situações de perigo, como ocorreram com o rompimento dos lacres das
portas de segurança dos vagões e o posterior salto às linhas férreas de
altura considerável, e duas estações de
parada.
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PROCESSO |
HC 574.495-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva,
Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 26/05/2020, DJe
01/06/2020
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RAMO DO DIREITO | DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL |
TEMA |
Obrigação alimentícia. Inadimplemento. Prisão civil. Suspensão temporária. Excepcionalidade. Pandemia (covid-19).
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DESTAQUE |
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Em
virtude da pandemia causada pelo coronavírus (covid-19), admite-se,
excepcionalmente, a suspensão da prisão dos devedores por dívida
alimentícia em regime
fechado.
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INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR |
A
pandemia de covid-19 foi declarada publicamente pela Organização
Mundial da Saúde - OMS - em 11 de março de 2020. Com base nessa
realidade, o Conselho Nacional de
Justiça editou a Recomendação CNJ n. 62/2020, que no seu artigo 6º
recomenda "aos magistrados com competência cível que considerem a
colocação em prisão domiciliar das pessoas presas por
dívida alimentícia, com vistas à redução dos riscos epidemiológicos e em
observância ao contexto local de disseminação do vírus".
Ao aprofundar a reflexão sobre o tema, percebe-se que assegurar aos
presos por dívidas alimentares o direito à prisão domiciliar é medida
que não cumpre o mandamento legal e que fere, por vias transversas,
a própria dignidade do alimentando.
Assim,
não há falar na relativização da regra do art. 528, §§ 4º e 7º, do
Código de Processo Civil de
2015, que autoriza a prisão civil do alimentante em regime fechado
quando devidas até 3 (três) prestações anteriores ao ajuizamento da
execução e as que se vencerem no curso do processo. Válido
consignar que a lei federal incorporou ao seu texto o teor da Súmula
309/STJ ("O débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é
o que compreende as três prestações anteriores ao
ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do processo").
Por esse motivo, não é plausível substituir o encarceramento pelo confinamento social, o
que, aliás, já é a realidade da maioria da população, isolada em prol do bem-estar de toda a coletividade.
Nesse
sentido, diferentemente do que assentado em recentes
precedentes desta Corte (HC 566.897/PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJe
19/3/2020, e HC 568.021/CE, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, DJe
25/03/2020), que aplicaram a Recomendação n. 62 do CNJ, afasta-se a
possibilidade de prisão
domiciliar dos devedores de dívidas alimentares para apenas suspender a
execução da medida enquanto pendente o contexto pandêmico mundial.
Portanto,
a excepcionalidade da
situação emergencial de saúde pública permite o diferimento provisório
da execução da obrigação cível enquanto pendente a pandemia. A prisão
civil suspensa terá seu
cumprimento no momento processual oportuno, já que a dívida alimentar
remanesce íntegra, pois não se olvida que, afinal, também está em jogo a
dignidade do alimentando, em regra, vulnerável.
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PROCESSO |
REsp 1.814.639-RS, Rel. Min. Paulo de Tarso
Sanseverino, Rel. Acd. Min. Moura Ribeiro, Terceira Turma, por
maioria, julgado em 26/05/2020, DJe 09/06/2020
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RAMO DO DIREITO | DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL |
TEMA |
Ação
de exigir contas. Pensão alimentícia. Informações sobre a destinação.
Viabilidade jurídica. Art. 1.538, § 5º, do Código Civil.
Princípios do melhor interesse e da proteção integral da criança e do
adolescente.
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DESTAQUE |
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É
cabível ação de exigir de contas ajuizada pelo alimentante, em nome
próprio, contra a genitora guardiã do alimentado para obtenção de
informações sobre a destinação da pensão paga mensalmente, desde que
proposta sem a finalidade de apurar a existência de eventual crédito.
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INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR |
O
ingresso no ordenamento jurídico da Lei n. 13.058/2014 incluiu a
polêmica norma contida no § 5º do art. 1.583 do CC/2002, versando sobre a
legitimidade do genitor não
guardião para exigir informações e/ou prestação de contas contra(o) a(o)
guardiã(ão) unilateral, devendo a questão ser analisada, com especial
ênfase, à luz dos princípios da
proteção integral da criança e do adolescente, da isonomia e,
principalmente, da dignidade da pessoa humana, que são consagrados pela
ordem constitucional vigente.
Como
os
alimentos prestados são imprescindíveis para a própria sobrevivência do
alimentado, devem, ao menos, assegurar uma existência digna a quem os
recebe. Assim, a função supervisora, por quaisquer dos
detentores do poder familiar, em relação ao modo pelo qual a verba
alimentar fornecida é empregada, além de ser um dever imposto pelo
legislador, é um mecanismo que dá concretude ao princípio do melhor
interesse e da proteção integral da criança ou do adolescente.
Dessa
forma, não há apenas interesse jurídico, mas também o dever legal do
genitor
alimentante de acompanhar os gastos com o filho alimentado que não se
encontra sob a sua guarda, fiscalizando o atendimento integral de suas
necessidades,materiais e imateriais, essenciais ao seu desenvolvimento
físico e
psicológico, aferindo o real destino do emprego da verba alimentar que
paga mensalmente, pois ela é voltada para esse fim.
Por
fim, o que justifica o legítimo interesse processual
em ação dessa natureza é exclusivamente a finalidade protetiva da
criança ou do adolescente beneficiário dos alimentos, diante da sua
possível malversação, e não o eventual acertamento de
contas, perseguições ou picuinhas com a(o) guardiã(ao), devendo ela ser
dosada, ficando vedada a possibilidade de apuração de créditos ou
preparação de revisional, pois os alimentos são
irrepetíveis.
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PROCESSO |
REsp 1.815.796-RJ, Rel. Min. Paulo de Tarso
Sanseverino, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 26/05/2020,
DJe 09/06/2020
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RAMO DO DIREITO | DIREITO CIVIL, DIREITO DO CONSUMIDOR |
TEMA |
Plano
de saúde. Tratamento quimioterápico. Prognóstico de falência ovarina
como sequela. Criopreservação dos óvulos. Necessidade de minimização dos
efeitos
colaterais do tratamento. Princípio médico "Primum, non nocere" (primeiro, não prejudicar). Obrigação de cobertura do procedimento até a alta da quimioterapia. Possibilidade.
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DESTAQUE |
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É
devida a cobertura, pela operadora de plano de saúde, do procedimento
de criopreservação de óvulos de paciente fértil, até a alta do
tratamento
quimioterápico, como medida preventiva à infertilidade.
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INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR |
Cinge-se
a controvérsia sobre a obrigação de a operadora de plano de saúde
custear o procedimento de criopreservação de óvulos de paciente
oncológica jovem sujeita a quimioterapia, com prognóstico de falência
ovariana, como medida preventiva à infertilidade.
Nos
termos do art. 10, inciso III, da Lei n.
9.656/1998, não se inclui entre os procedimentos de cobertura
obrigatória a "inseminação artifical", compreendida nesta a manipulação
laboratorial de óvulos, dentre outras técnicas de
reprodução assistida (cf. RN ANS 387/2016).
Nessa linha, segundo a jurisprudência do STJ, não caberia a condenação da operadora de plano de saúde a
custear criopreservação como procedimento inserido num contexto de mera reprodução assistida.
O
caso concreto, porém, revela a necessidade de atenuação
dos efeitos colaterais, previsíveis e evitáveis, da quimioterapia,
dentre os quais a falência ovariana, em atenção ao princípio médico "primum, non nocere"
e à norma que emana do
art. 35-F da Lei n. 9.656/1998, segundo a qual a cobertura dos planos de
saúde abrange também a prevenção de doenças, no caso, a infertilidade.
Nessa
hipótese,
é possível a manutenção da condenação da operadora à cobertura de parte
do procedimento pleiteado, como medida de prevenção para a possível
infertilidade da paciente, cabendo à
beneficiária arcar com os eventuais custos do procedimento a partir da
alta do tratamento quimioterápico.
Ressalte-se
a distinção entre o caso dos autos, em que a paciente
é fértil e busca a criopreservação como forma de prevenir a
infertilidade, daqueles em que a paciente já é infértil, e pleiteia a
criopreservação como meio para a reprodução
assistida, casos para os quais não há obrigatoriedade de cobertura.
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PROCESSO |
REsp 1.842.066-RS, Rel. Min. Moura Ribeiro,
Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 09/06/2020, DJe
15/06/2020
|
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RAMO DO DIREITO | DIREITO DO CONSUMIDOR, DIREITO INTERNACIONAL |
TEMA |
Transporte
aéreo internacional. Extravio de bagagem e atraso de voo. Indenização.
Danos materiais. Limitação da responsabilidade civil da transportadora.
Aplicação da
Convenção de Montreal. Danos morais. Código de Defesa do Consumidor.
Incidência.
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DESTAQUE |
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As
indenizações por danos morais decorrentes de extravio de bagagem e de
atraso de voo internacional não estão submetidas à tarifação prevista na
Convenção de Montreal, devendo-se observar, nesses casos, a efetiva
reparação do consumidor preceituada pelo CDC.
|
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR |
Em
1999, após a ampla privatização das empresas do setor e o advento de
normas consumeristas em todo o mundo, foi celebrada em Montreal, sede da
Organização da
Aviação Civil Internacional (OACI), uma nova convenção, ampliando a
proteção dos usuários do transporte aéreo internacional.
O
art. 1º da
Convenção de Montreal, inserida no ordenamento jurídico brasileiro pelo
Decreto n. 5.910, de 27/9/2006, esclarece que essa norma tem aplicação
para todos os casos de transporte de pessoas, bagagem ou carga efetuado
em
aeronaves, mediante remuneração ou a título gratuito, por uma empresa de
transporte aéreo. Muito embora deixe claro que trata de danos
decorrentes de morte ou lesões corporais, atraso no transporte de
pessoas e
destruição, perda ou avaria de bagagem/carga, não esclarece se os danos
referenciados são apenas os de ordem patrimonial ou também os de
natureza extrapatrimonial.
Apesar da norma internacional, não mencionar claramente a espécie
de danos aos quais se refere, é preciso considerar que ela representou
uma mera atualização da Convenção de Varsóvia, firmada
em 1929, quando sequer se cogitava de indenização por danos morais.
Assim, se a norma original cuidou apenas de danos materiais, parece
razoável sustentar que a norma atualizadora também se ateve a essa mesma
categoria de
danos.
Além disso,
os prejuízos de ordem extrapatrimonial, pela sua própria natureza, não
admitem tabelamento prévio ou tarifação. Nesse sentido,
inclusive, já se posicionou a jurisprudência desta Corte Superior.
Se
os países signatários da Convenção de Montreal tinham a intenção de
impor
limites à indenização por danos morais, nos casos de atraso de voo e de
extravio de bagagem/carga, deveriam tê-lo feito de modo expresso.
Registra-se,
também, que, se
a própria Convenção de Montreal admitiu o afastamento do limite
indenizatório legal quando feita declaração especial do valor da bagagem
transportada, é possível concluir que ela não incluiu
os danos morais.
Por sua vez, o STF, no julgamento do RE n. 636.331/RJ, com repercussão geral reconhecida (Tema 210),
fixou a seguinte tese jurídica: nos termos do artigo 178 da
Constituição da República, as normas e os tratados internacionais
limitadores da responsabilidade das transportadoras aéreas de
passageiros, especialmente as Convenções de Varsóvia e Montreal, têm
prevalência em relação ao Código de Defesa do Consumidor. No entanto,
referido entendimento tem aplicação apenas aos pedidos de reparação por
danos materiais.
Com efeito, apesar de não estar em pauta a questão da
indenização por danos morais, o STF no RE 636.331/RJ, afirmou, a título
de obiter dictum, que os limites indenizatórios da
Convenção de Montreal não se aplicavam às hipóteses de indenização por danos extrapatrimoniais.
Muito embora se trate de norma posterior ao CDC e
constitua lex specialis em relação aos contratos de transporte
aéreo internacional, não pode ser aplicada para limitar a indenização
devida aos passageiros em caso de danos morais decorrentes de atraso
de voo ou extravio de bagagem.
Assim,
é de se reconhecer que a tarifação prevista na Convenção de Montreal
tem aplicação restrita aos danos
patrimoniais, mantendo-se incólume, em relação aos danos morais por
extravio de bagagem e atraso de voo, o primado da efetiva reparação do
consumidor insculpido nos arts. 5º, V, da CF, e 6º, VI, do CDC.
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PROCESSO |
REsp 1.701.824-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi,
Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 09/06/2020, DJe
12/06/2020
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RAMO DO DIREITO | DIREITO PROCESSUAL CIVIL |
TEMA |
Cumprimento
de sentença. Pagamento voluntário. Não ocorrência. Honorários
advocatícios. Acréscimo de 10% (dez por cento). Art. 523, § 1º, do
CPC/2015.
Relativização. Impossibilidade.
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DESTAQUE |
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O
acréscimo de 10% (dez por cento) de honorários advocatícios, previsto
pelo art. 523, § 1º, do CPC/2015, quando não ocorrer o pagamento
voluntário no
cumprimento de sentença, não admite relativização.
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INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR |
As
alterações realizadas pelo CPC/2015 na disciplina da fixação dos
honorários advocatícios já foram objeto de debate na Segunda Seção desta
Corte Superior, que concluiu que, dentre as alterações, o novo Código
reduziu, visivelmente, a subjetividade do julgador, restringindo as
hipóteses nas quais cabe a fixação dos honorários de
sucumbência por equidade.
Isso
porque, enquanto no CPC/1973 a fixação equitativa da verba era possível
nas causas de pequeno valor, nas de valor inestimável, naquelas
em que não houvesse condenação ou fosse vencida a Fazenda Pública e nas
execuções, embargadas ou não (art. 20, § 4º). Reconheceu-se que no
CPC/2015 tais hipóteses são restritas,
havendo ou não condenação, às causas em que o proveito econômico foi
inestimável, ou irrisório, ou, ainda, quando o valor da causa for muito
baixo (art. 85, § 8º).
Nesse contexto, no cumprimente de sentença,
nos termos do art. 523, § 1º, do CPC/2015, não ocorrendo o pagamento
voluntário do débito no prazo de 15 (quinze) dias, o mesmo será
acrescido de multa de 10% (dez por cento) e de honorários de advogado no
percentual de 10% (dez por cento).
Assim,
vencido o prazo sem pagamento do valor devido, haverá acréscimo,
por força de lei, da multa de 10% (dez por cento) sobre o valor do
débito atualizado, mais honorários advocatícios que o julgador deverá
fixar, nos termos da lei, também em 10% (dez por cento) sobre o valor
devido.
Com efeito, a
lei não deixou dúvidas quanto ao percentual de honorários advocatícios a
ser acrescido ao débito nas hipóteses de ausência de
pagamento voluntário. Diz-se: o percentual de 10% (dez por cento) foi
expressamente tarifado em lei.
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PROCESSO |
REsp 1.760.914-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso
Sanseverino, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 02/06/2020,
DJe 08/06/2020
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RAMO DO DIREITO | DIREITO PROCESSUAL CIVIL |
TEMA |
Réu
revel na fase de conhecimento. Advogado não constituído. Intimação por
carta para o cumprimento de sentença. CPC/2015. Necessidade.
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DESTAQUE |
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Ainda
que citado pessoalmente na fase de conhecimento, é devida a intimação
por carta do réu revel, sem procurador constituído, para o cumprimento
de
sentença.
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INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR |
Os temas controvertidos dizem respeito à necessidade, ou não, de concessão de exequatur
ao pedido de cooperação jurídica formulado pela Autoridade
francesa, lastreado em Acordo de Assistência Judiciária em Matéria Penal
entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da
França, qual seja, o Decreto n. 3.324/1999 e ao reconhecimento ou não da
nulidade da oitiva do Recorrente.
O
pleito foi encaminhado ao Ministério da Justiça do Brasil, que o
remeteu ao Procurador-Geral da República, o qual, por sua vez, designou
Procurador da República atuante na Cidade do Rio de Janeiro para a
execução das diligências. O membro do Ministério Público Federal
requereu o deferimento das medidas assecuratórias ao Juízo da Vara
Federal do Rio de Janeiro, no que foi atendido. As diligências foram
cumpridas. Contra essa decisão foi impetrado o writ, buscando a declaração de nulidade dos atos praticados pelo referido Juízo, oriundos do
pedido de auxílio direto requerido pela Justiça francesa, em razão da ausência de exequatur pelo Superior Tribunal de Justiça no pedido de cooperação jurídica internacional.
Nesse
cenário, é mister levar em consideração a natureza do pedido de
cooperação internacional para o deslinde da questão, uma vez que a carta
rogatória e o auxílio direto, apesar de conviverem no ordenamento
jurídico como sistemas de cooperação internacional em matéria penal, são
institutos com ritos e procedimentos diversos, principalmente, em
razão das normas aplicáveis e da origem da decisão que ensejou o pedido
estrangeiro.
Na
carta rogatória passiva, há decisão judicial oriunda da justiça
rogante que precisa ser executada e cumprida no Estado rogado, cabendo
ao Superior Tribunal de Justiça o juízo de delibação, sem, contudo,
adentrar-se no mérito da decisão oriunda do país estrangeiro. No
auxílio direto passivo, há um pedido de assistência do Estado alienígena
diretamente ao Estado rogado, para que este preste as informações
solicitadas ou provoque a Justiça Federal para julgar a
providência requerida (medida acautelatórias), conforme o caso concreto.
Tudo isso baseado em Acordo ou Tratado Internacional de cooperação.
In casu, o Promotor da
República de Paris denunciou e solicitou investigação, e o juiz de instrução julgou necessárias as providências "para a manifestação da verdade".
O juízo
estrangeiro, ao deferir a produção da prova requerida pelo Ministério
Público, emitiu pronunciamento jurisdicional. Quer dizer, houve um juízo
de valor realizado pelo Juízo alienígena sobre a necessidade
e adequação da colheita de prova.
Assim, a decisão judicial estrangeira deve ser submetida ao juízo delibatório do Superior Tribunal de Justiça, assegurando-se
às partes as garantias do devido processo legal, sem, contudo, adentrar-se no mérito da decisão proveniente do país rogante.
É
importante frisar que não se
trata de mero ato judicial formal de encaminhamento de pedido de
cooperação, mas de ato com caráter decisório proferido pelo poder
judiciário francês no exercício típico da função
jurisdicional.
Portanto, a concessão do exequatur é imprescindível na hipótese, pois, existente decisão judicial estrangeira a ser submetida ao crivo desta
Corte, o caso concreto amolda-se à definição de carta rogatória, sendo de rigor a anulação dos procedimentos já realizados.
Ademais,
a defesa aduz
nulidade na oitiva do recorrente, porque todas as perguntas teriam sido
formuladas direta e exclusivamente pela autoridade judiciária francesa
que acompanhava o membro do Ministério Público Federal nomeado para
realizar as
diligências.
Verifica-se
que o Tribunal local afastou a alegação de nulidade da produção da
prova em razão de o sistema persecutório da França ser
muito diverso do sistema persecutório brasileiro. Tal fundamento,
todavia, é inteiramente irrelevante para delimitação da existência, ou
não, de ofensa à soberania nacional, dado que, independentemente das
funções desempenhadas pelo Juiz de Instrução francês, quando comparado
ao brasileiro, o que importa é o fato de tratar-se de autoridade pública
estrangeira.
A defesa tem razão ao questionar a legalidade da oitiva do
recorrente, pois breve análise da gravação de vídeo da mencionada
audiência é capaz de comprovar a veracidade da alegação de
que as autoridades estrangeiras dirigiram e conduziram, por cerca de
cinco horas seguidas, o ato de produção de prova oral. É dizer: ao
limitar-se a dar início ao ato de produção de prova, com posterior
atribuição da palavra e da condução das perguntas às autoridades
estrangeiras, o membro do Ministério Público Federal, ao qual foi
confiada a realização do mencionado ato, desobedeceu ordem
expressa da Procuradoria Geral da República, a qual fez constar a
exigência de que a autoridade brasileira não apenas estivesse presente
durante todo ato, como também o dirigisse.
Insta salientar que, no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, na
Carta Rogatória n. 5.480/FR, também já houve a oportunidade de salientar
que a presença de agentes públicos estrangeiros é
permitida "sem que interfiram, direta ou indiretamente, na direção da
audiência". Essa, com efeito, é a melhor interpretação a ser dada aos
dispositivos do Acordo de Cooperação
Judiciária em Matéria Penal entre o Brasil e a França (Decreto n.
3.324/1999), os quais demonstram nítida preocupação com os limites dos
atos de cooperação ali previstos, a bem da
preservação da soberania dos Estados requerente e requerido.
Em
termos simples: o ato de delegação, expressa ou tácita, da condução e
direção de produção de prova oral a autoridade estrangeira, a fim de que
esta proceda diretamente à inquirição da testemunha ou do investigado,
não encontra qualquer tipo de respaldo
constitucional, legal ou jurisprudencial.
Assim,
à luz do explicitado, houve decisão judicial estrangeira que deve ser
submetida ao juízo delibatório do Superior Tribunal de
Justiça, assegurando-se às Partes as garantias do devido processo legal,
sem, contudo, adentrar-se no mérito da decisão proveniente do País
rogante.
Por fim, é
imperativo reconhecer a nulidade da oitiva do recorrente, porque todas
as perguntas teriam sido formuladas direta e exclusivamente pela
autoridade judiciária francesa que acompanhava o membro do Ministério
Público Federal nomeado
para realizar as diligências, bem como a nulidade decorrente do
reconhecimento da necessidade de exequatur, abrange também a realização do aludido ato.
|
PROCESSO |
REsp 1.770.863-PR, Rel. Min. Nancy Andrighi,
Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 09/06/2020, DJe
15/06/2020
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RAMO DO DIREITO | DIREITO PROCESSUAL CIVIL |
TEMA |
Alienação
fiduciária em garantia. Pagamento da integralidade da dívida. Art. 3º, §
2º, do Decreto-Lei n. 911/1969. Prazo. Direito material. Contagem. Dias
corridos. Art. 219,
caput, do CPC/2015. Inaplicabilidade.
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DESTAQUE |
---|
O
prazo de cinco dias para pagamento da integralidade da dívida, previsto
no art. 3º, § 2º, do Decreto-Lei n. 911/1969, deve ser considerado de
direito material, não se
sujeitando, assim, à contagem em dias úteis, prevista no art. 219, caput, do CPC/2015.
|
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR |
A
natureza processual de um determinado prazo é determinada pela
ocorrência de consequências endoprocessuais do ato a ser praticado nos
marcos temporais definidos, modificando a
posição da parte na relação jurídica processual e impulsionando o
procedimento à fase seguinte.
A
partir da entrada em vigor da Lei n. 10.931/2004, que deu
nova redação aos parágrafos do artigo 3º do Decreto-Lei n. 911/1969,
prevê-se a possibilidade de, em cinco dias, contados da execução da
liminar deferida na ação de busca e apreensão, o
devedor de mútuo com garantia de alienação fiduciária pagar
integralmente a dívida.
A
definição da natureza do referido prazo de cinco dias depende da
aferição das consequências da prática, ou não, do ato a ele relacionado,
isto é, ao pagamento, ou não, da integralidade da dívida.
O
pedido da
ação de busca e apreensão é, primordialmente, reipersecutório, haja
vista tratar-se do exercício do direito de sequela inerente ao direito
real de propriedade incidente sobre o bem gravado com
alienação fiduciária; e, por essa razão, ela não se confunde com a ação
de cobrança, por meio da qual o credor fiduciário requer a satisfação da
dívida.
Justamente
por ser o autor o proprietário do bem e, como consequência, possuir o
direito de sequela – de poder buscá-lo na (ou "retirá-lo da") mão de
terceiros –, a ação de busca e apreensão tem como causa de pedir próxima
a relação de direito real, cujo implemento da condição resolutiva não
se operou, em virtude da mora.
Assim,
a sentença de procedência proferida na ação de busca e apreensão tem
natureza meramente declaratória, porquanto, de acordo com a doutrina,
não tem
efeito constitutivo relativamente à consolidação da propriedade; esta
resulta, de pleno direito, da condição, que corresponde à não purgação
da mora.
Realmente, o pagamento da dívida no prazo do art. 3º, §
2º, do Decreto-Lei n. 911/1969, acarretaria, no máximo – na hipótese de
não se discutir a ocorrência de mora ou a
regularidade de sua comprovação –, a declaração da perda do objeto da
ação de busca e apreensão, haja vista ter ocorrido, supervenientemente,
no plano material, a condição que extingue
a propriedade resolúvel do credor.
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PROCESSO |
REsp 1.845.536-SC, Rel. Min. Nancy Andrighi, Rel.
Acd. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, por maioria,
julgado em 26/05/2020, DJe 09/06/2020
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RAMO DO DIREITO | DIREITO PROCESSUAL CIVIL |
TEMA |
Incidente de desconsideração da personalidade jurídica. Condenação em honorários advocatícios. Descabimento. Art. 85, caput e § 1º, do CPC/2015.
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DESTAQUE |
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Não há condenação em honorários advocatícios em incidente de desconsideração da personalidade jurídica.
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INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR |
Nos
termos do novo regramento emprestado aos honorários advocatícios pelo
atual Código de Processo Civil, verifica-se que, em regra, a condenação
nos ônus de
sucumbência é atrelada às decisões que tenham natureza jurídica de
sentença. Excepcionalmente, estende-se essa condenação àquelas decisões
previstas na reconvenção, no
cumprimento de sentença, provisório ou definitivo, na execução,
resistida ou não, e nos recursos interpostos, cumulativamente, conforme
disposição expressa do § 1º do art. 85.
No
caso concreto, está-se diante de uma decisão que indeferiu o pedido
incidente de desconsideração da personalidade jurídica, à qual o
legislador atribuiu de forma
expressa a natureza de decisão interlocutória, nos termos do art. 136 do
CPC/2015.
Assim,
tratando-se de incidente de desconsideração da personalidade jurídica, o
descabimento da condenação nos ônus sucumbenciais decorre da ausência de
previsão legal excepcional, sendo irrelevante se apurar quem deu causa
ou foi sucumbente no julgamento final do incidente.
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PROCESSO |
REsp 1.854.882-CE, Rel. Min. Nancy Andrighi,
Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 02/06/2020, DJe
04/06/2020
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RAMO DO DIREITO | DIREITO PROCESSUAL CIVIL, DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE |
TEMA |
Ação
civil pública. Acolhimento institucional de menor por período acima do
teto legal. Danos morais. Questão repetitiva que não foi objeto de
precedente vinculante.
Existência de inúmeras ações civis públicas no juízo acerca do tema.
Irrelevância. Interpretação restritiva das hipóteses autorizadoras do
julgamento prematuro. Litígio de
natureza estrutural. Necessidade de dilação probatória.
|
DESTAQUE |
---|
Em
ação civil pública que versa sobre acolhimento institucional de menor
por período acima daquele fixado em lei, não é admissível o julgamento
de
improcedência liminar ou o julgamento antecipado do pedido,
especialmente quando, a despeito da repetitividade da matéria, não há
tese jurídica fixada em precedente vinculante.
|
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR |
Na
hipótese, a sentença e o acórdão recorrido concluíram ser possível o
julgamento de improcedência liminar do pedido sob fundamento de que
existiam causas
repetitivas naquele mesmo juízo sobre a matéria, o que autorizaria a
extinção prematura do processo com resolução de mérito.
Todavia,
diferentemente do
tratamento dado à matéria no revogado CPC/1973, não mais se admite, no
novo CPC, o julgamento de improcedência liminar do pedido com base no
entendimento firmado pelo juízo em que tramita o processo sobre a
questão repetitiva, exigindo-se, diferentemente , que tenha havido a
prévia pacificação da questão jurídica controvertida no âmbito dos
Tribunais, materializada em determinadas espécies de
precedentes vinculantes, a saber: súmula do STF ou do STJ; súmula do TJ
sobre direito local; tese firmada em recursos repetitivos, em incidente
de resolução de demandas repetitivas ou em incidente de assunção de
competência.
Por
limitar o pleno exercício de direitos fundamentais de índole processual,
em especial o do contraditório e o da ampla defesa, é certo que a
referida
regra deve ser interpretada de modo restritivo, não se podendo dar a ela
amplitude maior do que aquela textualmente indicada pelo legislador,
razão pela qual se conclui que o acórdão recorrido violou o art. 332,
III, do novo
CPC, sobretudo porque é fato incontroverso que, no que tange ao tema,
não há súmula ou tese firmadas em nenhuma das modalidades de precedentes
anteriormente mencionadas.
De
igual modo, para que possa o juiz resolver o mérito liminarmente e em
favor do réu, ou até mesmo para que haja o julgamento antecipado do
mérito imediatamente após a citação do réu, é
indispensável que a causa não demande ampla dilação probatória, o que
não se coaduna com a ação civil pública em que se pretende discutir a
ilegalidade de acolhimento institucional de
menores por período acima do máximo legal e os eventuais danos morais
que do acolhimento por longo período possam decorrer, pois são questões
litigiosas de natureza estrutural.
Os litígios de natureza estrutural, de que é exemplo a
ação civil pública que versa sobre acolhimento institucional de menor
por período acima do teto previsto em lei, ordinariamente revelam
conflitos de natureza complexa, plurifatorial e policêntrica,
insuscetíveis de solução adequada pelo processo civil clássico e
tradicional, de índole essencialmente adversarial e individual.
Conclui-se que também sob esse enfoque houve violação ao art. 332, caput
e III, do novo CPC, na medida em que o julgamento de improcedência
liminar do pedido (ou de
julgamento antecipado do mérito) é, em regra, incompatível com os
processos estruturais, ressalvada a possibilidade de já ter havido a
prévia formação de precedente qualificado sobre o tema que
inviabilize nova discussão da questão controvertida no âmbito do Poder
Judiciário.
|
QUARTA TURMA
PROCESSO |
RHC 80.124-RJ, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti,
Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 26/05/2020, DJe
03/06/2020
|
---|---|
RAMO DO DIREITO | DIREITO EMPRESARIAL, DIREITO FALIMENTAR |
TEMA |
Empresa
falida. Quebra decretada na vigência do Decreto-Lei n. 7.661/1945.
Sócio minoritário sem poderes de administração. Fixação de residência no
estrangeiro.
Possibilidade. Retroatividade da Lei n. 11.101/2005. Desnecessidade de
autorização judicial. Comunicação fundamentada ao juízo. Suficiência.
|
DESTAQUE |
---|
A
norma mais benéfica do art. 104, III, da Lei n. 11.101/2005, que não
exige mais autorização judicial, mas apenas a comunicação justificada
sobre mudança
de residência do sócio, inclusive para o exterior, pode ser aplicada às
quebras anteriores à sua vigência.
|
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR |
No
caso, apesar da falência estar submetida ao rito do Decreto-Lei n.
7.661/1945, em razão da data de sua decretação no ano de 2004, e a
despeito da previsão contida na
Lei n. 11.101/2005, cujo art. 192 impede expressamente a retroação dos
seus efeitos às falências decretadas antes de sua vigência, não se cuida
aqui de atos processuais que importem ao andamento do processo de
falência, os quais continuam regidos pelo Decreto-Lei n. 7.661/1945, mas
do estatuto pessoal de sócio minoritário, sem poder de administração da
falida, devendo prevalecer o regime jurídico atual, mais
benéfico.
Vale lembrar que, na hipótese de apuração de crimes falimentares, a interpretação desta Corte admite a retroação da norma mais
benéfica.
Além
disso, a restrição de ir e vir apenas se justificaria se houvesse
indício de cometimento de ilícito criminal, o que não ocorreu no caso.
Nem mesmo há referência a inquérito instaurado (após mais de uma década
da quebra), não se olvidando os efeitos de eventual prescrição.
Assim,
deve ser decidido com base no art. 104, inciso III, da Lei n.
11.101/2005, o qual não mais exige a autorização judicial, mas apenas a
comunicação, devidamente justificada, ao juiz da mudança de
residência.
Destaque-se,
por fim, que o "interesse social" em que a falência transcorra dentro
da normalidade (para satisfação dos credores da massa) carece de
concretude, se não há indicação precisa de qual seria a ameaça
representada pela mudança de domicílio, enquanto o processo não alcança a
fase final, nem há o que possa colocar em
risco a solução da lide falimentar.
|
QUINTA TURMA
PROCESSO |
AgRg no HC 580.495-SC, Rel. Min. Reynaldo
Soares da Fonseca, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em
09/06/2020, DJe 17/06/2020
|
---|---|
RAMO DO DIREITO | DIREITO PROCESSUAL PENAL |
TEMA |
Pandemia
de covid-19. Suspensão temporária do trabalho externo do reeducando.
Possibilidade. Substituição automática da prisão decorrente da sentença
condenatória
pela domiciliar. Não cabimento. Resolução n. 62/2020 do CNJ.
|
DESTAQUE |
---|
A
suspensão temporária do trabalho externo no regime semiaberto em razão
da pandemia atende à Resolução n. 62 do CNJ, cuja recomendação não
implica automática substituição da prisão decorrente da sentença
condenatória pela domiciliar.
|
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR |
Não
há constrangimento ilegal na suspensão temporária do trabalho externo,
pois, embora este constitua meio importante para a ressocialização do
apenado, diante
do cenário de crise em que o Brasil se encontra em razão da pandemia,
tem-se que a suspensão do benefício encontra justificativa na proteção
de um bem maior, qual seja, a saúde do próprio
reeducando e da coletividade.
Dessa
forma, considerando que a vedação do ingresso de pessoas nas unidades
prisionais devido à pandemia visa a proteger, de modo eficiente, a
integridade física dos apenados, seria incongruente permitir que os
executados deixassem o presídio para realizar trabalho externo e a ele
retornassem diariamente, enquanto o restante da população é solicitada a
permanecer em isolamento em suas residências.
Ademais,
a recomendação contida na Resolução n. 62, de 18 de março de 2020, do
CNJ não implica
automática substituição da prisão decorrente da sentença condenatória
pela domiciliar. É necessário que o eventual beneficiário do instituto
demonstre: a) sua inequívoca
adequação ao chamado grupo de vulneráveis da covid-19; b) a
impossibilidade de receber tratamento no estabelecimento prisional em
que se encontra; e c) risco real de que o estabelecimento em que se
encontra, e que o segrega do
convívio social, cause mais risco do que o ambiente em que a sociedade
está inserida.
Assim,
a suspensão temporária do benefício vem ao encontro das
ações adotadas pelo Poder Público, as quais, visando à proteção da saúde
da população carcerária, têm admitido a restrição ao direito de visitas
ao preso, a
prorrogação ou antecipação de outras benesses da execução penal.
|
SEXTA TURMA
PROCESSO |
AgRg no HC 575.112-RJ, Rel. Min. Rogerio
Schietti Cruz, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 02/06/2020,
DJe 10/06/2020
|
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RAMO DO DIREITO | DIREITO PROCESSUAL PENAL |
TEMA |
Pandemia de covid-19. Réu residente no exterior sem risco de extradição. Não aplicação da Resolução n. 62/2020 do CNJ.
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DESTAQUE |
---|
A Recomendação n. 62/2020 do CNJ não é aplicável ao acusado que não está privado de liberdade no sistema penal brasileiro.
|
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR |
No caso, o réu está no exterior e não corre o risco de ser extraditado para o Brasil enquanto aguarda o julgamento do habeas corpus pelo Tribunal Regional Federal.
Nesse
contexto, não são aplicáveis as medidas previstas na Recomendação n.
62/2020 do CNJ, pois não se trata de pessoa privada de liberdade no
sistema penal
pátrio.
Ademais, a
idade e histórico de saúde do réu, bem como o fato de seus genitores e
irmão se enquadrarem no grupo de risco da covid-19 em nada interferem na
solução da lide.
A
revisão da cautela em face da pandemia tem o escopo específico de
reduzir os riscos epidemiológicos em unidades prisionais e não de
blindar
pessoas que residem no exterior e que estão em conflito com a lei de
providências processuais, apenas porque têm familiares no Brasil que
integram o grupo de risco pela infecção da doença.
|
PROCESSO |
HC 575.495-MG, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior,
Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 02/06/2020, DJe
08/06/2020
|
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RAMO DO DIREITO | DIREITO PROCESSUAL PENAL |
TEMA |
Execução
penal. Pandemia. Covid-19. Sentenciados do regime semiaberto e aberto.
Suspensão do exercício do trabalho externo. Recrudescimento da situação
prisional. Ilegalidade.
Recomendação n. 62/CNJ. Prisão domiciliar. Concessão.
|
DESTAQUE |
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É
cabível a concessão de prisão domiciliar aos reeducandos que cumprem
pena em regime semiaberto e aberto que tiveram suspenso o exercício do
trabalho externo, como
medida preventiva de combate à pandemia, desde que não ostentem
procedimento de apuração de falta grave.
|
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR |
A
revogação dos benefícios concedidos aos reeducandos configura flagrante
ilegalidade, sobretudo diante do recrudescimento da situação em que
estavam na
execução da pena, todos em regime semiaberto, evoluídos à condição menos
rigorosa, trabalhando e já em contato com a sociedade.
A
adoção
de medidas preventivas de combate à pandemia da covid-19 extremamente
restritivas não levaram em conta os princípios norteadores da execução
penal (legalidade, individualização da pena e dignidade da
pessoa humana), nem a finalidade da sanção penal de reinserção dos
condenados no convívio social, pois a suspensão do exercício do trabalho
externo daqueles em regime semiaberto traz
degradação à situação vivida pelos custodiados que diariamente saem do
estabelecimento prisional para laborar, readaptando-se à sociedade;
portanto, a obrigação de voltar a permanecer em tempo
integral na prisão representa alteração na situação carcerária de cada
um dos atingidos pela medida de extrema restrição.
É
preciso ter em
mente que o recrudescimento da situação prisional somente é admitido em
nosso ordenamento jurídico como forma de penalidade em razão de
cometimento de falta disciplinar, cuja imposição definitiva exige
prévio procedimento disciplinar, com observância dos princípios
constitucionais, sobretudo da ampla defesa e do contraditório.
Assim,
é preciso dar imediato
cumprimento à Resolução n. 62/CNJ, como medida de contenção da pandemia
causada pelo coronavírus (covid-19), notadamente ao disposto no inc. III
do art. 5º, que dispõe sobre a concessão de
prisão domiciliar para todas as pessoas presas em cumprimento de pena em
regime aberto e semiaberto, mediante condições a serem definidas pelo
juízo da execução.
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